Budismo. www.maisbelashistoriasbudistas.com.br BUDISMO E A DOUTRINA DO CORAÇÃO. Texto de Greg
Martin (1984- ). Como foi criado o mundo, em outras palavras, o
universo? Esta interrogação tem mantido perplexos aos seres humanos através de
todos os tempos. A mitologia, a ciência e a religião nasceram dessa permanente
busca. Os dez primeiros capítulos da Bíblia, Gênesis 1-10 formam a pedra
angular das três principais tradições religiosas do ocidente, judaísmo,
cristianismo e islamismo. Eles nos relatam a história da Criação. Deus criou o
universo e tudo o que nele existe, incluindo a terra, o céu, a luz, as plantas e
os animais, em seis dias, descansando no sétimo dia. Ele criou o primeiro
homem, Adão, soprando a alma ao pó para depois dar-lhe como morada o Jardim do
Éden. Deus criou a primeira mulher, Eva, da costela de Adão, para
proporcionar-lhe uma companheira. Enganada por uma serpente, Eva desobedeceu às
ordens dadas por Deus ao comer a maçã da árvore do conhecimento do bem e do
mal. Ao mesmo tempo, ela convence Adão para que faça o mesmo. O castigo
infringido por Deus a condena ao alumbramento com dor e à servidão ao marido.
Deus expulsa ambos do Jardim. Transcorreram várias gerações e Deus não estava
feliz com os resultados de sua criação, particularmente porque a maldade
imperava no mundo. Disse-lhe a Noé que construísse uma grande embarcação, e
colocasse nela casais de todos os animais que habitavam a terra e a sua
família. Depois provocou uma grande inundação que exterminou todos os seres
vivos da face da terra. Após 150 dias as águas se retiraram e a embarcação de
Noé ficou depositada no topo do Monte Ararat. Um novo começo se inicia para a
humanidade a partir dos descendentes de Noé. Estes são os pontos básicos da
história da criação, tal como a relata o livro do Gênesis. Deus é o criador
original de tudo o que existe ex nihilo (criado do nada). Em
épocas anteriores esta história era aceita como um fato inquestionável e como a
palavra divina e irrefutável de Deus. Hoje em dia há os que ainda professam
esta crença. A captura e deportação do povo judeu à Babilônia
por parte de Nabucodonosor no ano 587 AC, onde permaneceram por cinquenta anos
(duas gerações), colocou o povo judeu em contato direto e de maneira frequente
com as influências do oriente revelada nos hindus, persas e babilônicos.
Durante este período, no seu exílio o povo judeu entrou em contato com mitos e
lendas do oriente, particularmente da Índia e do Irã, convertendo-se os mesmos
em parte da tradição judaica. Dentro destes encontram-se os mitos da criação e
a ideia tomada dos ensinamentos do zoroastrismo, particularmente a
profecia de um redentor ou salvador. A história da
criação não é original dos cristãos, ou dos judeus. Os elementos chaves datam
de fontes anteriores ao Antigo Testamento e provêm de áreas geográficas, tais
como a Índia, o Oriente Médio, e Grécia. A criação do universo, o mundo e os primeiros
seres humanos, partindo do conceito de uno que depois se
converte em dois, são temas comuns em algumas das tradições
mais antigas. As origens do mito do dilúvio são, também mais antigas.
Referências aos mesmos se encontram nos textos da escritura cuneiforme dos
sumérios ao redor dos anos 2000 – 1750 AC. Todos os elementos essenciais a
respeito da história sobre a criação do mundo encontram-se em fontes pagãs de
maior antiguidade. A ideia da criação ex
nihilo nem sempre foi parte da doutrina cristã. A comunidade dos
primeiros cristãos não tinha uma posição monolítica a esse respeito. Não foi
senão até o dia 20 de maio do ano 325 no Conselho de Niceia que esta doutrina,
tornou-se oficial sob a supervisão do imperador romano Constantino. É interessante notar que as famosas palavras de abertura do Evangelho de
João nos dão um ponto de partida ligeiramente diferente a respeito da criação:
“No início existia o Verbo, o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”.
“Verbo” é uma tradução do grego logos, e refere-se a um princípio
integrador (lei) que cria a ordem no cosmos. A semelhança com o conceito
budista do Dharma, o que nós denominamos Lei Mística, é surpreendente. Tanto o oriente como o ocidente, compartilham histórias mitológicas
sobre a criação. Porém, por volta de 1500, quando os pensadores da Reforma
questionavam a veracidade destas histórias, os muçulmanos estudavam que o
paraíso e o inferno eram assuntos internos a cada indivíduo, os cabalistas
advertiam aos seus discípulos a não tomar a mitologia de maneira literal;
porém, a maioria dos cristãos ainda insisti que o narrado nesta história
ajustava-se aos fatos reais, ou seja, eram certos e verdadeiros em todos seus
detalhes e aspectos. Desta forma, inicia-se o longo
conflito entre o cristianismo e a ciência, ou com maior precisão, o conflito
entre dois pontos de vista científicos, separados por 6000 anos, uma data de
4000 AC e o outro de 2000 DC. A interpretação
literal do mito da criação em qualquer religião ou cultura tem a desafortunada
consequência de obrigar às pessoas a escolher entre o coração que anseia
acreditar, e o cérebro, que vê que o argumento não é consistente com a
observação objetiva dos fenômenos. Os mitos sobre a
criação no oriente, ainda quanto um tanto similares na superfície (a final de
contas, são a fonte de onde emanam os mitos do ocidente), porém, são essencial
e fundamentalmente diferentes dos do ocidente, num aspecto importante. Os
primeiros, geralmente não apresentam distinção entre Deus e o ser humano. O
divino encontra “aqui dentro”. No ocidente, porém, de acordo com a Bíblia, o
Criador é diferente, separado e “lá fora”, dando-se, assim, o caso de que
existe uma brecha intransponível entre ambos. O Budismo, porém, tem como
intenção ajudar aos fiéis a realizar a vivência de sua identidade original
na própria vida, aquela identidade que é una com a força criativa, ou Lei
Mística. Dentro do cristianismo, a igualdade com o Criador não é possível. O
cristianismo tem como propósito restaurar a relação com este
“outro” ser absoluto. Qual é o ponto de vista
budista a respeito de nossas origens? As antigas tradições da Índia indicam que
os budistas entendiam que o universo era ordenado por ciclos recorrentes de
mundos que se manifestavam e desapareciam. Cada ciclo tinha seu término em
dilúvio ou fogo. Estes ciclos de formações e destruições de mundos duravam
bilhões de anos e ocorriam em todo o universo. Das cinzas ou lodo que
resultavam da destruição, um novo ciclo nascia. Este ciclo não tem início nem fim.
Mundos e universos eram criados e destruídos como parte de um ciclo
interminável de nascimento e morte que operava em escala cósmica. Para os budistas, então, não existe uma criação no sentido da história
bíblica. O universo se formou quando as condições necessárias se deram,
baseadas na lei de causa e efeito inerente na própria natureza do universo. Da
mesma forma como surge, desaparece. Mas não há uma causa original, como não há
um final. O universo é infinito, sem limites de tempo e espaço. “O universo em
si mesmo é um ser vital que contém o potencial da vida que desenvolve de
diferentes formas; é, portanto, definido como a entidade de vida mais
grandiosa”. Os cosmólogos, hoje em dia, postulam a teoria de
um universo dinâmico, em fluxo constante. Onde, num ponto, o universo parece
ter nascido da causa do “big bang” original e encontra-se em constante
expansão, em tanto que, em outro ponto parece encontrar-se num processo de
contração e extinção. Mas o universo em si não tem começo ou fim. Este ponto está
de acordo com a perspectiva budista. A Lei Mística é o nome que
damos a esta lei de causalidade subjacente que opera eternamente através do
universo inteiro. Quando as condições são propícias, surgem planetas. Quando as
condições são adequadas, a vida evolui. O oceano gera ondas. O universo gera
vida. A vida evolui para o despertar e a iluminação. O potencial para a vida, para a vida iluminada, existe na própria
essência do universo, é uma lei mística natural. Dado que o ritmo universal
apoia a vida, podemos descrever a natureza do universo como benevolente. Há os
que dão, a esta capacidade inerente criadora para construir o mundo, ao
potencial de gerar o universo, o nome de Deus; nós o chamamos Lei Mística de
Nam myoho rengue kyo. Abraços. Davi.http://www.maisbelashistoriasbudistas.com.br.
quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019
quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019
RENUNCIAR NÃO É SUFICIENTE
Bhagavad
Gita – A Ciência Suprema. www.vrinda.vaisnava.hu/vrindastudio.
Compilado por Swami B. A. Paramadvaiti e Sripad Atulananda Acharya. RENUNCIAR
NÃO É SUFICIENTE. ATUAR COM Capítulo Três. DEVOÇÃO TRANSCENDENTAL NOS CONDUZ À
LIBERAÇÃO 1. Arjuna disse: Ó Krishna! (Ó Janardana! Ó Keshava)! Por que me
impele a participar nesta guerra horrível se considera que a inteligência é
melhor que o trabalho lucrativo? 2. Minha inteligência está confusa por Suas
instruções ambíguas. Assim por favor, diga-me de forma definitiva, o que é
melhor para mim. 3. O bem-aventurado Senhor disse: Ó impecável Arjuna! Já
expliquei que há duas classes de pessoas que compreendem o eu. Algumas se
inclinam a compreendê-lo mediante a especulação filosófica empírica, e outros
se inclinam a conhecê-lo mediante o trabalho devocional. 4. A pessoa não pode
se liberar da reação simplesmente por se abster do trabalho, nem pode alcançar
a perfeição unicamente pela renúncia. 5. Todas pessoas estão irremediavelmente
forçadas a atuar conforme os impulsos nascidos das modalidades da natureza
material; portanto, ninguém pode se abster de fazer algo, nem sequer por um
momento. 6. Aquele que restringe os sentidos e os órgãos da ação, mas cuja
mente mora nos objetos dos sentidos, certamente engana a si mesmo e é chamado
farsante. 7. Por outro lado, aquele que controla os sentidos com a mente e
ocupa sem apego seus órgãos ativos em trabalhos devocionais, é muito superior.
8. Execute seu dever prescrito, pois a ação é melhor que a inação. Sem o
trabalho, a pessoa nem sequer pode manter seu corpo físico. TODO SACRIFÍCIO
DEVE SER OFERECIDO A VISHNU 9. O trabalho deve ser executado como um sacrifício
a Deus (Vishnu), de outro modo, o trabalho ata a pessoa a este mundo material.
