domingo, 27 de fevereiro de 2022

ESTABELECIMENTO DA JUSTIÇA - UM FUNDAMENTO NO ISLAM

Islamismo. www.arresala.org.br. Por Ahmed Ismail. ESTABELECIMENTO DA JUSTIÇA – UM FUNDAMENTO NO ISLAM. A ordem divina do estabelecimento da justiça está presente na essência de todos os aspectos do Islam. Este propósito é frisado do começo ao fim do Alcorão em que a Religião é apresentada como um restabelecimento do equilíbrio ou harmonia original entre os Direitos Divinos (de adoração, obediência) e os direitos das criaturas. Por outro lado, a descrença, as transgressões ou pecados, são apresentados como “dzulumat” (injustiças). A própria razão da Profecia e missão dos Profetas e Mensageiros é declarada no Alcorão da seguinte maneira: “Enviamos os Nossos mensageiros com as evidências: e enviamos, com eles, o Livro e a balança, para que os humanos observem a justiça; e criamos o ferro, que encerra grande poder (para a guerra), além de outros benefícios para os humanos, para que Deus Se certifique de quem O secunda intimamente, a Ele e aos Seus mensageiros; Sabei que Deus é Poderoso, Fortíssimo”. (57:25) A história dos Profetas possui um ponto em comum: em todas as épocas e em todos os povos a quem foram enviados seu desafio essencial foi predicar “a Justiça em seu amplo sentido”: o abandono da Idolatria (reconhecendo a Unicidade Divina), o arrependimento dos pecados com o abandono da corrupção e das muitas formas de opressão e injustiça. Em razão disso, a concepção islâmica de Religião não separa os vários aspectos da vida humana e da sociedade, destinando orientação a alguns aspectos e negligenciando outros. De fato, a religião tomou o sentido corrente no mundo moderno devido a um processo de secularização promovido por fatores alheios ao Plano Divino. O objetivo essencial das mensagens anteriores foi corrompido pelos interesses dos detentores de poder e influência nas sociedades que, ao separarem o Estado da Religião, conseguiram manter o predomínio da injustiça em suas muitas manifestações e ao mesmo tempo, reduziram a religião a um papel irrelevante e desprovido de efetivo poder de transformação social. Este fator de integridade teórica e prática do Islam à justiça fez com que no decorrer da história diversos movimentos sociais e de resistência se aproximassem e até mesmo aderissem a ele. Mesmo no mundo ocidental temos um exemplo desse fenômeno notável no movimento dos muçulmanos afro-americanos que tiveram importante papel na luta por direitos civis dos cidadãos negros dos Estados Unidos, sendo um significativo referencial na formação de uma nova mentalidade do homem negro naquela sociedade. Este fenômeno pode ser compreendido como um encontro das aspirações autênticas do homem com a Disposição Divina. Entretanto, a perspectiva de JUSTIÇA tal como é apresentada no Alcorão tem um caráter abrangente e complexo onde o restabelecimento da justiça trata-se de um plano global. Na verdade, o Islam não considera um verdadeiro restabelecimento da justiça nada que seja restrito a um determinado aspecto da vida humana, que não corresponda a um tahsin (melhoramento) voltado tanto para a esfera política, social, espiritual e individual. De modo diverso, os vários movimentos sociais e revolucionários que o homem engendrou no decorrer da história ainda que justos e necessários em suas reivindicações e propostas careciam desta visão global que apenas a Mensagem Divina possui. Na prática, por não possuírem esta perspectiva abrangente estes movimentos encontram invariavelmente a sua limitação e são assimilados pelas forças corruptoras dominantes e são descaracterizados até que se tornam mais um elemento na ordem estabelecida. No que diz respeito ao Islam, sua sólida base como Mensagem Divina possibilita que, apesar dos diferentes graus de aderência ou de secularização nas sociedades e nações islâmicas a sua perspectiva de ação permaneça viva e constante. A despeito de todos os fatores contrários, o Islam inspirou em pleno final do século XX uma revolução do porte e da importância da Revolução Iraniana que reafirmou brilhantemente os postulados dos primeiros tempos do Islam. Para que compreendamos a natureza deste apelo a justiça presente no Islam se faz necessário que atentemos para alguns princípios orientadores para os quais o Din conclama os seres humanos. 1. Allah, O Altíssimo, ordena aos crentes o estabelecimento da justiça integralmente e o faz de modo peremptório. Evidencia o Alcorão: “E que surja de vós uma nação que recomende o bem, dite a retidão e proíba o ilícito. Esta será (uma nação) bem-aventurada”. (3: 104) A ordem implícita no ayat acima é abrangente, dirige-se ao conjunto de muçulmanos e muçulmanas e evidentemente só pode ser efetivada se tomada no sentido individual. Ou seja, os muçulmanos individualmente são instados a por em prática os princípios do din e a recomendar o bem aos demais, empenhar-se na retidão (justiça) e opor-se ao mal (ilícito). Esta mesma ordem deve refletir-se na Ummah (comunidade muçulmana). Tal é a relevância deste mandamento divino que o Alcorão reitera que do conjunto dos seres humanos, somente os que se empenham sinceramente em seu cumprimento são os que se orientam pela senda da salvação. “Pela era, Que o homem está na perdição, Salvo os fiéis, que praticam o bem, aconselham-se na verdade e recomendam-se, uns aos outros, a paciência e a perseverança!” (103 : 1 a 3) As características apresentadas nos versículos acima correspondem ao conjunto das características ordenadas no ayat anterior, cabe inclusive destacar a perseverança como um componente absolutamente necessário neste propósito, visto que o bem e a justiça num mundo em que as regras e as ações humanas sejam opostas e tão devotadas a injustiça e ao mal somente com muita perseverança poderão se afirmar. Um notável exemplo desta realidade foi a vida e a missão do Profeta (S.A.A.S.) que para cumprir seu propósito teve que demonstrar uma férrea perseverança diante das agruras, injustiças, crueldades e tiranias dos que se opunham a Allah e a sua Mensagem. 2. Um princípio igualmente ressaltado é o estabelecimento da justiça com imparcialidade. Aos fiéis é ordenado que se oponham a suas paixões e adotem o critério divino na determinação do que seja justo e correto. O Alcorão apresenta esta ordem situando-a em atitudes e comportamentos muito comuns nos homens e mulheres de todas as épocas e de todos os povos e culturas. Diz Allah o Poderoso no Alcorão: “Ó fiéis, sede firmes em observardes a justiça, atuando de testemunhas, por amor a Deus, ainda que o testemunho seja contra vós mesmos, contra os vossos pais ou contra os vossos parentes, seja contra vós mesmos, contra os vossos pais ou contra os vossos parentes, seja o acusado rico ou pobre, porque a Deus incumbe protegê-los. Portanto, não sigais os vossos caprichos, para não serdes injustos; e se falseardes o vosso testemunho ou vos recusardes a prestá-lo, sabei que Deus está bem inteirado de tudo quanto fazeis”. (4 : 135) “Ó fiéis, sede perseverantes na causa de Deus e prestai testemunho, a bem da justiça; que o ódio aos demais não vos impulsione a serdes injustos para com eles. Sede justos, porque isso está mais próximo da piedade, e temei a Deus, porque Ele está bem inteirado de tudo quanto fazeis”. (5:8) Nestes ayát sagrados são mencionadas todas as típicas inclinações que conduzem o homem a prática da injustiça, desconsiderando os direitos alheios e apenas fazendo prevalecer os seus interesses egoístas ou os interesses do grupo a que pertence. Esse padrão vicioso de comportamento alastrou-se nas comunidades humanas dando origem a variadas formas de corrupção, incitando ódios e a maior parte das guerras e conflitos da história. Com tal intensidade tornou-se comum o desprezo ao que seja justo e correto em favor do que seja vantajoso e cômodo, que esta característica incorporou no próprio espírito da grande maioria das sociedades humanas. Podemos detectar este traço de barbárie nas sociedades mais avançadas, em seus códigos de leis (sempre repletos de privilégios para uns em detrimento de outros), em seu espírito belicista e em seus sistemas políticos e econômicos. O Alcorão apresenta como a raiz do problema o indivíduo e suas inclinações egoístas, seu chauvinismo, sua hostilidade aos demais que o conduzem a corrupção pelo testemunho falso, pela omissão ao testemunho fiel, pelo suborno e pela opressão e a tirania. Apresenta também como única alternativa possível a isso, a adoção da justiça e da imparcialidade, o que é em outras palavras acatar o critério e a lei divina mesmo quando isso contrarie seus próprios interesses. Nas tradições fiéis consta que o Mensageiro de Allah (S.A.A.S.) tenha dito que: “O mais temente dos homens é aquele que diz a verdade quer ela o prejudique ou o beneficie”. 3. Um terceiro princípio orientador, que é ordenado aos muçulmanos para o estabelecimento da justiça é a integridade de propósito. Este princípio é evidenciado no seguinte ayat: “Quem interceder em favor de uma causa nobre participará dela; por outra, quem interceder em favor de um ignóbil princípio, igualmente participará dele; e Deus tem poder sobre tudo”. (4: 85) Assim sendo, é haram (proibido) apoiar o erro e a injustiça de outros conscientemente, desobedecendo a Allah e seu Profeta sob qualquer pretexto. Qualquer apoio ou participação em algo que se oponha ao din é manifesta cumplicidade com o mal. Ademais, aos fiéis é ordenado apoiar toda causa que promova o bem e o que seja justo. 4. Um quarto princípio orientador é o JIHAD FII SABÍLILLAHI (ESFORÇO PELA CAUSA DE ALLAH) que deve ser efetivado pelos muçulmanos sempre que se faça necessário. As circunstâncias principais que requerem o Jihad são: – A agressão de um indivíduo ou de um grupo aos muçulmanos e muçulmanas ameaçando seja suas vidas, seus bens ou seus direitos. – A agressão ou a perseguição ao Islam, seus sítios sagrados ou aos territórios islâmicos. – Quando forças corruptoras ponham em risco a integridade moral dos muçulmanos seja num estado islâmico ou onde eles sejam majoritários. – Quando um governante tirano ou corrupto se estabeleça no poder de um estado islâmico. Sob este princípio orientador o direito natural de defesa e de defesa do din e de seus valores é uma obrigação para os muçulmanos. 5. O quinto princípio orientador se reserva aos Imames (líderes dos muçulmanos) e àqueles que exerçam a posição de juiz. Se trata do estabelecimento da Shariah (lei divina) e a sua aplicação conscienciosa nas questões judiciais. Evidencia o Alcorão: “Revelamos a Tora, que encerra Orientação e Luz, com a qual os profetas, submetidos a Deus, julgam os judeus, bem como os rabinos e os doutos, aos quais estavam recomendadas a observância e a custódia do Livro de Deus. Não temais, pois, os homens, e temei a Mim, e não negocieis as Minhas leis a vil preço. Aqueles que ao julgarem, conforme o que Deus tem revelado, serão incrédulos”. (5: 44) Portanto é obrigatório para o governante dos muçulmanos pautar suas decisões em conformidade com o Alcorão, zelar para o fiel cumprimento da Lei divina e para manter o povo dentro dos limites por ela firmados. Se não o fizer (adotando aquilo que se opõe a palavra divina) é obrigação dos muçulmanos combatê-lo, mas se for um Imam Justo e cumpridor de seus deveres, é obrigatório para os muçulmanos manter-se fiéis a ele. A aplicação desses 5 princípios orientadores assegura o estabelecimento da justiça no seu amplo sentido. Muito embora as más inclinações humanas não possam ser sublimadas por completo, na medida em que as pessoas e a sociedade como um todo os apliquem os efeitos positivos tendem a obliterar o mal e a injustiça. Num estado islâmico corretamente estabelecido a Shariah (lei divina) regula os direitos e os deveres dos cidadãos de maneira que a sociedade se liberte da corrupção e da injustiça. As leis adquirem seu verdadeiro propósito, não são meros instrumentos de coerção ou de produção de privilégios para uma minoria. O sentido de justiça não se reduz a vergonhosa condição em que se encontra nas sociedades dirigidas por códigos de leis que são alterados segundo a vontade da maioria. Os sofistas ocidentais pretendem identificar no Sistema sócio-político islâmico o que classificam de ditadura, isso pode ser verdadeiro se tomarmos como exemplo as monarquias islâmicas ou os sistemas equivocados e obscurantistas aplicados por grupos ou seitas integristas como o Regime Taliban. Porém, o estado islâmico na sua verdadeira acepção se caracteriza pelo “ESTABELECIMENTO DA JUSTIÇA” para todos indistintamente, e este objetivo e nenhum outro corresponde aos anseios de toda a humanidade em todas as épocas. www.arresala.org.br. Abraço. Davi

sábado, 26 de fevereiro de 2022

SER FELIZ OU ESTAR FELIZ

 

