Tecerei
alguns comentários baseados em dois textos bíblicos correlatos, que estão I
João 2:20 "E vós tendes a unção do Santo, e sabeis todas as coisas".
e versículo 27 do mesmo capítulo "E a unção que vós recebestes dele, fica
em vós, e não tendes necessidade que alguém vos ensine; mas como a sua unção
vos ensina todas as coisas, e é verdadeira, e não é mentira, como ela vos
ensinou, assim nele permanecereis". Brenann Manning (1934-2013) é um autor
cristão americano que causa forte impressão em seus leitores. Sua história se
identifica com o catolicismo, já que por muitos anos serviu a ordem dos frades
menores, franciscanos, cumprindo os votos de pobreza, castidade e fidelidade a
igreja. Em seus livros conta importantes episódios relacionados a seu período no
catolicismo, experiências marcantes que fizeram crescer sua espiritualidade,
acentuando o misticismo individual. Lembro-me, que num de seus escritos relatou
uma situação em que esteve, por um período, morando entre os pobres numa cidade
da América Central. Através de cartas à amigos nos USA, conseguia
comprometimentos à donativos a essa comunidade. Um fato interessante ocorreu,
dias antes dele despedir-se da coletividade, um de seus amigos enviou um cheque
à uma das famílias com uma quantia razoável. Esse que recebeu a quantia,
descontou o cheque, comprou e distribuindo alimentos, roupas e utensílios de
pequena necessidade à toda comunidade. Antes de tornar-se franciscano serviu a
US Mariner Special force, e por um descuido não foi enviado ao Vietnã, acabou
perdendo o voo que transportaria os soldados para a guerra. Dias depois vencia
seu prazo na Marinha dando baixa da corporação. Brennan tinha uma amiga com
quem se correspondia a anos; os dois acabaram apaixonando-se e decidiram que se
casariam. Como ainda estava debaixo dos votos da Ordem, pediu ao seu
eclesiástico superior autorização para contrair núpcias. Isso era realmente
impossível, pois se ele quisesse assumir esse compromisso deveria desligar-se
da igreja. O celibato é condição imprescindível à desenvolver a vida pastoral e
clerical. Desse modo espontaneamente foi desligado da ordem franciscana
recebendo a carta de exclusão do sacerdócio e meses depois oficializou seu
matrimônio. Um fato que Brennan não esconde de seu leitores, era seu vício com a
bebida. Por anos foi alcoólatra, mesmo exercendo a vida religiosa, sendo que no
catolicismo, seus superiores, tiveram compreensão de sua fraqueza com esperança
que se libertaria com o tempo. Como tinha uma ótima retórica e fundamentação
teológica, além de filosófica, agora como leigo, era constantemente convidado
para fazer conferências e palestras evangelísticas. Isso no meio católico e
também protestante, mas com o tempo as dioceses o proibiram que ministrar nas
paróquias e eventos católicos. Seu casamento durou pouco, pois como se agravava
sua condição de alcoólatra era uma situação dificílima para sua esposa suportar
com resignação tal estado de entorpecimento produzido pela bebida. Foi
tremendamente penoso pra ele o divórcio; nutria uma forte impressão pela
família, desejando a felicidade em seu lar com muitos filhos; que não se
realizou. Algo que o ajudou muito nesse período da incontinência com a bebida,
foi fazer parte do grupo dos alcoólatras anônimos. Com esse grupo e com outros,
Brenann, elaborava palestras motivacionais e testemunho de como enfrentavam o
alcoolismo e outras questões. Já no início dos anos 80 reunia grupos de homo afetivos
em congresso, ministrando-lhes o amor de Cristo numa mensagem de tolerância,
compreensão e integração social. Mostrando-lhes que Deus os amava como eram, e
sua sexualidade podia ser desenvolvida sem culpa ou pecado, desde que, se
comprometessem com seu parceiro num amor mútuo, afinidade e cumplicidade no
relacionamento. Isso escandalizava os líderes cristãos da época. Num de seus
livros O Evangelho Maltrapilho, Brenann, fala que as prostitutas estão no céu
junto com todos os filhos de Deus. Uma referência ao famoso escritor russo
Fiodor Dostoievsky (1821-1881) que com a personagem Sonia Marmeladov da obra
Crime e Castigo, cujo primeiro nome significa sabedoria, tipificou a
prostituta, não só para ilustrar a misericórdia divina com relação a mulher
"caída", mas para ter dela sua própria salvação através da
extravagante graça divina. Esse irmão em Cristo, morreu ano retrasado em abril
de 2013 com 81 anos. Sua velhice foi bastante complicada em termos de saúde, já
que perdeu a visão, tinha dificuldade em se locomover, sendo carregado nos
deslocamentos básicos como tomar banho, deitar-se e levantar-se. Se
alimentava com auxílio de um enfermeiro. Muitos desses fatos estão relatados em
seus livros, tendo muita coragem e confiando na graça divina para expor suas
fraquezas ao público; coisa que já vi, mas em pouquíssimos escritores. Assim,
em seus últimos dias viveu praticamente amparado, sendo guardado e sustentado
pela graça divina da qual ele tanto fala em seus vários livros publicados; pelo
seu testemunho pessoal nunca se afastando dela. Um exemplo, a graça divina, a
ser seguido por nós. E quanto ao alcoolismo, ele se curou, talvez alguns de
vocês estejam se perguntando? Bem, quanto a isso não tenho resposta. O Brennan
tem um interessante livro com o título Deus o Ama do Jeito que Você É. Também O
Impostor que Morra em Mim e O Obstinado Amor de Deus são outros excelentes livros.