Portanto, ó Arjuna (filho de Kunti), execute seus deveres prescritos para a
satisfação dele, e dessa forma, sempre permanecerá desapegado e livre do
cativeiro. Meditação: O trabalho lucrativo prende o ser condicionado. Todas as
atividades materiais estão motivadas pelo conceito de "eu" e
"meu". Devemos aprender a trabalhar com consciência divina. O
trabalho para ajudar a missão de Sri Cheitanya Mahaprabhu (1486-1534) não é um
trabalho egoísta, não é para o próprio benefício. Como é um trabalho para Deus
mesmo, os únicos beneficiados são os seres condicionados. Trabalhar para esta
causa, sem interesse pessoal e sob as ordens do mestre espiritual, pode nos
liberar do cativeiro material. Muitas pessoas pensam que os devotos de Krishna
trabalham para seus interesses egoístas de forma oculta, mas este verso
esclarece que aquele que trabalha para si mesmo, não pode ser uma pessoa
avançada, ainda que vista o hábito de renunciante. 10. No princípio da criação,
o Senhor de todas as criaturas manifestou gerações de homens e semideuses junto
com sacrifícios para Vishnu, e os abençoou ao dizer: "Sejam felizes com
este sacrifício, porque sua realização proporcionará a vocês todas as coisas
desejáveis". Meditação: Srila Prabhupada (1896-1918) nos ensina: Esta
criação material, feita pelo Senhor das criaturas (Vishnu), é uma oportunidade
que se oferece aos seres vivos para regressar ao lar, regressar a Deus. Todos
os seres vivos dentro da criação material estão condicionados pela natureza
material, devido ao esquecimento de sua relação com Krishna, a Suprema
Personalidade de Deus. Os princípios védicos são para nos ajudar a compreender
essa relação eterna, tal como se estabelece no Bhagavad-gita: "Eu sou o
que deve ser conhecido em todo conteúdo dos Vedas". 11. Os semideuses
satisfeitos com os sacrifícios, também os satisfarão. Dessa forma, com a
nutrição recíproca, reinará a máxima prosperidade para todos. 12. Os semideuses
que estão a cargo das diversas necessidades da vida, ao estarem satisfeitos com
a execução do sacrifício, abastecem os seres vivos com tudo o que necessitam.
Mas aquele que aproveita esses dons sem oferecê-los de volta aos semideuses,
certamente é um ladrão. Meditação: De acordo com os Vedas, os semideuses são
assistentes da Suprema Personalidade de Deus para os assuntos materiais. Eles
provêm luz, água, ar, etc., sempre sob a ordem de Krishna. Na Antiguidade se
ofereciam sacrifícios aos semideuses como agradecimento pelos bens recebidos,
mas isso não é necessário se a pessoa agradece a Krishna, que é o Supremo Controlador
e raiz do universo. 13. Os devotos do Senhor se liberam de toda classe de
pecados porque comem alimentos que se oferece primeiro em sacrifício. Os
demais, que preparam alimentos para o seu próprio prazer dos sentidos, na
verdade comem somente pecados. Meditação: Este é um verso muito importante do
Bhagavad-gita que marca um regulamento diário na vida dos devotos do Senhor.
Eles, antes de comer, oferecem seus alimentos com amor e devoção a Deus. O
alimento é aceito por Krishna e se espiritualiza, assim se torna um agente
purificador para quem o come. Assim o mesmo fato de comer se torna uma
meditação, uma ajuda em nosso avanço espiritual. Quem pelo contrário não faz
isso, come somente pecado, pois só quer saber de aproveitar separadamente de
Deus. 14. Todos os corpos vivos subsistem de grãos alimentícios, que se
produzem das chuvas. As chuvas se produzem pela execução de sacrifício, e o
sacrifício nasce dos deveres prescritos. Meditação: Neste verso, Krishna
resolve a maior parte do problema econômico do mundo. Se as pessoas fazem
sacrifícios, haverá chuva, e a chuva fará crescer cereais suficientes, frutas e
verduras para todos. O sacrifício nasce do dever prescrito. Esse dever é social
e espiritual. A pessoa deve cumprir seus deveres sociais de forma honesta e
constante. Nosso dever espiritual, especialmente nesta era, é o de cantar os
santos nomes de Krishna: Hare Krishna, Hare Krishna, Krishna, Krishna, Hare
Hare, Hare Rama, Hare Rama, Rama Rama, Hare Hare, e servir ao Senhor na
companhia dos devotos. Dessa forma, pela satisfação do Senhor Supremo, a
humanidade poderá gozar abundantemente de todos os bens desejáveis sem nenhuma
ansiedade. 21. Nos Vedas se prescrevem atividades reguladas, e os Vedas se
manifestam diretamente da Suprema Personalidade de Deus. Em consequência, a
transcendência toda-penetrante se situa eternamente nos atos de sacrifício. 16.
Meu querido Arjuna, a pessoa que não segue o sistema de sacrifício prescrito
nos Vedas, leva na verdade uma vida de pecado, porque aquele que se deleita
unicamente nos sentidos, vive em vão. 17. No entanto, não há dever para aquele
que se deleita no eu, que está iluminado no eu, que se regozija e que,
plenamente saciado, se satisfaz unicamente no eu. Meditação: Srila Prabhupada
diz: O Supremo é, para os devotos, a Personalidade de Deus, e para os
impersonalistas é a liberação. Portanto, uma pessoa que atua para Krishna, ou
seja, em consciência de Krishna, sob uma guia adequada e sem apego ao resultado
do trabalho, certamente progride até a meta suprema da vida. Arjuna recebeu a
ordem de lutar na batalha de Kurukshetra pelo interesse de Krishna, pois
Krishna queria que ele lutasse. Ser uma pessoa boa ou uma pessoa não violenta é
um apego pessoal, mas atuar pelo Supremo é atuar sem apego ao resultado. Essa é
a ação perfeita do grau mais elevado que recomenda Sri Krishna, a Suprema
Personalidade de Deus. Os rituais védicos, tais como os sacrifícios prescritos,
são levados a cabo para purificar as atividades ímpias realizadas com o fim da
satisfação pessoal. Mas a atividade em consciência de Krishna é transcendental
às reações do trabalho bom ou mau. Uma pessoa em consciência de Krishna não tem
apego pelo resultado, senão que atua unicamente para Krishna. Ela se ocupa em
todo tipo de atividades, mas está completamente desapegada. 18. A pessoa auto
realizada não tem nenhum propósito para satisfazer enquanto desempenha seus
deveres prescritos, nem tem algum motivo para deixar de executar tal trabalho,
nem tem necessidade de depender de nenhum outro ser vivo. 19. Portanto, a
pessoa deve atuar como uma questão de dever, sem se apegar aos frutos das
atividades, porque se trabalhar sem apego, a pessoa alcança o Supremo.
Meditação: Antes de tudo temos que investigar qual é nosso dever. Isso
aprendemos de Krishna no Bhagavad-gita, e é servi-Lo, e dedicar o resultado de
nossas atividades a Ele. Ao avançar mais, a pessoa poderá encontrar o mestre
espiritual que o guiará na consciência de Krishna e indicará deveres mais
específicos. OS LÍDERES DEVEM ATUAR SEMPRE COMO UM EXEMPLO PARA OS DEMAIS 20.
Inclusive reis como Janaka e outros alcançaram a etapa da perfeição mediante a
execução dos deveres prescritos. Portanto, deve executar seu trabalho
unicamente para educar as pessoas em geral. 21. As pessoas comuns seguem os
passos de um grande homem, qualquer que seja a ação que este execute, e
quaisquer que sejam as normas que ele estabeleça mediante seus atos exemplares,
serão seguidas por todo mundo. 22. Ó Arjuna! Não há trabalho prescrito para Mim
dentro dos três sistemas planetários. Nem necessito nada, nem tenho que obter
nada; ainda assim, Eu Me ocupo no trabalho. 23. Pois se Eu não Me ocupasse no
trabalho, ó Arjuna (Partha), certamente todas pessoas seguiriam meus passos.
24. Se Eu deixasse de trabalhar, então todos estes mundos iriam à ruína. Eu
também seria a causa de população não desejada e, por conseguinte, destruiria a
paz de todos os seres conscientes. Meditação: Krishna se faz diretamente
responsável se os seres vivos se desviam. Por isso, o Senhor descende e corrige
a sociedade quando há um descuido geral dos princípios reguladores. Krishna,
junto dos Vedas e de Seus devotos, prescreve regras e regulamentos mediante os
quais a população pode progredir de forma automática, pacífica e organizada na
vida espiritual. 25. Assim como os ignorantes executam seus deveres com apego
aos resultados, de forma similar, os sábios devem atuar também, mas sem apego,
a fim de conduzir as pessoas pelo caminho correto. 26. Os sábios não devem
perturbar a mente dos ignorantes que estão apegados à ação lucrativa. Não se
deve incitá-los a se abster do trabalho, senão a trabalhar com espírito de
devoção. 27. Por estar sob a influência dos três modos da natureza material, o
ser vivo confuso se crê o executor das atividades, que na realidade são levadas
a cabo pela natureza. Meditação: Os três modos da natureza material serão
explicados em detalhes nos capítulos posteriores, como Quatorze e Dezoito. Os
três modos são bondade, paixão e ignorância. Os seres vivos condicionados estão
sempre subjugados por estes modos. Também devemos entender que nossas
atividades estão muito condicionadas pelos arranjos da natureza material e por
vontade do Senhor Supremo; portanto, não devemos nos orgulhar se sair algo bem,
nem nos desesperar se sair algo mal. Ao atuar sempre com boa fé, sob as sábias
instruções de Krishna, a pessoa deve tratar de satisfazê-Lo, sem se apegar ao
resultado nem nunca se desanimar. 28. Ó Arjuna de braços poderosos! Aquele que
conhece a Verdade Absoluta não se ocupa nem nos sentidos, nem na satisfação
desses, pois conhece bem a diferença entre o trabalho devocional e o trabalho
pelos resultados lucrativos. 29. Os ignorantes, iludidos pelos modos da
natureza material, se ocupam totalmente em atividades materiais e se apegam.
Mas os sábios não devem perturbá-los, ainda que esses compromissos sejam
inferiores devido à falta de conhecimento da parte dos executores. 30.
Portanto, ó Arjuna, entregue-Me todas suas ações, com sua mente absorta em Mim,
sem desejo de ganho, livre de egoísmo e letargia, lute. 31. Aqueles que
executam seus deveres de acordo com Minhas ordens e que seguem estes
ensinamentos fielmente, sem inveja, se liberam do cativeiro das ações
lucrativas. 32. Mas aqueles que devido à inveja fazem caso omisso destes
ensinamentos e não os praticam regularmente, devem ser considerados desprovidos
de todo conhecimento, enganados e condenados à ignorância e ao cativeiro. 33.
Mesmo a pessoa com conhecimento atua de acordo com sua própria natureza pois
cada qual segue sua natureza de acordo as três modalidades adquiridas. Que pode
se alcançar com a repressão? 34. Os seres corporificados sentem atração e
repulsão pelos objetos dos sentidos, mas não se deve cair sob o controle dos
sentidos e dos objetos dos sentidos, pois eles são obstáculos no caminho da
auto realização. 35. É muito melhor executar os próprios deveres prescritos,
ainda que seja de forma defeituosa, do que executar o dever de outro. É
preferível a destruição enquanto se executa os deveres próprios, que se ocupar
nos deveres alheios, já que é perigoso seguir o caminho de outro. A LUXÚRIA, O
GRANDE INIMIGO DO MUNDO. 36. Arjuna disse: Ó Krishna (descendente de Vrisni)! O
que faz a pessoa cometer atos pecaminosos, ainda que involuntariamente, como se
fosse obrigada pela força? 37. O bem-aventurado Senhor disse: É unicamente a
luxúria, Arjuna, que nasce do contato com as modalidades materiais da paixão.