Judaísmo. www.morasha.com.br. Por Rabino Gabriel Aboutboul. SER FELIZ OU ESTAR FELIZ? Muitas pessoas acreditam que o objetivo da vida é ser feliz. O Judaísmo acredita na força e na importância da alegria. Contudo, a felicidade não é uma meta, e sim, uma forma de viver a vida. Não corremos atrás da felicidade, pois quem a persegue só acaba se afastando dela. obtém-se a felicidade por meio de nossas atitudes e de nossa forma de ver a vida e de como vivemos neste mundo. Vejamos como o Judaísmo e alguns de nossos Sábios veem a felicidade e qual o caminho que nos recomendaram percorrer para alcançá-la. A felicidade e alegria constituem uma Mitzvá, um mandamento da Torá. Vários de seus versículos claramente ordenam ao ser humano servir a D’us com alegria. O Baal Shem Tov (1698-1760) – fundador do Movimento Chassídico – ensinou que é por meio da alegria que o ser humano verdadeiramente serve a D’us. Um de seus ensinamentos fundamentais era a necessidade de uma pessoa estar sempre feliz e alegre. Encontramos no Tanach a ideia de que a alegria era um pré-requisito para que um profeta conseguisse profetizar. Por exemplo, quando o Rei David quis profetizar, ele pediu que tocassem instrumentos musicais para levantar seu ânimo. Por outro lado, a profecia deixou de recair sobre o nosso Patriarca Jacob durante todos os anos em que ele viveu imerso em melancolia em virtude da ausência de seu filho Yossef. A alegria é, portanto, um elemento fundamental do Judaísmo. Por outro lado, a Cabalá ensina que se a felicidade constituísse o objetivo da vida, nossa alma não faria a viagem até este mundo, pois seria muito mais feliz no Mundo das Almas, onde não existem sofrimentos ou preocupações. Nosso objetivo neste mundo não é a busca pela felicidade, mas certamente faz parte da nossa missão trazer felicidade a outras pessoas. De fato, é nisso que reside o segredo da verdadeira alegria. Somos verdadeiramente felizes quando conseguimos fazer outras pessoas felizes. Felicidade versus Diversão. É importante ressaltar que existe uma enorme diferença entre diversão e felicidade. A diversão é algo passageiro e sem muita consistência. A felicidade, por outro lado, é um sentimento interiorizado e bastante forte. Diversão, por exemplo, pode ser passar um dia em um parque de diversões; já um exemplo de felicidade é olhar nos olhos de uma pessoa amada. No Judaísmo, a felicidade não é sinônimo de passividade: não significa deitar-se em uma rede, sem ter de enfrentar desafios. A verdadeira felicidade se obtém por meio da luta, da dor e das conquistas alcançadas. É um estado de espírito que nos ajuda a alcançar nossos objetivos: ela nos dá força e nos torna mais ágeis, levando-nos a fazer as coisas com mais vontade. E cabe ressaltar que a felicidade requer uma boa dose de humildade. Em muitos casos, uma pessoa arrogante não se permite ser feliz porque acredita que tudo que recebeu da vida é muito pouco. Uma pessoa arrogante nunca está satisfeita, pois acredita que merece mais e que deveria ser ainda mais valorizada do que é. Felicidade, portanto, é saber usufruir e apreciar o que nos é dado. As portas de nossa mente. Antes de mais nada, devemos saber que ser feliz é um sentimento que depende de nós – de nossa mente, nossas atitudes e nossos sentimentos. Se nossa felicidade depender de fatores externos ou do estado de espírito de outras pessoas, será muito difícil sermos felizes. É inegável, porém, que pessoas e fatores externos tenham influência sobre nosso estado de espírito. Como impedir que afetem a nossa felicidade? Uma famosa história chassídica ensina como lidar com tais desafios: Uma certa pessoa estava tendo muita dificuldade em lidar com seus problemas. Não conseguia se manter tranquila – vivia sempre angustiada e preocupada. Um dia, procurou seu Rebe para pedir um conselho de como lidar com seu estado de espírito. O Rebe lhe disse: “Viaje para tal cidade e procure tal rabino. Lá você encontrará a resposta que busca”. Apesar do inverno rigoroso, o homem fez uma longa viagem até chegar à casa do rabino. Do lado de fora da casa, percebeu que o rabino estava sentado em frente à lareira. O homem, passando muito frio, bateu na porta da casa repetidamente, mas ninguém abriu a porta. Finalmente, depois de um tempo, o rabino abriu a porta e o convidou para entrar. Serviu-lhe uma bebida quente e deixou seu hóspede à vontade até que se aquecesse. O viajante, que havia vindo de tão longe para encontrar uma resposta para seus tormentos, antes de abordar os assuntos que lhe afligiam, perguntou ao rabino: “Percebi que o senhor estava em casa enquanto eu batia na porta. Gostaria de entender por que demorou tanto para abrir e permitir que eu entrasse”. E ele lhe respondeu, “Não abri a porta antes porque a casa é minha e abro a porta apenas quando eu quiser. Agora você já pode voltar para casa: foi para aprender essa lição que você veio até mim”. Essa famosa história chassídica transmite uma lição importante: cada um de nós tem o poder de escolher quando abrir as nossas portas. Metaforicamente, temos em mão a chave da nossa mente e do nosso coração – podemos escolher quem e o que deixamos entrar. Não devemos permitir que pessoas negativas, palavras negativas, pensamentos negativos, problemas e pressões externas entrem em nossa mente e nosso coração e acabem com a nossa felicidade. Se adentram em nosso coração, é porque permitimos sua entrada. Nós temos as chaves de nossa felicidade. Vale ressaltar que a palavra hebraica Besimchá, “com alegria” tem as mesmas palavras que a palavra Machshavá, “pensamento”. Não devemos permitir que problemas dominem nossos pensamentos e tirem nossa serenidade. Pensar em um problema constantemente, só trará angústia em vez de soluções. Podemos também escolher não dar ouvidos a tudo que nos dizem. Temos o poder de abrir nossas portas apenas quando o desejarmos. Isso significa que não é necessário interromper o que estamos fazendo – um jantar de família, uma aula ou uma ocasião especial – toda vez que toca o telefone ou recebemos uma mensagem no celular. À medida que dominamos nossa mente e nosso tempo, alcançamos mais felicidade. Assim, quando falamos em felicidade, estamos falando, acima de tudo, sobre o controle de nossa mente, de nossos sentimentos e de nossa capacidade de manter uma postura ativa e proativa. Mas controlar a mente e nossos sentimentos depende – como qualquer outra habilidade adquirida na vida – de treinamento. É por meio do controle de nossa mente que nos fortalecemos e nos tornamos mais felizes. Rir e Chorar ao mesmo tempo.  Havia um chassid chamado Rav Peretz que rezava de forma singular: ele chorava com um olho e sorria com o outro. Os amigos lhe perguntavam como era possível chorar e se alegrar simultaneamente. Rav Peretz lhes respondeu: minha alegria advém da minha consciência a respeito da grandeza de D’us; já a fonte das minhas lágrimas é a minha conscientização dos meus defeitos e das minhas falhas. O Zohar, livro fundamental da Cabalá, explica de forma profunda esses dois sentimentos simultaneamente expressos por Rav Peretz. Ensina que a alegria advém de estar próximo de D’us e as lágrimas do fato do ser humano ser falível. Rav Peretz nos ensinou uma importante lição: que mesmo ao rezar, um dos olhos pode ser usado para que a pessoa reflita a respeito de seus atos e de si mesma. Por meio da expressão simultânea desses sentimentos aparentemente antagônicos, Rav Peretz demonstrou como aprimorar o caráter com alegria. Ele via suas fraquezas, mas não permitia que elas o tornassem infeliz. O ser humano vive esse conflito continuamente. Por um lado, vemos nosso lado bom – nossa alma Divina – e nos alegramos com o privilégio de poder fazer o bem e ajudar os outros. Por outro lado, todo ser humano tem falhas e defeitos e tem dificuldade de vê-los e se libertar deles. Fazer uma autoavaliação sincera requer muita força e coragem, pois uma autorreflexão genuína nos leva a ver em nós mesmos uma série de falhas, erros e defeitos de caráter. A pessoa que ama D’us e faz uma reflexão séria a respeito de si, aceita seus defeitos com alegria sabendo que esses são desafios que D’us lhe deu. Ela sente alegria porque sabe que parte da missão de sua vida é crescer e se autocorrigir. Se conseguir identificar o que precisa ser trabalhado e melhorado, isso lhe servirá como um trampolim para seu crescimento. Sob este olhar, as falhas não são vistas como fraquezas, pois a pessoa que tem fé em D’us sabe que lhe foi dada a capacidade de enfrentar tal desafio e prevalecer. Portanto, a alegria de conseguir enxergar seus próprios defeitos não constitui um sentimento