sexta-feira, 31 de julho de 2020

DEUS


Espiritismo. www.febnet.org.br. Livro A Gênese – Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo. Texto de Allan Kardec (1804-1869). Capítulo II. DEUS • Existência de Deus • Da natureza divina • A Providência • A visão de Deus. Existência de Deus. 1. Sendo Deus a causa primária de todas as coisas, a origem de tudo o que existe, a base sobre que repousa o edifício da Criação, é também o ponto que importa consideremos antes de tudo. 2. Constitui princípio elementar que pelos seus efeitos é que se julga de uma causa, mesmo quando ela se conserve oculta. Se, fendendo os ares, um pássaro é atingido por mortífero grão de chumbo, deduz-se que hábil atirador o alvejou, ainda que este último não seja visto. Nem sempre, pois, se faz necessário vejamos uma coisa, para sabermos que ela existe. Em tudo, observando os efeitos é que se chega ao conhecimento das causas. 3. Outro princípio igualmente elementar e que, de tão verdadeiro, passou a axioma é o de que todo efeito inteligente tem que decorrer de uma causa inteligente. Se perguntassem qual o construtor de certo mecanismo engenhoso, que pensaríamos de quem respondesse que ele se fez a si mesmo? Quando se contempla uma obra-prima da arte ou da indústria, diz que há de tê-la produzido um homem de gênio, porque só uma alta inteligência poderia concebê-la. Reconhece-se, no entanto, que ela é obra de um homem, por se verificar que não está acima da capacidade humana; mas a ninguém acudirá a ideia de dizer que saiu do cérebro de um idiota ou de um ignorante, nem, ainda menos, que é trabalho de um animal, ou produto do acaso. 4. Em toda parte se reconhece a presença do homem pelas suas obras. A existência dos homens antediluvianos não se provaria unicamente por meio dos fósseis humanos: provou-a também, e com muita certeza, a presença, nos terrenos daquela época, de objetos trabalhados pelos homens. Um fragmento de vaso, uma pedra talhada, uma arma, um tijolo bastarão para lhe atestar a presença. Pela grosseria ou perfeição do trabalho, reconhecer-se-á o grau de inteligência ou de adiantamento dos que o executaram. Se, pois, achando-vos numa região habitada exclusivamente por selvagens, descobrirdes uma estátua digna de Fídias, não hesitareis em dizer que, sendo incapazes de tê-la feito os selvagens, ela é obra de uma inteligência superior à destes. 5. Pois bem! lançando o olhar em torno de si, sobre as obras da natureza, notando a providência, a sabedoria, a harmonia que presidem a essas obras, reconhece o observador não haver nenhuma que não ultrapasse os limites da mais portentosa inteligência humana. Ora, desde que o homem não as pode produzir, é que elas são produto de uma inteligência superior à humanidade, a menos se sustente que há efeitos sem causa. 6. A isto opõem alguns o seguinte raciocínio: As obras ditas da natureza são produzidas por forças materiais que atuam mecanicamente, em virtude das leis de atração e repulsão; as moléculas dos corpos inertes se agregam e desagregam sob o império dessas leis. As plantas nascem, brotam, crescem e se multiplicam sempre da mesma maneira, cada uma na sua espécie, por efeito daquelas mesmas leis; cada indivíduo se assemelha ao de quem ele proveio; o crescimento, a floração, a frutificação, a coloração se acham subordinados a causas materiais, tais como o calor, a eletricidade, a luz, a umidade etc. O mesmo se dá com os animais. Os astros se formam pela atração molecular e se movem perpetuamente em suas órbitas por efeito da gravitação. Essa regularidade mecânica no emprego das forças naturais não acusa a ação de qualquer inteligência livre. O homem movimenta o braço quando quer e como quer; aquele, porém, que o movimentasse no mesmo sentido, desde o nascimento até a morte, seria um autômato. Ora, as forças orgânicas da natureza são puramente automáticas. Tudo isso é verdade, mas essas forças são efeitos que hão de ter uma causa e ninguém pretende que elas constituam a Divindade. Elas são forças materiais e mecânicas; não são por si mesmas inteligentes, o que também é verdade; mas são postas em ação, distribuídas, apropriadas às necessidades de cada coisa por uma inteligência que não é a dos homens. A aplicação útil dessas forças é um efeito inteligente que denota uma causa inteligente. Um pêndulo se move com automática regularidade e é nessa regularidade que lhe está o mérito. É toda material a força que o faz mover-se e nada tem de inteligente. Mas que seria esse pêndulo se uma inteligência não houvesse combinado, calculado, distribuído o emprego daquela força, para fazê-lo andar com precisão? Do fato de não estar a inteligência no mecanismo do pêndulo e do fato de que ninguém vê, seria racional deduzir-se que ela não existe? Julgamos  pelos seus efeitos. A existência do relógio atesta a existência do relojoeiro; a engenhosidade do mecanismo lhe atesta a inteligência e o saber. Quando um relógio vos indica a hora que desejais saber, quem se lembrará de dizer: aí está um relógio bem inteligente? Outro tanto ocorre com o mecanismo do universo: Deus não se mostra, mas se revela pelas suas obras. 7. A existência de Deus é, pois, uma realidade comprovada não só pela revelação, como pela evidência material dos fatos. Os povos selvagens nenhuma revelação tiveram; entretanto, creem instintivamente na existência de um poder sobre-humano. Eles veem coisas que estão acima das possibilidades do homem e deduzem que essas coisas provêm de um ente superior à humanidade. Não demonstram raciocinar com mais lógica do que os que pretendem que tais coisas se fizeram a si mesmas? Da natureza divina 8. Não é dado ao homem sondar a natureza íntima de Deus. Para compreender Deus, ainda nos falta o sentido, que só se adquire com a completa depuração do Espírito. Mas se o homem não pode penetrar a essência de Deus, pode ter como premissa a sua existência. O homem pode, então, pela razão chegar a conhecer-lhe os atributos necessários e concluir que esses atributos só podem ser divinos, deduzindo daí quem é Deus. Sem o conhecimento dos atributos de Deus, impossível seria compreender-se a obra da Criação. Esse é o ponto de partida de todas as crenças religiosas e por não se terem reportado aos atributos, como ao farol capaz de as orientar, que a maioria das religiões errou em seus dogmas. As que não atribuíram a Deus a onipotência imaginaram muitos deuses; as que não lhe atribuíram soberana bondade fizeram dele um Deus ciumento, colérico, parcial e vingativo. 9. Deus é a suprema e soberana inteligência. É limitada a inteligência do homem, pois que não pode fazer, nem compreender tudo o que existe. A de Deus, abrangendo o infinito, tem que ser infinita. Se a supuséssemos limitada num ponto qualquer, poderíamos conceber outro ser mais inteligente, capaz de compreender e fazer o que o primeiro não faria e assim por diante, até o infinito. 10. Deus é eterno, isto é, não teve começo e não terá fim. Se tivesse tido princípio, houvera saído do nada. Ora, não sendo o nada coisa alguma, coisa nenhuma pode produzir. Ou, então, teria sido criado por outro ser anterior e, nesse caso, este ser é que seria Deus. Se lhe supuséssemos um começo ou fim, poderíamos conceber uma entidade existente antes dele e capaz de lhe sobreviver, e assim por diante, ao infinito. 11. Deus é imutável. Se estivesse sujeito a mudanças, nenhuma estabilidade teriam as leis que regem o universo. 12. Deus é imaterial, isto é, a sua natureza difere de tudo o que chamamos matéria. De outro modo, não seria imutável, pois estaria sujeito às transformações da matéria. Deus carece de forma apreciável pelos nossos sentidos, sem o que seria matéria. Dizemos: a mão de Deus, o olho de Deus, a boca de Deus, porque o homem, nada mais conhecendo além de si mesmo, toma a si próprio por termo de comparação para tudo o que não compreende. São ridículas essas imagens em que Deus é representado pela figura de um ancião de longas barbas e envolto em manto. Têm o inconveniente de rebaixar o Ente supremo até as mesquinhas proporções da humanidade. Daí a lhe emprestarem as paixões humanas e a fazerem-no um Deus colérico e ciumento não vai mais que um passo. 13. Deus é onipotente. Se não possuísse o poder supremo, sempre se poderia conceber uma entidade mais poderosa e assim por diante, até chegar-se ao ser cuja potencialidade nenhum outro ultrapassasse. Esse então é que seria Deus. 14. Deus é soberanamente justo e bom. A providencial sabedoria das Leis divinas se revela nas mais pequeninas coisas, como nas maiores, não permitindo essa sabedoria que se duvide da sua justiça, nem da sua bondade. O fato de ser infinita uma qualidade, exclui a possibilidade de uma qualidade contrária, porque está a apoucaria ou anularia. Um ser infinitamente bom não poderia conter a mais insignificante parcela de malignidade, nem o ser infinitamente mau conter a mais insignificante parcela de bondade, do mesmo modo que um objeto não pode ser de um negro absoluto, com a mais ligeira nuança de branco, nem de um branco absoluto com a menor mancha preta. Deus, pois, não poderia ser simultaneamente bom e mau, porque então, não possuindo qualquer dessas duas qualidades no grau supremo, não seria Deus; todas as coisas estariam sujeitas ao seu capricho e para nenhuma haveria estabilidade. Não poderia Ele, por conseguinte, deixar de ser ou infinitamente bom ou infinitamente mau. Ora, como suas obras dão testemunho da sua sabedoria, da sua bondade e da sua solicitude, concluir-se-á que, não podendo ser ao mesmo tempo bom e mau sem deixar de ser Deus, Ele necessariamente tem de ser infinitamente bom. A soberana bondade implica a soberana justiça, porquanto, se Ele procedesse injustamente ou com parcialidade numa só circunstância que fosse, ou com relação a uma só de suas criaturas, já não seria soberanamente justo e, em consequência, já não seria soberanamente bom. 15. Deus é infinitamente perfeito. É impossível conceber-se Deus sem o infinito das perfeições, sem o que não seria Deus, pois sempre se poderia conceber um ser que possuísse o que lhe faltasse. Para que nenhum ser possa ultrapassá-lo, faz-se mister que Ele seja infinito em tudo. Sendo infinitos, os atributos de Deus não são suscetíveis nem de aumento, nem de diminuição, visto que do contrário não seriam infinitos e Deus não seria perfeito. Se lhe tirassem a qualquer dos atributos a mais mínima parcela, já não haveria Deus, pois que poderia existir um ser mais perfeito. 16. Deus é único. A unicidade de Deus é consequência do fato de serem infinitas as suas perfeições. Não poderia existir outro Deus, salvo sob a condição de ser igualmente infinito em todas as coisas, visto que, se houvesse entre eles a mais ligeira diferença, um seria inferior ao outro, subordinado ao poder desse outro e, então, não seria Deus. Se houvesse entre ambos igualdade absoluta, isso equivaleria a existir, por toda eternidade, um mesmo pensamento, uma mesma vontade, um mesmo poder. Confundidos quanto à identidade, não haveria, em realidade, mais que um único Deus. Se cada um tivesse atribuições especiais, um não faria o que o outro fizesse; mas, então, não existiria igualdade perfeita entre eles, pois que nenhum possuiria a autoridade soberana. 17. A ignorância do princípio de que são infinitas as perfeições de Deus foi que gerou o politeísmo, culto adotado por todos os povos primitivos, que davam o atributo de divindade a todo poder que lhes parecia acima dos poderes inerentes à humanidade. Mais tarde, a razão os levou a reunir essas diversas potências numa só. Depois, à proporção que os homens foram compreendendo a essência dos atributos divinos, retiraram dos símbolos, que haviam criado, a crença que implicava a negação desses atributos. 18. Em resumo, Deus não pode ser Deus, senão sob a condição de que nenhum outro o ultrapasse, porquanto o ser que o excedesse no que quer que fosse, ainda que apenas na grossura de um cabelo, é que seria o verdadeiro Deus. Para que tal não se dê, indispensável se torna que Ele seja infinito em tudo. É assim que, comprovada pelas suas obras a existência de Deus, por simples dedução lógica se chega a determinar os atributos que o caracterizam. 19. Deus é, pois, a inteligência suprema e soberana, é único, eterno, imutável, imaterial, onipotente, soberanamente justo e bom, infinito em todas as perfeições, e não pode ser diverso disso. Tal o eixo sobre que repousa o edifício universal. Esse o farol cujos raios se estendem por sobre o universo inteiro, única luz capaz de guiar o homem na procura da verdade. Orientando-se por essa luz, ele nunca se transviará. Se, portanto, o homem há errado tantas vezes, é unicamente por não ter seguido o roteiro que lhe estava indicado. Tal também o critério infalível de todas as doutrinas filosóficas e religiosas. Para apreciá-las, dispõe o homem de uma medida rigorosamente exata nos atributos de Deus e pode afirmar a si mesmo que toda teoria, todo princípio, todo dogma, toda crença, toda prática que estiver em contradição com um só que seja desses atributos, que tenda não tanto a anulá-lo, mas simplesmente a diminuí-lo, não pode estar com a verdade. Em Filosofia, em Psicologia, em Moral, em Religião, só há de verdadeiro o que não se afaste, nem um til, das qualidades essenciais da Divindade. A religião perfeita será aquela de cujos artigos de fé nenhum esteja em oposição àquelas qualidades; aquela cujos dogmas todos suportem a prova dessa verificação sem nada sofrerem. A Providência. 