Infelizmente por tentar ser uma pessoa autêntica, procurando em suas palavras e
atos ser genuíno, esse irmão foi muito criticado pela liderança cristã em seu
país e seus livros ainda hoje são visto com reservas pelos ortodoxos e
dogmáticos da teologia. Os que leem sua obra se apaixonam por saber que alguns
confiando na graça divina, vivem a vida com intensidade dando frutos dignos de
arrependimento. As vezes ficamos pensamos, mas porque sofremos? Sendo esse
sofrimento causado pelos nossos pecados e outros fatores, o que devemos fazer
para nos livrar dessa situação? Nessa particularidade é interessante
acrescentarmos aquilo que Jesus falou em João 16:33 "Tenho vos dito isso,
para que em mim tenhais paz; no mundo tereis aflições, mas tende bom ânimo, eu
venci o mundo". As palavras do mestre são enfáticas ao asseverar que todos
os seres, humanos e não humanos, sem distinção terão que enfrentar o sofrimento
em suas vidas. Ele se manifesta em nosso nascimento, crescimento,
envelhecimento e morte. Para um entendimento mais abrangente desse tema,
sofrimento, precisamos ter a ideia de que, estamos nesse mundo de passagem;
forasteiros e peregrinos como a bíblia fala em I Pedro 2:11; estivemos aqui
antes, estamos hoje e retornaremos depois, quantas vezes forem necessárias
pelos renascimentos. Do contrário não temos como justificar que alguém que
conhecemos, vivendo de maneira justa, reta e integra diante de Deus sofra
terríveis vicissitudes em sua vida. O sofrimento funciona como ajuste e
correção de situações não resolvidas no passado, aperfeiçoando e
desenvolvendo a vida presente. Ao referir-se a paz, imagino que o
Mestre quis dizer, que o sofrimento é além de uma disciplina corretiva ao nosso
ser, também o processo inevitável que nos conduzirá ao progresso espiritual.
Como é dito em Gálatas 6:7 "(...) tudo o que o homem semear isso também
ceifará". Dessa maneira, as situações que enfrentamos em nossas vidas são
resultados daquilo que fizemos, no passado ou no presente, para recebermos como
consequência o que estamos colhendo. Não tenho a intenção de insinuar um
determinismo ou predestinação, mas nossos atos são resultado daquilo que
escolhemos baseados em nossa vontade. Assim os dois aspectos conjugados
reproduzem a evolução de nossa consciência espiritual; um nos levará
infalivelmente ao Logos Eterno, o outro disciplina, corrigindo, nosso
comportamento e conduta nos renascimentos. Um bom exemplo como ilustração
é o da lagarta que está sendo preparada para ser uma linda borboleta. Por um
período de tempo ela sofre em seu casulo com terríveis dores advinda da
metamorfose, transformação, pela qual passa, mudando completamente sua
aparência física, incluindo nervos, peles, músculos, asas, antenas e outros
adaptadores. Tudo para viver sua elevada vida de borboleta, que voando por
galhos, árvores e flores, distribui o pólen, para reprodução dos vegetais,
disseminando vida em abundância na natureza. Desse modo, deixa para
trás a primitiva e rastejante forma de lagarta, que contamina e infesta
degradantemente a vida vegetal e animal. Acho que nessa vida estamos também
passando por um processo semelhante. Nossa personalidade terrena, apegada ao
materialismo e desejos egoístas de nossa vontade precisa ser depurada pelo
fogo, sofrimento, que limpará toda a impureza e sordidez incrustadas pelo
pecado, onde nesse estágio espiritual somos introduzidos numa individualidade
límpida, pura e santa que culminará com nossa salvação completa, tornando-nos
homem perfeito como dito em Efésios 4;13 "Até que todos cheguemos a
unidade da fé, e ao conhecimento do filho de Deus, a homem perfeito, a medida
da estatura completa de Cristo". Acontece que muitas vidas serão
necessárias à que cheguemos no topo da escada de Jacó, onde os anjos de Deus
subiam e desciam por ela. Assim cotidianamente estamos aprendendo as