contraditório. O ser humano que vive com essa perspectiva e faz esse tipo de autorreflexão nunca será uma pessoa infeliz. Pois ao reconhecer suas fraquezas e se arrepender pelos seus atos, seu choro será uma expressão de alegria. Por outro lado, o ser humano que teme ver seus defeitos ou que acredita que não tem o poder de mudar e crescer, certamente será uma pessoa infeliz. É importante procurar conhecer nossos defeitos. É muito fácil analisar e enxergar as falhas de outras pessoas. Contudo, ver os defeitos de outros seres humanos não é nossa missão de vida. Nossa missão é encarar nossas próprias falhas e fraquezas e utilizá-las como o ímpeto necessário para o nosso crescimento pessoal. O Rabi Yosef Yitzhak Schneerson (1880-1950) – o sexto Rebe de Lubavitch, conhecido como o Rebe Anterior – ensinou que admitir nossos defeitos é uma Mitzvá, mas reconhecer nossas qualidades constitui uma Mitzvá ainda maior. Retificação. Rabi Menachem Mendel Schneerson (1902-1994), o Lubavitcher Rebe, traz em seus escritos um conceito muito bonito sobre pecado e felicidade. Ele escreve que o próprio fato de saber que, mesmo quando erramos, D’us sempre nos dá outra chance, é, por si só, uma grande fonte de alegria. Em outras palavras, saber que é sempre possível mudar a nossa situação e a nós mesmos é uma grande fonte de alegria. Cada pessoa pode, de maneira alegre e positiva, modificar sua maneira de ser ou viver: pode escolher tomar um outro caminho. É a própria alegria que nos dá a força para mudar e crescer e, assim, transformar a nossa situação. Portanto, a alegria é o sentimento que leva a pessoa a se retificar. Confiar em D’us. Conta-se a história de um grande rabino que se encontrava em uma situação muito difícil. Tanto ele como seus alunos não tinham o que comer ou beber, mas enquanto os alunos choravam, o rabino cantava. Os alunos não entendiam a atitude de seu mestre. Perguntaram ao rabino: “Como o senhor consegue cantar em meio a essa situação difícil?” Ele respondeu: “Meus alunos têm motivo para chorar, pois eles esperam que eu os tire dessa situação. Eles depositaram sua confiança em mim. Eu, por outro lado, estou feliz e alegre porque confio em D’us”. Essa história nos ensina que nossa alegria e tranquilidade depende de nossa escolha em quem confiar. Quando confiamos em seres humanos, que são falíveis – quando esperamos que eles resolvam nossos problemas ou que sejam a chave do nosso sucesso – sempre teremos motivo para chorar. Mas confiar em D’us significa viver com felicidade. O ser humano que confia em D’us de verdade tem bons motivos para viver com alegria, pois aquele que acredita que D’us pode mudar toda uma situação difícil e, em um piscar de olhos, passa a viver com mais tranquilidade. A confiança em D’us nos dá a capacidade de reduzirmos a preocupação, que é tão nociva e destruidora. Mas confiar em D’us não significa apenas rezar. Toda pessoa precisa trabalhar e perseguir seus objetivos, pois D’us abençoa nossos esforços. Como ensina a Torá, D’us abençoa o trabalho das nossas mãos. Isto é, o esforço do ser humano é o meio que atrai as bênçãos Divinas. É necessário se esforçar para resolver problemas, mas com a alegria e tranquilidade que advêm da confiança em D’us. Portanto, mesmo em momentos de frustração ou preocupação, é possível ser feliz. Essa é a ideia de chorar com um olho e rir com o outro, simultaneamente. Obtendo Felicidade. Em certa ocasião, Rabi Yosef Yitzhak Schneerson – o sexto Rebe de Lubavitch – escreveu uma carta para uma pessoa que precisava ser encorajada a ser feliz. Ele escreveu: “Seja tão alegre como você seria se seus problemas já tivessem sido resolvidos”. Em outras palavras, viva com a alegria que você viveria se esses problemas não mais existissem. Quando se vive com a fé em D’us de que todos os problemas serão resolvidos, é possível viver com tranquilidade e alegria. Conta-se a seguinte história sobre um tio do Rebe de Lubavitch: ele era dono de uma fazenda de criação de ovelhas que, em certa ocasião, foi destruída por um incêndio. Como já era um senhor de idade avançada, as pessoas tinham receio de lhe informar que sua fazenda havia sido destruída. Mas quando ele ficou sabendo do ocorrido, permaneceu tranquilo. Surpreendidas com sua reação, as pessoas lhe perguntaram como ele havia conseguido manter a calma. E ele respondeu: “Daqui a um ou dois anos, isso não mais me abalará. Fará parte do meu passado e eu continuarei a viver a minha vida. Por que então devo passar um ou dois anos aborrecido e permitir que esse sentimento me consuma, que paralise a minha vida, se já posso olhar para frente?” É natural que certas situações na vida nos deixem tristes, frustrados e irritados. Mas nosso problema é que, em muitos casos, esquecemos o bom e só nos lembramos dos incêndios em nossa vida. Nossos problemas nos consomem por muitos anos – mesmo depois de terem sido resolvidos há tempos. Na maioria dos casos, o que nos preocupa tanto hoje – os assuntos que parecem ser tão importantes na atualidade – irão passar e nem sequer nos lembraremos deles. Por que, então, sofrer tanto por algo passageiro? Por que permitir que tais assuntos preencham nossa mente e nossos sentimentos? Por que não seguir o conselho do Rebe Yosef Yitzhak e agir hoje como se nossos problemas já tivessem sido resolvidos? Por que levar anos para superar uma situação que pode ser superada no presente? Uma pessoa que só se foca nas coisas que deram errado em seu dia a dia – e não em tudo que deu certo – será uma pessoa infeliz. Alguém que se coloca em situações que lhe fazem mal, será infeliz. E quando condicionamos nossa felicidade a algum fator externo – ganhar na loteria ou conseguir o trabalho de nossos sonhos – a felicidade se torna difícil de alcançar. É errado passar a vida à espera da felicidade. A verdadeira felicidade não depende de situações externas, e sim, da capacidade de viver uma vida que leve à felicidade. Isso significa optar por ver o que há de bom em nosso dia a dia; significa se colocar em situações positivas; significa, acima de tudo, escolher ser feliz. Adquire-se a felicidade a partir do momento em que se cria o espaço para que ela cresça e se desenvolva. Quando o ser humano tem uma atitude positiva e alegre, ele naturalmente se torna uma pessoa mais feliz. Quando substitui uma visão negativa por uma positiva, o ser humano se abre para a alegria e para mudanças positivas em sua vida. O Rebe Yosef Yitzhak nos deu uma lição valiosa para evitarmos problemas e preocupações: ao nos concentrarmos no bom e no positivo, direcionando nossas emoções para o bem, conseguiremos viver como se o que nos aflige já tivesse sido resolvido. Por meio de alegria e felicidade, torna-se possível nos transformarmos e transformar a própria vida. Alegria e espiritualidade. Está escrito em nossos livros sagrados que a alegria é o recipiente para a espiritualidade. Isto é, as rezas são ouvidas e as Mitzvot têm seu efeito desejado se rezarmos e cumprirmos os mandamentos de D’us com alegria. Quando se reza por mera obrigação, não há como saber se os efeitos da reza se perpetuarão. Mas quando essa oração é acompanhada por um sentimento de alegria e felicidade, essa reza valerá para muitas gerações. Isso vale também para as Mitzvot. Toda Mitzvá que é feita com alegria se perpetua ao longo das gerações. Quando o Judaísmo é praticado com felicidade, torna-se muito mais fácil transmiti-lo para a próxima geração. Quando os pais cumprem as Mitzvot com alegria, eles transmitem aos filhos a ideia de que o Judaísmo atrai bênçãos, paz e felicidade. Isso incentiva os filhos a seguir o mesmo caminho espiritual dos pais. Por outro lado, se as cerimônias e os rituais do Judaísmo forem praticados com má vontade – em meio a discussões e discórdia – os filhos podem vir a associar a prática das Mitzvot ao oposto da felicidade, e isso pode fazer com que eles se distanciem de sua herança espiritual. É interessante notar que a palavra Mashiach – a personificação da salvação – possui as mesmas letras que a palavra Simchá – alegria. Está escrito, portanto, que o “salvador” que habita dentro de nós é a própria alegria. Segundo o Judaísmo, a alegria é a expressão da essência da nossa alma. O Lubavitcher Rebe sempre enfatizava a importância de viver com alegria. Ele ensinava que em nossa geração não há espaço para amargura, melancolia ou tristeza. Hoje, há espaço apenas para alegria e felicidade. E não há maior alegria do que gerá-la na vida de outras pessoas. Rabino Gabriel Aboutboul é rabino da Sinagoga de Ipanema no Rio de Janeiro – Brasil e palestrante. www.morasha.com.br. Abraço. Davi