20. A providência é a solicitude de Deus para com as suas criaturas. Ele está em toda parte, tudo vê, a tudo preside, mesmo às menores coisas. É nisto que consiste a ação providencial. “Como pode Deus, tão grande, tão poderoso, tão superior a tudo, imiscuir-se em pormenores ínfimos, preocupar-se com os menores atos e os menores pensamentos de cada indivíduo?” Está a interrogação que a si mesmo dirige o incrédulo, concluindo por dizer que, admitida a existência de Deus, só se pode admitir, quanto à sua ação, que ela se exerça sobre as leis gerais do universo; que o universo funcione de toda a eternidade em virtude dessas leis, às quais toda criatura se acha submetida na esfera de suas atividades, sem que haja mister a intervenção incessante da ­Providência. 21. No estado de inferioridade em que ainda se encontram, só muito dificilmente podem os homens compreender que Deus seja infinito, pois, vendo-se limitados e circunscritos, eles o imaginam também circunscrito e limitado. Imaginando-o circunscrito, figuram-no quais eles são, à imagem e semelhança deles. Os quadros em que o vemos com traços humanos não contribuem pouco para entreter esse erro no espírito das massas, que nele adoram mais a forma que o pensamento. Para a maioria, é Ele um soberano poderoso, sentado num trono inacessível e perdido na imensidade dos céus. Tendo restritas suas faculdades e percepções, não compreendem que Deus possa e se digne de intervir diretamente nas pequeninas coisas. 22. Impotente para compreender a essência mesma da Divindade, o homem não pode fazer dela mais do que uma ideia aproximativa, mediante comparações necessariamente muito imperfeitas, mas que, ao menos, servem para lhe mostrar a possibilidade daquilo que, à primeira vista, lhe parece impossível. Suponhamos um fluido bastante sutil para penetrar todos os corpos. Sendo ininteligente, esse fluido atua mecanicamente, por meio tão só das forças materiais. Se, porém, o supusermos dotado de inteligência, de faculdades perceptivas e sensitivas, ele já não atuará às cegas, mas com discernimento, com vontade e liberdade: verá, ouvirá e sentirá. 23. As propriedades do fluido perispirítico podem nos dar uma ideia. Ele não é de si mesmo inteligente, pois que é matéria, mas é o veículo do pensamento, das sensações e percepções do Espírito. O fluido perispiritual não é o pensamento do Espírito; é, porém, o agente e o intermediário desse pensamento. Sendo ele que o transmite, fica, de certo modo, impregnado do pensamento transmitido, e na impossibilidade em que achamos de isolar o pensamento, a nós parece que ele faz corpo com o fluido, dando a entender que são uma coisa só, como sucede com o som e o ar, de maneira que podemos, a bem dizer, materializá-lo. Assim como dizemos que o ar se torna sonoro, poderíamos, tomando o efeito pela causa, dizer que o fluido se torna inteligente. 24. Seja ou não assim no que concerne ao pensamento de Deus, isto é, que o pensamento de Deus atue diretamente ou por intermédio de um fluido, para facilitar a nossa inteligência, figuremo-lo sob a forma concreta de um fluido inteligente que enche o universo infinito e penetra todas as partes da Criação: a natureza inteira está mergulhada no fluido divino. Ora, em virtude do princípio de que as partes de um todo são da mesma natureza e têm as mesmas propriedades que ele, cada átomo desse fluido, se assim nos podemos exprimir, possuindo o pensamento, isto é, os atributos essenciais da Divindade e estando o mesmo fluido em toda parte, tudo está submetido à sua ação inteligente, à sua previdência, à sua solicitude. Nenhum ser haverá, por mais ínfimo que o suponhamos, que não esteja saturado dele. Achamo-nos então, constantemente, em presença da
Divindade; nenhuma das nossas ações lhe podemos subtrair ao olhar; o nosso pensamento está em contato ininterrupto com o seu pensamento, havendo, pois, razão para dizer-se que Deus vê os mais profundos refolhos do nosso coração. Estamos nele, como Ele está em nós, segundo a palavra do Cristo (1 João, 4:13). Para estender a sua solicitude a todas as criaturas, não precisa Deus lançar o olhar do Alto da imensidade. As nossas preces, para que Ele as ouça, não precisam transpor o espaço, nem ser ditas com voz retumbante, pois que, estando sempre ao nosso lado, os nossos pensamentos repercutem nele. Os nossos pensamentos são como os sons de um sino, que fazem vibrar todas as moléculas do ar ambiente. 25. Longe de nós a ideia de materializar a Divindade. A imagem de um fluido inteligente universal evidentemente não passa de uma comparação apropriada a dar de Deus uma ideia mais exata do que os quadros que o apresentam debaixo de uma figura humana. Essa imagem se destina a fazer compreensível a possibilidade que tem Deus de estar em toda parte e de se ocupar com todas as coisas. 26. Temos constantemente sob as vistas um exemplo que nos permite fazer ideia do modo por que talvez se exerça a ação de Deus sobre as partes mais íntimas de todos os seres e, conseguintemente, do modo por que lhe chegam as mais sutis impressões de nossa alma. Esse exemplo tiramo-lo de certa instrução que a tal respeito deu um Espírito. 27. “O homem é um pequeno mundo, que tem como diretor o Espírito e como dirigido o corpo. Nesse universo, o corpo representará uma criação cujo Espírito seria Deus. (Compreendei bem que aqui há uma simples questão de analogia e não de identidade). Os membros desse corpo, os diferentes órgãos que o compõem, os músculos, os nervos, as articulações são outras tantas individualidades materiais, se assim se pode dizer, localizadas em pontos especiais do corpo. Se bem seja considerável o número de suas partes constitutivas, de natureza tão variada e diferente, a ninguém é lícito supor que se possam produzir movimentos, ou uma impressão em qualquer lugar, sem que o Espírito tenha consciência do que ocorra. Há sensações diversas em muitos lugares simultaneamente? O Espírito as sente todas, distingue, analisa, assinala a cada uma a causa determinante e o ponto em que se produziu, tudo por meio do fluido perispirítico. “Análogo fenômeno ocorre entre Deus e a Criação. Deus está em toda parte, na natureza, como o Espírito está em toda parte, no corpo. Todos os elementos da Criação se acham em relação constante com Ele, como todas as células do corpo humano se acham em contato imediato com o ser espiritual. Não há, pois, razão para que fenômenos da mesma ordem não se produzam de maneira idêntica, num e noutro caso. “Um membro se agita: o Espírito o sente; uma criatura pensa: Deus o sabe. Todos os membros estão em movimento, os diferentes órgãos estão a vibrar; o Espírito se ressente de todas as manifestações, as distingue e localiza. As diferentes criações, as diferentes criaturas se agitam, pensam, agem diversamente: Deus sabe o que se passa e assina a cada um o que lhe diz respeito. “Daí se pode igualmente deduzir a solidariedade da matéria e da inteligência, a solidariedade entre si de todos os seres de um mundo, a de todos os mundos e, por fim, de todas as criações com o Criador.” (Quinemant, Sociedade de Paris, 1867). 28. Compreendemos o efeito: já é muito. Do efeito remontamos à causa e julgamos da sua grandeza pela grandeza do efeito. Escapa-nos, porém, a sua essência íntima, como a da causa de uma imensidade de fenômenos. Conhecemos os efeitos da eletricidade, do calor, da luz, da gravitação; calculamo-los e, entretanto, ignoramos a natureza íntima do princípio que os produz. Será então racional neguemos o princípio divino, porque não o compreendemos? 29. Nada obsta a que se admita, para o princípio da soberana inteligência, um centro de ação, um foco principal a irradiar incessantemente, inundando o universo com seus eflúvios, como o Sol com a sua luz. Mas onde esse foco? É o que ninguém pode dizer. Provavelmente, não se acha fixado em determinado ponto, como não o está a sua ação, sendo também provável que percorra constantemente as regiões do espaço sem- -fim. Se simples Espíritos têm o dom da ubiquidade, em Deus há de ser sem limites essa faculdade. Enchendo Deus o universo, poder-se-ia ainda admitir, a título de hipótese, que esse foco não precisa transportar-se, por se formar em todas as partes onde a soberana vontade julga conveniente que ele se produza, donde o poder dizer-se que está em toda parte e em parte nenhuma. 30. Diante desses problemas insondáveis, cumpre que a nossa razão se humilhe. Deus existe: disso não podemos duvidar. É infinitamente justo e bom: essa a sua essência. A tudo se estende a sua solicitude: compreendemo-lo. Só o nosso bem, portanto, pode Ele querer, donde se segue que devemos confiar nele, isso é essencial. Quanto ao mais, esperemos, que tenhamos tornado dignos de o compreender. A visão de Deus. 31. Se Deus está em toda parte, por que não o vemos? Vê-lo-emos quando deixarmos a Terra? Tais as perguntas que se formulam todos os dias. À primeira é fácil responder. Por serem limitadas as percepções dos nossos órgãos visuais, elas os tornam inaptos à visão de certas coisas, mesmo materiais. Assim é que alguns fluidos nos fogem totalmente à nossa visão e aos instrumentos de análise; entretanto, não duvidamos da existência deles. Vemos os efeitos da peste, mas não vemos o fluido que a transporta;19 vemos os corpos em movimento sob a influência da força de gravitação, mas não vemos essa força. 32. Os nossos órgãos materiais não podem perceber as coisas de essência espiritual. Unicamente com a visão espiritual é que podemos ver os Espíritos e as coisas do mundo imaterial. Somente a nossa alma, portanto, pode ter a percepção de Deus. Dar-se-á que ela o veja logo após a morte? A esse respeito, só as comunicações de além-túmulo nos podem instruir. Por elas sabemos que a visão de Deus constitui privilégio das mais purificadas almas e que bem poucas, ao deixarem o envoltório terrestre, se encontram no grau de desmaterialização necessária a tal efeito. Uma comparação vulgar tornará facilmente compreensível essa condição. 33. Uma pessoa que se ache no fundo de um vale, envolvido por densa bruma, não vê o Sol. Entretanto, pela luz difusa, percebe a claridade do Sol. Se começa a subir a montanha, à medida que for ascendendo, o nevoeiro se irá dissipando e a luz ficará cada vez mais viva. Contudo, ainda não verá o Sol. Só depois que se haja elevado acima da camada brumosa e chegado a um ponto onde o ar esteja perfeitamente límpido, ela o contemplará em todo o seu esplendor. O mesmo se dá com a alma. O envoltório perispirítico, conquanto nos seja invisível e impalpável, é, com relação a ela, verdadeira matéria, ainda grosseira demais para certas percepções. Esse invólucro, porém, se espiritualiza, à proporção que a alma se eleva em moralidade. As imperfeições da alma são quais camadas nevoentas que lhe obscurecem a visão. Cada imperfeição de que ela se desfaz é uma mácula a menos; todavia, só depois de se haver depurado completamente é que goza da plenitude das suas faculdades. 34. Sendo Deus a essência divina por excelência, unicamente os Espíritos que atingiram o mais alto grau de desmaterialização o podem perceber. Pelo fato de os Espíritos imperfeitos não verem a Deus, não se segue que eles estejam mais distantes de Deus do que os outros; esses Espíritos, como os demais, como todos os seres da natureza, se encontram mergulhados no fluido divino, do mesmo modo que nós o estamos na luz. O que há é que as imperfeições daqueles Espíritos são vapores que os impedem de vê-lo. Quando o nevoeiro se dissipar, vê-lo-ão resplandecer. Para isso, não lhes é preciso subir, nem procurá-lo nas profundezas do infinito. Desimpedida a visão espiritual das manchas que a obscureciam, eles o verão de todo lugar onde se achem, mesmo da Terra, porquanto Deus está em toda parte. 35. O Espírito só se depura com o tempo, sendo as diversas encarnações o alambique em cujo fundo deixa de cada vez algumas impurezas. Com o abandonar o seu invólucro corpóreo, os Espíritos não se despojam instantaneamente de suas imperfeições, razão por que, depois da morte, não veem a Deus mais do que o viam quando vivos; mas, à medida que se depuram, têm dele uma intuição mais clara. Não o veem, mas compreendem-no melhor; a luz é menos difusa. Quando, pois, alguns Espíritos dizem que Deus lhes proíbe respondam a uma dada pergunta não é que Deus lhes apareça, ou dirija a palavra, para lhes ordenar ou proibir isto ou aquilo, não; eles, porém, o sentem; recebem os eflúvios do seu pensamento, como nos sucede com relação aos Espíritos que nos envolvem em seus fluidos, embora não os vejamos. 36. Nenhum homem, conseguintemente, pode ver a Deus com os olhos da carne. Se essa graça fosse concedida a alguns, só o seria no estado de êxtase, quando a alma se acha tão desprendida dos laços da matéria que torna possível o fato durante a encarnação. Tal privilégio, aliás, exclusivamente pertenceria a almas de eleição, encarnadas em missão, que não em expiação. Mas como os Espíritos da mais elevada categoria refulgem de ofuscante brilho, pode dar-se que Espíritos menos elevados, encarnados ou desencarnados, maravilhados com o esplendor de que aqueles se mostram cercados, suponham estar vendo o próprio Deus. É como quem vê um ministro e o toma pelo seu soberano. 37. Sob que aparência se apresenta Deus aos que se tornaram dignos de vê-lo? Será sob uma forma qualquer? Sob uma figura humana, ou como um foco de resplendente luz? A linguagem humana é impotente para dizê-lo, porque não existe para nós nenhum ponto de comparação capaz de nos facultar uma ideia de tal coisa. Somos quais cegos de nascença a quem procurassem inutilmente fazer compreendessem o brilho do Sol. A nossa linguagem é limitada pelas nossas necessidades e pelo círculo das nossas ideias; a dos selvagens não poderia descrever as maravilhas da civilização; a dos povos mais civilizados é extremamente pobre para descrever os esplendores dos céus, a nossa inteligência muito restrita para os compreender e a nossa vista, por muito fraca, ficaria deslumbrada. Livro A Gêneses – Os Milagre e as Predições Segundo o Espiritismo. www.febnet.org.br. Abraço. Davi.

