sexta-feira, 29 de junho de 2018

III. A MULHER NO ISLAM - MITO E REALIDADE.


Islamismo. www.ccib.org.br. Texto de Yusuf al-Qaradawi. III. A MULHER NO ISLAM – MITO E REALIDADE. A VOZ DA MULHER NO ISLAM. Muitos muçulmanos adotaram a ética judaico-cristã, que vê a mulher como fonte da tragédia humana por causa de seu papel bíblico de sedutora, que levou Adão a desobedecer ao seu Senhor. Ao convencer seu marido a comer do fruto proibido, ela não só desafiou Allah como também causou a expulsão da humanidade do Paraíso, determinando, assim, todo o sofrimento temporal humano. Aqueles que defendem este mito bíblico, se apoiam em arquivos da literatura pseudo islâmica, como, por exemplo, alguns ahadith falsos ou fracos. Este mito do Velho Testamento é uma crença largamente difundida na comunidade islâmica, apesar de Allah salientar no Alcorão que Adão foi o único responsável por seu erro. "Havíamos firmado o pacto com Adão, porém, ele esqueceu-se dele; e não vimos nele firme resolução" (Alcorão 20:115). "E ambos comeram (os frutos) da árvore, (...). Adão desobedeceu a seu Senhor e foi seduzido. Mas logo o seu Senhor o elegeu, absolvendo-o e encaminhando-o." (Alcorão 20:121-122). Portanto, não há nada na doutrina islâmica ou no Alcorão que considere a mulher como responsável pela expulsão de Adão do Paraíso ou pela miséria da humanidade. Contudo, a misoginia prolifera nos pronunciamentos de muitos "sábios" e "imams" islâmicos. Como resultado dessa má interpretação de ahadith, sociedades inteiras têm maltratado seus membros femininos não obstante o fato de o Islam ter dignificado e fortalecido a mulher em todas as esferas da vida. A mulher na lei islâmica é igual ao homem. Ela é tão responsável por seus atos como o homem o é. Seu testemunho é solicitado e valido na corte. Suas opiniões são buscadas e seguidas. Diferentemente do pseudo hadith que diz "Consultem as mulheres e façam o oposto", o Profeta (sas) consultou sua esposa, Um Salama, sobre uma das mais importantes questões para a comunidade muçulmana. As referências às atitudes positivas do Profeta em relação às mulheres desacreditam o hadith, erroneamente atribuído a Ali bin Abu Talib: "A mulher é toda um mal e o seu maior mal é que o homem não faz nada sem ela". A divulgação de tal negatividade contra a mulher levou muitos "sábios" e "imams" a fazer regras inconsistentes sobre a fala das mulheres. Afirmam que a mulher deve baixar sua voz, ou mesmo silenciar, exceto quando falar com seu marido, seu guardião ou outras mulheres. Para alguns, o simples ato de se comunicar transformou a mulher em fonte de tentação e fascinação do homem. No entanto, o Alcorão menciona, especificamente, que aqueles que buscavam informação das esposas do Profeta podiam fazê-lo, desde que atendidas determinadas condições. "(...) E se desejardes perguntar algo a elas (suas esposas), fazei-o detrás de cortinas." (Alcorão 33:53) Na medida em que perguntas exigem respostas, as Mães dos crentes ofereciam fatwas àqueles que perguntavam e narravam ahadith a todo aquele que desejasse transmiti-los. Além do mais, as mulheres estavam acostumadas a questionar o Profeta (sas) mesmo na presença dos homens. Nem elas ficavam constrangidas por se fazerem ouvir nem o Profeta as impedia de indagar. Mesmo no caso de Omar, quando ele foi desafiado por uma mulher durante o seu sermão no minbar, ele não retrucou, pelo contrário, admitiu que ela estava certa e ele errado e disse: "Todo mundo é mais instruído do que Omar." Um outro exemplo alcorânico de uma mulher falando em público é o mencionado no versículo 28:23. Além desse, o Alcorão relata a conversa entre Salomão e a Rainha de