 

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

A LIBERTAÇÃO PELA RENÚNCIA

 

Bhagavad Gita – A LIBERTAÇÃO PELA RENÚNCIA. Esse é o 18º capítulo do Bhagavad Gita, que conclui essa Escritura Canônica. Ocuparemos esse espaço a partir de agora com os Yoga Sutras de Patanjali. Segue o último texto sagrado do Gita. “Arjuna: Quisera Oh! Abençoado Krishna Senhor, conhecer em que consiste realmente a abstenção (Sanyasa) e renúncia (Tyaga). Krishna: Os exegetas entendem por Sanyasa o abster-se dos atos dimanantes, resultante, do desejo. Os sábios dizem que Tyaga é a renúncia dos frutos de todas as ações. Uns opinam que toda ação é pecaminosa e se deve abster-se dela. Outros sustentam que jamais se devem omitir atos como os de sacrifícios, esmolas e disciplina. Escuta, pois, meu veredito acerca da renúncia. Tem-se dito que é de três espécies. Os atos de sacrifício, esmolas e disciplina, e similares, não devem ser abandonados, mas praticados, pois purificam os Yogues. Estes atos, como o Yoga, devem ser praticados, mas sem apego aos seus resultados e sem interesse pessoal. Tal é a minha firme convicção. Não é correto abster-se alguém de uma ação inerente a sua própria condição. Tal abstenção derivada ilusão e é considerada Tamásica. O que se abstêm da ação para evitar incômodos corporais, dizendo: isto é penoso, praticar uma renúncia de natureza Rajástica, e nada ganha com essa renúncia. Se alguém, sem apego nem visando resultados, pratica um ato inerente à sua própria condição, dizendo: isto precisa ser feito, essa renúncia é tida como de natureza Sátwica. Quem não tem repugnância a fazer aquilo que não lhe dá proveito e não tem desejo do que lhe é vantajoso. Quem é prudente e não nutre dúvida alguma, é um verdadeiro renunciador, Tyagui. Não há homem que possa abster-se de toda a ação enquanto vive no corpo terrestre. Verdadeiro renunciador, é, porém, considerado quem se abstém de gozar os frutos de suas obras. É tríplice o fruto da ação desejável, indesejável e semi desejável, que nas vidas futuras colhem aqueles que não renunciam. Mas quem renunciar, nada tem a colher. Ouve agora quais são os cinco fatores que, segundo a filosofia Sankya, requer o cumprimento de todas as ações. O meio (o corpo), o agente (o eu), os órgãos motores, as energias e as divindades presidentes. Qualquer obra boa ou má, em ação, palavra ou pensamento, tem como causas esses cinco fatores. Por isto, ofuscada está a mente e cega a visão de quem, por falta de conhecimento, se considere como o único agente. Alguém que, abstendo-se da ação e não se ligando ao fruto, exterminasse aquelas hostes, não seria seu matador nem a tal ação se vincularia. Cada ação tem três elementos causais: o conhecimento, o objeto do conhecimento e o conhecedor. Analogamente, cada ação tem três elementos de realização: o instrumento, a operação e o agente. Também de três espécies são o conhecimento, a ação e o agente, em correspondência com as qualidades, Gunas. Atenta no que sobre isto vou dizer-te. Puro e de natureza Sátwica é o conhecimento mediante o qual se vê em todos os seres o imperecível Ser, indivisível no dividido. Passional e de natureza Rajásica é o conhecimento que considera separadas as diversas e múltiplas existências dos seres. Mas tenebroso e de natureza Tamásica é o conhecimento que se fixa numa só coisa como se fosse tudo, olhando-a fora da realidade, sob um aspecto mesquinho e irrazoável. Pura é a ação cumprida por dever, sem apetecer o fruto, sem gosto nem repugnância e livre de afeto interesseiro. Passional é a ação cumprida por sugestão do desejo, por motivos egoístas ou determinações violentas. Tenebrosa é a ação cumprida por causa do erro, sem reparar na sua eficácia nem nas consequências nocivas que possa acarretar à outros. Puro é o agente livre de afetação e egoísmo, dotado de energia e perseverança, e inalterável no êxito e no fracasso. Passional é o agente que, desejoso de obter fruto de suas ações , está dominado pela cobiça, maldade e impureza. Oscilando entre impulsos de alegria e pesar. Tenebroso é o agente hipócrita, vulgar, malévolo, negligente, contumaz, desconfiado, falaz e preguiçoso. Tríplice-mente concorde com as qualidades, Gunas, é também a divisão do Intelecto, Buddhi, e da Constância, Dhriti, segundo passo a descrever-te claramente e sem reservas. Puro é o Intelecto de quem conhece a ação e a omissão, o que deve e o que não deve fazer-se, o temor e a intrepidez, a escravidão e a libertação. Passional é o Intelecto que confunde o justo com o injusto, o que deve com o que não deve fazer-se, o bem com o mal. Tenebroso é o Intelecto que imputa o bem pelo mal, o justo pelo injusto, e vê todas as coisas subvertidas e contrárias ao que realmente são. Pura é a Constância que por meio da Yoga refreia a fogosidade da mente da mente, dos sentidos e dos alentos vitais. Passional é a Constância que leva o homem ao cumprimento de seus deveres, com o desejo de colher o fruto das ações e desfrutar de riquezas e prazeres. Tenebrosa é a Constância que mantém o homem submerso na preguiça, no medo, na tristeza, no abatimento e na vaidade. E agora escuta de meus lábios as três distinções do prazer por cujo desfruto contínuo tanto se alvoroça o homem e que lhe extingue as aflições. Puro é o prazer que nascido do bendito autoconhecimento, no princípio repugna como adstringente peçonha, mas no fim deleita, qual suavíssima ambrosia. Passional é o prazer que nascido da união entre os sentidos e seus objetos, deleita no princípio qual suavíssima ambrosia, mas no fim repugna como adstringente peçonha. Tenebroso é o prazer que no princípio e no fim conturba o ânimo, e provém da morbidez, da negligência e da preguiça. Ninguém na terra nem mesmo entre os próprios deuses do céu, está isento destas três qualidades, Gunas, oriundas da natureza. Entre as castas dos Brahmanes (sacerdotes, instrutores, intelectuais), Kshattiyas (militares, estadistas, políticos). Vaishyas (comerciantes, banqueiros, fazendeiros) e Shudras (domésticos, criadores e serventes) foram as tarefas (Karma) de conformidade com as qualidades dimanantes de sua peculiar natureza. Animo tranquilo, pureza, autodomínio, austeridade, misericórdia, retidão, sabedoria, conhecimento e fé em Deus: tal é Karma (1) dos brahmanes, nascidos de sua peculiar natureza. (1). Karma: ação. Nesse contexto significa os atos, pensamentos e desejos do indivíduo em suas existências anteriores, e que atualmente constitui o seu Dever específico. Assim, pois, segundo Krishan a casta ou classe social do indivíduo não é hereditária, mas oriunda de sua conduta pretérita.  Agricultura, pastoreio e comércio, tal é o Karma dos Vaishyas, nascido de sua peculiar natureza. Os serviços são o Karma dos Shudras, igualmente nascido de sua peculiar natureza. Alcança a perfeição quem quer que cumpra contente o seu próprio dever o Supremo Ser de que emanam todas as vidas e que penetra todo o Universo. É preferível cumprir-se o próprio dever, embora inferior, a imiscuir-se no dever alheio embora superior. Não incide em pecado quem cumpre seu dever congênito. Que a ninguém repugne seu dever natural embora seu cumprimento seja acompanhado de inquietações. Pois como a fumaça é inerente a toda chama, assim são as inquietações em relação as ações. Ao cumprir o seu dever, que ele permaneça desapegado de quaisquer espécies de resultado, conserve sua mente totalmente concentrada e afaste de si toda preocupação, quanto ao executor. Mediante esta renúncia atingirá ele a meta superior que se galga mediante o Yoga do Conhecimento. Aprende também brevemente de meus lábios, Oh filho de Kunti, como quem conquistou esta meta, chega à unificação com Deus, que é a etapa suprema da realização. Com a mente saturada de plenos e claros conhecimentos acerca da verdadeira natureza do Espírito, sendo perseverante no domínio da mente. Tendo abandonado toda aliança com objetos sensórios, e estando livre de influências do amor e ódio. Sendo frugal na dieta, e com a palavra, o corpo e a mente educados na obediência, sente-se ele num lugar solitário e pratique sempre a meditação, cultivando o não se apaixonar. Finalmente, banindo de si o egoísmo, a resistência, o orgulho, o desejo, o rancor e o senso de posse, alcançará ele aquela paz que o capacitará a unificar-se com Deus. Unificando-se com Deus, ele é sereno, nada mais o entristecendo. Nem ele deseja, mas amando por igual todos os seres e me ama intensamente. Com este amor intenso, ele sabe claramente quem sou e o que sou. Conhecendo-me ela claramente, com esse mesmo amor, ele penetra então em Mim. Realize ele todas as ações, refugiado em Mim, e não apenas o seu dever próprio. E por minha graça alcançará a perfeição eterna e imutável. Dedica tu, em pensamento, todas as tuas ações a Mim, e perseverando nesta atitude, estarás sempre com tua mente fixa em mim. Com tua mente fixa em Mim, com minha graça vencerás todos os obstáculos. Se, confiando apenas em ti, pensares: não lutarei, e evitares a luta, vã será a tua determinação, pois tua natureza te lançará à luta. Oh! filho de Kunti! O que por ilusão não desejares fazer, isso farás irremediavelmente, forçado pelos impulsos de tua própria natureza. O Senhor Supremo como que atou todos os seres a uma roda girante de corpos, e habitando em seus corações, fá-los mover-se atraídos pelos objetos sensórios. Portanto, obedece de coração o conselho desse mesmo Senhor. Por sua graça alcançarás a Paz Suprema e a mansão imperecível. Assim te transmitir, Eu o conhecimento, que é o mistério dos mistérios. Medita cuidadosamente nele e age como preferires. Escuta de novo, e ouve minha última palavra, referente ao maior de todos os mistérios. Por seres o meu muito amado, Eu te digo aquilo que te convém. Fixa tua mente em Mim. Sê Meu devoto, serve-me, prostra-se diante de mim, e desse modo chegarás até Mim. Esta é a pura verdade, Eu te declaro pois és Meu muito amado. Desiste de todas as obrigações religiosas, e toma-me como teu único refúgio. Eu te libertarei de todas as dificuldades. Não te aflijas. Disto não fales nada ao mundano, nem ao ímpio, nem ao que não quer ouvir, nem ao que me maldiz. Mas quem com sublime devoção divulgar este segredo entre meus devotos, chegará até mim sem dúvida alguma. Entre os homens ninguém poderá oferecer-me serviço mais grato que este, nem nenhum outro homem será tão amado por mim na terra. E quem meditar neste nosso Santo Colóquio, por meio dele me adorará com o sacrifício da Sabedoria (1). Tal é a minha vontade. (1). O jnana Yojana, o Sacrifício da Sabedoria, é considerado superior a todos os demais atos sacrificiais, porque é o que conduz diretamente à libertação. E, também o homem que, cheio de fé, o escutar tão só sem malícia, alcançará livre do mal, o esplendente mundo dos justos. Ouviste-me atentamente, Oh filho de Prithá? Desvaneceu-se essa tua ilusão, filha da ignorância, Oh Dhananajayal? Arjuna: Desvanecida está a minha ilusão. Por tua graça adquiri o conhecimento, Oh imutável Senhor. Estou decidido. Dissiparam-se as minhas dúvidas. Agirei segundo tua palavra. Conclui Sanjaya. Assim ouvi esse maravilhoso diálogo entre o Divino Krishna e o nobre Arjuna. E ao ouvi-lo, eriçavam-me os cabelos. Por mercê de Vyasa (2) conheci este mistério do Yoga, revelado pela palavra do próprio Krishna, o Senhor do Yoga. Oh Rei! Quanto mais recordo e me lembro deste maravilhoso e sagrado diálogo entre Keshava e Arjuna, tanto mais me regozijo. E quando recordo e me lembro daquela maravilhosíssima transfiguração de Hari (3), aniquilou-me de assombro, Oh Rei!, e outras tantas vezes me rejubilo. Onde quer que esteja Krishna, o Senhor do Yoga, e onde quer que esteja Partha, o arqueiro, ali imperarão seguramente a grandeza, a prosperidade, a vitória, a felicidade e a justiça eterna. (2), A Vyasa Dvaipayana são atribuídas a composição do Bhagavad Gita e a autoria do Mahabharata. Foi um grande Yogue, dotado de poderes sobrenaturais. (3). Um dos nomes de Vishnu e de Krishna. Assim, termina aqui, no Bhagavad Gita, a Essência dos Upanishads, que é a Ciência de Brahma e do Yoga, o maravilhoso diálogo entre Sri Krishna e Arjuna. PAZ A TODOS OS SERES”. Abraços. Davi. 

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

A TRANSIÇÃO PLANETÁRIA E O CORONAVIRUS

 