quarta-feira, 29 de julho de 2020

SANTA MISSA NA SOLENIDADE DO CORPO SANTO E DO SANGUE DE CRISTO


Catolicismo. www.vantican.va. SANTA MISSA NA SOLENIDADE DO CORPO SANTO E DO SANGUE DE CRISTO. Homilia do Santo Padre Francisco. Basílica de São Pedro – Altar da Presidência. Domingo, 14 de junho de 2020. "Lembra-te de todo o caminho que o Senhor teu Deus te fez seguir" (Deuteronômio 8,2). Lembre - se: com este convite de Moisés, a Palavra de Deus foi aberta hoje, e pouco depois Moisés reiterou: "Não se esqueça do Senhor, seu Deus" (cf. v. 14). As escrituras nos foram dadas para superar o esquecimento de Deus, e quão importante é lembrá-lo quando oramos! Como ensina o Salmo, que diz: "Lembro-me das maravilhas do Senhor, lembro-me das tuas maravilhas" (77,12). Até as maravilhas e maravilhas que o Senhor fez em nossas próprias vidas. É essencial lembrar o bem recebido: sem lembrar, tornamo-nos estranhos para nós mesmos, "transeuntes" da existência; sem memória, arrancamo-nos do solo que nos nutre e nos deixamos levar como folhas pelo vento. Por outro lado, lembrar é voltar aos laços mais fortes, sentir-se parte de uma história, respirar com um povo. A memória não é uma coisa privada, é o caminho que nos une a Deus e aos outros. É por isso que na Bíblia a memória do Senhor deve ser passada de geração em geração, deve ser contada de pai para filho, como uma bela passagem diz: «Quando, no futuro, seu filho lhe perguntar:“ O que essas instruções significam [...] que o Senhor, nosso Deus, ele te deu? ", você responderá a seu filho:" Nós éramos escravos [...] - toda a história da escravidão - e o Senhor operou sinais e maravilhas diante de nossos olhos "» (Deuteronômio 6,20-22). Você vai dar memória ao seu filho. Mas há um problema: se a cadeia de transmissão de memórias é interrompida? E então, como podemos lembrar o que ouvimos apenas sem ter experimentado? Deus sabe o quão difícil é, ele sabe o quão frágil é a nossa memória e, para nós, ele realizou uma coisa inédita: ele nos deixou um memorial . Ele não nos deixou palavras, porque é fácil esquecer o que você ouve. Ele não nos deixou apenas as Escrituras, porque é fácil esquecer o que lemos. Ele não nos deixou apenas sinais, porque também podemos esquecer o que vemos. Ele nos deu uma comida, e é difícil esquecer um sabor. Ele nos deixou um pão no qual ele é, vivo e verdadeiro, com todo o sabor do seu amor. Ao recebê-lo, podemos dizer: "Ele é o Senhor, ele se lembra de mim!". Portanto, Jesus nos perguntou: «Faça isso em memória de mim "( I Coríntios 11:24). Destino : a Eucaristia não é uma lembrança simples, é um fato : é a Páscoa do Senhor que vive para nós. Na missa, a morte e a ressurreição de Jesus estão diante de nós. Faça isso em minha memória: junte-se e como comunidade, como povo, como família, celebre a Eucaristia para lembrar de mim. Não podemos evitar, é o memorial de Deus, pois cura nossa memória ferida. Antes de tudo, cura nossa memória órfã. Vivemos em uma era de grande orfanato. Cura a memória órfã. Muitos têm lembranças marcadas pela falta de afeto e decepções abrasadoras, recebidas por aqueles que deveriam ter dado amor e, em vez disso, tornaram o coração órfão. Gostaríamos de voltar e mudar o passado, mas não podemos. No entanto, Deus pode curar essas feridas colocando um amor maior em sua memória: a dele. A Eucaristia nos traz o amor fiel do Pai, que cura nosso orfanato. Dá-nos o amor de Jesus, que transformou um sepulcro de ponto de chegada em ponto de partida e da mesma maneira pode derrubar nossas vidas. Isso nos dá o amor do Espírito Santo, que consola, porque ele nunca sai sozinho e cura feridas. Com a Eucaristia, o Senhor também cura nossa memória negativa, a negatividade que vem tantas vezes em nosso coração. O Senhor cura essa memória negativa, que sempre traz à tona as coisas erradas e nos deixa com a triste ideia de que não somos bons para nada, de que apenas cometemos erros, de que estamos "errados". Jesus vem nos dizer que não é assim. Ele fica feliz por ter intimidade conosco e, toda vez que o recebemos, ele nos lembra que somos preciosos: somos os convidados esperados em seu banquete, os clientes que ele deseja. E não apenas porque ele é generoso, mas porque ele está realmente apaixonado por nós: ele vê e ama o belo e o bem que somos. O Senhor sabe que o mal e os pecados não são nossa identidade; são doenças, infecções. E ele vem curá-los com a Eucaristia, que contém os anticorpos para a nossa memória doentia da negatividade. Com Jesus podemos nos imunizar da tristeza. Sempre teremos nossas quedas diante de nossos olhos, nossos esforços, os problemas em casa e no trabalho, nossos sonhos não realizados. Mas o peso deles não vai nos esmagar porque, mais profundamente, há Jesus que nos encoraja com seu amor. Aqui está a força da Eucaristia, que nos transforma em portadores de Deus : portadores de alegria, não de negatividade. Podemos ir à missa nos perguntar o que trazemos ao mundo? Nossa tristeza, nossa amargura ou a alegria do Senhor? Tomamos a Comunhão e depois continuamos reclamando, criticando e chorando sobre nós mesmos? Mas isso não melhora nada, enquanto a alegria do Senhor muda vidas. Finalmente, a Eucaristia cura nossa memória fechada. As feridas que mantemos por dentro não criam problemas apenas para nós, mas também para os outros. Eles nos deixam com medo e desconfiados: inicialmente fechados, a longo prazo, cínicos e indiferentes. Eles nos levam a reagir aos outros com desapego e arrogância, iludindo-nos de que dessa maneira podemos controlar as situações. Mas é um engano: apenas o amor cura o medo em sua raiz e o liberta dos fechamentos que aprisionam. O mesmo acontece com Jesus, vindo ao nosso encontro gentilmente, na fragilidade desarmante do Host; Jesus também quebra o pão para quebrar as conchas do nosso egoísmo; o mesmo acontece com Jesus, que se entrega para nos dizer que somente se abrindo podemos nos libertar dos bloqueios internos, da paralisia do coração. O Senhor, oferecendo-se a nós tão simples quanto o pão, também nos convida a não desperdiçar a vida perseguindo milhares de coisas inúteis que criam vícios e deixam o vazio interior. A Eucaristia extingue a fome de coisas e acende o desejo de servir. Isso nos eleva de nosso estilo de vida confortável e sedentário, e nos lembra que não somos apenas bocas para alimentar, mas também somos as mãos dele para alimentar os outros. Agora é urgente cuidar daqueles que têm fome de comida e dignidade, daqueles que não trabalham e lutam para seguir em frente. E faça isso de maneira concreta, como concreto é o Pão que Jesus nos dá. Você precisa de proximidade real, precisa de verdade cadeias de solidariedade. Na Eucaristia, Jesus se aproxima de nós: não deixamos apenas aqueles que estão perto de nós! Queridos irmãos e irmãs, continuemos a celebrar o Memorial que cura nossa memória - lembre-se: curando a memória, a memória é a memória do coração - este memorial é a Missa. É um tesouro colocar em primeiro lugar na Igreja e na vida. E, ao mesmo tempo, redescobrimos a adoração, que continua o trabalho da Missa em nós. É bom para nós, nos cura por dentro. Especialmente agora, realmente precisamos disso. www.vaticano.va. Abraço. Davi