Esta luxúria logo se transforma em ira, devora tudo e constitui o inimigo
pecaminoso deste mundo. 38. Assim como a fumaça encobre o fogo, ou como o pó
encobre um espelho, ou como o ventre encobre o embrião, de forma similar, o ser
vivo é encoberto por diferentes graus desta luxúria. 39. Assim a consciência
pura do ser vivo está coberta por seu inimigo eterno, na forma da luxúria, que
nunca se satisfaz e arde como o fogo. 40. Os sentidos, a mente e a inteligência
são os lugares onde se situa a luxúria, que cobre o verdadeiro conhecimento do
ser vivo e o confunde. 41. Portanto, ó Arjuna, o melhor dos Bharatas! Refreie
desde o princípio esse grande símbolo do pecado (a luxúria) mediante a
regulação dos sentidos, e mate esse destruidor do conhecimento e da auto
realização. 42. Os sentidos de trabalho são superiores à matéria inerte, a
mente é superior aos sentidos, a inteligência é ainda mais elevada que a mente;
e ela (a alma), é superior inclusive à inteligência. 43. Dessa maneira,
sabendo-se transcendental aos sentidos, à mente e à inteligência materiais, a
pessoa deve controlar o eu inferior por meio do eu superior, e assim, mediante
a força espiritual, conquistar esse insaciável inimigo conhecido como luxúria.
Meditação: Srila Prabhupada nos instrui: Este Terceiro Capítulo do
Bhagavad-gita dirige conclusivamente à consciência de Krishna, ao se conhecer a
si mesmo como servente eterno da Suprema Personalidade de Deus, sem considerar
o vazio impessoal como o fim último. Na existência material, a pessoa
certamente está sob a influência da luxúria e o desejo de dominar os recursos
da natureza material. Os desejos de assenhorear-se e de gratificar os sentidos
são os piores inimigos do ser condicionado; mas graças ao poder da consciência
de Krishna, a pessoa pode controlar os sentidos materiais, a mente e a
inteligência. Não se pode abandonar repentinamente o trabalho e os deveres
prescritos, mas com desenvolvimento gradual da consciência de Krishna, a pessoa
pode se situar em uma posição transcendental sem estar influenciada pela mente
nem pelos sentidos materiais; e pode desenvolver uma inteligência firme e
encaminhada para a própria identidade pura. Essa é a conclusão do presente
capítulo. Na etapa imatura desta existência, nem as especulações filosóficas,
nem as tentativas artificiais para controlar os sentidos mediante a suposta
prática das posturas de yoga, poderão ajudar uma pessoa na vida espiritual. Tal
pessoa deve treinar a consciência de Krishna com o uso de uma inteligência
superior. www.vrinda.vaisnava.hu/vrindastudio.
Abraço. Davi
terça-feira, 26 de fevereiro de 2019
KAMA LOKA
Teosofia.
www.verdademundial.com.br.
O OCEANO DA TEOSOFIA – O KAMA LOKA. Tendo passado por todo o campo da evolução
das coisas e seres de uma maneira geral, vamos considerar agora os estados do
homem após a morte do corpo e antes do nascimento. Isso nos traz de imediato as
seguintes questões: Há algum paraíso ou inferno, e onde eles ficam? Eles são
lugares ou estados? Há um ponto no espaço onde eles possam ser encontrados e
para os quais nós vamos, ou de onde nós viemos? Também devemos retomar o
assunto do quarto princípio da constituição humana, aquele princípio
chamado Kama em
sânscrito, e Paixões ou Desejos nos idiomas
ocidentais. Tendo em mente o que foi dito sobre aquele princípio, e também
o ensinamento a respeito do corpo astral e da Luz Astral [1] será mais fácil entender o
que é ensinado sobre os dois estados, anterior e posterior à morte. Em ordem
cronológica, nós vamos para o kama-loka – ou o plano do desejo – logo após a
morte do corpo, e mais tarde os princípios mais elevados, que formam o homem
real, entram no estado de devachan. Depois de tratar do kama-loka, será mais fácil estudar a
questão do devachan. O sopro
deixa o corpo e dizemos que o homem está morto, mas isso é apenas o começo da
morte; ela prossegue em outros planos. Quando a estrutura física está fria e os
olhos fechados, todas as forças do corpo e da mente se lançam através do
cérebro, e através de uma série de imagens toda a vida recém-terminada é
impressa indelevelmente no homem interior; não apenas em linhas gerais, mas até
o mínimo detalhe, e mesmo no caso de impressões minúsculas e passageiras. Nesse
momento, embora todas as indicações levem o médico a declarar o óbito, e embora
do ponto de vista prático externo a pessoa já esteja morta, o homem real está
ocupado em seu cérebro, e só depois do trabalho ali ser concluído é que a
pessoa se vai. Quando esse trabalho solene está terminado, o corpo astral se
destaca do físico, e a energia vital tendo partido, os quatro princípios
remanescentes [2] ficam
no plano de kama-loka. A
separação natural dos princípios, trazida pela morte, divide o homem total em
três partes: Primeiro, o corpo
visível com todos os seus elementos deixados para posterior desintegração no
plano terrestre, onde tudo que o compõe será a seu tempo dissolvido nos
diferentes aspectos da natureza. Segundo, o Kama rupa, constituído do corpo astral e das paixões e
desejos, que também começa logo a se desintegrar no plano astral. Terceiro, a tríade superior, Atma-Buddhi-Manas, o homem
real. Ele não está morto, mas agora está fora das condições terrestres, desprovido
de corpo, e começa a funcionar no devachan apenas como mente. Ele fica então
coberto por uma veste muito etérea, que irá abandonar quando tiver chegado a
hora de retornar à terra. O kama-loka ou
o lugar dos desejos é a região astral que permeia e rodeia a terra. Como lugar,
ele está acima, dentro e em volta da terra. Sua extensão vai até uma distância
mensurável da terra, mas as leis habituais que agem aqui não agem lá, e as
entidades lá não estão sob as mesmas condições de espaço e tempo em que nós
estamos. Como um estado, ele é metafísico, embora esta metafísica se
relacione com o plano astral. É chamado de plano do desejo porque se relaciona
com o quarto princípio, e nele a força dominante é o desejo destituído de
inteligência manásica e divorciado dela. É uma esfera astral intermediária
entre a vida terrena e a celeste. Sem sombra de dúvida, esta é a origem da
teoria cristã do purgatório, onde a alma passa por punições pelo mal feito, e
do qual ela pode ser liberada pela oração e outras cerimônias e oferendas. O
fato subjacente a essa superstição é que a alma pode ficar detida em kama-loka pela força de algum
enorme desejo insatisfeito, sem poder se livrar das vestimentas astrais e
kâmicas até que o desejo seja satisfeito por alguém na terra, ou pela alma em
si. Mas se a pessoa tinha a mente pura e altas aspirações, a separação dos
princípios naquele plano é completada logo, permitindo que a tríade superior
siga para o devachan.
Como este plano é feito apenas de esfera astral, ele partilha da natureza da
matéria astral que é essencialmente terrestre e maldosa. Nela todas as forças
agem sem a direção da alma ou da consciência no sentido superior. Este
astral é o esgoto, por assim dizer, da grande fornalha da vida, que a natureza
provê para lançamento dos elementos que não terão lugar no devachan, e por essa razão deve
ter vários estágios, cada um dos quais foi observado pelos antigos. Esses
estágios são conhecidos em sânscrito como lokas ou lugares, em um sentido
metafísico. A vida humana é muito variada, e para cada uma das suas
potencialidades é dado um lugar apropriado após a morte, o que faz de kama-loka uma esfera
infinitamente variada. Na vida, algumas das diferenças entre os homens são
modificadas e algumas são inibidas por uma similaridade de corpo e de
hereditariedade, mas em kama-loka todas
as paixões e desejos ocultos são liberados em consequência da ausência de
corpo, e por essa razão o estado é imensamente mais diversificado do que no
plano da vida. Não apenas é necessário enfrentar as diferenças e variedades
naturais, mas também aquelas causadas pelo tipo de morte, sobre o que algo deve
ser dito. E todas essas divisões são apenas o resultado natural dos pensamentos
durante a vida e dos últimos pensamentos de cada pessoa que morre na terra.
Está além do alcance deste trabalho entrar na descrição de todos esses
estágios, já que volumes inteiros seriam necessários para descrevê-los, e,
ainda assim, poucos entenderiam. Lidar com o Kama-loka nos obriga a lidar
também com o quarto princípio na classificação da constituição do homem, e cria
um conflito com as ideias e a educação modernas quanto ao tema de desejos e
paixões. Em geral se supõe que os desejos e as paixões são tendências inerentes
ao indivíduo. O tema tem uma aparência irreal e nebulosa para o estudante
comum. Mas de acordo com esse sistema filosófico, elas não são apenas inerentes
ao indivíduo, nem são devidas ao corpo em si. Enquanto o homem está
vivendo no mundo, os desejos e as paixões – o princípio kama – não têm vida separada do
homem astral e interior. Eles estão, por assim dizer, distribuídos por todo o
seu Ser. Mas como eles se unem ao corpo astral depois da morte, desta maneira
formando uma entidade com seu prazo próprio de vida embora sem alma [3], questões muito importantes
surgem. Durante a vida mortal, os desejos e paixões são guiados pela mente e
pela alma; após a morte eles funcionam sem a direção do antigo mestre. Enquanto
vivemos, somos responsáveis por eles e por seus efeitos, e quando deixamos essa
vida ainda somos responsáveis, embora eles continuem a trabalhar e a provocar
efeitos nos outros enquanto durarem nas condições que descrevi, e sem o nosso
comando direto. Nisso é vista a continuidade da responsabilidade. Eles são uma
parte dos skandhas [4] – bem conhecidos na
filosofia oriental – que são os agregados formadores do homem. O corpo inclui
um conjunto de skandhas, o homem
astral outro, o princípio kama é outro conjunto, e ainda outros se referem a outras
partes. Em kama estão
aqueles realmente ativos e importantes, que controlam os renascimentos e levam
a todas as variedades de vida e circunstâncias a cada renascimento. Eles são
formados no dia-a-dia de acordo com a lei segundo a qual todo pensamento
se combina instantaneamente com uma das forças elementais da natureza,
tornando-se nesta medida uma entidade que irá durar de acordo com a força do
pensamento com que deixa o cérebro, e todos eles estão inseparavelmente
conectados com o ser que os produziu. Não há modo de escapar; tudo o que
podemos fazer é ter pensamentos de boa qualidade, pois mesmo os maiores Mestres
não estão excluídos dessa lei, mas eles “povoam sua corrente no espaço” com
entidades potentes apenas para o bem. Em kama-loka, essa massa de desejos e
pensamentos existe de modo muito definido até o término de sua desintegração, e
então os remanescentes consistem da essência desses skandhas, conectados, é claro, com
o ser que os teve e que os produziu. Eles não podem ser apagados, assim como não
se pode desmanchar o universo. Então se diz que eles permanecem até que o
ser saia do devachan. Quando
isso ocorre, eles são levados imediatamente até o ser, pela lei da
atração. Eles servem como base ou germe, e a partir deles o ser constrói
um novo conjunto de skandhas para
a próxima vida. O kama-loka é,
portanto, diferente do plano terreno porque nele a massa de paixões e desejos
está descontrolada e sem direção. Mas ao mesmo tempo a vida terrestre é
também um kama-loka, já
que é largamente governada pelo princípio kama, e assim o será até o dia
distante em que no curso da evolução, as raças dos homens terão desenvolvido o
quinto e o sexto princípios, limitando desta forma kama à sua própria esfera e
livrando a vida terrestre da sua dominação. Os restos do homem astral em kama-loka são apenas uma casca
desprovida de mente e de alma, sem consciência e também incapaz de agir, a
menos que seja vivificada por forças externas. A casca tem algo que se
parece com uma consciência animal ou automática, apenas por causa da sua
associação muito recente com um Eu humano. Pois de acordo com o princípio
exposto em outro capítulo, todo átomo que vai integrar um homem tem uma memória
própria, a qual é capaz de durar um período de tempo proporcional à força dada
a ele. No caso de uma pessoa muito material e bruta, ou egoísta, a força dura
mais do que em qualquer outra, e assim nesse caso a consciência automática será
mais definida e desorientadora para alguém que, por não ter conhecimento, se
envolve com necromancia. Sua porção puramente astral contém e carrega o
registro de tudo que se passou perante a pessoa enquanto viva, pois uma das
funções da substância astral é absorver todas as cenas, quadros e impressões de
todos os pensamentos, para retê-los, e lançá-los adiante por reflexo, quando as
condições o permitirem. Essa casca astral, deixada para trás por todo homem ao
morrer, seria uma ameaça a todos os homens, não fosse desprovida, em todos os
casos − exceto em um que deverá ser mencionado − dos princípios superiores, que
são os diretores. Mas como os elementos que servem de guia já estão separados
da casca, ela tremula e flutua de um lugar ao outro sem qualquer vontade
própria, mas governada apenas pelas atrações dos campos astrais e magnéticos. É
possível ao homem real – chamado de “espírito” por alguns – comunicar-se
conosco imediatamente após a morte, por uns poucos breves instantes; mas,
quando estes passaram, a alma nada mais tem a ver com a terra até reencarnar. O
que pode influenciar e de fato influencia o médium e o sensitivo a partir dessa
esfera são as Cascas que descrevi. Sem alma e sem consciência, elas não são, em
sentido algum, os espíritos dos nossos mortos. Elas são os trajes jogados fora
pelo homem interior, a porção grosseiramente terrena descartada no voo para
o devachan, e
sempre foram consideradas pelos antigos como demônios – nossos demônios
pessoais – porque são essencialmente astrais, terrenas e passionais. Seria
estranho, de fato, se uma tal Casca, depois de ser por tanto tempo o veículo do
verdadeiro homem na terra, não retivesse uma memória e consciência
automáticas. Se vemos o corpo decapitado de uma rã ou de um galo se
movendo e atuando por um tempo com uma inteligência aparente, por que
então não seria possível para a forma astral, mais fina e sutil, agir e
mover-se com um grau muito maior de aparente direcionamento mental? Na esfera
de kama-loka − como,
de fato, também em todas as partes do globo e do sistema solar − estão os
elementais, ou forças da natureza. Eles são inumeráveis e seus tipos são quase
infinitos, uma vez que são, em certo sentido, os nervos da natureza. Cada
classe tem seu próprio trabalho tal como o tem cada coisa ou elemento natural.