Astrologia. blogdosaber.com.br. Texto de Ricardo Lindemann, doutor em Ciência da Religião pela UFJF. Mestre em Filosofia pela UNB. Presidente do Sindicato dos Astrólogos de Brasília. Ciência. A TRANSIÇÃO PLANETÁRIA E O CORONAVÍRUS. O vírus e a vida na transição para a era de Aquário. “A era de aquário será um lindo dia ensolarado, mas temos antes que cruzar a nuvem Kármica de nossas dívidas com o passado, cuja cobrança estamos assistindo”. O grande desafio do momento parece ser o novo coronavírus (SARS-CoV-2) ou a doença que ele gera, a Covid-19. O vírus é novo, surgiu no fim de 2019, durante a conjunção de Saturno com Plutão; o apego à vida é um problema filosófico bem mais antigo, mas o medo da morte, sua sombra inseparável, tornou-se um problema muito atual. Uma vacina poderia resolver o problema, mas apesar dos esforços de vários países, ainda não está disponível. Recentemente, na véspera do Ano Novo Astrológico (20/03/2020) e coincidindo com a conjunção de Marte com Júpiter e Plutão, e do ingresso de Saturno em Aquário (22/03/2020), divulgou-se uma primeira inspiradora notícia de um lenitivo: a Hidroxicloroquina. Tal fato está conforme considerei na minha página do Facebook em 10/02/2020: “A entrada de Saturno em Aquário em 22/03/2020 deverá aliviar mais os efeitos ainda remanescentes da Grande Conjunção de Saturno com Plutão em Capricórnio, cujo processo culminou em 12/01/2020.” Saturno em Aquário pode produzir insegurança social devido ao impulso aquariano pela excentricidade e pelo radicalismo, mas pode estabilizar-se pelo conhecimento definido, pela concentração na pesquisa científica e pelo compromisso com metas sociais ou voltadas para o futuro. Há controvérsias sobre a origem do novo coronavírus, mas a maioria das notícias converge para o seu surgimento no início de dezembro de 2019, em uma feira de Wuhan na China. Há indícios de que havia ali venda de animais vivos bastante exóticos para alimentação, incluindo morcegos, e que assim o vírus que estava nos animais teria contaminado os humanos. No início, houve imposição de sigilo e até repressão aos pesquisadores que identificaram a doença. Chegou a ocorrer a morte, pela própria Covid-19, de um médico, Dr. Li Wenliang, que tentou alertar as autoridades sobre a gravidade da crise, em fevereiro. Os efeitos do novo coronavírus se fizeram sentir durante a lunação que abrangeu o plenilúnio do Eclipse Penumbral Lunar de 10/01/2020 e do ápice da conjunção de Saturno com Plutão em 12/01/2020, conforme considerei na minha página do Facebook em 22/06/2019: “…já tenho assinalado aqui, e em meu livro (A Ciência da Astrologia e as Escolas de Mistérios. Brasília: Teosófica, [2020. 4 ed.]), os aspectos de Saturno com Plutão têm se relacionado com crises internacionais. Tais aspectos têm causado crises particularmente entre o Ocidente e o Oriente, como na oposição em 2001, com a queda das torres do World Trade Center, que parece ter sido o estopim da Guerra do Iraque; e na quadratura em 2011, com a caçada a Osama Bin Laden (1957-2011) e o início do último conflito na Síria. Teremos o ponto crítico da transformação na conjunção exata em 12/01/2020, mas os eclipses podem potencializar efeitos antecipados, que tendem a afetar também a economia internacional. No Brasil, uma vez que pelo menos o Plutão já tem estado em conjunção com a cúspide da casa XII ou do Karma, também chamada Inimici ou dos inimigos, tais aspectos poderão agravar as dificuldades já existentes, período óbvio de aceleramento kármico e ajuste de contas com os excessos do passado.” Num comentário posterior e de retrospectiva dos fatos ocorridos ou atraídos pela conjunção de Saturno com Plutão, também ali considerei em 10/02/2020: “… depois do Eclipse Penumbral da Lua de 10/01/2020. Incidentes ocorridos na proximidade daquela data, cuja gravidade foi aqui antecipada, poderiam ter tido desdobramentos muito mais sérios, o que é motivo de alívio, como se pode destacar, entre outros: A morte do General Soleimani do Irã, produzida por um drone norte-americano, e consequente retaliação iraniana; a derrubada do avião ucraniano por míssil iraniano, o processo parcial de impeachment de Trump; a renúncia do premiê russo; o Brexit inglês ou ROMAN GRAC/PIXABAY respectiva saída da União Europeia; o incêndio na Austrália; a erupção do vulcão nas Filipinas; o terremoto na Turquia; a avalanche na Caxemira; e a ainda não encerrada epidemia do coronavírus iniciada na China.” A Era de Aquário, que é regida por Urano, é esperada há muito tempo como sendo o período da Fraternidade Universal e do fim das guerras, por meio de uma Federação das Nações no modelo da União Europeia ocorrida em 1993 (conjunção de Urano com Netuno), sendo uma Era Astrológica um período de 2.150 anos que abrange uma constelação sideral dentro do movimento de Precessão dos Equinócios. Um grau de transição representa 72 anos que seria provavelmente o período que estamos vivendo, embora haja controvérsias de quando teria iniciado, o que é natural para períodos tão longos. Cada vez que um planeta ingressa em Aquário, um novo impulso vibratório se soma na direção da Era de Aquário, mas grande mesmo será a transformação que se iniciará quando Plutão ingressar em Aquário em março de 2023, quando Saturno sairá daquele signo, depois de ter preparado a chegada de Plutão. O universo é como um grande relógio e tudo indica existirem inteligências que o dirijam, como dizia Helena Petrovina Blavatskky em A Doutrina Secreta: “A Natureza não é um aglomerado fortuito de átomos.” A Astrologia se baseia na unidade da vida e na interdependência de suas formas de manifestação, bem como no princípio da periodicidade universal e no grande axioma hermético: “Como em cima; assim embaixo.” O que acontece no Céu, se espelha na Terra. Conforme também considerei mais detalhadamente sobre as eras na revista SOPHIA nº 26, de abril e junho/2009, bem como no artigo Nostradamus e a Nova Era, publicado na revista SOPHIA nº 27, de jul/set/2009: “Existe uma dinastia espiritual cujo trono nunca está vazio, cujo esplendor jamais decai; seus membros formam uma corrente de ouro cujos elos jamais poderão romper-se porque eles fazem o mundo retornar para Deus de quem proveio.” É o ser humano que costuma transgredir as leis da harmonia espiritual e da natureza fazendo escolhas pouco sábias, como dizia Platão em A República: “A responsabilidade é de quem escolhe: Deus está inocente nisso.” Daí surge o karma coletivo da Humanidade, que colhe o que semeou… A ignorância é a causa do mal… Atualmente estamos ingressando no Ano Novo Astrológico (20/03/2020) com Netuno em Peixes, regente da respectiva era anterior e planeta das águas e do contágio (que se dá por perdigotos ou gotículas d’água…), em semi quadratura com Urano, caracterizando uma crise entre os regentes das eras que estão em transição, ao contrário do período glorioso de 1993, quando iniciou a União Europeia, em que eles estavam em conjunção, como se estivessem “passando o bastão do revezamento”. A partir da primeira Conjunção de Júpiter com Plutão em 04/04/2020, que assim caracteriza uma data para haver uma maior clareza ou um despertar para a real dimensão do problema até o dia 12/05/2020, numa progressiva libertação, onde poderia surgir algum remédio ou tratamento lenitivo. Entretanto, se este diagnóstico for correto, de que a conjunção de Saturno e Plutão teria originado o problema, então deveria ser favorável também o seu maior afastamento neste semestre, que será em 12/05/2020, porém depois o Saturno iniciará seu movimento retrógrado. Outras datas favoráveis seriam 05/06/2020, quando ocorrerá um novo Eclipse Penumbral Lunar que pareceria diluir os efeitos do anterior. Datas assim representam ápices de processos que influenciam todo o período da lunação. Melhor será o dia 27/07/2020, quando ocorrerá o sextil de Júpiter com Netuno, compreendendo com especial intuição ou superando a questão do contágio talvez com algum novo remédio ou alguma tão esperada vacina. É, todavia, importante compreender que na Astrologia Mundial, que trata do karma coletivo que envolve um número muito maior de países com interação de variáveis que não se consegue isolar, as previsões e os prognósticos são naturalmente mais probabilísticos do que no estudo de Mapas Astrais de indivíduos. Conforme o clássico provérbio: “Os astros inclinam; mas não determinam.” Embora se possa interpretar a natureza e direção das circunstâncias envolvidas, é difícil quantificar ou mensurar a sua intensidade. Conforme mencionei também no Facebook em 31/12/2017: “‘Saturno em Capricórnio, desde 20/12/2017, onde ficará pelo menos até março de 2020, parece trazer um ano de austeridades, ajuste de contas e tendências mais conservadoras e realistas em busca de segurança. Pode-se fazer uma analogia com o pêndulo que agora oscila para o outro lado, ou um arco que acumula tensão para lançar a flecha da mudança que virá com Plutão ingressando em Aquário em 2023, e principalmente com o Grande Trígono de Plutão, Urano e Júpiter em 2029, que associo à Federação das Nações simbolizando o fim das guerras na Era de Aquário, conforme publiquei na revista SOPHIA nº 36, de outubro e dezembro/2011 (p. 43), se eu tiver interpretado corretamente a profecia do Bispo + C.W. Leadbeater em 1913.’ Será um lindo dia ensolarado de uma nova era de paz, mas temos antes de cruzar a nuvem kármica de nossas dívidas com o passado, cuja cobrança estamos assistindo.” O novo coronavírus parece fazer parte deste plano divino, que guia as nações, de acordo com as possibilidades do karma coletivo, para mostrar à humanidade que somos todos um, sem as aparentes distinções de raça, crença religiosa, ideologia, classe social, ou como dizia Jiddu Krishnamurti (1895-1986): “vós sois o mundo.” Também em Aos Pés do Mestre: “Deus tem um plano, e esse plano é a evolução.” Por outro lado, o apego à vida ou o medo da morte têm se intensificado com a presença do Covid-19. No mínimo é importante ressaltar que muitos sábios da antiguidade como Samkara, Buddha, Krishna, Platão e talvez Cristo, também parecem concordar nessa questão dá ignorância ser a causa do mal ou do sofrimento, caracterizando um ponto essencial do estudo comparativo entre religião e filosofia. Poderia parecer até que também Cristo concorda neste tema quando afirma “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” [João VIII: 32], pois sugere que há uma escravidão ou submissão, talvez à matéria, causada pela ignorância ou carência do conhecimento da verdade. Pela ignorância de sua verdadeira natureza espiritual o ser humano se identifica com os corpos com os quais seu espírito se reveste, sendo está a raiz do egoísmo. O egoísmo também é definido por Ksemaraja, sábio comentado por I. K.Taimni (1898-1978) em O Segredo da Autorrealização: “A natureza essencial da escravidão, no mundo ilusório da manifestação, é o apaixonar-se pelo próprio poder individual limitado, devido à falta de percebimento daquela Realidade que é a única fonte existente de todo poder.” Dessa identificação com os corpos surge a atração por repetir o prazer ou a repulsão que tenta evitar a dor, abrangendo assim as diversas paixões que aprisionam o ser humano na matéria, resultando no apego à vida e medo da morte, que reforça assim a ignorância de sua verdadeira natureza espiritual. Dessa forma cria-se um círculo vicioso que tende a reforçar-se, mas o vírus pode ser um agente kármico ou um instrumento da natureza para quebrar tal círculo e levar a humanidade a meditar na imortalidade da alma e na ciclicidade da vida, como se encontra em A Tradição-Sabedoria. Assim, o ser humano poderá despertar para a importância do autoconhecimento e perceber sua grandeza divina, como se encontra em O Idílio do Lótus Branco: “A alma do homem é imortal, e o seu futuro é o de algo cujo crescimento e esplendor não têm limites.” www.blogdosaber.com.br. Abraço. Davi



terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

LIVRO A CIÊNCIA DO YOGA - I. SAMADHI PHADA

 