terça-feira, 28 de julho de 2020

III. A MULHER NO ISLAM


Islamismo. www.ccib.org.br. III. A MULHER NO ISLAM. Por Sherif Abdel Azeem Mohammed. Há 5 anos atrás, li no Toronto Star, edição de 3.7.90, um artigo intitulado "O Islam não está sozinho nas doutrinas patriarcais", de Gwyne Dyer. O artigo descrevia as reações furiosas das participantes de uma conferência sobre mulheres e poder, realizada em Montreal, aos comentários da famosa feminista egípcia, doutora Nawal Saadawi.Suas declarações "politicamente incorretas", incluíam: "os elementos mais restritivos em relação às mulheres, podem ser encontrados, primeiro no Judaísmo, Velho Testamento, depois no Cristianismo e, finalmente, no Alcorão"; "todas as religiões são patriarcais porque elas provêm de sociedades patriarcais"; e "o véu das mulheres não é uma prática especificamente islâmica mas, sim, um herança cultural antiga, com analogia nas religiões irmãs". As participantes não puderam ficar sentadas, enquanto suas crenças estavam sendo igualadas ao Islam. Assim, a doutora Saadawi recebeu uma avalanche de críticas. "Os comentários da doutora Saadawi eram inaceitáveis. Suas respostas revelavam uma falta de compreensão acerca da fé das outras pessoas" , declarou Bernice Dubois, do Movimento Mundial de Mães. "Eu tenho que protestar", disse a participante Alice Shalvi, da televisão feminina de Israel, "não existe o conceito do véu no Judaísmo". O artigo atribuía esses furiosos protestos a uma forte tendência no Ocidente de culpar o Islam por práticas que são muito mais uma parte da própria herança cultural do Ocidente. "As feministas cristãs e judias não irão se sentar para discutir, em igualdade de condições, com as más muçulmanas", escreveu Gwyne Dyer. Não me surpreendeu que as participantes da conferência tivessem uma tal visão negativa do Islam, especialmente por envolver questões femininas. Acredita-se, no Ocidente, que o Islam é o símbolo da subordinação das mulheres por excelência. A fim de compreendermos como está enraizada tal crença, basta mencionar que o Ministro da Educação da França, a terra de Voltaire, recentemente ordenou a expulsão das escolas francesas, de todas as jovens muçulmanas que vestissem o Hijab! Na França é negado a uma jovem muçulmana, que usa um lenço, o direito à educação, enquanto que estudantes católicos podem usar uma cruz ou um estudante judeu pode usar o solidéu. A cena de policiais franceses, impedindo jovens muçulmanas com as cabeças cobertas de entrarem no colégio, é inesquecível. Este fato nos traz à memória outra cena igualmente triste, a do Governador George Wallace, do Alabama, em l962, em pé, defronte ao portão da escola, tentando bloquear a entrada de estudantes negros, a fim de impedir a desagregação das escolas do Alabama. A diferença entre as duas cenas é que os estudantes negros tiveram a simpatia de muitas pessoas nos EUA e no mundo inteiro. O presidente Kennedy enviou a Guarda Nacional Americana para forçar a entrada dos estudantes negros. As moças muçulmanas, por outro lado, não receberam a ajuda de ninguém. Sua causa parece ter muito pouca simpatia, tanto dentro da França como fora. A razão é a incompreensão e o medo de tudo que seja islâmico no mundo atual. O que mais me intrigou sobre a conferência de Montreal foi uma questão: As declarações feitas por Saadawi, ou qualquer de suas críticas, são verdadeiras? Em outras palavras, o Judaísmo, o Cristianismo e o Islam têm o mesmo conceito sobre as mulheres? São tais conceitos diferentes? O Judaísmo e o Cristianismo, na verdade, oferecem às mulheres um tratamento melhor do que o Islam? Qual é a verdade? Não é tarefa fácil pesquisar e encontrar respostas para estas questões difíceis. A primeira dificuldade é que a pessoa tem que ser honesta e objetiva ou, pelo menos, fazer o máximo para o ser. Isto é o que o Islam ensina. O Alcorão instruiu os muçulmanos a dizerem a verdade, mesmo que aqueles que estejam próximos a eles não gostem disso: "... e se falardes, sede justo, mesmo que se refira a um parente próximo" (6:152); "Ó aqueles que creram, erijam a justiça na partilha, como testemunhas de Alá, ainda que contra vós mesmos, ou seus pais ou seus parentes, ..." A outra grande dificuldade é o fôlego irresistível do assunto. Por essa razão, durante os últimos anos, passei muitas horas lendo a Bíblia, a Enciclopédia da Religião e a Enciclopédia Judaica, na busca de respostas. Também li muitos livros que discutem a posição das mulheres nas diferentes religiões, escritos por exegetas, apologistas e críticos. O material apresentado nos capítulos seguintes representa as descobertas importantes dessa humilde pesquisa. Eu não sou objetivo, absolutamente. Isto está além da minha limitada capacidade. Tudo que posso dizer é que tentei, através dessa pesquisa, me aproximar do ideal alcorâmico de "falar imparcialmente". Gostaria de enfatizar nesta introdução, que minha proposta para este estudo não é denegrir o Judaísmo ou o Cristianismo. Como muçulmanos, acreditamos nas origens divinas de ambos. Ninguém pode ser muçulmano sem acreditar em Moisés e Jesus como grandes profetas de Deus. Meu intento é somente afirmar o Islam e pagar um tributo para a última mensagem verdadeira de Deus para a raça humana. Também gostaria de enfatizar que me preocupei somente com a Doutrina, isto é, minha preocupação é, principalmente, a posição das mulheres nas três religiões, como aparece em suas fontes originais, e não como é praticada por seus milhões de seguidores no mundo hoje. Por causa disso, a maior parte das evidências citadas vêm do Alcorão, dos ditos do Profeta Mohammad, da Bíblia, do Talmud e dos ditos de alguns dos mais influentes padres da Igreja, cujos pontos de vista contribuíram imensamente para definir e desenhar o Cristianismo. Muitas pessoas confundem cultura com religião, e outras não sabem o que seus livros religiosos dizem, e outras ainda, sequer se preocupam com disso. 1. O ERRO DE EVA? As três religiões concordam com um fato básico: Tanto as mulheres como os homens foram criados por Deus, o Criador de todo o Universo. Contudo, a divergência começa logo após a criação do primeiro homem, Adão, e da primeira mulher, Eva. A concepção judaico-cristã da criação de Adão e Eva está narrada detalhadamente em (Gênesis, 2:4-3:24). Lá está dito que Deus proibiu o homem de comer do fruto da árvore proibida. O Senhor Deus deu ao homem uma ordem, dizendo: "Podes comer de todas as árvores do jardim. 17 Mas, da árvore do conhecimento do bem e do mal não deves comer, porque no dia em que o fizeres serás condenado a morrer". Também deu a mesma ordem à mulher. A serpente seduziu Eva para que o comesse. E a mulher respondeu à serpente: "Do fruto das árvores do jardim, Deus nos disse 'não comais dele nem sequer o toqueis, do contrário morrereis." A serpente replicou à mulher: "De modo algum morrereis 5 É que Deus sabe que no dia em que dele comerdes, vossos olhos se abrirão e sereis como deuses, conhecedores do bem e do mal". E Eva, por sua vez, seduziu Adão para comer com ela. (Gênesis 6) A mulher notou que era tentador comer da árvore, pois era atraente aos olhos e desejável para se alcançar inteligência. Colheu o fruto, comeu-o e deu também ao marido, que estava junto. E ele comeu. E quando Deus repreendeu Adão pelo que ele havia feito, ele colocou a culpa em Eva. (Gênesis 11) Disse-lhe Deus: "E quem te disse que estavas nu? Então, comeste da árvore, de cujo fruto te proibi?"12 E o homem disse: "A mulher que me destes por companheira, foi ela que me fez provar do fruto da árvore e eu o comi". Consequentemente, Deus disse a Eva Gênesis 16: "Multiplicarei os sofrimentos de tua gravidez. Em meio a dores darás à luz os filhos, a paixão arrastar-te-á para o marido e ele te dominará". Para Adão Ele disse (Gênesis 17) "Porque ouviste a voz da mulher e comeste da árvore, cujo fruto te proibi comer, amaldiçoada será a terra por tua causa. Com fadiga tirarás dela o alimento durante toda a vida. 18 Produzirá para ti espinhos e abrolhos e tu comerás das ervas do campo. 19 Comerás o pão com o suor do rosto, até voltares à terra, de onde foste tirado. Pois tu és pó e ao pó hás de voltar". O conceito islâmico da primeira criação é encontrado em muitas passagens do Alcorão, como por exemplo: "E dissemos ó! Adão, mora tu e tua zauj (mistura companheira) no Paraíso e comam dele prosperamente onde lhes aprouver, e não vos aproximeis desta árvore e então sereis dos injustos." (Alcorão 2:35). Então, Satanás sussurrou para eles, a fim de revelar a ambos o que lhes havia sido ocultado de SAUÉTIHIMÉ (suas ambas e outras igualmente presentes, invisíveis, não bons atributos) e, então, disse: "Não vos proibiu a ambos, Vosso Senhor, desta árvore senão de seres ambos convertidos em anjos ou de serem ambos dentre os imortais". E jurou-lhes que era um conselheiro sincero. Assim, a ambos, DALLÉHUMÉ (indicou a ambos em confiança, porém, com enganos, arrancando-os e enviando-os para baixo, no que intencionou). Quando ambos provaram da árvore, divisaram ambos suas SAUÉTIHIMÉ e começaram a cobrir-se com folhas do paraíso. E seu Senhor chamou a ambos: "Eu não vos havia proibido daquela árvore e dito a ambos que Satanás é vosso inimigo declarado?" Eles disseram: "Senhor Nosso. Nós injustiçamos a nós mesmos e se Tu não nos perdoares, Te apiedares de nós, certamente estaremos dentre os perdedores." (7:20:23). Um exame mais cuidadoso dos dois relatos sobre a Criação, revela algumas diferenças essenciais. O Alcorão, ao contrário da Bíblia, coloca a culpa igualmente em Adão e Eva pelo erro de ambos. Não há no Alcorão a mais leve sugestão de que Eva tentou Adão, ou mesmo que ela tenha comido do fruto antes dele. Eva, no Alcorão, não é insinuante, sedutora ou vencida. Além do mais, Eva não pode ser culpada pelas dores do parto. Deus, de acordo com o Alcorão, não pune ninguém pelas faltas do outro. Ambos, Adão e Eva, cometeram um pecado e então pediram a Deus o perdão, e Ele os perdoou. 