Assim como o fogo queima e a água rola para baixo e não para cima de acordo com
a lei geral, assim também os elementais agem sob a lei, mas como eles estão
mais acima na escala do que a água e o fogo brutos, suas ações parecem guiadas
por uma mente. Alguns deles têm uma relação especial com as operações mentais e
com as ações dos órgãos astrais, quer estejam ligados ou não a um corpo. Quando
um médium forma o canal, e também por outros processos, esses elementais
fazem uma conexão artificial com a casca da pessoa morta, ajudados pelo fluido
nervoso do médium e dos outros que estão por perto. Assim a casca é galvanizada
para que tenha uma vida artificial. Através do médium, é feita uma conexão com
as forças físicas e psíquicas de todos os presentes. As impressões
antigas do corpo astral projetam suas imagens sobre a mente do médium, e as
antigas paixões são atiçadas. Várias mensagens e relatos são então obtidos daí,
mas nenhum deles é original, nenhum é do espírito. Por sua estranheza, e em
consequência da ignorância daqueles que se envolvem nesse campo, isso é
encarado como obra do espírito, mas tudo vem dos vivos, quando não é uma mera
coleta, na luz astral, de imagens do que aconteceu no passado. Em certos casos
a serem mencionados, há uma inteligência trabalhando que é total e intensamente
ruim, à qual todo médium está sujeito, e isso explica por que tantos deles
sucumbiram ao mal, como têm confessado. Uma classificação simples dessas cascas
que visitam os médiuns será como se segue: (1) As cascas de pessoas
recentemente falecidas, cujo local de sepultamento não está muito longe. As
cascas desse tipo são bem coesas e correspondem à vida e ao pensamento do
antigo dono. Uma pessoa boa, não-materialista e espiritualizada deixa uma casca
que logo se desintegrará. A casca de uma pessoa bruta, má, egoísta e
materialista será pesada, consistente e duradoura, e isso ocorre com todas as
variedades. (2) As cascas de pessoas que morreram longe do lugar onde o
médium está. O lapso de tempo permite que escapem das cercanias de seus antigos
corpos, e ao mesmo tempo traz um grau maior de desintegração, que corresponde
no plano astral ao que é a putrefação no físico. Estas cascas são vagas,
sombrias, incoerentes; respondem apenas brevemente a estímulos psíquicos, e são
dispersas por qualquer corrente magnética. Elas são galvanizadas
momentaneamente pelas correntes astrais do médium e daquelas pessoas presentes
que eram relacionadas com o falecido. (3) Remanescentes puramente sombrios, aos
quais mal se pode atribuir um local. Não há uma palavra nos idiomas ocidentais
para descrevê-los, embora sejam fatos reais nessa esfera. Pode-se dizer que são
o mero molde ou impressão deixada na substância astral pela casca anteriormente
coesa e há muito desintegrada. Tais cascas estão, por conseguinte, tão próximas
de serem fictícias que quase merecem essa designação. Como fotografias
sombrias, elas são ampliadas, embelezadas e lhes é dada uma vida imaginária
pelos pensamentos, desejos, esperanças e ideações do médium e dos assistentes
da sessão. (4) Entidades definidas, consistentes, almas humanas desprovidas de
vínculo espiritual, tendendo agora ao pior estado de todos, avitchi, onde a aniquilação
da personalidade é o fim. Tais seres são conhecidos como magos negros. Tendo
concentrado a consciência no princípio kama, preservaram o intelecto, divorciaram-se do espírito, e são os
únicos seres condenados que conhecemos. Em vida, tiveram corpos humanos e
alcançaram seu estado terrível através de vidas em que persistiram na maldade
pela maldade. Alguns seres, já condenados a se tornarem o que é descrito aqui,
estão hoje entre nós na terra. Estas não são cascas comuns, pois centraram
toda a sua força em kama, jogaram
fora qualquer fagulha de bom pensamento ou aspiração e têm completo domínio da
esfera astral. Eu coloco tais seres na classificação de Cascas porque o são, no
sentido de que estão condenados à desintegração consciente, enquanto as outras
terão o mesmo fim apenas mecanicamente. Estas cascas podem durar, e duram de
fato ao longo de muitos séculos, satisfazendo seus apetites através de qualquer
sensitivo de quem possam se apoderar, e onde o mau pensamento lhes abra uma
brecha. Eles presidem quase todas as sessões espíritas, adotando
nomes importantes e assumindo o comando de modo a manter o controle e continuar
a ilusão do médium, assim se habilitando a ter um canal conveniente para seus
próprios objetivos maldosos. De fato, usando as cascas dos suicidas, ou
daqueles pobres coitados que morrem sob as penas da lei, ou dos bêbados e dos
glutões, esses magos negros que vivem no mundo astral se apoderam do campo da
mediunidade e são capazes de invadir a esfera de qualquer médium, por melhor
que ele seja. A porta, uma vez aberta, está aberta para todos. Esse tipo de
Casca perdeu o manas
superior, e não só na luta após a morte, mas também na vida. A
porção inferior de manas, que deveria
ter sido elevada a uma excelência divina, foi arrancada do seu senhor e
agora dá inteligência a essa entidade, que é desprovida de espírito mas tem a
possibilidade de sofrer, e o fará quando seu dia final chegar. No estado
de kama-loka, os
suicidas e aqueles que são subitamente expulsos da vida por acidente ou
assassinato, legal ou ilegal, passam um período quase igual à duração da vida
que teriam se não tivesse ocorrido a sua interrupção súbita. Estes não estão
realmente mortos. Para haver uma morte normal, deve estar presente um fator não
reconhecido pela ciência médica. Os princípios do ser, conforme descritos nos
capítulos anteriores, têm seus próprios prazos de coesão. Quando chega o seu
final natural, eles se separam uns dos outros de acordo com suas próprias leis.
Isso envolve o grande tema das forças coesivas no indivíduo humano, o que
necessitaria um livro à parte. Devo me contentar, portanto, com a
afirmação de que essa lei de coesão atua nos princípios humanos. Antes
daquele fim natural, os princípios são incapazes de se separar. Obviamente, a
destruição normal das forças coesivas não pode ser conseguida por processos
mecânicos, exceto no que diz respeito ao corpo físico. Assim, um suicida, ou um
indivíduo morto por acidente ou assassinado por outro homem − ou por
imposição da lei humana − não chegou ao término natural das forças de coesão
que unem os seus outros elementos constituintes, e é lançado ao estado de kama-loka apenas parcialmente
morto. Lá os princípios remanescentes têm que esperar até que o fim natural da
vida seja alcançado, seja isso um mês ou sessenta anos. Mas os graus de kama-loka atendem as muitas
variedades de cascas mencionadas acima. Algumas passam o período em grande
sofrimento; outras, em um tipo de sono com sonhos, cada uma de acordo com a
responsabilidade moral. Os criminosos executados são em geral lançados para
fora da vida cheios de ódio e vingança, sofrendo uma penalidade na qual eles
não reconhecem justiça. Eles ficam sempre reencenando no kama-loka o seu crime, seu
julgamento, sua execução e sua vingança. E sempre que podem ter contato com uma
pessoa viva sensitiva, médium ou não, tentam injetar pensamentos de assassinato
e outros crimes no cérebro do infeliz. O fato de que eles obtêm sucesso em tais
tentativas é conhecido pelos estudantes mais sérios de Teosofia. Agora nos
aproximamos do tema do devachan. Depois
de certo tempo no kama-loka, o
indivíduo saudável alcança um estado de inconsciência que precede a mudança
para o próximo estado. É como o nascimento para a vida, após um período de
escuridão e sono pesado. Ele então acorda para a felicidade do devachan. [5] NOTAS: [1] Veja os capítulos
anteriores da presente obra. (NT) [2] “Quatro princípios remanescentes”. Esta é a correção de um erro. No
original em inglês, lemos, certamente por um erro de revisão, “cinco princípios
remanescentes”. Ocorre que há sete princípios, e o terceiro princípio, linga-sharira, é
inseparável do segundo princípio, prana, morrendo junto com ele e com o corpo físico. Nas Cartas
dos Mahatmas, lemos: “Quando
o homem morre os seus segundo e terceiro princípios morrem com ele; a tríade
inferior desaparece, e o quarto, o quinto, o sexto e o sétimo princípios formam
o quaternário sobrevivente.” A afirmação está na resposta 5 da Carta
68, em “Cartas dos Mahatmas para Alfred Percy Sinnett (1840-1921)”, Ed. Teosófica,
Brasília, vol. 1, primeiras linhas da p. 302. Confirmando este fato, nas
próximas frases W. Q. Judge não menciona como sobrevivente o terceiro
princípio, linga-sharira.