Yoga. Livro A Ciência do Yoga. Autor I. K. Taimni. I. SAMADHI PADA. Atha yoganusasanam. 1. Será feita agora uma exposição do Yoga. Geralmente, um tratado dessa natureza, em sânscrito, começa com um sutra que dá uma ideia da natureza da tarefa. O presente tratado é uma “exposição” do Yoga. O autor não pretende ser o descobridor dessa ciência, mas apenas um expositor, que tentou condensar em uns poucos sutras todo o conhecimento essencial concernente à ciência que um estudante ou aspirante deve possuir. Muito pouco se conhece sobre Patanjali. Embora não tenhamos sobre ele uma informação que possa ser chamada propriamente histórica, ainda assim, de acordo com a tradição oculta, ele foi a mesma pessoa conhecida como Govinda Yogi e que iniciou Samkaracarya na ciência do Yoga. Da maneira magistral com que ele expôs o tema do Yoga nos Yoga-Sutras, é óbvio que ele foi um yogi muito avançado, com um conhecimento pessoal de todos os aspectos do yoga, inclusive sua técnica prática. Como o método de expor um assunto na forma dos sutras é peculiar e geralmente pouco familiar aos estudantes Ocidentais, que não conhecem a linguagem sânscrita, talvez não fosse demais dizer-se aqui umas poucas palavras sobre esse método clássico, adotado pelos sábios e letrados antigos na sua exposição que fizeram de alguns dos mais importantes temas. A palavra sutram, em sânscrito, significa “um fio” e este significado primário deu origem ao secundário de sutram como um aforismo. Do mesmo modo que um fio une uma quantidade de contas num rosário, a subjacente continuidade da ideia une, em linhas gerais, os aspectos de um tema. As características mais importantes desse método são a máxima condensação, consistente com a exposição clara de todos os aspectos essenciais, e a continuidade do tema fundamental, apesar da aparente descontinuidade das ideias apresentadas. Esta última característica é digna de nota, pois o esforço para se reconhecer o “fio” oculto do raciocínio, sob ideias aparentemente desconexas, muito frequentemente fornece a chave para o significado de muitos sutras. Deve-se lembrar que este método de exposição prevaleceu numa época em que a imprensa era desconhecida, e a maioria dos mais importantes tratados tinha de ser memorizada pelo estudante. Daí, a necessidade de condensar ao máximo. É claro que nada de essencial foi deixado de lado, mas tudo aquilo com que se esperava que o estudante estivesse familiarizado, ou que ele pudesse facilmente inferir do contexto, era cortado impiedosamente. O estudante verificará, em um estudo cuidadoso, quão enorme é a quantidade de conhecimento teórico e prático que o autor conseguiu incorporar em tão pequeno tratado. Tudo quanto é necessário para a devida compreensão do assunto foi dado num ou noutro lugar, sob forma estrutural. Mas a essência do conhecimento, requerido tem que ser extraída, convenientemente preparada, analisada e assimilada, antes que o assunto possa ser completa e integralmente compreendido. O método sutra de exposição pode parecer, ao estudante moderno, desnecessariamente obscuro e difícil. Mas, se ele se dedicar ao trabalho requerido para domínio do assunto, compreenderá realmente sua superioridade sobre todos os demais métodos modernos de apresentação, demasiadamente fáceis. A necessidade de lutar com as palavras e as ideias e extrair seus significados ocultos assegura uma assimilação bastante completa do conhecimento e desenvolve, simultaneamente, os poderes e as faculdades da mente, em especial aquela importante e indispensável capacidade de extrair do recôndito da própria mente o conhecimento nele oculto. Embora esse método de exposição seja muito eficaz, apresenta também suas desvantagens. A principal é a dificuldade com que o estudante comum, não completamente familiarizado com o assunto, depara-se para encontrar o significado correto. Não somente é possível que ele considere muitos sutras difíceis de compreender, tendo em vista sua concisão, mas, pode entender de modo completamente equivocado alguns deles, e perder-se de modo irremediável. Lembremo-nos de que, num tratado como o dos yoga-Sutras, por trás de muitas palavras há todo um padrão de reflexão, do qual a palavra é um mero símbolo. Para compreender o verdadeiro significado dos sutras, temos que estar inteiramente familiarizados com tais padrões. A dificuldade aumenta ainda mais, quando as palavras precisam ser traduzidas para um outro idioma que não contém termos e exatamente equivalente. Aqueles que escreveram esses tratados tinham mentes superiores, eram mestres do tema e da linguagem com a qual lidavam. Não poderia haver falhas em seu método de apresentação. Mas, ao longo do tempo, é possível que tenha ocorrido alterações fundamentais no significado das palavras e nos padrões de pensamento daqueles que estudaram esses tratados. E este fato gera infinitas possibilidades de enganos e interpretações errôneas de alguns dos sutras. Em tratados de natureza puramente filosófica ou religiosa, talvez tais equívocos não tivessem tanta importância, mas em um de natureza altamente técnica e prática, como os Yoga-Sutras, podem levar a grandes complicações e, mesmo, sérios perigos. Felizmente, para o estudante sério, o Yoga sempre foi uma ciência viva no Oriente, e que tem contado com uma sucessão ininterrupta de especialistas vivos que continuamente verificam, com base em suas experiências pessoais, as verdades básicas dessa ciência. Isso tem ajudado não somente a manter vivas e puras as tradições da cultura do Yoga. Mas também a preservar os significados das palavras técnicas, utilizadas nessa ciência, numa forma claramente definida e exata. Somente quando uma ciência está divorciada completamente de sua aplicação prática é que ela tende a perder-se num emaranhado de palavras que perderam seu significado e sua relação com os fatos. Ao mesmo tempo em que o método de apresentar um assunto sob a forma de sutras mostra-se perfeitamente adequado ao estudante prático e avançado, não há como negar sua difícil adequação às nossas condições modernas. Nos tempos antigos, aqueles que estudavam esses sutras tinham fácil acesso aos instrutores da ciência, que elaboravam o conhecimento corporificado em uma forma condensada, preenchiam as lacunas e davam orientação prática. Esses estudantes tinham tempo para pensar, meditar e extrair os significados por si mesmos. O estudante moderno, que está interessado apenas no estudo teórico da filosofia do Yoga, e que não a está praticando sob a orientação de um instrutor especializado, não tem nenhuma dessas facilidades, e necessita de uma exposição clara e elaborada para que possa ter uma adequada compreensão do assunto. O estudante precisa de um comentário que não apenas explique o significado óbvio, mas também o significado oculto das palavras e expressões utilizadas. Em termos dos conceitos com os quais está familiarizado e que pode facilmente compreender. Ele deseja seu alimento não sob a forma de “um comprimido”, mas de forma volumosa e, se possível, saborosa. Livro A Ciência do Yoga de I. K. Taimni. Abraço. Davi.

 

domingo, 20 de fevereiro de 2022

A CIÊNCIA DO YOGA - PREFÁCIO DO AUTOR

 