lições ensinadas pela escola da vida, em alguns testes somos
aprovados, mas em outros, temos que repetir a mesma aula. A pedagogia da vida é
tão maravilhosa que nos dá tantas oportunidades, quantas forem
necessárias para que aprendamos a lição, sendo aprovados no exame. Mas o que a
unção tem haver com o que acabamos de falar? Acho que tudo, pois ela é a chave
da solução do problema do sofrimento; a iniciadora e finalizadora
do estágio de nossa transformação à estatura completa de Cristo. A unção,
entendo, como nosso mestre espiritual, nosso guru interno ou o Espírito Santo
que faz morada em nosso ser. Podemos inferir da passagem bíblica de I João
2:27, que a responsabilidade pelas escolhas quando passadas pelo crivo da
vontade é individual, sendo legitimadas pelo livre arbítrio. Deus nos outorga
essa liberdade sem interferir em nossa decisão, respeitando e abençoando o
caminho que escolhemos, dentro daquilo que compreendemos como o melhor para
proporcionar-nos felicidade e paz. Os dois textos da unção, penso, deixa claro
que nossa opinião sobre nossos problemas têm preponderância sobre aquilo que os
outros dizem sobre eles. Em outras palavras, posso ouvir o que as pessoas tem a
dizer sobre o que estou vivendo no presente, mas esses conselhos posso
aceitá-los ou rejeitá-los, dependendo do que seja melhor para mim e minha
família. Em alguns casos por assumirmos um excesso de preciosismo pela
organização ou instituição onde estamos afiliados, confundimos nossas escolhas
públicas com as privada. Uma está na esfera geral e comum, onde compartilhamos
a responsabilidade com o grupo onde estamos inserido. A outra é
particular, em nosso foro íntimo como obrigação exclusiva. Sendo que nessa
situação respondemos diante de Deus pessoalmente pelo que decidimos; a
despeito do que falou qualquer irmão ou amigo. Essa última instância, a
privada, está ligada a unção interior comentada pelo apóstolo João em sua
carta que citamos no início. O zelo exagerado, expresso em nossa
espiritualização, impessoaliza a deliberação, fragilizando nosso
pensamento em relação ao conflito ou questão que enfrentamos, criando
dúvida se nossa escolha foi correta ou incorreta. A falsa impressão de que
devemos dividir com outros, os lucros ou perdas de nossas escolhas acaba comprometendo
o livre arbítrio, retirando parte de nossa liberdade, mas ao final das
contas, apenas nós arcaremos com o ônus ou bônus de nossa escolha. Assim,
nossa consciência ganha importância fundamental nas decisões que temos de
tomar. Precisamos estar sensíveis a voz interior manifestada na intuição,
percepção, sensação e sentimento. Em questão de consciência não devemos nos
deixar influenciar por terceiro, a obrigação do direcionamento de qual caminho
vamos tomar é inteiramente nossa, e tenhamos certeza que, nosso mestre, a unção
interior, nos conduzirá pela senda que trará progresso espiritual, felicidade,
amor e paz. Budha disse: "Veja o falso como falso, o verdadeiro como
verdadeiro. Olhe para o seu coração. Siga a sua natureza". Osho
(1931-1990) explicando esse aforismo diz: "Budha não está dizendo, siga as
escrituras. Ele não está dizendo siga-me. Ele não está dizendo, siga certas
regras de conduta. Ele não está ensinando a você qualquer moralidade. Ele não
está tentando criar um certo caráter em você, porque todo caráter é uma bela
cela de prisão. Ele não está dando a você um certo caminho para viver. Ao invés
disso, ele está lhe dando coragem para seguir a sua própria natureza. Ele quer
que você seja corajoso o bastante para ouvir o seu próprio coração, e seguir de
acordo com ele. Siga a sua natureza, quer dizer, flua com você mesmo. Você é a
escritura (...) e escondido lá no fundo de você ainda está uma pequena voz. Se
você se tornar silencioso, você será guiado por ela". Abraço. Davi.
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