2. O LEGADO DE EVA. A imagem de Eva na Bíblia, como uma mulher sedutora, teve um impacto extremamente negativo para as mulheres através da tradição judaico-cristã. Acreditava-se que todas as mulheres haviam herdado de sua mãe, a bíblica Eva, tanto a sua culpa como a sua astúcia. Consequentemente, as mulheres não eram dignas de confiança, eram moralmente inferiores e más. Menstruação, gravidez e parto eram considerados punições justas para uma culpa eterna do amaldiçoado sexo feminino. A fim de examinarmos como foi negativo o impacto da Eva bíblica sobre sua descendência feminina, temos que olhar para os escritos de alguns do mais importantes judeus e cristãos de todos os tempos. Comecemos pelo Velho Testamento, e olhemos para alguns excertos da chamada Literatura da Sabedoria, onde encontramos: "Eu acho a mulher um pouco pior do que a morte, porque ela é uma armadilha, cujo coração é um alçapão e cujas mãos são cadeias. O homem que agrada a Deus foge dela, mas ao pecador ela o aprisionará ... enquanto eu estava procurando, e não estava encontrando, achei um homem correto entre mil, mas não encontrei uma só mulher correta entre todas elas" (Eclesiastes 7:26-28). Em outra parte da literatura hebraica, que é encontrada na bíblia católica, nós lemos: "Nenhuma maldade está mais próxima do que a maldade de uma mulher" ... "O pecado começa com a mulher e, graças a ela, todos nós devemos morrer". (Eclesiastes 25:19,24). Os rabinos judeus listaram nove maldições infligidas às mulheres, como resultado da Queda: "Para a mulher Ele deu nove maldições e a morte: o peso do sangue da menstruação e o sangue da virgindade; o peso da gravidez; o peso do parto; o peso de educar crianças; sua cabeça é coberta como no luto; ela fura a orelha como uma escrava permanente, ou escrava que serve ao seu senhor; ela não deve ser tomada por testemunha; e depois de tudo -- a morte". (2) Nos dias atuais, judeus ortodoxos, em suas preces matinais diárias, recitam "Abençoado seja Deus, Rei do universo que não nos fez mulher". As mulheres, por outro lado, agradecem a Deus cada manhã por "me fazer de acordo com Tua vontade". (3) Outra oração encontrada em muitos livros de preces judeus: "Louvado seja Deus que não me criou gentio. Louvado seja Deus que não me criou mulher. Louvado seja Deus que não me criou ignorante". (4) A Eva bíblica desempenhou um papel mais importante no Cristianismo do que no Judaísmo. Seu pecado foi a base de toda a fé cristã, porque a concepção cristã da razão da missão de Jesus Cristo na terra provém da desobediência de Eva. Ela pecou e, então, seduziu Adão para segui-la em seu propósito. Consequentemente, Deus expulsou a ambos do céu para a terra, que foi amaldiçoada por causa deles. Eles herdaram seus pecados, os quais não foram perdoados por Deus e, por isso, todos os humanos nascem em pecado. A fim de purificar os seres humanos do "pecado original", Deus teve que sacrificar, na cruz, Jesus, que é considerado o filho de Deus. Em razão disso, Eva é culpada de seu próprio pecado, do pecado de seu marido, do pecado original de toda a humanidade e da morte do Filho de Deus. Em outras palavras, uma só mulher, agindo por conta própria, causou toda a queda da humanidade (5). O que dizer sobre suas filhas? Elas são pecadoras como Eva e devem ser tratadas como tal. Ouçam o tom severo de São Paulo no Novo Testamento: Uma mulher deve aprender em calma e total submissão. Eu não permito a uma mulher ensinar ou ter autoridade sobre um homem; ela deve ser calada. Porque Adão foi feito primeiro, e depois Eva. E Adão não foi o que perdeu, foi a mulher que perdeu e se tornou pecadora (I Timóteo 2:11-14). São Tertuliano foi mais brando que São Paulo, quando falava "às queridas irmãs" na fé. Ele dizia (6): "Vocês sabem que cada uma de vocês é uma Eva? A sentença de Deus sobre o sexo de vocês subsiste até agora: a culpa necessariamente subsiste também. Vocês são a porta de entrada para o Diabo: Vocês são a marca da árvore proibida: Vocês são as primeiras desertoras da divina lei: Vocês são aquelas que persuadiram o homem de que o diabo não precisava ser atacado. Vocês destruíram tão facilmente a imagem de Deus, o homem. Por causa de sua deserção, o Filho de Deus teve que morrer". Santo Agostinho foi fiel ao legado de seus antecessores. Ele escreveu a um amigo: "Qual é a diferença, seja uma esposa ou uma mãe, ainda assim é da Eva tentadora que devemos nos precaver em qualquer mulher. Eu não consigo ver qual o uso que uma mulher pode ter para um homem, exceto a função de dar à luz crianças". Séculos mais tarde, São Tomás de Aquino ainda considerava a mulher como um defeito: "Com relação à natureza individual, a mulher é defeituosa e mal feita, porque a força ativa na semente masculina tende para a produção de uma perfeita semelhança no sexo masculino; enquanto que a produção da mulher provém de um defeito na força ativa ou de alguma indisposição material, ou mesmo de algumas influências externas". Finalmente, o famoso reformador Martinho Lutero não conseguia ver qualquer benefício em uma mulher, a não ser trazer ao mundo tantas crianças quanto possível, apesar das conseqüências: "Se elas se cansarem ou mesmo morrerem, isto não é problema. Deixe-as morrer no parto, é para isso que estão aqui". Muitas vezes as mulheres foram denegridas por causa da imagem de Eva como a tentadora, graças ao relato em Gênesis. Para resumir, a concepção judaico-cristã sobre as mulheres foi envenenada pela crença na natureza pecaminosa de Eva e de sua descendência feminina. Se agora voltarmos nossa atenção para o que o Alcorão diz sobre as mulheres, logo perceberemos que a concepção islâmica sobre elas é radicalmente diferente daquela encontrada no conceito judaico-cristão. Deixemos que o Alcorão fale por si mesmo: "Quanto aos muçulmanos e muçulmanas, aos fiéis e às fiéis, aos devotados e às devotadas, aos verdadeiros e às verdadeiras, aos homens e mulheres que são perseverantes, aos homens e mulheres que são humildes, para os homens e mulheres que fazem a caridade, para os homens e mulheres que jejuam, aos homens e mulheres que guardam a castidade, e aos homens e mulheres que se comprometem em louvar Alá, para todos eles Alá preparou o perdão e uma grande recompensa" (33:35). "Os crentes, homens e mulheres, são protetores uns dos outros: usufruem do que é justo e proíbem o mal, observam as preces regulares, praticam a caridade regularmente e obedecem a Alá e Seu Mensageiro. Sobre eles Alá despejará Sua Misericórdia: porque Alá é Exaltado em poder e sabedoria" (9:71) "E seu Senhor respondeu a eles: Verdadeiramente, jamais perderei a obra de qualquer um de vós, seja homem ou mulher, porque procedeis uns do outros" (3:195) "Quem cometer uma iniquidade será pago na mesma moeda e aquele que praticar o bem, seja homem ou mulher, e é um crente, entrará no Jardim de felicidade" (40:40) "Quem praticar o bem, seja homem ou mulher, e for fiel, concederemos uma vida agradável e premiaremos com uma recompensa, de acordo com o melhor de suas ações" (16:97). Está claro que a visão do Alcorão a respeito da mulher não difere da do homem. Ambos são criaturas de Deus e têm como sublime meta adorar seu Senhor, fazer boas ações e evitar o mal e por isso serão avaliados harmoniosamente. O Alcorão jamais menciona que a mulher é a porta de entrada para o mal ou que ela é uma enganadora por excelência. O Alcorão também jamais menciona que o homem é a imagem de Deus. Homens e mulheres são suas criaturas e só. De acordo com o Alcorão, o papel da mulher na terra não está limitado somente ao parto. Dela se exige fazer boas ações, tanto quanto é exigido dos homens. O Alcorão nunca diz que jamais existiu uma mulher correta. Pelo contrário, o Alcorão instruiu a todos os crentes, homens e mulheres, a seguir o exemplo daquelas mulheres , tais como a Virgem Maria e a esposa do Faraó: "E Deus dá, como exemplo aos fiéis, o da esposa do Faraó, que disse: Ó Senhor meu, construí, junto a ti, uma morada no Paraíso e livra-me do Faraó e de suas ações, e salva-me dos iníquos! E com Maria, filha de Imram, que conservou seu pudor e a qual alentamos com o Nosso Espírito; e ela testemunhou a verdade das palavras de seu Senhor e de Suas revelações e era uma das devotas" (66:11/13). 3. FILHAS VERGONHOSAS? Realmente, a diferença entre a atitude bíblica e a alcorâmica, em relação ao sexo feminino, começa logo que a mulher nasce. Por exemplo, a Bíblia estabelece que o período do ritual materno da impureza é duas vezes mais longo no caso do nascimento de uma menina do que no de um menino (Levítico 12:2-5) . A Bíblia Católica estabelece explicitamente que: "O nascimento de uma filha é uma prejuízo" (Eclesiastes 22:3). Em contraste com essa absurda declaração, os meninos recebem especial louvor: "Um homem que educa seu filho será invejado por seu inimigo" (Eclesiastes 30:3). Os rabinos judeus tornaram uma obrigação para os homens produzirem uma descendência, a fim de propagar a raça. Ao mesmo tempo, eles não escondiam sua preferência por meninos: "É bom para aqueles cujas crianças são meninos, mas é mau para aqueles cujas crianças são meninas", " no nascimento de um menino tudo é alegria ... no nascimento de uma menina tudo é tristeza", e "Quando um menino chega ao mundo, a paz chega ao mundo ... Quando uma menina chega ao mundo, nada chega". (7) Uma filha é considerada um peso doloroso, uma fonte potencial de vergonha para seu pai: "Sua filha é teimosa? Mantenha um olhar firme para que ela não faça de você um motivo de gargalhada para seus inimigos, de falatório na cidade, objeto de fofocas e coloque você em situação de vergonha pública" (Eclesiastes 42:11). Mantenha uma filha teimosa sob firme controle ou ela abusará de qualquer indulgência que receba. Mantenha vigilância sobre seu olho sem-vergonha, não se surpreenda se ela o desgraçar" (Eclesiastes 26:10-11). Foi esta mesma idéia de tratar as filhas como fonte de vergonha, que levou os árabes pagãos , antes do advento do Islam, a praticar o infanticídio feminino. O Alcorão condena vigorosamente esta prática hedionda: "Quando a algum deles é anunciado o nascimento de uma filha o seu semblante se entristece e fica angustiado. Oculta-se do seu povo, pela má notícia que lhe foi anunciada: deixá-la-á viver, envergonhado, ou a enterrará viva? Que péssimo é o que julgam." (16:58/59). Deve ser dito que, este crime sinistro, jamais teria parado na Arábia, não fora a força dos termos que o Alcorão usou para condenar tal prática (l6:59, 43:17, 8l:8/9). Além disso, o Alcorão não faz distinção entre meninos e meninas. Em contraste com a Bíblia, o Alcorão considera o nascimento de uma mulher como um presente e uma bênção de Deus, da mesma forma que o nascimento de um menino. O Alcorão sempre menciona o presente do nascimento feminino primeiro: "A Alá pertence o domínio dos céus e da terra. Ele cria o que lhe apraz. Concede filhas a quem quer e filhos a quem lhe apraz" (42:49). A fim de apagar qualquer traço do infanticídio feminino na nascente sociedade muçulmana, o Profeta Mohammad prometeu àqueles que fossem abençoados com filhas uma grande recompensa, se eles as tratassem gentilmente: "Aquele que se ocupa da educação das filhas e as trata benevolentemente, estará protegido contra o Inferno" (Bukhari e Muslim). "Aquele que mantém duas meninas, até que elas atinjam a maturidade, ele e eu chegaremos no dia da ressurreição desse modo: e ele juntou seus dedos" (Muslim). www.ccib.org.br. Abraço. Davi.