Yoga. Livro A Ciência do Yoga. Autor I. K. Taimni. PREFÁCIO DO AUTOR. Grande número de pensadores, tanto no Oriente quanto no Ocidente, tem genuíno interesse pelo tema Yoga. Isto é natural, porquanto o homem que começa a questionar a vida e seus problemas mais profundos quer algo mais definido e vital para suas necessidades espirituais que uma simples promessa de alegrias celestiais ou “vida eterna”, para quando tiver deixado sua breve e febril vida neste planeta. Aqueles que perderam a fé nos ideais das religiões ortodoxas e, ainda assim, sentem que sua vida não é um fenômeno da natureza, passageiro e sem sentido, naturalmente se voltam para a filosofia do Yoga, em busca de uma solução para as questões ligadas à sua vida “interior”. As pessoas que iniciam o estudo do Yoga com o objetivo de encontrar uma solução mais satisfatória para tais problemas, deparar-se-ão provavelmente com uma séria dificuldade. É possível que considerem a filosofia interessante, e, mesmo, fascinante. Mas demasiadamente envolta em mistério e incoerências para que tenha valor prático em suas vidas. Pois não há assunto mais cercado de mistério e sobre o qual se pode escrever o que se quiser sem risco de ser considerado equivocado. De certo modo, está atmosfera de mistério e obscuridade que cerca o Yoga deve-se à própria natureza do assunto. A filosofia do Yoga trata de alguns dos maiores mistérios da vida e do universo e, assim, é inevitável que esteja associada a uma atmosfera de profundo mistério. Entretanto, muito da obscuridade da literatura do Yoga decorre não da profundidade intrínseca do tema, mas da falta de correlação entre seus ensinamentos e os fatos com os quais se supõe estar o homem de cultura comum familiarizado. Se as doutrinas do Yoga forem estudadas tanto à luz do pensamento antigo quanto do moderno, serão de mais fácil compreensão e apreciação. As descobertas no campo da ciência são de especial ajuda, pois habilitam o estudante a entender alguns fatos da vida do Yoga. Já que há certa analogia entre as leis da vida superior e as da vida como ela existe no plano físico – relacionamento sugerido na conhecidíssima máxima oculta “assim como é em cima, é embaixo”. Alguns instrutores do Yoga têm tentado resolver essa dificuldade extraindo da filosofia e da técnica do Yoga aquelas práticas que são fáceis de ser entendidas e exercitadas, colocando-as ante o público em geral como ensinamentos do Yoga. Muitas dessas práticas, tais como asana, pranayama etc.., são de natureza puramente física e, quando divorciadas dos ensinamentos essenciais e mais elevados do Yoga. Reduzem seus sistemas a uma ciência de cultura física equiparável a outros sistemas de natureza similar. Esta super simplificação do problema da vida física mais saudável, vulgarizou o movimento em prol da cultura do Yoga e produziu uma impressão errada, especialmente no Ocidente, sobre o verdadeiro propósito e técnica do Yoga. O que é necessário, por conseguinte, para a média dos estudantes do Yoga, é uma apresentação inteligível e clara de sua filosofia e de sua técnica, para que se tenha uma ideia correta e equilibrada de todos os seus aspectos em termos do pensamento moderno. Pois, embora seja verdade que muitos aspectos da vida do Yoga estejam além da compreensão daqueles que estão confinados ao domínio do intelecto, a filosofia geral e os amplos aspectos de sua técnica podem ser compreendidos pelo estudante sério que esteja familiarizado com as principais tendências do pensamento filosófico e religioso e preparado para conduzir seu estudo com uma mente aberta e ávida. Ele pode, pelo menos, compreender esta filosofia de tal modo que seja capaz de decidir se vale a pena empreender um estudo mais profundo do assunto e, mais tarde, ingressar no caminho do Yoga como sadhaka. Pois somente quando ingressa no caminho do Yoga prático e começa a efetuar mudanças fundamentais em sua natureza é que ele pode esperar vislumbrar de fato os problemas do Yoga e sua solução. Este livro pretende dar ao estudante sério uma ideia clara sobre os ensinamentos fundamentais do Yoga, em linguagem que ele possa entender. O livro não apresenta o Yoga sob determinado ângulo ou baseado em determinada escola filosófica. Os que o estudarem verão por si mesmos que esta ciência das ciências é demasiadamente abrangente em sua natureza e muito profunda em suas doutrinas, para enquadrar-se em qualquer filosofia, seja antiga ou moderna. Ela preserva sua característica de ciência baseada nas leis eternas da vida superior, sem necessitar que qualquer ciência ou sistema filosófico endosse suas afirmativas. Suas verdades são baseadas em experiências e experimentos de uma linha ininterrupta de místicos, ocultistas, santos e sábios, que as realizaram e as testemunharam através das eras. Embora se tenha tentado explicar os ensinamentos do Yoga em bases racionais, de modo que o estudante possa compreendê-los facilmente, nada se procura fazer para comprová-los no sentido comum. As verdades do Yoga superior não podem ser comprovadas nem demonstradas. Elas se dirigem à intuição e não ao intelecto. Há uma vasta literatura tratando de todos os aspectos e tipos do yoga. Mas é provável que o principiante que tente mergulhar nessa massa caótica sinta aversão pela confusão e pelas exageradas afirmativas que venha a encontrar por toda parte. Em torno de um pequeno núcleo de ensinamentos fundamentais e genuínos do Yoga, cresceu, ao longo de milhares de anos, substancial quantidade de literatura espúria, composta de comentários, exposições de sistemas inferiores de cultura do Yoga e de práticas tântricas. Qualquer estudante inexperiente que adentre esta floresta, provavelmente se sentirá perdido, dela saindo com a impressão de que sua procura do ideal do Yoga poderá resultar em perda de tempo. O estudante, por conseguinte, faria melhor caso se limitasse à literatura básica, a fim de evitar confusão e frustração. Na literatura básica do Yoga, os Yoga-Sutras de Patanjali revelam-se a obra de maior autoridade e a mais útil de todas. Em seus 196 sutras o autor sintetizou o essencial da filosofia e da técnica do Yoga, de maneira a constituir uma maravilhosa exposição condensada e sistemática. O estudante que analisa o livro superficialmente, ou pela primeira vez, talvez o considere um tanto estranho e desordenado, porém um estudo mais cuidadoso e profundo revelará a racionalidade com que é tratada a matéria. O resumo a seguir dá uma ideia de quão racional é a forma de tratar todo o tema. A primeira seção refere-se à natureza geral do Yoga e sua técnica. Ocupa-se realmente em responder à pergunta: “O que é o Yoga”. Dado que samadhi é a técnica essencial do Yoga, é natural que ocupe a posição mais importante entre os vários tópicos tratados na seção. Está seção é, assim, chamada de Samadhi Pada. A primeira parte da segunda seção trata da filosofia de Klesas e tem por objetivo responder à pergunta “por que deveria alguém praticar Yoga?”. Ela analisa magistralmente as condições da vida humana, bem como a miséria e o sofrimento inerentes a tais condições. A filosofia de Klesas tem que ser muito bem entendida por qualquer pessoa, que pretenda seguir o caminho do Yoga com a inflexível determinação de perseverar, vida após vida, até que tenha atingido o fim. A segunda parte da seção II trata das primeiras cinco práticas da técnica do yoga, referidas como bahiranga ou externas. São práticas de natureza preparatória e têm a finalidade de torna o sadhaka apto à prática do samadhi. Como esta seção ocupa-se em habilitar o aspirante, física, mental, emocional e moralmente, à prática do Yoga superior, é chamada de Sadhana Pada. A primeira parte da terceira seção trata das três práticas restantes da técnica do Yoga, referidas como antaranga ou internas. É através dessas práticas, que culminam em samadhi, que todos os mistérios da vida do Yoga são desvendados e os poderes ou siddhis, são adquiridos. Na segunda parte desta seção são discutidas em detalhes estas realizações e a seção é, assim, chamada Vbhuti Pada. Na quarta e última seção são expostos todos aqueles problemas filosóficos essenciais envolvidos no estudo e na prática do Yoga. A natureza da mente e a percepção mental, do desejo e seus efeitos aprisionadores, da liberação e os resultados que lhe seguem, são todos tratados de forma resumida. Mas sistematicamente, de modo que o estudante tenha uma base adequada de conhecimento teórico. Como todos esses tópicos estão ligados de um modo ou de outro com a conquista de kaivalya, a seção tem o título de kaivalya pada. Em virtude de seu tratamento abrangente e sistemático do assunto, os Yoga-Sutras constituem o livro mais adequado a um profundo e sistemático estudo do yoga. Nos velhos tempos, todos os estudantes do yoga eram preparados para memorizar e meditar de forma regular e profunda sobre os sutras, para deles extrair seus significados ocultos. Mas o estudante moderno, que precisa, primeiramente, ser convencido de que o estudo e a prática do Yoga valem a pena. Requer um tratamento mais detalhado e sofisticado do assunto, o qual lhe permita compreender sua filosofia como um todo. Mesmo para este propósito os Yoga-Sutras são a base mais adequada, não somente por oferecerem todas as informações essenciais sobre o Yoga de maneira magistral. Mas também por serem reconhecidos como uma obra-prima na literatura do Yoga e, como tal, resistir ao teste do tempo e da experiência. Eis a razão de constituírem a base deste livro. A tarefa de quem se dedica a comentar um livro como os Yoga Sutras não é fácil. Trata-se de um assunto da mais profunda natureza. As ideias que precisa interpretar são expostas sob a forma de sutras, que corporificam o máximo da arte da condensação. A linguagem em que os sutras são escritos é antiga, e, embora de extraordinária eficácia na expressão de ideias filosóficas, pode implicar enorme variedade de intepretações. E, o que é mais importante, o autor está lidando com uma ciência relacionada a fatos ligados a experiência humana. Ele não pode, como o filósofo acadêmico, dar asas à sua imaginação e adiantar meramente uma interpretação ideal. Ele tem que apresentar as coisas, da melhor maneira possível, como realmente são e não como deveriam ou poderiam ser. Tendo em vista a possibilidade de alterações que sempre acontecem nas conotações das palavras, no decorrer do tempo, é extremamente arriscado interpretar os sutras de modo rígido, literal. É, claro que não se pode tomar liberdades com um livro como os Yoga-Sutras, escrito por uma mente magistral, em linguagem considerada quase perfeita. Mas uma coisa é interpretar um sutra de maneira livre e descuidada, outra é expor seu significado com o devido respeito aos fatos da experiência e às reconhecidas tradições das várias épocas. O sensato, portanto, é levar em consideração todos os fatores envolvidos, em especial, explicações que nada explicam. Outra dificuldade, ao escrever-se um comentário em um idioma Ocidental, é a impossibilidade de encontrar equivalentes exatos para muitas palavras sânscritas. Como a ciência do Yoga floresceu principalmente n Oriente e o interesse pelo Yoga no Ocidente é de origem recente. Não é possível encontrar equivalentes para muitas palavras sânscritas que exprimem conceitos filosóficos bem definidos. Em muitos casos, os termos disponíveis, com significados aproximados, podem dar uma impressão totalmente errada. Para evitar esse perigo, as palavras sânscritas foram usadas livremente no comentário, sempre que não tenha sido possível obter um equivalente exato. Contudo, para facilitar um cuidadoso estudo do assunto, não somente é dado o texto em sânscrito, em cada sutra, mas também os significados das palavras sânscritas nele utilizadas. Por certo, conforme dito acima, não se dispõe dos exatos equivalentes de muitas palavras sânscritas. Em tais casos, são apresentados somente os significados exatos dos termos contidos no comentário que acompanha o sutra. Tal procedimento habilitará o estudante a julgar por si mesmo o quanto a intepretação está de acordo com o significado literal das palavras utilizadas no sutra e, se houver alguma divergência, até onde esta se justifica. Mas, é claro, a justificativa final de qualquer interpretação é sua conformidade com os fatos da experiência, e, se este tipo de verificação não se tornar possível, devem o bom senso e a razão servir de guia. Aquele que procura a verdade deve ater-se especialmente aos fatos e à verdade subjacente nos vários sutras. E não se envolver em controvérsias sobre o significado das palavras. Que esse passatempo seja deixado aos meros eruditos. Um cuidadoso estudo dos Yoga-Sutras e o tipo de preparação e esforço necessários à realização do objetivo do empreendimento do Yoga podem dar ao estudante a impressão de uma tarefa extremamente difícil, se não impossível, superior à capacidade do aspirante comum. Essa impressão certamente o desencorajará e, se ele não refletir profundamente sobre os problemas da vida e clarear suas ideias a este respeito, será levado a abandonar a ideia de empreender a Divina Aventura ou postergá-la para uma vida futura. Não pode haver dúvida de que a séria persecução do ideal do Yoga é uma tarefa difícil, e não pode ser assumida como mero lazer, ou como um meio de escapar às tensões e pressões da vida comum. Pode ser empreendida somente a partir de um pleno entendimento da natureza da vida humana. Da miséria e do sofrimento que lhes são inerentes, e de uma compreensão de que o meio de acabar permanentemente com a miséria e como sofrimento é encontrar a verdade que está guardada em nosso íntimo, através do único método disponível – a disciplina do Yoga. Sem dúvida, a consecução deste objetivo é algo que requer muito tempo e o aspirante tem que estar preparado para despender certo número de vidas – tantas quantas necessárias – em sua procura séria e de todo coração. Ninguém pode saber, no princípio, quais são suas potencialidades e de quanto tempo necessitará. Pode esperar o melhor, mas é bom estar preparado para o pior. Aqueles que não se sentem prontos a enfrentar essa tarefa não são forçados a tentá-la imediatamente. Podem continuar o estudo teórico do Yoga, refletir constantemente sobre os mais profundos problemas da vida. Tentar purificar suas mentes e fortalecer seu caráter, até que sua capacidade de discernimento, torne-se suficientemente forte que lhes possibilite penetrar as ilusões comuns e ver a vida em sua crua realidade. De fato, este é o propósito do Kriya-Yoga, a que Patanjali refere-se no começo da seção II. Quando os olhos interiores do verdadeiro discernimento começam a se abrir, como resultado da prática do Kriya-Yoga, deixarão de cogitar se são bastante fortes para empreender esta longa e difícil jornada em direção a seus verdadeiros lares. Aí, então, nada poderá detê-lo e eles se devotarão natural e de todo o coração a essa difícil, mas sagrada tarefa. O que importa é partir definitivamente, de algum lugar, o mais cedo possível – agora. No momento em que se dá esta partida, forças começam a juntar-se em torno do eixo do empreendimento e impelem o aspirante para a sua meta, lentamente, a princípio. Mas com velocidade crescente, até que ele esteja tão absoluto na persecução de seu ideal que o tempo e a distância deixam de importar-lhe. E, um dia, ele descobre que atingiu seu objetivo, e olha para trás com uma espécie de admiração. Para a longa e tediosa viagem que completou no reino do tempo, embora durante todo o tempo ele estivesse vivendo no eterno. Livro A Ciência do Yoga. Escrito por I.K. Taimni. Abraço. Davi.

 

 

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

O MUNDO DOS ORIXÁS - OBÁ

 