(NT) [3] A
“ausência de alma” ocorre porque o foco central de consciência elevou-se em
direção ao Devachan. Esta Casca abandonada pode ser chamada de
“Elementário”. Ela vagueia algum tempo antes de desfazer-se. Veja a
resposta 5, na Carta 68, de “Cartas dos Mahatmas”, obra citada. (NT) [4] Skandhas – registros cármicos. (NT) [5] O próximo capítulo de “O Oceano da Teosofia” é
dedicado ao Devachan – o “plano sagrado” em que a alma vive entre
uma encarnação e outra. (NT). www.verdademundial.com.br.
Abraço. Davi
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019
SUCOT - AS NUVENS DE GLÓRIA E AS QUATRO ESPÉCIES
Judaísmo. www.morasha.com.br.
SUCOT – AS NUVENS DE GLÓRIA E AS QUATRO ESPÉCIES. Sucot, festa de sete dias que
se inicia no dia 15 do mês judaico de Tishrei, celebra a proteção que D’us
ofereceu ao Povo Judeu durante sua jornada de 40 anos a caminho da Terra
Prometida. Em nossas orações, nos referimos a Sucot como Zman Simchateinu –
“Época de nosso júbilo” – porque o tema da festa é o amor Divino por nós e Sua
preocupação com nosso bem-estar. O nome dessa festividade, Sucot,
literalmente significa “cabanas”. Alguns comentaristas explicam que a Torá nos
ordena habitar nas Sucot durante a festividade para relembrar
as tendas nas quais o Povo Judeu habitou durante os longos 40 anos em que
viveram no deserto, e que lhes deu abrigo e proteção. Outros afirmam que as
cabanas nas quais habitamos durante a festa de Sucot simbolizam
as milagrosas Ananei HaKavod, as Nuvens de Glória, que conduziram,
abrigaram e protegeram os Filhos de Israel durante aqueles anos. Quer o
nome Sucot se refira às tendas, quer às Nuvens de Glória ou a
ambas, trata-se de uma festa que recorda a proteção e o abrigo provido por D’us
ao Povo Judeu no Deserto de Sinai. O Gaon de Vilna (1720-1797) pergunta: se o
tema de Sucot é a celebração da proteção de D’us aos judeus
após o Êxodo do Egito, por que razão essa festa cai no mês de Tishrei e
não em Nissan – mês em que celebramos Pessach? E
ele responde que se Sucot comemora as Nuvens de Glória – uma
visão aceita por Rashi em seu comentário no Chumash –, a data
de 15 de Tishrei para o início da festividade está correta. E
explica: ainda que as Nuvens da Glória tenham acompanhado o Povo Judeu na saída
do Egito, elas desapareceram após o pecado do Bezerro de Ouro. Somente quando
D’us concordou em novamente residir em meio ao Povo Judeu e se iniciou o
trabalho da construção do Mishkan, o Tabernáculo, as Nuvens
voltaram. A cronologia dos eventos é a seguinte: em Yom Kipur, dia
10 de Tishrei, D’us perdoou nosso povo pelo pecado do Bezerro de
Ouro e concordou em voltar Sua Presença ao nosso meio, no deserto. Naquele
mesmo dia, Moshé desceu do Monte Sinai trazendo as Segundas Tábuas e informou
ao povo sobre a ordem de construir o Mishkan. No dia seguinte, dia
11 de Tishrei, Moshé ordenou ao Povo Judeu que trouxesse os
materiais para a construção do Tabernáculo. Eles o fizeram durante os dois dias
seguintes (v. Êxodo 36:3). No 14o dia de Tishrei,
Moshé disse ao povo que não mais trouxesse material para o Mishkan.
E finalmente, em 15 de Tishrei, começaram a construir o
Tabernáculo. Foi então que as Nuvens de Glória retornaram. Como Sucot também
celebra as Nuvens de Glória que abrigaram nosso povo no Deserto do Sinai, faz
todo o sentido que essa festa se inicie em 15 de Tishrei –
data em que esse abrigo Divino sobrenatural voltou a proteger o Povo Judeu,
permanecendo com eles durante sua longa jornada pelo deserto. As Quatro
Espécies – Arbaat HaMinim. Os dois mandamentos principais da festa de Sucot são
habitar na Sucá e segurar as Quatro Espécies. O Midrash encontra
muitos simbolismos no mandamento das Quatro Espécies. Um deles é o seguinte:
o Etrog (cidra amarela ou citrus medica) se parece
ao coração; o Lulav (folha de palmeira), à coluna vertebral;
o Hadass (murta), aos olhos; e o Aravá (ramo
de salgueiro), aos lábios. Ao utilizar as Quatro Espécies em conjunto, estamos
simbolizando a necessidade que temos de fazer bom uso de nossas faculdades a
serviço de D’us. Lulav. O Midrash compara o Lulav à
coluna vertebral devido a seu comprimento e formato. Chama a atenção o fato de
que a bênção que recitamos ao cumprir o mandamento das Quatro Espécies apenas
mencione o Lulav. Não mencionamos nenhuma das outras três espécies
nessa bênção. Isso indica que, de certa forma, o Lulav é a
espécie destacada. O Lulav lembra a coluna vertebral, tão
importante para o corpo humano já que sem ela, cérebro e corpo não se poderiam
comunicar. A coluna é o caminho para os impulsos do corpo ao cérebro e
vice-versa. Junto com o cérebro, a coluna vertebral controla as funções do
corpo humano, inclusive seu movimento e comportamento. O Lulav nos
transmite várias lições. Uma delas é a importância de um relacionamento
saudável entre o cérebro e o restante do corpo. Nossos Sábios ensinam que se o
ser humano deseja ser justo e íntegro e viver uma vida com moralidade e
propósito, sua mente deve comandar seu corpo. A racionalidade deve prevalecer
sobre nossos instintos e impulsos. A sabedoria deve ditar nosso comportamento. Hadass.
As folhas do Hadass, a murta, se parecem com o olho humano.
Essa espécie nos ensina o quão importante é ver os outros com um olhar bondoso
e generoso. As obras sagradas do Judaísmo usam o olho como metáfora para
descrever as percepções humanas, os sentimentos e desejos em relação aos
demais. Por exemplo, o Ayin HaRá, o “olho gordo”, é um famoso
conceito que denota inveja e ciúme, e que, como ensina o Talmud, é um fenômeno
real – veículo de poder espiritual que pode afetar a vida de outras pessoas.
Por outro lado, ter um “olhar bondoso” significa desejar o bem dos demais e
julgá-los favoravelmente. Muitas pessoas de boa índole podem ser dominadas por
sentimentos de ciúmes, inveja e ressentimento ou mágoa. O Ayin HaRá,
infelizmente, é um fenômeno comum entre os seres humanos. Além do mais, temos a
tendência de julgar erroneamente aqueles de quem não gostamos. É comum não
darmos aos outros o benefício da dúvida. Quem não combate a inveja e o ciúme e
é rápido em julgar os demais deve ter em mente que a energia espiritual
negativa se volta contra quem a carrega. O Talmud ensina que os Céus julgam as
pessoas da mesma forma como esta pessoa julga os demais. Quem julga os outros
favoravelmente é julgado também favoravelmente pelos Céus; e o oposto também é
verdadeiro. De forma semelhante, o Baal Shem Tov, mestre da Cabalá e fundador
do Movimento Chassídico, ensinava que “um suspiro emitido em virtude da dor de
um outro rompe todas as barreiras impenetráveis dos acusadores celestiais. E
quando a pessoa se alegra com o júbilo de seu amigo e o abençoa, ela é tão
querida a D’us e por Ele aceita como as preces de Rabi Yishmael, o Sumo
Sacerdote, no Kodesh HaKodashim”. Em outras palavras: o Altíssimo
está mais aberto às preces daqueles que sentem a dor de outras pessoas e se
alegram com a felicidade e o sucesso delas. Aravá. As folhas alongadas
do Aravá se parecem com os lábios. Os ramos do salgueiro nos
transmitem um dos mais sábios ensinamentos do mais sábio dentre os homens, o
Rei Salomão, que escreveu em seus Provérbios: “A vida e a morte estão sob o
poder da língua (...)”. (Provérbios 18:21). Nossos Sábios ensinam que uma das
razões para a Torá usar a metáfora da fala para descrever a Criação Divina do
Universo é mostrar que as palavras podem construir mundos. No entanto, podem
também os destruir. Uma ou outra palavra errada, mesmo se dita, por vezes, de
forma descuidada, pode destruir um casamento, uma antiga amizade, o bom nome de
uma pessoa e a reputação e solidez de uma empresa. Palavras maldosas já
destruíram muitas esperanças, sonhos e vidas. Palavras maldosas já resultaram
em guerras e genocídios. Ensina o Talmud que não há pecado maior do que o
de Lashon HaRá – “a má língua”. Aos olhos da Torá, assassinar
um caráter ou assassinar uma pessoa são atos que guardam incrível semelhança.
Por outro lado, palavras que expressam sabedoria e bondade têm o poder de
erguer vidas e mundos – criando novas realidades. Uma palavra animadora pode
curar um coração ferido e restaurar uma alma desprovida de esperança; pode
instilar fé e coragem; pode levar a pessoa a seguir seus sonhos e realizar
grandes feitos; pode restaurar relacionamentos rompidos e construir novos. Não
surpreende o fato de que alguns dos principais mandamentos do Judaísmo sejam
cumpridos com palavras: a leitura e o estudo da Torá e a recitação de orações e
bênçãos, para citar apenas alguns. O Aravá nos ensina que
devemos escolher com muito cuidado nossas palavras. A pena é de fato muito mais
potente do que a espada – assim como o são as palavras que saem de nossos
lábios. Etrog. A Torá se refere ao Etrog, a cidra amarela,
como um belo fruto. Entre as Quatro Espécies, é o que mais atrai por sua
aparência. Por seu formato, esse fruto simboliza o coração. O Etrog nos
ensina que a beleza verdadeira está no coração. Muitas pessoas possuem forte
coluna vertebral (Lulav) – são sábias e de conduta reta; um olhar
bondoso (Hadass) – não guardam rancor, inveja ou ciúme dos demais; e bons
lábios (Aravá) – não falam mal dos outros. Mas, apesar disso, não têm
coração. Não fazem mal a ninguém, mas tampouco fazem o bem. Não guardam ódio ou
falam mal dos outros, mas não se preocupam com ninguém. Falta-lhes amor, calor
humano e compaixão. O Etrog é o fruto da beleza porque não há
nada mais atrativo no ser humano do que um bom coração. Bem verdade, o amor não
cura todos os males e as boas intenções não substituem a sabedoria. Mas se em
nosso mundo houvesse mais corações bondosos, viveríamos em um lugar bem mais
bonito. No Pirkei Avot, cujas palavras deveriam ser gravadas no
coração e na mente de todo judeu, ecoa o seguinte ensinamento atemporal: “(Rabi
Yochanan) disse a (seus alunos): Procurem saber qual o melhor traço de caráter
que a pessoa deve possuir. Respondeu Rabi Eliezer: Um olhar bondoso. Disse Rabi
Joshua: Ser um bom amigo. Disse Rabi Yossi: Ser um bom vizinho. Disse Rabi
Shimon: Ser alguém que se preocupa com o resultado de suas ações. Disse Rabi
Elazar: Ter um bom coração. (Rabi Yochanan) lhes respondeu: Prefiro as palavras
de Elazar, filho de Arach, às vossas, pois suas palavras incluem todas as
vossas” (Avot 2:10). www.morasha.com.br.