segunda-feira, 27 de julho de 2020

RELACIONAMENTO DO SIGNO DE VIRGEM COM OUTROS SIGNOS


Astrologia. Zodíaco. www.universa.uol.com.br. Sinastria (1) dos Signos. RELACIONAMENTO DO SIGNO DE VIRGEM (23 de agosto a 22 de setembro) COM OUTROS SIGNOS.

VIRGEM E ÁRIES. Apesar de terem personalidades contrastantes, esses dois signos têm possibilidade de se complementar. Virgem valoriza a praticidade, a utilidade, a segurança material e profissional. Áries aprecia novas iniciativas e fortes emoções. É destemido e confiante. Virgem costuma ser conservador, comprometido, crítico, atento aos detalhes – busca qualidade em todos os níveis. Áries é impulsivo, enérgico e individualista e não gosta de se sentir preso ou entediado. No entanto, se ambos superarem essas diferenças, a parceria poderá ser duradoura. Numa relação profissional, virgem proporciona o raciocínio lógico e o trabalho metódico. Áries contribui com seu instinto para decisões e competitividade. O grande desafio é equilibrar a impulsividade ariana com a capacidade analítica e crítica virginiana. Sexualmente, é importante que busquem se conhecer melhor para que haja compreensão e intimidade. Virgem gosta de se sentir intelectualmente estimulado; Áries prefere agir de forma impetuosa e apaixonada. VIRGEM E TOURO. Esses dois signos possuem o elemento Terra em comum: gostam de cultivar a praticidade, de construir, realizar e manter os pés no chão. Os dois são trabalhadores, tradicionais, caseiros e racionais. Precisam se sentir seguros para gozar de uma rotina organizada, como também pensar no futuro para garantir uma boa velhice. Na questão sexual, a conexão entre eles tende a ganhar sintonia com o tempo e ir melhorando. Mas há algumas diferenças. Touro é mais tranquilo, paciente, carinhoso e romântico. Virgem é mais exigente, expressivo, inteligente e metódico. O virginiano deve tomar cuidado com o excesso de críticas, pois em algum momento o pacato taurino irá perder a paciência e explodir. De qualquer forma, eles têm pontos de vista semelhantes em relação aos assuntos econômicos. Tanto Virgem quanto Touro buscam a segurança material. Com lealdade e firmeza, essa combinação tem potencial para alcançar todas as metas a que se propuserem, caso eles tirem proveito das qualidades e dos pontos fortes um do outro. VIRGEM E GÊMEOS. Apesar de terem o planeta regente (Mercúrio) com algumas qualidades em comum, são dois signos muito diversos, o que pode significar uma união enriquecedora se ambos souberem se respeitar e fazer concessões. Na relação sexual, caso estejam dispostos, a sintonia será aprimorada ao longo do tempo. São signos inteligentes e que têm facilidade para passar horas conversando sobre projetos, experiências, ideias. Mas, no início, é possível que haja desentendimentos. É importante que exista diálogo, estímulo intelectual e sinceridade entre eles. Para que a parceria se torne longa e sólida, Gêmeos deve compreender a necessidade virginiana de qualidade, detalhamento e perfeição. Ao mesmo tempo, Virgem deve aprender com o geminiano a rir e a se divertir mais, não se cobrar tanto nem levar a vida tão a sério. Quando conseguirem apreciar as respectivas qualidades, poderão até se casar: Gêmeos admirando a praticidade e a objetividade de Virgem; e Virgem sentindo-se rejuvenescido pela vivacidade e leveza do geminiano. VIRGEM E CÂNCER. É possível que a atração e o amor entre esses signos apareçam aos poucos, a partir de uma amizade, por exemplo. Depois de certo tempo, é provável que percebam como se completam, já que as qualidades de um cobrem as carências do outro. Câncer é acolhedor, emotivo, ligado ao lar e à família. Virgem é prático, detalhista, racional e dedicado. O carinho, o cuidado, a simplicidade e o estilo atencioso de Câncer fará com que o virginiano se sinta mais tranquilo e relaxado. Já o canceriano vai admirar a inteligência, a honestidade e a objetividade de Virgem. A sensibilidade de Câncer contribui para adoçar a vida prática e organizada de Virgem. Ao mesmo tempo, a boa capacidade de discernimento e o olhar detalhista do virginiano tendem a colocar ordem no caótico mundo dos cancerianos. Ambos têm interesses em comum: valorizam a segurança, a economia, a simplicidade e a fertilidade, além de serem mais tímidos e retraídos. Com diálogo e fidelidade, podem ter uma relação duradoura e uma família numerosa, se assim o quiserem. VIRGEM E LEÃO. Com naturezas muito diferentes, contraditoriamente podem se complementar, principalmente na questão profissional. A praticidade, o foco no detalhe e as habilidades estratégicas de Virgem servirão de grande suporte para os projetos criativos e ambiciosos de Leão. Numa união amorosa, se houver comprometimento e respeito por suas divergências, eles conseguirão ficar juntos. Essa tendência será fortalecida se tiverem outros aspectos favoráveis em seus mapas astrológicos. O desafio é que encontrem um equilíbrio entre o lado exuberante, exibicionista, divertido e extrovertido de Leão, com a natureza tímida, objetiva, retraída, racional e observadora de Virgem. A perspectiva é que Leão dê as ordens e Virgem as execute. É importante que o leonino abaixe a guarda do orgulho, da vaidade e da arrogância para reconhecer seus limites, suas falhas e aceitar as sugestões do virginiano, que provavelmente serão realistas e objetivas. Por sua vez, Virgem absorverá o bom humor e a confiança de Leão, adoçando suas palavras com amor para que suas críticas sejam ouvidas. VIRGEM E VIRGEM. Este casal pode descobrir muito interesses em comum: são práticos, inteligentes, observadores, dedicados e trabalhadores. Sexualmente têm chances de se entender. A desvantagem é que os dois também podem revelar os mesmos defeitos: são críticos, detalhistas, perfeccionistas e exigentes. É fundamental que façam concessões e sejam mais tolerantes com seu parceiro. Se houver amor e se as exigências forem superadas, conseguirão manter uma relação fiel e duradoura. A parceria profissional também tem muitas possibilidades, pois os virginianos gostam de se sentir úteis, de aprimorar técnicas e desenvolver sua habilidade. O risco é o de ficarem presos na rotina, portanto, devem programar juntos atividades de lazer. Ambos são cuidadosos com as finanças. A união será baseada na honestidade e na prudência, sem grandes arrebatamentos emocionais. É provável que a relação não seja muito romântica, pois os virginianos são mais objetivos e têm certa dificuldade de expressar os sentimentos. Sua forma de demonstrar carinho é através de pequenos gestos e atitudes concretas. VIRGEM E LIBRA. Embora tenham afinidades complementares, são signos com naturezas divergentes. Libra é regido por Vênus: cordial, sociável, diplomático, romântico e sedutor. Virgem é regido por Mercúrio: racional, prático, tímido, crítico e exigente. Mas ambos são prudentes, lógicos, inteligentes e ponderados. É possível que o amor surja depois de uma amizade, já que nenhum dos dois traz tendência para atos impulsivos. No que diz respeito à vida sexual, haverá cumplicidade. O libriano é conciliador e gosta de cultivar suas habilidades sociais. Tem apurado senso estético, busca a harmonia e o equilíbrio e está sempre sugerindo novas ideias. O virginiano aprecia essas qualidades e se encantará com a leveza, o otimismo, a alegria e as longas conversas com o ponderado libriano. Ao mesmo tempo, Libra pode ouvir as críticas, sugestões e análises do observador virginiano e levá-las em consideração. Assim, a vida em comum se tornará harmoniosa. Mas têm de encontrar o equilíbrio estre os deveres e as responsabilidades do lar e a vida social. Caso contrário, pode haver discussões. VIRGEM E ESCORPIÃO. Aqui temos o encontro de perfis exigentes, com fortes personalidades e com naturezas muito distintas. Há poucas chances para um relacionamento duradouro, a não ser que haja outros pontos favoráveis nos mapas astrológicos dos dois. Virgem é prático, metódico, racional e independente. Escorpião é emocional, intenso, profundo e apaixonado. Embora as diferenças incomodem no princípio, é provável que sejam compreendidas e superadas. Sexualmente, os dois precisam se sentir seguros para que possam se abrir. O ciúme de Escorpião e as críticas de Virgem podem desgastar o relacionamento. Os escorpianos são mais corajosos e intuitivos do que o prudente virginiano. Para que relação avance, o grande desafio é conquistarem o respeito mútuo e controlarem sua tendência de exigir demais. Esta é uma boa combinação para projetos profissionais, parcerias de negócios e investimentos. Escorpião contribui com sua força e sua capacidade investigativa, e Virgem colabora com seu método, suas técnicas e sua organização. VIRGEM E SAGITÁRIO. A princípio, é possível que Sagitário admire a inteligência, a capacidade de discernimento e o senso crítico de Virgem. Por sua vez, Virgem se interessará pelos conhecimentos e pelo senso de justiça de Sagitário. Mas depois as diferenças tendem a prevalecer. Sagitário busca liberdade, aventuras e conquistas. Virgem procura estabilidade, praticidade e segurança. Sagitário é corajoso, otimista, entusiasmado e bem-humorado. Virgem é prudente, cauteloso, racional, sério e reservado. No quesito sexual, há diferenças de estilo. Virgem é mais tímido e retraído, enquanto Sagitário gosta de experimentar. Ambos cultivam estímulo intelectual, parceria nos estudos, gostam de dialogar e programar atividades culturais. Virgem traz mais organização e incentivos para os talentos e as ambições de Sagitário, que pode trabalhar um pouco mais, cultivando mais objetividade. Sagitário se sentirá, com certeza, mais confortável e seguro, graças à estabilidade proporcionada por Virgem. Ao mesmo tempo, o nativo de Virgem pode se inspirar com o espírito corajoso, confiante e entusiasmado de Sagitário. VIRGEM E CAPRICÓRNIO. Essa pode ser uma combinação muito produtiva para os projetos profissionais, os negócios e os investimentos, já que se trata de dois signos de Terra, muito práticos, objetivos, trabalhadores, sérios e compenetrados. Mas a relação afetiva e sexual pode deixar a desejar, a não ser que a dupla conte com outros aspectos favoráveis em seus mapas astrológicos. A união tende a ficar enfadonha e monótona. Além disso, ambos são críticos e exigentes. Porém, é possível que haja uma certa compatibilidade, porque seus desejos são semelhantes, já que não são signos impulsivos, gostam de aprimorar a sintonia aos poucos. É o tipo de união que pode ficar cada vez mais afinada. Virgem estimula o diálogo, o desenvolvimento intelectual os estudos e planejamentos de Capricórnio. Já Capricórnio traz mais estrutura, estratégia, perseverança e determinação para Virgem. Capricórnio costuma ser mais ambicioso, traça metas, planeja cada passo para chegar ao sucesso. Neste sentido, Virgem tende a ser o parceiro ideal, pois é dedicado, trabalhador, mais simples e não cultiva inveja. VIRGEM E AQUÁRIO. Um relacionamento entre dois signos com naturezas tão adversas pode ser dificultoso. Virgem é um signo de Terra: conservador, prático, crítico e perfeccionista. Aquário é um signo de Ar: contestador, excêntrico, ousado e questionador. Na parte sexual, ambos têm preferências distintas. Aquário costuma ser mais curioso e aberto para novas experiências. Virgem é mais tímido, mas na medida em que ganha confiança e intimidade, acaba se soltando. Enquanto o virginiano é metódico, o aquariano é avesso às regras: Virgem coloca ordem no caos, Aquário coloca o caos na ordem. É preciso que se conheçam bem, respeitem e aceitem suas diferenças. Para que esta combinação tenha sucesso, cada um, com sua inteligência, deve aprender a aproveitar os pontos fortes do parceiro. Virgem tentando ser um pouco menos prudente e mais ousado, para se adaptar à versatilidade de Aquário. Por sua vez, Aquário aprendendo com Virgem a ser mais atento, responsável e dedicado. Se investirem nisso, há chances de surgir uma relação duradoura. VIRGEM E PEIXES. Esta é uma combinação de dois signos opostos e complementares. Justamente por isso, podem se integrar: Peixes trazendo mais romance, fantasia e imaginação para o mundo burocrático e metódico de Virgem, que pode levar um pouco de praticidade, ordem e segurança para o sonhador Peixes. Sexualmente, há chance de haver química e atração. Ambos se entenderão, desde que Virgem deixe um pouco de lado seu conservadorismo e abra seu coração para Peixes, que costuma ser sensível, carinhoso e sedutor. Por causa das diferenças, há alguns riscos: Peixes pode se incomodar com a frieza, a rigidez, o perfeccionismo de Virgem; Virgem tende a ficar desconcertado com a falta de senso prático, o sentimentalismo, a distração e as loucuras de Peixes. Virgem deve aprender com Peixes que um pouco de desordem, de fé e de entrega faz bem à alma. Já o pisciano encontrará no virginiano um ótimo apoio para que possa estruturar seus projetos e transformar seus sonhos em realidade. Com suas qualidades combinadas, o casal pode formar um lar acolhedor e ao mesmo tempo organizado e criativo.