Sabá, assim como entre ela e seus subordinados. Todos esses exemplos demonstram que as mulheres podem expressar suas opiniões publicamente porque o que quer que tenha sido prescrito a elas antes de nós está prescrito para nós, a não ser que seja unanimemente rejeitado pela doutrina islâmica. Portanto, a única proibição é a mulher se comportar de modo a se insinuar ou tentar o homem. Isto está expresso no Alcorão, onde Allah diz: "Ó esposas do Profeta, vós não sois como as outras mulheres; se sois tementes, não sejais insinuantes na conversação, para evitardes a cobiça daquele que possui morbidez no coração, e falai o que é justo." (Alcorão 33:32) Assim, o que é proibido é o falar insinuante que induz aqueles que têm os corações doentes a se comportarem de forma inadequada. Mas, isto não quer dizer que toda conversa com as mulheres seja proibida, porque Allah completa o versículo "(...) mas falai o que é justo." (Alcorão 33:32). Buscar desculpas para silenciar as mulheres é apenas uma das injustiças que certos sábios e imams tentam impor às mulheres. Eles assinalam que tais ahadith foram narrados por Bukhari sobre o Profeta, que diz: "As mulheres são o perigo maior que deixei para os homens." Eles afirmam que esse perigo quer dizer que as mulheres são uma maldição a ser tolerada da mesma forma que a pobreza, a fome, a doença, a morte e o medo. Esses "sábios" ignoram o fato de que o homem é testado mais por suas bênçãos do que por suas tragédias. E Allah diz: "(...) e vos provaremos com o mal e com o bem." (Alcorão 21:35) Em apoio a este argumento Allah diz no Alcorão que as duas maiores bênçãos da vida, riqueza e filhos, são provas. "E sabei que tanto vossos bens como vossos filhos são para vos pôr à prova" (Alcorão 8:28) Umas mulheres, não obstante as bênçãos que ela espalha em seu ambiente, também pode ser uma prova, posto que ela pode desviar um homem de sua obrigação para com Allah. Assim, Allah cria a consciência de como as bênçãos podem ser extraviadas a ponto de se tornarem maldições. Os homens podem usar suas esposas como uma desculpa para não cumprir a jihad ou para fugir do sacrifício de produzir riqueza. No Alcorão Allah avisa: "Ó fiéis, em verdade, tendes adversários entre as vossas mulheres e os vossos filhos" (Alcorão 64:14) A advertência é a mesma para aqueles abençoados com riqueza e descendência abundantes (63:9). Além disso, o hadith diz: "Por Deus não receio a pobreza para vós, mas sim que o mundo vos seja abundante como o foi para aqueles antes de vós e assim que luteis pela abundância da mesma forma que aqueles antes de vós lutaram e assim que sejais destruídos assim como eles foram destruídos." Este hadith não quer dizer que o Profeta encorajasse a pobreza. A pobreza é uma maldição contra a qual o Profeta buscava refúgio em Allah. Ele não pretendia que sua Ummah se privasse da riqueza e da abundância- "O melhor da boa riqueza é para o justo." As mulheres também são um presente para o justo, porque o Alcorão diz que o muçulmano e a muçulmana, o crente e a crente, são ajuda e conforto um para o outro, aqui e no além. O Profeta não condenou as bênçãos que Allah propiciou para a sua Ummah. Antes pelo contrário, ele desejava afastar os muçulmanos e a sua Ummah dos caminhos escorregadios, cujo fosso insondável é uma lama de crueldade e desejo. MULHERES QUE FIZERAM HISTÓRIA NO ISLAM.  Khadija bint Khuwaili (555-620).  Fatimah Bint Muhammad (604-632).  