Abraço. Davi
sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019
A DOUTRINA DAS PENAS ETERNAS
Espiritismo. www.febnet.org.br.
Texto de Allan Kardec (1804-1869). Livro O Céu e o Inferno. Capítulo 6. A DOUTRINA DAS PENAS
ETERNAS. Origem da doutrina das penas eternas. Argumentos a favor das
penas eternas. Impossibilidade material das penas eternas. A doutrina das
penas eternas fez sua época. O profeta bíblico Ezequiel contra a eternidade
das penas e o pecado original. Origem da doutrina das penas eternas 1. A crença
na eternidade das penas perde terreno dia a dia, de modo que, sem ser profeta,
pode prever-se o fim próximo. Tais e de tal ordem poderosos e peremptórios têm
sido os argumentos a ela opostos, que nos parece quase supérfluo ocuparmo-nos
de tal doutrina de ora em diante, deixando que por si mesma se extinga. Não se
pode contestar, porém, que, apesar de caduca, ainda constitui o baluarte dos
adversários das ideias novas, o ponto que defendem com mais obstinação,
convictos aliás da vulnerabilidade que ela apresenta, e não menos convictos das
consequências dessa queda. Por este lado, a questão merece sério exame. 2. A
doutrina das penas eternas teve sua razão de ser, como a do inferno material,
enquanto o temor podia constituir um freio para os homens pouco adiantados
intelectual e moralmente. Na impossibilidade de apreenderem as nuanças tantas
vezes delicadas do bem e do mal, bem como o valor relativo das atenuantes e
agravantes, os homens não se impressionariam, então, a não ser pouco ou mesmo
nada com a ideia das penas morais. Tampouco compreenderiam a temporalidade
dessas penas e a justiça decorrente das suas gradações e proporções. 3. Quanto
mais próximo do estado primitivo, mais material é o homem. O senso moral é o
que de mais tardio nele se desenvolve, razão pela qual também não pode fazer de
Deus, dos seus atributos e da vida futura, senão uma ideia muito imperfeita e
vaga. Assimilando-o à sua própria natureza, Deus não passa para ele de um soberano
absoluto, tanto mais terrível quanto invisível, como um rei despótico que,
fechado no seu palácio, jamais se mostrasse aos súditos. Deus só é então
poderoso pela força material, porque eles não compreendem o poder espiritual.
Só o concebem armado com o raio, ou no meio de relâmpagos e tempestades,
semeando de passagem a destruição, a ruína, semelhantemente aos guerreiros
invencíveis. Um Deus de mansuetude e cordura não seria um Deus, porém um ser
fraco e sem meios de se fazer obedecer. A vingança implacável, os castigos
terríveis, eternos, nada tinham de incompatíveis com a ideia que se fazia de
Deus, não lhes repugnavam à razão. Implacável também ele, homem, nos seus
ressentimentos, cruel para os inimigos e inexorável para os vencidos, Deus, que
lhe era superior, deveria ser ainda mais terrível. Para tais homens eram
precisas crenças religiosas assimiladas à sua natureza rústica. Uma religião
toda espiritual, toda amor e caridade não podia aliar-se à brutalidade dos
costumes e das paixões. Não censuremos, pois, a Moisés sua legislação
draconiana, apenas bastante para conter o povo indócil, nem o haver feito de
Deus um Deus vingativo. A época assim o exigia, essa época em que a doutrina de
Jesus não encontraria eco e até se anularia. 4. À medida que o Espírito se
desenvolvia, o véu material ia-se dissipando pouco a pouco, e os homens
habilitavam-se a compreender as coisas espirituais. Mas isso não aconteceu
senão lenta e gradualmente. Por ocasião de sua vinda, já Jesus pôde proclamar
um Deus clemente, falando do seu reino, não deste mundo, e acrescentando:
«Amai-vos uns aos outros e fazei bem aos que vos odeiam” (Lucas 6,27), ao passo
que os antigos diziam: “olho por olho, dente por dente”. Ora, quais eram os
homens que viviam no tempo de Jesus? Seriam
almas novamente criadas e encarnadas? Mas se assim fosse, Deus teria criado
para o tempo de Jesus almas mais adiantadas que para o tempo de Moisés? E daí o
que teria decorrido para estas últimas? Consumir-se-iam por toda a eternidade
no embrutecimento? O mais comezinho bom senso repele essa suposição. Não; essas
almas eram as mesmas que viviam sob o império das leis mosaicas e que tinham
adquirido, em várias existências, o desenvolvimento suficiente à compreensão de
uma doutrina mais elevada, assim como hoje mais adiantadas se encontram para
receber um ensino ainda mais completo. 5. O Cristo não pôde, no entanto,
revelar aos seus contemporâneos todos os mistérios do futuro. Ele próprio o
disse: Muitas outras coisas vos diriam se estivésseis em estado de as
compreender, e eis por que vos falo em parábolas. Sobretudo no que diz respeito
à moral, isto é, aos deveres do homem, foi o Cristo muito explícito porque,
tocando na corda sensível da vida material, sabia fazer-se compreender; quanto
a outros pontos, limitou-se a semear sob a forma alegórica os germens que
deveriam ser desenvolvidos mais tarde. A doutrina das penas e recompensas
futuras pertence a esta última ordem de ideias. Sobretudo, em relação às penas,
Ele não poderia romper bruscamente com as ideias preconcebidas. Vindo traçar
aos homens novos deveres, substituir o ódio e a vingança pelo amor do próximo e
pela caridade, o egoísmo pela abnegação, era já muito; além disso, não podia
racionalmente enfraquecer o temor do castigo reservado aos prevaricadores, sem
enfraquecer ao mesmo tempo a ideia do dever. Se o Cristo prometia o reino dos
Céus aos bons, esse reino estaria interdito aos maus, e para onde iriam eles?
Ademais, seria necessária a inversão da natureza para que inteligências ainda
muito rudimentares pudessem ser impressionadas de feição a identificarem-se com
a vida espiritual, levando-se em conta a circunstância de Jesus se dirigir ao
povo, à parte menos esclarecida da sociedade, que não podia prescindir de
imagens de alguma sorte palpáveis, e não de ideias sutis. Eis a razão por que
Jesus não entrou em minúcias supérfluas a este respeito; nessa época não era
preciso mais do que opor uma punição à recompensa. 6. Se Jesus ameaçou os
culpados com o fogo eterno, também os ameaçou de serem lançados na Geena. Ora,
que vem a ser a Geena? Nada mais nada menos que um lugar nos arredores de
Jerusalém, um monturo onde se despejavam as imundícies da cidade. Dever-se-ia
interpretar isso também ao pé da letra? Entretanto era uma dessas figuras
enérgicas de que Ele se servia para impressionar as massas. O mesmo se dá com o
fogo eterno. E se tal não fora o seu pensar, Jesus estaria em contradição,
exaltando a clemência e misericórdia de Deus, pois clemência e inexorabilidade
são sentimentos antagônicos, que se anulam. Desconhecer-se-ia, pois, o sentido
das palavras de Jesus, atribuindo-lhes a sanção do dogma das penas eternas,
quando todo o seu ensino proclamou a mansidão do Criador. No Pai-nosso Jesus nos
ensina a dizer: “Perdoai-nos, Senhor, as nossas faltas, assim como nós
perdoamos aos nossos devedores” (Lucas 11,4; Mateus 6,12). Pois se o culpado
não devesse esperar algum perdão, inútil seria pedi-lo. Esse perdão é, porém,
incondicional? É uma remissão pura e simples da pena em que se incorre? Não; a
medida desse perdão subordina-se ao modo pelo qual se haja perdoado, o que
equivale dizer que não seremos perdoados desde que não perdoemos. Deus, fazendo
do esquecimento das ofensas uma condição absoluta, não podia exigir do homem
fraco o que Ele, onipotente, não fizesse. O Pai Nosso é um protesto cotidiano
contra a eterna vingança de Deus. 7. Para homens que só possuíam da
espiritualidade da alma uma ideia confusa, o fogo material nada tinha de
improcedente, mesmo porque já participava da crença pagã, quase universalmente
propagada. Igualmente a eternidade das penas nada tinha que pudesse repugnar a
homens desde muitos séculos submetidos à legislação do terrível Jeová. No
pensamento de Jesus o fogo eterno não podia passar, portanto, de simples
figura, pouco lhe importando fosse essa figura interpretada à letra, desde que
ela servisse de freio às paixões humanas. Sabia Ele ademais que o tempo e o
progresso se incumbiriam de explicar o sentido alegórico, mesmo porque, segundo
a sua predição, o Espírito de Verdade viria esclarecer aos homens todas as
coisas. O caráter essencial das penas irrevogáveis é a ineficácia do
arrependimento, e Jesus nunca disse que o arrependimento não mereceria a graça
do Pai. Ao contrário, sempre que se lhe deparou ensejo, Ele falou de um Deus
clemente, misericordioso, solícito em receber o filho pródigo que voltasse ao
lar paterno; inflexível, sim, para o pecador obstinado, porém, pronto sempre a
trocar o castigo pelo perdão do culpado sinceramente arrependido. Este não é,
por certo, o traço de um Deus sem piedade. Também convém assinalar que Jesus
nunca pronunciou contra quem quer que fosse, mesmo contra os maiores culpados,
a condenação irremissível. 8. Todas as religiões primitivas, revestindo o
caráter dos povos, tiveram deuses guerreiros que combatiam à frente dos
exércitos. O Jeová dos hebreus facultava-lhes mil modos de exterminar os
inimigos; recompensava-os com a vitória ou punia-nos com a derrota. Tal ideia a
respeito de Deus levava a honrá-lo ou apaziguá-lo com sangue de animais ou de
homens, e daí os sacrifícios sangrentos que representavam papel tão saliente em
todas as religiões da Antiguidade. Os judeus tinham abolido os sacrifícios
humanos; os cristãos, apesar dos ensinamentos do Cristo, por muito tempo
julgaram honrar o Criador votando, aos milhares, às chamas e às torturas, os
que denominavam hereges, o que constituía sob outra forma verdadeiros
sacrifícios humanos, pois que os promoviam para a maior glória de Deus, e com
acompanhamento de cerimônias religiosas. Hoje, ainda invocam o Deus dos
exércitos antes do combate, glorificam-no após a vitória, e quantas vezes por
causas as mais injustas e anticristãs. 9. Quão tardo é o homem em desfazer-se
dos seus hábitos, prejuízos e primitivas ideias! Quarenta séculos nos separam
de Moisés, e a nossa geração cristã ainda vê traços de antigos usos bárbaros,
senão consagrados, ao menos aprovados pela Religião atual! Foi preciso a
poderosa opinião dos não ortodoxos para acabar com as fogueiras e fazer
compreender a verdadeira grandeza de Deus. À falta de fogueiras, porém,
prevalecem ainda as perseguições materiais e morais, tão radicada está no homem
a ideia da crueldade divina. Nutrido por sentimentos inculcados desde a
infância, poderá o homem estranhar que o Deus que lhe apresentam, lisonjeado
por atos bárbaros, condene a eternas torturas e veja sem piedade o sofrimento
dos culpados? Sim, são filósofos, ímpios como querem alguns, que se hão
escandalizado vendo o nome de Deus profanado por atos indignos dele. São eles
que o mostram aos homens na Doutrina das penas eternas plenitude da sua
grandeza, despojando-o de paixões e baixezas atribuídas por uma crença menos
esclarecida. Neste ponto a Religião tem ganho em dignidade o que tem perdido em
prestígio exterior, porque se homens há devotados à forma, maior é o número dos
sinceramente religiosos pelo sentimento, pelo coração. Ao lado destes, porém,
quantos não têm sido levados, sem mais reflexão, a negarem toda a Providência!