Religião Afrodescendente. Candomble. www.ocandomble.com. O MUNDO DOS ORIXÁS – OBÁ. A missão divina da Mãe Terra (Edan – Onile). Quando a divina e poderosa mãe Edán (Onile Ogboduora) fez sua aparição nesta Terra, ela fez isso com um propósito específico e sagrado. Sua manifestação nesta Terra sinalizou uma nova oportunidade para a humanidade se renovar, progredir e ter uma vida equilibrada. Sua aparição marcou um novo começo para toda a humanidade e não apenas o povo privilegiado dos yorùbá. Seu objetivo e propósito era, e é, de alcance universal. Èdán veio para trazer cura, ordem, harmonia, abrigando preceitos divinos e equilíbrio para as comunidades da Terra em geral e cada ser humano em particular. Você deve se lembrar e ter em mente que Èdán não é um ser humano. Èdán não é yorùbá, chinês, americano, oriental ou ocidental. Èdán é uma personagem divina de habilidades extraordinárias e poderes supra-humanos. Èdán não é deste mundo. Ela vem de um reino glorioso e inconcebível de santidade, beleza e poder. A inteligência, compreensão, força, atratividade e carisma da mãe divina Èdán é extraordinária, penetrante e excepcional. Èdán pode ver a profundidade e a realidade das coisas. Ela não pode ser enganada, manipulada ou subornada, ela não comete erros na administração de sua dispensação (ato de dividir). Ela está além do alcance da influência humana. Ela nunca cairá ou balançará à mesquinhez e a inconstância, que é comum entre a humanidade. Sua visão divina nunca é obstruída e sua atividade não pode ser prejudicada. Sua virtude, caráter, personalidade e carisma são sem igual. Mesmo Ọrúnmìlà reconheceu sua grandeza, eficiência, capacidade e singularidade. Foi, afinal, Ọrúnmìlà quem invocou Èdán, sua amiga e sócia divina para apoio, soluções e alívio! Quando Èdán desceu do reino dos Irunmọlẹ a esta Terra, ela apareceu com a plenitude da autoridade divina, poder e comando. Todos Ajogùn interno, externo e Elénìní fugiram diante dela. Com o poder de sua majestosa personalidade, divinamente atraente, beleza, carisma e àşé ela foi capaz de libertar e entregar os corações e as mentes dos pensamentos negativos, atitudes e energias prejudiciais que oprimiam e dominavam os seres humanos. Èdán foi capaz de desarmar as pessoas de suas preocupações, medos e inseguranças. Para aqueles que faziam, que se deliciavam em fazer o errado, o engano, a opressão e a corrupção ela colocava medo nos seus corações para que talvez eles pudessem mudar suas maneiras sob sua administração do perdão, da ordem, da capacitação e da renovação. Tais era, e é, o poder e a influência da mãe divina Èdán. Juntamente com o inseparável, a importação do ase aos membros sensíveis da humanidade, ela deu preceitos e injunções divinas para seus alunos-discípulos para praticar e implementarem em todos os níveis da sociedade e da vida pessoal. Estes seguidores obedientes e confiáveis ​​de Èdán são os Ogboni porque só existe sabedoria, saúde e longa vida com Èdán se as pessoas obedecerem e praticarem seus preceitos. Do lado de fora uma pessoa constituiria um Ogberi (ignorante) porque aparentemente tinha conhecimento e não praticava a verdade, o que é isso, se não o maior ignorância, infelicidade e loucura. Os princípios divinos de Èdán tornaram-se os veículos de sua divina presença, carisma, poder, apoio e influência-retificando a cura. Ter vivido na época do aparecimento de Èdán sobre esta Terra sagrada foi a experiência mais extraordinária, gratificante e maravilhosa. Isto é, a forma divinamente sancionada, a vida que ela estava revelando à humanidade e continua revelando à humanidade. O teimoso, obstinado e beligerante que não fizer, não vai durar muito tempo sob a administração de Èdán. Èdán é naturalmente amável, justa e compreensiva, como a Sagrada Mãe preciosa e amável que ela é, ela proporcionou a todos o perdão, um novo começo sem referência a erros do passado, uma oportunidade para mudar e a bênção para fazer uso de seu apoio pessoal, garantia, inspiração e poder. Èdán está ciente de nossas fragilidades e fraquezas como seres humanos. Ninguém precisa ter medo por causa de suas fraquezas ou falhas. Èdán não pareceu para fazer-nos ricos e famosos. Èdán apareceu para nos fazer participantes da verdadeira vida, saúde, paz, segurança e prosperidade através da prática de seus ensinamentos claros. Èdán apareceu para nos permitir descobrir a nossa nobre e bela natureza divina. Ela veio para restaurar a dignidade, clareza, transparência, saúde moral e limpeza moral de nossas vidas. Èdán inculca a verdade divina para seus seguidores inteligentes e humildes, quando estamos individual e coletivamente para a direita e para dentro, em seguida, nesta ordem interna, a saúde e a retidão serão reveladas e expressas no mundo. As instruções de Èdán não foram e não são sugestões, mas comandos divinamente concedidos e leis. Eles são vinculativos e obrigatórios para toda a humanidade e especialmente para aqueles que se dedicam a Èdán. Para ser Ogboni significa ser o melhor dos melhores. Significa ser um modelo de impecabilidade, idoneidade e confiabilidade. Para ser Ogboni significa estar pessoalmente convencido a perseguir e fazer o que é certo, correto e adequado independentemente de tempos, lugares e / ou circunstâncias. Para ser Ogboni significa ter auto iniciativa, ser responsável e fazer o que é certo para o bem do amor da verdade e não ser visto, elogiado e aplaudido por outros. Iniciação formal sozinha não faz de você um seguidor de Èdán. O que é importante não é que outras pessoas te chamem de Ogboni, mas que Èdán te reconhece e o aceita como um dos seus verdadeiros, leais e obedientes filhos. O que é importante é que você seja Ogboni 24 horas por dia em seus pensamentos, atitudes, ações e relacionamentos. Ogboni é uma forma global e abrangente de viver. Uma delas é ser Ogboni o tempo todo para que Èdán, ela mesma, possa garantir que você é um Ogboni genuíno, verdadeiro, com honra, humildade, alegria e realização digna. Os ritos de iniciação Ogboni foram desenvolvidos mais tarde por Èdán e seus seguidores, mas, inicialmente, a verdadeira iniciação era uma mudança espiritual de coração, mente e vida como um resultado do encontro com Èdán, sua personalidade, seu caráter, seu carisma, encantamento, inspiração, autoridade e poder, tudo foi expresso e manifestado através de tudo que Èdán fez. Tudo que Èdán fez foi cheio de graciosidade, dignidade e poder. Não foi através de ritos e rituais que Èdán mudou o mundo, mas pela graça divina, pelas maneiras, inteligência e conduta. Èdán por suas maneiras, caráter, personalidade e conduta comandou o respeito, reverência, confiança e obediência de todos aqueles com coração sincero e bom. O verdadeiro símbolo de honra e título de um Ogboni autêntica o caráter, a virtude, a bondade e a imparcialidade que ele pratica. Conformidade exterior e aderência superficial com o protocolo Ogboni para o bem das pessoas não faz de você um Ogboni, não importa o seu título ou o quanto você está velho. Èdán deu seu amor, vida e foco total e dedicação à humanidade. Para ser Ogboni você tem que dar o seu tudo para a missão divina de Èdán e você deve procurar com sua força, habilidade, atividade e meios transferir o conhecimento de Èdán a todos os povos do mundo. Isto é o que é significa ser Ogboni. Ogboni não é uma instituição humana. Ogboni não é um negócio. Ogboni não é um clube. Ogboni é uma vocação divina e sagrada. Èdán era uma revolucionária espiritual, divina, missionária, diplomática e embaixadora da boa vontade e da esperança. Nós também devemos ser isso. Devemos buscar a propagação do Ogbonismo. Não os chamados clubes Ogboni e instituições formais, devemos propagar a verdade e a realidade que Èdán promoveu e instituiu para toda a humanidade. A humildade e o serviço vêm antes da honra, do orgulho, da presunção. Èdán diz que a indiferença precede a queda. Ancestral Pride Temple. Templo Orgulho Ancestral. ORIXÁ OBÁ. Os orixás são deuses africanos que correspondem a pontos de força da Natureza e os seus arquétipos estão relacionados às manifestações dessas forças. As características de cada Orixá, aproxima-os dos seres humanos, pois eles manifestam-se através de emoções como nós. Sentem raiva, ciúmes, amam em excesso, são passionais. Cada orixá tem ainda o seu sistema simbólico particular, composto de cores, comidas, cantigas, rezas, ambientes, espaços físicos e até horários. Como resultado do sincretismo que se deu durante o período da escravatura, cada orixá foi também associado a um santo católico, devido à imposição do catolicismo aos negros. Para manterem os seus deuses vivos, viram-se obrigados a disfarçá-los na roupagem dos santos católicos, aos quais cultuavam apenas aparentemente. Estes deuses da Natureza são divididos em 4 elementos – Água, Terra, Fogo e Ar. Alguns estudiosos ainda vão mais longe e afirmam que são 400 o número de Orixás básicos divididos em 100 do Fogo, 100 da Terra, 100 do Ar e 100 da Água, enquanto que, na Astrologia, são 3 do Fogo, 3 da Terra, 3 do Ar e 3 da Água. Porém os tipos mais conhecidos entre nós formam um grupo de 16 deuses. Eles também estão associados à corrente energética de alguma força da natureza. Assim, Iansã é a dona dos ventos, Oxum é a mãe da água doce, Xangô domina raios e trovões, e outras analogias. No Candomblé cultuam-se muitos outros orixás, desconhecidos por leigos, por serem menos populares do que Xangô, Iansã, Oxossi e outros, mas com um significado muito forte para os adeptos dos cultos afro-brasileiros. Alguns são necessariamente cultuados, devido à ligação com trabalhos específicos que regem, para a saúde, morte, prosperidade e diversos assuntos que afligem o dia-a-dia das pessoas. Estes deuses africanos são considerados intermediários entre os homens e Deus, e por possuírem emoções tão próximas dos seres humanos, conseguem reconhecer os nossos caprichos, os nossos amores, os nossos desejos. É muito frequente dizer-se que as personalidades dos seus filhos são consequência dos orixás que regem as suas cabeças, desenvolvendo características iguais às destes deuses africanos. Apresento a seguir as descrições dos 16 Orixás mais cultuados. Recordo, no entanto, que existem diversas correntes no Candomblé e por essa razão as informações poderão ser diferentes de acordo com a tradição ou região. ORIXÁ OBÁ. Dia: Quarta-feira. Cores: Marron raiado, Vermelho e Amarelo. Símbolos: Ofange (espada) e Escudo de Cobre, Ofá (arco e flecha). Elementos: Fogo e Águas Revoltas. Domínios: Amor e Sucesso Profissional. Saudação: Obà Siré! Obá é um Orixá ligado à água, guerreira e pouco feminina. As suas roupas são vermelhas e brancas, usa um escudo, uma espada e uma coroa de cobre. O tipo psicológico dos filhos de OBA, constitui o estereotipo da mulher de forte temperamento, terrivelmente possessiva e carente, é mulher de um homem só, fiel e sofrida. São combativas, impetuosas e vingativas. Obá é um ORIXÁ que raramente se manifesta e há pouco estudo sobre ela. Obá é a mulher consciente do seu poder, que luta e reivindica os seus direitos, que enfrenta qualquer homem – menos aquele que tomar o seu coração. Ela abraça qualquer causa, mas rende-se a uma paixão. Obá é a mulher que se anula quando ama. Obá filha de Iemanjá e Oxalá. Em toda a África Obá era cultuada como a grande deusa protetora do poder feminino, por isso também é saudada como Iyá Agbá, e mantém estreitas relações com as Iya Mi. Era uma mulher forte, que comandava as demais e desafiava o poder masculino. Embora Obá se tenha transformado num rio, é uma deusa relacionada ao fogo. Obá é saudada como o Orixá do ciúme, mas não se pode esquecer que o ciúme é o corolário inevitável do amor, portanto, Obá é um Orixá do amor, das paixões, com todos os dissabores e sofrimentos que o sentimento pode acarretar. Obá tem ciúme porque ama. O lado esquerdo (Osì) sempre esteve relacionado à mulher e, por uma razão muito elementar, é o lado do coração. Quando Obá é saudada como guardiã da esquerda, isso quer dizer que é a guardiã de todas as mulheres, aquela que compreende os sentimentos do coração, pois Obá pensa com o coração, por isso dança sempre com a mãe esquerda apontando para o lado esquerdo na altura da orelha, poder genitor feminino, rainha em África da sociedade Elecô, onde homem não entra, as grandes amazonas de Oba. Oba não conhece a cabeça de homem. Ligadas a Oxóssi pela caça e grande arqueira, ligada a Xangô através do fogo a luta pela vida. Como pode uma deusa ligada a esses sentimentos, dedicar-se à guerra? Toda a energia das suas paixões frustradas é canalizada por ela para a guerra, tornando-se a guerreira mais valente, que nenhum homem ousa enfrentar. Obá supera a angústia de viver sem ser amada. Obá troca um palácio por uma cabana, troca todas as riquezas do mundo por uma frase: “Eu te amo”. Características dos filhos de Obá. Os filhos de Obá não têm muito jeito para se comunicar com as pessoas, chegam a ser duros e inflexíveis. Têm dificuldade em ser gentis e estabelecer um canal de comunicação afetiva com os outros; às vezes são brutos e rudes afastando as pessoas. Isso deve-se ao fato de os filhos de Obá, na maioria das vezes, sofrerem um certo complexo de inferioridade achando que as pessoas que se aproximam querem tirar partido de alguma coisa. De facto, isso tende a acontecer com os filhos de Obá. A sua sinceridade chega a ferir; expressam as suas opiniões, fazem críticas e acabam por magoar as pessoas, pois não se preocupam em ser agradáveis. Mas essa agressividade é puramente defensiva. São bons companheiros e amigos fiéis, são ciumentos e possessivos no amor, por isso não têm muita sorte. Quando apaixonados, nunca são senhores da relação, cedem em tudo, abdicam de todas as suas convicções. Algumas vezes infelizes no amor, investem todas as suas cartas nas suas carreiras e, de entre as mulheres que se destacam profissionalmente numa sociedade machista, podem-se encontrar muitas filhas de Obá excelentes juizas, advogadas, comandando quartéis, etc. Muitas vezes despertam a inveja dos seus inimigos e podem sofrer algumas emboscadas, por isso devem vencer a tendência que possuem para a ingenuidade. www.ocandomble.com. Abraço. Davi