Referência: (1). Sinastria – é uma técnica utilizada na astrologia para verificar o grau de compatibilidade numa relação (afetiva, profissional ou familiar) entre duas pessoas. Esse procedimento faz uso do MAPA ASTRAL, recorrendo aos perfis astrológicos de um indivíduo e seu parceiro. Requer encontrar um profissional, caso deseje realizar o método do mapa, recomendado e capacitado na ciência astrológica. Deve ter registro profissional na instituição ou sindicato que regula a prática em sua região ou estado. Abraço.


domingo, 26 de julho de 2020

NASCIMENTO I


Espiritualidade. Texto de Sri Prem Baba (1951-  ). Capítulo. I. NASCIMENTO I. NASCE UM POTENCIAL. Neste plano físico, para fazermos uma viagem, precisamos de um meio de transporte. No que diz respeito ao trânsito da alma rumo à consciência divina, precisamos passar pela consciência humana. E para vivermos essa experiência aqui na Terra, usufruindo de uma personalidade humana, se faz necessário um veículo, pois o espírito não teria como viver tal experiência sem uma estrutura psíquica projetada para desenvolver um ego. Ego e corpo formam um veículo, um instrumento projetado para que o espírito possa viver essa experiência material. PRINCÍPIO DA IDEIA DE EU. A alma é a porção individual do espírito que se manifesta através desse veículo. Ela é a ponte entre os planos material e espiritual. A alma acompanha o Ser em toda a sua jornada evolutiva, por meio dos ciclos de mortes e renascimentos, e deixa de existir quando a consciência individual se expande e se funde na consciência cósmica. Essa é a forma que a consciência encontra para se expandir através do ser humano no plano material. Assim como uma planta nasce e cresce a partir de uma semente, a consciência cósmica se manifesta e se expande através de uma consciência individual. Nesse sentido, o ego é como uma semente que é plantada na Terra com o objetivo de se desenvolver, amadurecer e gerar frutos. Essa semente traz consigo um potencial divino que irá se expressar de maneira particular por meio de cada um de nós. Existem muitas definições para a palavra ego. Aqui me refiro a ela como o princípio da individualização, ou ainda como o princípio da ideia de eu. Apesar de ter uma função muito importante no projeto divino de expansão da consciência (cuja meta, em última instância, é restabelecer o estado de Unidade), o ego também representa o nascimento de um senso de separação, ou seja, é o princípio da ideia de que somos separados uns dos outros. Por termos um corpo, uma forma, a mente cria essa ilusão de separação. De fato, no nível físico, que é o nível das aparências, nós estamos separados, mas no nível do espírito somos apenas um. Entretanto, essa ilusão faz parte do jogo divino aqui na Terra e está a serviço da expansão da consciência. Ela é o que, na cosmovisão hindu, é chamado de mahamaya, a grande ilusão. Ao mesmo tempo em que encobre nossa visão com o véu da dualidade, mahamaya é também a nossa grande professora. Através dela, aprendemos aquilo que precisamos aprender e aos poucos vamos começando a enxergar além dela. Mahamaya é uma distorção da realidade que pode tomar muitas formas, entre elas o egoísmo – a doença do ego. SEMENTES DE AMOR. Quando nos permitirmos contemplar e nos deixar envolver pela beleza da vida, observando os fenômenos da natureza, percebemos que tudo é fantástico e que, certamente, a vida vai muito além dessa realidade cotidiana que captamos através dos nossos olhos físicos. Você já se perguntou como é possível frutos e flores dos mais diversos tamanhos, cores, fragrâncias e sabores simplesmente brotarem de árvores? Isso é fantástico. Mesmo sabendo como a natureza funciona, se puder observar esses fenômenos com mais profundidade imediatamente você perceberá quão extraordinária ela é. A semente é um exemplo disso. De um pequeno grão nasce uma majestosa árvore. A semente contém em si uma porção mínima, um quantum de uma essência que é impressa em um código genético. Nesse código, estão as informações sobre o seu potencial máximo, que é também aquilo que ela vai realizar quando for plantada na Terra. E o seu potencial máximo são os frutos que ela vai dar. Da mesma maneira, nós, seres humanos, trazemos uma porção da consciência divina que deseja se expandir e se expressar através de nós. Também trazemos um código, um programa, algo a ser realizado. Esse programa é o propósito da alma. Nós viemos para este mundo justamente para realizar esse propósito, que também costumo chamar de visão – uma visão a ser compartilhada com o mundo. O propósito se manifesta de forma muito particular em cada um de nós. Cada alma individual chega aqui com um programa específico a ser realizado, e esse programa ou propósito individual está alinhado com o propósito maior da vida. Estou me referindo ao que, na sabedoria milenar do Yoga, é conhecido como dharma – a lei Universal que rega a vida e une todos os seres em torno do mesmo propósito. Em última instância, o dharma, ou propósito maior da humanidade, é a expansão da consciência, mas costumo dizer que é o despertar do amor, pois a consciência se expande através dele. Saber qual é o propósito é saber o que viemos fazer aqui. E o que viemos fazer aqui está intimamente relacionado àquilo que somos em essência, ou seja, o programa individual da alma está relacionado à consciência do Ser. Assim como a laranjeira só pode das laranjas, o ser humano só pode dar um tipo de fruto: o amor, pois o amor é a sua essência. Entretanto, o amor é um fruto que pode se manifestar de infinitas formas. Cada alma traz consigo dons e talentos que são a maneira única por meio da qual o amor se expressa através de nós. DESAFIOS DE CRESCIMENTO. Ao mesmo tempo em que cada alma traz consigo dons e talentos, que são suas virtudes e potencialidades a serem desenvolvidas, ela traz também desafios que servirão para o seu crescimento. Certos desafios são parte do próprio programa da alma e encontram-se impressos no DNA, como as doenças genéticas e determinadas limitações físicas. Outros serão gerados a partir das escolhas que a alma fizer no decorrer da encarnação. Mas, independentemente de sua natureza, os desafios são instrumentos de aprendizado. Também comparo esses desafios ou obstáculos a lugares de parada na jornada da alma em evolução. A viagem é longa e muitas vezes nos sentimos cansados. Às vezes parar para abastecer e nos alimentar, às vezes para cumprir acordos em lugares específicos. Mas toda parada serve para, de alguma maneira, nos recuperarmos e absorvermos aprendizados. As pausas servem para revermos o mapa da vida e nos situarmos na jornada. Nesses momentos, também podemos rever os lugares por onde andamos e os buracos pelos quais passamos, a fim de evitar novas quedas. Mas paramos, principalmente, para resgatar partes nossas que ficaram presas no passado e para absorver determinadas lições. E, dessa forma, vamos nos fortalecendo para seguir rumo ao destino final. Esses lugares de parada, onde a alma estaciona temporariamente para absorver determinados aprendizados e se libertar da cadeia de reações geradas pelas ações equivocadas do passado, são o que chamamos de Karma. Essa palavra em sânscrito significa literalmente “ação”, mas se refere a uma lei cósmica – a lei de causa e efeito (ação e reação), que determina que todo efeito tem uma causa: tudo que se manifesta agora em nossas vidas é um produto das nossas ações do passado. Para toda ação, existe uma reação. Assim, o Karma envolve não somente a ação, mas também a reação inerente a ela. Uma via do Yoga, chamada de Karma Yoga (o yoga da ação), fala sobre a prática da “não ação”, que é uma ação que não gera reação – uma causa sem efeito. Entretanto, para uma ação não gerar reação, ela precisa ser desprovida de interesses egoístas. Esse é o fundamento básico do Karma Yoga (yoga da ação), cujo principal instrumento é a ação ou o serviço desinteressado. Muito se fala em Yoga hoje em dia, mas pouco se sabe de verdade sobre ele. Yoga não é simplesmente um sistema de posturas físicas e meditação. Yoga é um grande conjunto de técnicas e ferramentas capazes de atuar em todos os níveis do nosso sistema (físico, mental, psicoemocional, energético e espiritual) que tem a função de nos ajudar a reconectar com a realidade maior, com a nossa essência, ou ainda com a nossa verdadeira identidade. Por isso Yoga é um caminho de auto realização ou de libertação. Ao reconhecermos nossa verdadeira identidade, nos tornamos livres para ser quem somos. Karma Yoga é o caminho da liberdade através da ação, é a via do Yoga que conduz à auto realização por meio do serviço desinteressado. A ação desinteressada nos liberta, pois ela possibilita que deixemos de produzir reações e, consequentemente, que nos libertemos da teia do Karma. Mas isso é possível somente quando Karma (ação) e dharma (propósito) estão alinhados, o que significa que nossas ações correspondem ao que de fato viemos fazer aqui. Quanto mais alinhadas estiverem com o propósito maior, menos efeitos nossas ações causarão e mais consciência elas trarão ao Planeta, pois o propósito da alma individual está diretamente ligado ao dharma e ao Karma coletivo. INFLUÊNCIAS EXTERNAS. Vimos que existe um propósito interno (da alma), um programa que nasce com a pessoa. Mas também existe um outro propósito, que é externo – um programa que é formado no decorrer da vida, juntamente com o desenvolvimento do ego e através do contato com a sociedade. Esse programa que é elaborado com base em influências externas é o que chamarei aqui de “programa do ego”. O programa do ego, além de depender de fatores externos, também vai depender do Karma, pois é ele que determina as condições nas quais a criança chega neste plano. Dependendo das condições sociais, do nível de conhecimento do desenvolvimento espiritual da família, a criança poderá aprender determinadas lições, desenvolver determinadas habilidades e consolidar valores e virtudes da alma.  Ao mesmo tempo, ela poderá sofrer traumas e criar imagens (cenários psicológicos fixos ou congelados) e crenças limitantes que farão parte dessa programação. O propósito do ego, o propósito externo, é como a casca de uma fruta, é uma camada superficial que encobre o verdadeiro programa da alma. A casca, no entanto, também tem uma função. Ela serve como uma proteção para que o ego possa se desenvolver e construir o que for necessário para a sua experiência. Mas chega um momento em que essa camada externa precisa ser retirada para que o verdadeiro propósito possa se manifestar plenamente. Da mesma forma que precisamos retirar a casca da fruta para saboreá-la, esse programa externo precisa ser removido para que o programa interno se revele. A entidade humana chega a este plano livre, amando e confiando. Ao nascer, a criança ainda tem uma lembrança de quem ela é e do que veio fazer aqui. Mas com o passar do tempo, através do contato com o mundo, ela vai cedendo a influências externas, adquirindo crenças e reprimindo sua expressão natural. Como sabemos, a fundação da personalidade acontece depois, nos próximos sete anos, mas a fundação é feita nos sete primeiros anos. E as crenças instaladas nesse período irão permear toda a vida da pessoa. Então logo cedo a criança começa a sentir-se carente e insegura: ela começa a sentir ciúme, raiva e inveja (...). E isso não acontece por acaso. Ela aprende isso com aqueles que estão ao seu redor, prioritariamente com os pais, mas também com os educadores e demais familiares próximos. Essas pessoas participam do processo de desenvolvimento da personalidade daquela alma. E, por ignorância, acabam transferindo para a criança as suas misérias e carências. Com isso é estabelecido um círculo vicioso no qual ignorância procria ignorância. Quando a criança começa a frequentar a escola e inicia uma vida social, ela recebe novos inputs, entrada (além dos que chegam através dos pais e familiares) sobre aquilo que, supostamente, é certo ou errado; sobre aquilo que ela deveria ser e fazer na vida (o que em geral não é o que ela gostaria de ser e fazer). Novos limites e regras são impostos, novas ideias (preconceitos, opiniões, crenças) são transmitidas. É verdade que, para o seu próprio bem, o jovem precisa de limites e regras, mas ninguém ensina que determinadas regras precisarão ser abandonadas, pois elas devem estar a serviço do desenvolvimento da consciência, e não o contrário. Todo ser humano traz consigo uma visão em prol do desenvolvimento sustentável do Planeta. Ele traz uma sabedoria, um poder. Mas, normalmente, devido a essas influências externas, sua visão vai sendo esquecida, e seu poder vai sendo contido. E na medida em que seu poder é contido, isso se volta contra ele. Forças contrárias ao seu propósito são criadas. O programa da alma impele a pessoa a se mover numa direção, mas a mente condicionada por fatores externos faz com que ela siga em outra. Essa contradição gera sofrimento. ESQUECIMENTO DA VISÃO. Podemos, de forma sintética, dizer que estamos aqui para realizar um trânsito do estado de esquecimento para o estado de lembrança – lembrança de quem somos e do que viemos fazer aqui, pois, como já vimos, ao chegarmos nesta Terra, somos envoltos por um véu de ilusão que atua através do esquecimento. Normalmente, até o início da juventude, uma pessoa ainda tem a visão clara daquilo que veio fazer: carrega um forte anseio, traz consigo sonhos que são expressões do seu propósito, mas aos poucos vai se esquecendo e acreditando nas vozes externas que insistem em dizer que esse sonho é impossível de ser realizado, que esse caminho não é bom, ou, ainda que a pessoa não tem capacidade para isso. Aos poucos, ela vai cedendo a essas vozes até que desiste e se esquece completamente dos seus sonhos e passa a sonhar o sonho dos outros. Se já teve a oportunidade de acompanhar o crescimento de uma criança, você sabe que ela nasce confiando e amando com toda a sua pureza. A criança que ainda não foi corrompida e contaminada pelas crenças e misérias dos adultos à sua volta simplesmente segura na mão do pai e da mãe e vai com eles, sem saber par onde a estão levando. Contudo, aos poucos, ela deixa de confiar. Começa a ser atingida pelo medo na forma da desconfiança e da insegurança, e pelo ódio na forma da raiva e da vingança. Mas por que isso acontece? Porque ensinam isso para ela. Desde cedo, a criança aprende que é uma vítima das circunstâncias externas e com isso também aprende que precisa se defender. Aos poucos, vai criando os mais variados mecanismos de defesa e adquirindo crenças e condicionamentos limitantes. Tais mecanismos são limitantes, porque, ao mesmo tempo em que servem para proteção, geram separação e esquecimento. Os muros que você constrói ao seu redor para se proteger são os mesmos que o mantêm isolado no mundo. Esse conjunto de mecanismos de proteção e esquecimento constitui o que costumo chamar de “natureza inferior” ou “eu inferior” ou ainda “maldade”. Isso que conhecemos como maldade nada mais é do que um conjunto de mecanismos de defesa que o humano desenvolve desde cedo na vida para se proteger da dor dos choques de humilhação, rejeição e exclusão. Ao falar de maldade, não estou me referindo ao comportamento exclusivo dos criminosos e corruptos, pois todos nós sofremos choques dessa natureza. Portanto, todos nós carregamos um tanto de maldade. E quanto mais maldade uma pessoa manifesta, mais dor ela carrega no seu sistema. Livro: Propósito – A Coragem de Ser Quem Somos. Abraço. Davi.

sexta-feira, 24 de julho de 2020

O SACRIFÍCIO DE ABRAÃO


Islamismo. www.ligaislamica.org.br. Texto de Sheikeh Mohamad Al Bukaí. O SACRIFÍCIO DE ABRAÃO. Irmãos e irmãs na fé, espero que a cada ano que se passa todos estejam em paz e peço a Allah para que os abençoe e que essas bênçãos alcancem a nossa nação islâmica, nos agraciando com a vitória, a dignidade e a ascensão em todos os aspectos da vida. Esta data nos leva a essa celebração e uma das mais belas da história da humanidade e que nos ensina uma profunda lição, especialmente para os crentes e para os que buscam o bem para a sua comunidade. Fazemos menção a essa história ano após ano, neste mesmo dia, de forma incansável. A data de hoje foi instituída com o nome de "festejos ou celebração do sacrifício" simbolizando o próprio ato de sacrifício e a total submissão e entrega a um propósito, nos remetendo à história de uma família muçulmana que entregou o seu destino incondicionalmente e diretamente nas mãos de Deus. As palavras de ordem que levaram essa família a essa submissão foram: 1 – Deus é o procurador de todos. 2 – a aceitação do destino que Deus reserva para cada um. 3 – ter a paciência necessária para suportar o martírio sem questionar os propósitos de Deus. Os fatos referentes a essa história começaram com o profeta de Deus, Ibrahim al Khalil – que quer dizer “Abraão, o companheiro de Deus – que a paz esteja com ele. Deus o escolheu para ser o Iman de toda a humanidade, vem outras palavras, o nosso condutor para a senda reta. Disse o Altíssimo: “Designar-te-ei Iman dos homens”. (Alcorão, 2:124). Logo no início de sua juventude, Abraão destruiu as estátuas que eram idolatradas no lugar de Deus, o Único. Por esta atitude, os líderes da comunidade o julgaram e o condenaram a morrer queimado na fogueira; começa aqui o primeiro sacrifício de Abraão, que arriscou sua própria vida para defender sua religião e sua crença. Deus o salvou desta calamidade ordenando para que a fogueira o tocasse dando-lhe a sensação de frescor e paz. Muito tempo depois, ao atingir a velhice, Deus lhe proporcionou a dádiva de uma esposa que logo gerou seu primeiro filho. Logo em seguida, Abraão recebeu a ordem de Deus para deixar a sua esposa Hejar (Hagar) e seu único filho na época, ainda lactante, em um local inóspito e desértico da nobre cidade de Meca. Abraão cumpriu a ordem sem questionar e sem se preocupar e temer pelo destino dos dois, fazendo desse ato o seu segundo sacrifício. Após alguns anos, Abraão recebeu a terceira e maior de todas as suas provações, não a ordem de sacrificar a si próprio, de sacrificar seu filho. Mais uma vez, Abraão superou a provação ao se apressar em cumprir a ordem de Deus, o Louvado, o Altíssimo. Abraão não estava só ao cumprir as ordens de Deus, sua esposa Hagar estava ao seu lado passando pelas mesmas provações e se dispondo de igual forma a fazer os sacrifícios solicitados por Deus, como na ocasião em que Abraão a levou junto de seu filho, Ismael, para Meca, Hagar pediu a Abraão que os deixassem lá e, dessa forma, declarou sua certeza de que Deus não os desampararia. Hagar deixou um exemplo para todas as mulheres crentes no que se referente à paciência, fé, coragem e sacrifício. Ismael, educado em ambiente onde os conceitos de fé e sacrifício eram bem claros, não se esquivou diante da ordem de Deus para que ele fosse imolado por seu pai e disse a Abraão: “cumpra a ordem de Deus, eu estarei entre os pacientes”. Irmãos e irmãs da nação islâmica, se observarmos todos os passos e rituais dos milhões de peregrinos, durante a peregrinação a Meca, todos os anos, o HAJJ, constataremos que quase tudo está relacionado a diversos momentos da vida de Abraão e sua família. A peregrinação é a perpetuação da memória de vida dessa família que jamais se esquivou diante de uma ordem de Deus, sempre disposta ao sacrifício com todos os meios ao seu alcance, almejando somente a proximidade de Deus, o Altíssimo, e, assim, alcançar as Suas bênçãos. Devido aos fatos narrados aqui, realizamos essa celebração que simboliza a vitória sobre o demônio por meio do cumprimento fiel das ordens de Deus; expressamos neste dia nossa imensa alegria por essa vitória. E nós, irmãos e irmãs? Com o que temos nos sacrificamos por nossa religião e por nossa fé para que sintamos essa mesma alegria em nossas vidas de forma particular? O sacrifício é o caminho e a trilha para todos aqueles que querem alcançar uma distinta posição aos olhos de Deus nesta vida terrena e na outra, depois da morte carnal. Foi esse o caminho seguido pelos profetas durante suas missões na Terra, pelos mártires, ascetas, os heróis magnânimos, sábios e todas as pessoas comuns que buscaram o conhecimento que nos leva a Deus. Assim, todos eles alcançaram a coragem que os levou à glória. Não existe na Terra um homem ou uma mulher que tenha alcançado uma distinta posição sem que tenha feito um grande sacrifício. Enquanto a maioria das pessoas está entretida com questões mundanas, buscando apenas por prazeres, encontramos poucas delas envolvidas e dedicadas aos livros, aos estudos, pesquisas e ao desenvolvimento da sua sociedade em geral. Essas poucas pessoas estão dedicando o tempo de suas vidas para atingir suas nobres metas e propósitos. Irmãos e irmãs crentes, há diversas maneiras para concretizarmos o sacrifício; podemos fazê-lo com o uso do dinheiro, despendendo-o em causas justas e caridades; por meio de trabalhos voluntários e dedicando o máximo de tempo possível a esta nobre causa; com o desapego às coisas supérfluas; e por meio do nosso desapego às questões mundanas, renunciando aos nossos prazeres e ao bem-estar quando necessário ou quando solicitado por Deus. Neste dia abençoado, dia da celebração do sacrifício, vamos pensar nos sacrifícios que poderemos fazer em beneficio e ascensão de nossa religião e nossa nação. Nossa religião cresceu e se desenvolveu às custas dos sacrifícios de homens e mulheres que não pouparam seus bens e patrimônios, valiosos ou não, suas vidas e o que lhes poderia ser mais valiosos. Esses atos têm de continuar se repetindo entre nós e com tudo o que possuímos, sejam bens materiais ou não. Peço a Deus, o Altíssimo, que nos recompense neste dia com a paz, a tranquilidade e as bênçãos. KOL 3AM WA ANTOM BIKHAIR (que todos os anos a paz os acompanhem). 06/11/11. Sheikh Mohamad Al Bukaí. www.ligaislamica.org.br. Abraço. Davi.