O modo por que a Religião tem estacionado, em antagonismo com os progressos da
razão humana, sem saber conciliá-los com as crenças, degenerou em deísmo para
uns, em ceticismo absoluto para outros, sem esquecermos o panteísmo, isto é, o
homem fazendo-se deus ele próprio, à falta de um mais perfeito. Argumentos a
favor das penas eternas. 10. Voltemos ao dogma das penas eternas. Eis o
principal argumento invocado em seu favor: “É doutrina sancionada entre os
homens que a gravidade da ofensa é proporcionada à qualidade do ofendido. O
crime de lesa-majestade, por exemplo, o atentado à pessoa de um soberano, sendo
considerado mais grave do que o fora em relação a qualquer súdito, é, por isso
mesmo, mais severamente punido. E sendo Deus muito mais que um soberano, pois é
Infinito, deve ser infinita a ofensa a Ele, como infinito o respectivo castigo,
isto é, eterno.” Refutação: Toda refutação é um raciocínio que deve ter seu
ponto de partida, uma base sobre a qual se apoie, premissas, enfim. Tomemos
essas premissas aos próprios atributos de Deus: — único, eterno, imutável,
imaterial, onipotente, soberanamente justo e bom, infinito em todas as
perfeições. É impossível conceber Deus de outra maneira, visto como, sem a
infinita perfeição, poder-se-ia conceber outro ser que lhe fosse superior. Para
que seja único acima de todos os seres, faz-se mister que ninguém possa
excedê-lo ou sequer igualá-lo em qualquer coisa. Logo, é necessário que seja de
todo infinito. E porque são infinitos, os atributos divinos não sofrem aumento
nem diminuição, sem o que não seriam infinitos e Deus perfeito tampouco. Se se
tirasse a menor parcela de um só dos seus atributos, não haveria mais Deus, por
isso que poderia coexistir um ser mais perfeito. O infinito de uma qualidade exclui a possibilidade da existência de outra
qualidade contrária que pudesse diminuí-la ou anulá-la. Um ser infinitamente
bom não pode ter a menor parcela de maldade, nem o ser infinitamente mal pode
ter a menor parcela de bondade. Assim também um objeto não seria de um negro
absoluto com a mais leve nuança de branco, e vice-versa. Estabelecido este
ponto de partida, oporemos aos argumentos supra os seguintes: 11. Só um ser
infinito pode fazer algo de infinito. O homem, finito nas virtudes, nos conhecimentos,
no poderio, nas aptidões e na existência terrestre, não pode produzir senão
coisas limitadas. Se o homem pudesse ser infinito no mal que faz, sê-lo-ia
igualmente no bem, igualando-se, então, a Deus. Se o homem, porém, fosse
infinito no bem não praticaria o mal, pois o bem absoluto é a exclusão de todo
o mal. Admitindo-se que uma ofensa temporária à Divindade pudesse ser infinita,
Deus, vingando-se por um castigo infinito, seria logo infinitamente vingativo;
e sendo Deus infinitamente vingativo não pode ser infinitamente bom e
misericordioso, visto como um destes atributos exclui o outro. Se não for
infinitamente bom não é perfeito; e não sendo perfeito deixa de ser Deus. Se
Deus é inexorável para o culpado que se arrepende, não é misericordioso; e se
não é misericordioso, deixa de ser infinitamente bom. E por que daria Deus aos
homens uma lei de perdão, se Ele próprio não perdoasse? Resultaria daí que o
homem que perdoa aos seus inimigos e lhes retribui o mal com o bem, seria
melhor que Deus, surdo ao arrependimento dos que o ofendem, negando-lhes por
todo o sempre o mais ligeiro carinho. Achando-se em toda parte e tudo vendo,
Deus deve ver também as torturas dos condenados; e se Ele se conserva
insensível aos gemidos por toda a eternidade, será eternamente impiedoso; ora,
sem piedade, não há bondade infinita. 12. A isto se responde que o pecador
arrependido, antes da morte, tem a misericórdia de Deus, e que mesmo o maior
culpado pode receber essa graça. Quanto a isto não há dúvida, e compreende-se que
Deus só perdoe ao arrependido, mantendo-se inflexível para com os obstinados;
mas se Ele é todo misericordioso para a alma arrependida antes da morte, por
que deixará de o ser para quem se arrepende depois dela? Por Doutrina das penas
eternas 69 que a eficácia do arrependimento só durante a vida, um breve
instante, e não na eternidade que não tem fim? Circunscritas a um dado tempo, a
bondade e Misericórdia divinas teriam limites, e Deus não seria infinitamente
bom. 13. Deus é soberanamente justo. A soberana justiça não é inexorável
absolutamente, nem leva a complacência ao ponto de deixar impunes todas as
faltas; ao contrário, pondera rigorosamente o bem e o mal, recompensando um e
punindo outro equitativa e proporcionalmente, sem se enganar jamais na aplicação.
Se por uma falta passageira, resultante sempre da natureza imperfeita do homem
e muitas vezes do meio em que vive, a alma pode ser castigada eternamente, sem
esperança de clemência ou de perdão, não há proporção entre a falta e o castigo
— não há justiça. Reconciliando-se com Deus, arrependendo-se, e pedindo para
reparar o mal praticado, o culpado deve subsistir para o bem, para os bons
sentimentos. Se, porém, o castigo é irrevogável, esta subsistência para o bem
não frutifica, e um bem não considerado significa injustiça. Entre os homens, o
condenado que se corrige tem por comutada e às vezes mesmo perdoada a sua pena;
e, assim, haveria mais equidade na justiça humana que na divina. Se a pena é
irrevogável, inútil será o arrependimento, e o culpado, nada tendo a esperar de
sua correção, persiste no mal, de modo que Deus não só o condena a sofrer
perpetuamente, mas ainda a permanecer no mal por toda a eternidade. Nisso não
há nem bondade nem justiça. 14. Sendo em tudo infinito, Deus deve abranger o passado
e o futuro; deve saber, ao criar uma alma, se ela virá a falir, assaz
gravemente, para ser eternamente condenada. Se o não souber, a sua sabedoria
deixará de ser infinita, e Ele deixará de ser Deus. Sabendo-o, cria
voluntariamente uma alma desde logo votada ao eterno suplício, e, nesse caso,
deixa de ser bom. Uma vez que Deus pode conferir a graça ao pecador
arrependido, tirando-o do inferno, deixam de existir penas eternas, e o juízo
dos homens está revogado. 15. Conseguintemente, a doutrina das penas eternas
absolutas conduz à negação, ou, pelo menos, ao enfraquecimento de alguns
atributos de Deus, sendo incompatível com a perfeição absoluta, donde resulta
este dilema: Ou Deus é perfeito e não há penas eternas, ou há penas eternas e
Deus não é perfeito. 16. Também se invoca a favor do dogma da eternidade das
penas o seguinte argumento: “A recompensa conferida aos bons, sendo eterna,
deve ter por corolário a eterna punição. Justo é proporcionar a punição à
recompensa.” Refutação: Deus criou as almas para fazê-las felizes ou
desgraçadas? Evidentemente a felicidade da criatura deve ser o fito do Criador,
ou Ele não seria bom. Ela atinge a felicidade pelo próprio mérito, que,
adquirido, não mais o perde. O contrário seria a sua degeneração. A felicidade
eterna é, pois, a consequência da sua imortalidade. Antes, porém, de chegar à
perfeição, tem lutas a sustentar, combates a travar com as más paixões. Não
tendo sido criada perfeita, mas suscetível de o ser, a fim de que tenha o
mérito de suas obras, a alma pode cair em faltas, que são consequentes à sua
natural fraqueza. E se por esta fraqueza fora eternamente punida, era caso de
perguntar por que não a criou Deus mais forte? A punição é antes uma
advertência do mal já praticado, devendo ter por fim reconduzi-la ao bom
caminho. Se a pena fosse irremissível, o desejo de melhorar seria supérfluo;
nem o fim da criação seria alcançado, porquanto haveria seres predestinados à
felicidade ou à desgraça. Se uma alma se arrepende, pode regenerar-se, e
podendo regenerar-se pode aspirar à felicidade. E Deus seria justo se lhe
recusasse os respectivos meios? Sendo o bem o fim supremo da Criação, a
felicidade, que é o seu prêmio, deve ser eterna; e o castigo, como meio de
alcançá-la, temporário. A noção mais comezinha da justiça humana prescreve que
se não pode castigar perpetuamente quem se mostra desejoso de praticar o bem.
17. Um último argumento a favor das penas eternas é este: “O temor das penas
eternas é um freio; anulado este, o homem, por nada temer, entregar-se-ia a
todos os excessos.” Refutação: Esse raciocínio procederia se a temporalidade
das penas importasse, de fato, na supressão de toda sanção penal. A felicidade
ou infelicidade futura é consequência rigorosa da Justiça de Deus, pois a
identidade de condições para o bom e para o mau seria a negação dessa justiça.