quarta-feira, 22 de julho de 2020

A ESTRUTURA DO MUNDO III


Religião Afro-brasileira. O Candomblé da Bahia – Rito Nagô. Tradução de Maria Isaura Pereira de Queiroz (1918-2018). Capítulo III. A ESTRUTURA DO MUNDO III.  O babalaô trabalha ou para os indivíduos, em caso de doença, de casamento, de viagens, etc., ou para a coletividade: os búzios são lançados a cada dia que começa, e a vida do candomblé, no transcurso das 24 horas que se seguem, será inteiramente determinada pelo odu que saiu. Assim é ele muitas vezes levado a aconselhar ou, melhor ainda, a ordenar aos assistentes banhos de folhas, remédios vegetais, isto é, passa do culto de Ifa para o culto de Ossaim. Como diz Lydia Cabrera (1899-1991), o babalaô "não está seguro" sem seu Exú e sem seu Ossaim. Aliás, uma das lendas africanas que acompanham os odu ensina que o axé se fez conhecer a Ifa e lhe explicou como proceder com as ervas para tornar seus atos eficazes. No entanto, babalorixá e ialorixá, por sua vez, não podem dispensar as ervas sagradas. Vimos já a importância dos banhos de folhas no ritual de iniciação. Estes, conforme o Orixá a que se pertence, são tomados dentro ou fora de casa, uma vez que existem Orixás do "ar livre" e Orixás que vivem no pegi interior do santuário. O batismo dos tambores, a oferenda de alimentos que lhes é feita uma vez por ano, requerem igualmente o preparo de um banho ou lavagem especial de folhas maceradas. E até as yauô, em sua existência cotidiana, são obrigadas a recorrer à virtude das ervas; uma vez por semana, no dia consagrado ao "dono da cabeça", tomam um banho em cuja composição entram folhas especiais pertencentes ao respectivo Orixá, o banho de amasin, isto é, de purificação. Tudo nos leva, pois, à mesma conclusão: de que é primordial a importância das "ervas" na vida dos africanos do Brasil. E poderíamos repetir, para a Bahia, o que Frobenius diz dos Yoruba da África: “É unicamente de Osseni (o nosso Ossaim) que emana a força mágica que vivifica os homens e os deuses". Leo Frobenius (1873-1938), todavia, interpreta o sacerdote de Ossaim como um feiticeiro e é exato que também na América o conhecimento das ervas - aquelas que envenenam, aquelas que despertam o amor nos corações rebeldes - teve como resultado a ligação do culto de Ossaim com a feitiçaria. Tanto mais que na luta dos escravos contra os senhores brancos o veneno era instrumento facilmente empregado; além disso, as negras, querendo melhorar seu status social tornando-se concubinas dos brancos, utilizavam também filtros de amor. Os próprios senhores de engenho e fazendeiros, no declinar da existência, esgotados pelos excessos amorosos de sua desenfreada poligamia, pediam muitas vezes aos negros de suas roças, que conheciam o segredo das ervas, afrodisíacos que lhes despertassem os sentidos. Isto posto, não deixa de ser verdade que a virtude das ervas não é virtude mágica e sim força de natureza religiosa e que o babalosaim, mesmo se nalgumas circunstancias tende para a feitiçaria, não é feiticeiro, é sacerdote, e é como sacerdote que vamos estudá-lo. Todos os autores que, pouco ou muito, se ocuparam com o culto de Ossaim, estão de acordo em reconhecer sua importância. Artur Ramos (1903-1949) observa, por exemplo, que na África os sacerdotes desta divindade fazem parte da primeira categoria sacerdotal ao lado dos babalaô, bem acima dos sacerdotes dos outros Orixá. Manoel Victorino dos Santos, na conferência que fez" no Congresso Afro-Brasileiro da Bahia, onde falou em nome dos membros dos candomblé, declarou: "todas as ervas são mágicas", querendo dizer com isto que todas elas têm uma virtude cujo conhecimento é indispensável na conduta dos candomblé. Quando Henri Georges Clouzot (1907-1977) firma um pacto com um babalorixá a fim de poder assistir às cerimônias de iniciação, deve em contraposição "não procurar desvendar o segredo das ervas". E já citei várias vezes a frase de um de meus informantes: "Todo o segredo do candomblé reside em suas ervas". Se algumas divindades, como Xangô de Ouro, não descem mais hoje, é porque as ervas que lhes permitiam se encarnar na cabeça dos fiéis não são mais encontradas. Dispomos, infelizmente, de poucas informações a respeito, justamente porque estamos tocando no "segredo" do candomblé; os sacerdotes se calam quando a questão é abordada. Faltam-nos informações circunstanciadas até sobre o que é "público" no culto de Ossaim, pois os africanistas, não sei porque razão, nunca mostraram muito interesse pela curiosa figura desse deus. E quando falam a seu respeito, os textos, além de muito curtos, contêm erros que os tornam inteiramente inutilizáveis. Artur Ramos, por exemplo, apresenta numa das fotografias a insígnia de Ossaim (um ferro com um dos lados pontudo para poder ser fincado na terra, e que traz na outra ponta um passarinho cercado de sete ramos) como sendo a de Exú, levado a esse engano sem dúvida pela designação de Exú como "Exú dos sete caminhos". Manuel Querino (1851-1923) aproxima Ossaim, que escreve "Ossonhe", de um espírito ameríndio, o Caipora, porque tanto um como o outro não têm senão uma perna. Nada há a reparar se se trata apenas de simples comparação entre duas mitologias; mas se Manuel Querino quer dar a entender que os negros adotaram o mito do Caipora, então o erro é manifesto. Ou mais exa-tamente, a identificação das duas divindades pernetas não tem lugar senão nos candomblés bantos, é desconhecida nos candomblés yoruba. Compreende-se certamente que os não iniciados possam confundir duas divindades que apresentam certo número de caracteres comuns. Mas se Ossaim não tem senão uma perna, não é devido a uma corrupção e assimilação com o Caipora; é simplesmente porque incorreu um dia na cólera de Xangô e, no decorrer da luta, perdeu uma perna (em Cuba, além disso, perdeu também um olho e um braço). Os autores que citam Ossaim interpretam-no como o deus da medicina; não é errado, mas a medicina não constitui senão um dos atributos desta divindade. Como já dissemos, ele preside a todos os rituais em que o emprego das ervas é indispensável - iniciação, banhos de purificação, etc. - e portanto seria melhor encará-lo como o dono das ervas e das plantas, a divindade da vegetação, antes do que da medicina. Como lfa, Ossaim também não se encarna. Seu sacerdote, babalosaim ou olosaim, da mesma forma que o babalaô, não conhece o transe; é antes de tudo aquele que se encarrega da colheita das ervas. Mas as ervas não são colhidas em qualquer lugar e de qualquer jeito, e este é ainda um dos elementos que distingue o babalosaim do simples curandeiro. Manuel Querino faz rápida referência a este ritual da colheita quando fala nas cerimônias de iniciação: "Uma pessoa entendida e de confiança", escreve ele (na realidade, trata-se do nosso babalosaim), "que esteja limpa de corpo", (isto é, que não entreteve relações sexuais na noite anterior), ''se dirige ao local levando oubi e pimenta da Costa na boca, mastiga-os e assim triturados, atira-os sobre a vegetação do campo; depois, dança, canta e coloca no chão qualquer quantia em dinheiro". A descrição permanece válida, mas precisa ser completada. Em primeiro lugar, as plantas encontradas no mato podem existir no quintal da casa, ou no jardim, mas assim domesticadas não apresentam valor algum. É preciso ir buscá-las no mato mesmo. Há oposição entre o mundo da cultura, de um lado, e o mundo selvagem, do outro. Ossaim não se aventura nos lugares em que o homem cultivou a terra e construiu casas, nos lugares em que disciplinou a natureza. É o deus do mato, e não das plantas cultivadas. Em segundo lugar, o babalosaim penetra no reino de Ossaim mastigando um obi (e talvez também pimenta); chegando ao seu domínio, volta-se sucessivamente para cada um dos quatro pontos cardeais e cospe nestas quatro direções o obi mastigado. Delimita assim, de certo modo, o espaço sagrado em que vai evoluir. Penetrando no mato, começa a cantar e não deixará de cantar enquanto não tiver saído; mesmo ao cortar um ramo de árvore, um cipó, ao arrancar ervas ou desenterrar uma planta, não pode interromper o canto. Pois, como veremos, embora Ossaim reine sobre todas as ervas, isto não impede que estas se classifiquem em categorias e que as diversas categorias estejam ligadas aos dife- . rentes Orixá. Conseguimos recolher num terreiro do Recife alguns desses cantos especiais, chamados "cantos , para tirar os axé da floresta". Todos obedecem a uma forma simples e monótona; são compostos de dois versos que indicam a divindade ligada à planta que se vai colher, seguidos de um terceiro verso sempre idêntico: tratarei (ou tirarei) o meu axé. Para as plantas de Ogun, por exemplo: Axé di Ogum niká di Ogun panà eu arei meu axé. E para as de Omolú: Axé di Omulú ornam di Omulú obetam eu arei meu axé ... etc. Não é somente num lugar determinado, consagrado - o mato selvagem - que as ervas devem ser colhidas. É preciso ainda colhê-las em horas determinadas: Com efeito, cada uma delas só pode ser colhida em certos dias ou certas noites, em certas horas do dia ou da noite. Algumas devem ser colhidas de madrugada, quando o sol começa a branquear o horizonte; outras devem ser arrancadas à meia-noite. Muitas devem ser colhidas na lua nova, enquanto outras só têm virtude se procuradas na lua cheia, e algumas delas em noites sem lua. E, do mesmo modo que os Orixá têm, cada um, um dia da semana, parece que há igualmente dias determinados para a colheita desta ou daquela planta; mas esse ponto não ficou bem esclarecido em minhas palestras com os babalosaim.  Finalmente, é preciso pedir a permissão de Ossaim para a colheita, e pagá-lo. Eis porque são deixadas junto à planta cortada algumas moedinhas ou um pedaço de fumo de corda. Para cortar o ramo, o cipó, o galho enfolhado, é utilizada uma faca especial, o obé. Ainda aqui encontramos certos enganos nas informações publicadas. Barbosa Rodrigues designa a faca de Ossaim com o nome de abébé, em lugar de obé. O abébé é um leque com o qual as divindades da água - Yemanjá ou Oxun - gostam de se divertir, e nunca uma faca. O babalosaim não se limita a colher as ervas, encarrega-se ainda de seu preparo. No entanto, enquanto dispomos para Cuba ou Haiti de boas descrições de como são confeccionados os "pacotes”, no Brasil nada sabemos a respeito. A única informação que possuímos é de que os cânticos dos axé também são entoados no interior dos santuários, que as filhas de santo entoam o cântico da planta e da divindade correspondentes, à qual pertencem; por exemplo, as filhas de Ogun cantam o cântico do axe de Ogun, as de Yemanjá o do axé de Yemanjá, etc.; e o coro de todas as filhas de santo reunidas responde em uníssono: Axé biu axé meu axé mio. Estas informações parecem indicar que o preparo das plantas dá lugar no Brasil, como nas outras partes da América negra, a cerimônias especiais. Mas não sabemos nem mesmo se esta preparação se faz ou não no pegi especial de Ossaim, pois Ossaim é "santo do ar livre". A planta de candomblé que apresentamos mostra bem para a Bahia este pegi separado dos outros, em pleno campo. No Recife e em Porto Alegre, Ossaim (ou Ossanhe) me foi sempre indicado como uma das três principais divindades obrigatoriamente adoradas fora da casa principal; as outras duas são Exú (ou Bara) e Oxossi (ou Ode). Um de nossos informantes sublinhava que, para preparar os banhos e as lavagens, é preciso quede a erva esteja viva. Eis porque, ajuntava, a dos ervanários não pode servir, ela perdeu a força ... vendem-na "seca". É preciso também esfregá-la, espremê-la, triturá-la com as mãos, e não com um pilão ou outro instrumento; é preciso quebrá-la viva entre os dedos. Página 161. Livro O Candomblé da Bahia Rito Nagô. Abraço. Davi