E não sendo eterno, nem por isso o castigo deixa de ser temeroso, e tanto maior
será o temor quanto maior a convicção. Esta, por sua vez, tanto mais profunda
será, quanto mais racional a procedência do castigo. Uma penalidade, em que se
não crê, não pode ser um freio, e a eternidade das penas está nesse caso. A
crença nessa penalidade, já o afirmamos, teve a sua utilidade, a sua razão de
ser em dada época; hoje, não somente deixa de impressionar os ânimos, mas até
produz descrentes. Antes de a preconizar como necessidade, fora mister
demonstrar a sua realidade. Seria preciso, além disso, inferir a sua eficácia
relativamente aos que a preconizam e se esforçam por demonstrá-la. E,
desgraçadamente, entre esses, muitos provam pelos atos que nada temem das penas
eternas. Assim, impotente para reprimir os próprios, que império poderá exercer
sobre os descrentes e refratários? Impossibilidade material das penas eternas
18. Até aqui, só temos combatido o dogma das penas eternas com o raciocínio.
Demonstremo-lo agora em contradição com os fatos positivos que observamos,
provando-lhe a impossibilidade. Por este dogma a sorte das almas,
irrevogavelmente fixada depois da morte, é, como tal, um travão definitivo
aplicado ao progresso. Ora, a alma progride ou não? Eis a questão: Se progride,
a eternidade das penas é impossível. E poder-se-á duvidar desse progresso,
vendo a variedade enorme de aptidões morais e intelectuais existentes sobre a
Terra, desde o selvagem ao homem civilizado, aferindo a diferença apresentada
por um povo de um a outro século? Se se admite não ser das mesmas almas, é
força admitir que Deus criou almas em todos os graus de adiantamento, segundo
os tempos e lugares, favorecendo umas e destinando outras à perpétua
inferioridade — o que seria incompatível com a justiça, que, aliás, deve ser
igual para todas as criaturas. 19. É incontestável que a alma atrasada moral e
intelectualmente, como a dos povos bárbaros, não pode ter os mesmos elementos
de felicidade, as mesmas aptidões para gozar dos esplendores do Infinito, como
a alma cujas faculdades estão largamente desenvolvidas. Se, portanto, estas
almas não progredirem, não podem em condições mais favoráveis gozar na
eternidade senão de uma felicidade, por assim dizer, negativa. Para estar de
acordo com a rigorosa justiça, chegaremos, pois, à conclusão de que as almas
mais adiantadas são as atrasadas de outro tempo, com progressos posteriormente
realizados. Aqui, então, atingimos a questão magna da pluralidade das
existências como meio único e racional de resolver a dificuldade. Façamos
abstração, porém, dessa questão e consideremos a alma sob o ponto de vista de
uma única existência. 20. Figuremos um rapaz de 20 anos, desses que comumente
se encontram, ignorante, viciado por índole, cético, negando-se a sua alma e a
Deus, entregue à desordem e cometendo toda sorte de malvadeza. Esse rapaz
encontra-se, depois, num meio favorável, melhor; trabalha, instrui-se,
corrige-se gradualmente e acaba por tornar-se crente e piedoso. Eis aí um
exemplo palpável do progresso da alma durante a vida, exemplo que se reproduz
todos os dias. Esse homem morre em avançada idade, como um santo, e
naturalmente certa se lhe torna a salvação; mas qual seria a sua sorte se um
acidente lhe pusesse termo à existência, trinta ou quarenta anos mais cedo? Ele
estava nas condições exigidas para ser condenado, e, se o fosse, todo o
progresso se lhe tornaria impossível. E assim, segundo a doutrina das penas
eternas, teremos um homem salvo somente pela circunstância de viver mais tempo,
circunstância, aliás, fragilíssima, uma vez que um acidente qualquer poderia
tê-la anulado fortuitamente. Desde que sua alma pôde progredir em um tempo
dado, por que razão não mais poderia progredir depois da morte, se uma causa
alheia à sua vontade a tivesse impedido de fazê-lo durante a vida? Por que lhe
recusaria Deus os meios de regenerar-se na outra vida, concedendo-lhes nesta?
Neste caso, o arrependimento veio, posto que tardio, mas se desde o momento da
morte se impusesse irrevogável condenação, esse arrependimento seria
infrutífero por todo o sempre, como destruídas seriam as aptidões dessa alma
para o progresso, para o bem. 21. O dogma da eternidade absoluta das penas é,
portanto, incompatível com o progresso das almas, ao qual opõe uma barreira
insuperável. Esses dois princípios destroem-se, e a condição indeclinável da
existência de um é o aniquilamento do outro. Qual dos dois existe de fato? A
lei do progresso é evidente: não é uma teoria, é um fato corroborado pela
experiência: é uma Lei da natureza, divina, imprescritível. E, pois, que esta
lei existe inconciliável com a outra, é porque a outra não existe. Se o dogma
das penas eternas existisse verdadeiramente, Santo Agostinho (354-430), Paulo e
tantos outros jamais teriam visto o Céu, caso morressem antes de realizar o
progresso que lhes trouxe a conversão. A esta última asserção respondem que a
conversão dessas santas personagens não é um resultado do progresso da alma,
porém, da graça que lhes foi concedida e de que foram tocadas. Porém, isto é
simples jogo de palavras. Se esses santos praticaram o mal e depois o bem, é
que melhoraram; logo, progrediram. E por que lhes teria Deus concedido como
especial favor a graça de se corrigirem? Sim, por que a eles, e não a outros?
Sempre, sempre a doutrina dos privilégios, incompatível com a Justiça de Deus e
com seu igual amor por todas as criaturas. Segundo a Doutrina Espírita, de
acordo mesmo com as palavras do Evangelho, com a lógica e com a mais rigorosa justiça,
o homem só merece por suas obras, durante esta vida e depois da morte, nada
devendo ao favoritismo: Deus o recompensa pelos esforços e pune pela
negligência, isto por tanto tempo quanto nela persistir. 22. A crença na
eternidade das penas prevaleceu salutarmente enquanto os homens não tiveram ao
seu alcance a compreensão do poder moral. É o que sucede com as crianças
durante certo tempo contidas pela ameaça de seres quiméricos com os quais são
intimidadas; chegadas ao período do raciocínio, repelem por si mesmas essas
quimeras da infância, tornando-se absurdo o querer governá-las por tais meios.
Se os que as dirigem pretendessem incutir-lhes ainda a veracidade de tais
fábulas, certo decairiam da sua confiança. É isso que se dá hoje com a
humanidade, saindo da infância e abandonando, por assim dizer, os cueiros. O
homem não é mais passivo instrumento vergado à força material, nem o ente
crédulo de outrora que tudo aceitava de olhos fechados. 23. A crença é um ato
de entendimento que, por isso mesmo, não pode ser imposta. Se, durante certo
período da humanidade, o dogma da eternidade das penas se manteve inofensivo e
benéfico mesmo, chegou o momento de tornar-se perigoso. Imposto como verdade
absoluta, quando a razão o repele, ou o homem quer acreditar e procura uma
crença mais racional, afastando-se dos que o professam, ou, então, descrê
absolutamente de tudo. Quem quer que estude o assunto, calmamente, verá que, em
nossos dias, o dogma da eternidade das penas tem feito mais ateus e
materialistas do que todos os filósofos. As ideias seguem um curso
incessantemente progressivo, e absurdo é querer governar os homens desviando-os
desse curso; pretender contê-los, retroceder ou simplesmente parar enquanto o
curso avança, é condenar e perder os homens. Seguir ou deixar de seguir essa
evolução é uma questão de vida ou de morte para as religiões como para os
governos. Este fatalismo é um bem ou um mal? Para os que vivem do passado,
vendo-o aniquilar-se, será um mal, mas para os que vivem pelo futuro é uma lei
do progresso, de Deus em suma. E contra uma Lei de Deus é inútil toda revolta,
impossível a luta. Para que, pois, sustentar a todo o transe uma crença que se
dissolve em desuso, fazendo mais danos que benefícios à Religião? Ah! contrista
dizê-lo, mas uma questão material domina aqui a questão religiosa. Esta crença
tem sido grandemente explorada pela ideia de que com dinheiro se abrem as
portas do Céu, livrando das do inferno. As quantias por estes meios
arrecadadas, outrora e ainda hoje, são incalculáveis, e verdadeiramente
fabuloso o imposto prévio pago ao temor da eternidade. E sendo facultativo tal
imposto, a renda é sempre proporcional à crença; extinta esta, improdutivo será
aquele. De bom grado cede a criança o bolo a quem lhe promete afugentar o
lobisomem, mas se a criança já não acreditar em lobisomens, guardará o bolo.
24. A Nova Revelação, dando noções mais sensatas da vida futura e provando que
podemos, cada um de nós, promover a felicidade pelas próprias obras, deve
encontrar tremenda oposição, tanto mais viva por estancar uma das mais rendosas
fontes de receita. E assim tem sido, sempre que uma nova descoberta ou invento
abala costumes inveterados e preestabelecidos. Quem vive de antigos e custosos
costumes sempre os defendem, alegando a superioridade e excelência deles, e
assim desabonam as novidades, por melhores que sejam. Acreditar-se, por
exemplo, que a imprensa, apesar dos benefícios prestados à sociedade, tenha
sido aclamada pela classe dos copistas? Não, certamente eles deveriam
profligá-la. O mesmo se tem dado em relação a maquinismos, caminho de ferro e
centenárias de outras descobertas e aplicações. Aos olhos dos incrédulos o
dogma da eternidade das penas afigura-se futilidade da qual se riem; para o
filósofo esse dogma tem uma gravidade social pelos abusos que acoroçoa, ao
passo que o homem verdadeiramente religioso tem a dignidade da Religião
interessada na destruição dos abusos que tal dogma origina, e da sua causa,
enfim. Ezequiel contra a eternidade das penas e o pecado original. A quem
pretenda encontrar na Bíblia a justificação da eternidade das penas, pode-se
opor os textos contrários que a tal respeito não comportam ambiguidades. As
seguintes palavras de Ezequiel são a mais explícita negação, não somente das
penas irremissíveis, mas da responsabilidade que o pecado do pai do gênero
humano acarretasse à sua raça: 1. O Senhor novamente me falou e disse: — 2.
Donde vem o uso desta parábola entre vós e consagrada proverbialmente em
Israel: Os pais, dizeis, comeram uvas verdes, e os dentes dos filhos ficaram
estragados? — 3. Por mim juro, disse o Senhor Deus, que essa parábola não
passará mais entre vós, como provérbio em Israel: — 4. Pois todas as almas me
pertencem; a do filho está comigo como a do pai; a alma que tiver pecado morrerá
ela própria. 5. Se um homem for justo. 6. Se proceder segundo a equidade e a
justiça; — 7. Se não magoar nem oprimir ninguém; se entregar ao seu devedor o
penhor que este lhe houver dado; se não tomar nada do bem de outrem por
violência; se dá o seu pão a quem tem fome; se veste os que estão nus; — 8. Se
não se presta à usura e não percebe mais do que tem dado; se desvia sua mão da
iniquidade e promove um juízo conciliatório entre dois que contendem; — 9. Se
caminha segundo a pauta dos meus preceitos e observa as minhas ordens para
obrar conforme a verdade, esse homem é justo e viverá mui certamente, disse o
Senhor Deus. Se esse homem tem um filho que dê em ladrão, e derrame sangue, ou
que cometa algumas destas faltas; — 13. Esse filho morrerá mui certamente, pois
tem praticado todas essas ações detestáveis, e seu sangue permanecerá sobre a
terra. 14. Se esse homem tem um filho que, vendo todos os crimes por seu pai
cometidos, se aterrorize e evite imitá-lo; — 17. Este não morrerá por causa da
iniquidade de seu pai, mas viverá mui certamente. — 18. Seu pai, que tinha
oprimido os outros por calúnias e que tinha praticado ações criminosas no meio
do seu povo, morreu por causa da sua própria iniquidade. 19. Se dizes: Por que
o filho não tem suportado a iniquidade de seu pai? É porque o filho tem obrado
segundo a equidade e a justiça; tem guardado todos os meus preceitos; e porque
os tem praticado viverá mui certamente. 20. A alma que tem pecado morrerá ela
mesma: o filho não sofrerá pela iniquidade do pai e o pai não sofrerá pela
iniquidade do filho; a justiça do justo verterá sobre ele mesmo, a impiedade do
ímpio verterá sobre ele. 21. Se o ímpio fez penitência de todos os pecados que
tem cometido, se observou todos os meus preceitos, se obra segundo a equidade e
a justiça, ele viverá certamente e não morrerá. — 22. Eu não me lembrarei mais
de todas as iniquidades que ele tenha cometido; viverá nas obras de justiça que
houver praticado. 23. É que Eu quero a morte do ímpio? — disse o Senhor Deus —,
e não quero antes que se converta e desgarre do mau caminho que trilha?
(Ezequiel 18) Dizei-lhes estas palavras: Eu juro por mim mesmo que não quero a
morte do ímpio, mas que o ímpio se converta, que abandone o mau caminho e que
viva. (Ezequiel 33,11). www.febnet.org.br.
Livro O Céu e o Inferno. Abraço. Davi
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