Aishah Bint Abu Bakr (605-678). Umm Salamah (580-608). Zaynab al-Ghazali (1917-2005). O Islam, hoje, é uma grande força no mundo. Mas, houve um tempo em que, quando ele ainda engatinhava, precisou de proteção contra os ventos da idolatria e do politeísmo. Os muçulmanos não podem se esquecer de uma figura importante na construção dos alicerces do Islam: Khadija bint Khuwaili. Khadija foi testemunha ocular do nascimento do Islam. Foi em sua casa que o Islam foi sendo esculpido e moldado. Foi a partir de sua casa que o Islam "alçou voo". Sua casa foi o lar do Alcorão, o Livro de Deus e código religioso e político do Islam. Durante 10 anos as mensagens foram sendo trazidas pelo anjo Gabriel e Khadija foi quem mais colecionou essas primeiras revelações vindas de Deus. Ela foi a primeira esposa do último dos profetas de Deus. Ela foi a primeira crente. Foi ela o primeiro ser humano a declarar que o Criador era Um e que Mohammad era Seu profeta. Ela foi a companheira constante de Mohammad. Até a sua morte, Mohammad dedicou exclusivamente a Khadija todo o seu amor, afeto e amizade. Ela foi a primeira pessoa a oferecer preces a Deus juntamente com seu marido. Afif Al-Kanadi relatou: "Cheguei a Macca durante os dias de ignorância e queria vender algumas roupas e perfumes em nome de minha família. Fui até Al-Abbas b. 'Abdul-Mutalib." Ele conta: "Enquanto estava em sua casa, olhei para a Caaba. O sol saiu quando um homem chegou, até aproximar da Caaba. Então ele levantou sua cabeça para o céu e olhou para a Caaba. Então, um jovem chegou e ficou à sua direita. Não levou muito tempo e uma mulher chegou e ficou atrás deles. Então o homem se curvou e o jovem e a mulher se curvaram. Então o homem levantou sua cabeça e o jovem e a mulher fizeram o mesmo. Então o homem se prostrou e o jovem e a mulher se prostraram também." Ele continuou: "Então, eu disse: 'Ó Abbas! Na verdade, vejo um grande homem.' E Abbas disse: 'Sabe quem é aquele homem?' Eu respondi: 'Não, não sei.' Ele disse: 'É Mohammad b.'Abdullah b.'Abdul-Mutalib, meu sobrinho. Sabe quem é aquela mulher?' Eu disse: 'Não sei.' Ele disse: 'Aquela é Khadija bint Khuwaylid, a esposa do meu sobrinho. Este meu sobrinho que você vê nos contou que seu Senhor é o Senhor dos céus e da terra e que Ele lhe ordenou esta religião que ele está seguindo. Juro por Allah que não conheço ninguém mais sobre a face da terra que esteja seguindo esta religião além daqueles três.' E Afif disse: “Gostaria de ser o quarto.”  Quando Mohammad proclamou sua missão como o mensageiro de Deus e disse aos árabes para não adorarem ídolos e os convocou para se unirem em torno da bandeira do Tauheed, uma onda de infortúnios se abateu sobre ele. Os politeístas quiseram beber seu sangue. Inventaram novas e engenhosas formas de atormentá-lo e fizeram inúmeras tentativas para sufocar sua voz para sempre. Naqueles tempos de tristeza e tensão, Khadija nunca lhe faltou. Foi somente por causa dela e de Abu Talib que os politeístas não conseguiram destruir o trabalho de pregação e divulgação do Islam. Desta forma, é dela a mais importante contribuição para a sobrevivência do Islam. Khadija criou os padrões básicos que traduzem a paz, harmonia, felicidade e satisfação domésticas e os aplicou em sua própria vida. Ela demonstrou que a chave para a felicidade familiar é a proximidade entre seus membros. Ela mostrou os direitos e deveres de maridos e esposas. O modelo criado por ela tornou-se um "esquema" de vida familiar para o Islam. Mohammad e Khadija ficaram juntos por 25 anos e durante esses anos formularam as "leis" que tornam um casamento bem-sucedido e a vida mais feliz. Desde então, mesmo que em termos temporais, o resto do mundo jamais foi capaz de encontrar regras de convivência melhores. Khadija transformou em realidade as abstrações do idealismo. Sua vida com Mohammad é uma prova concreta deste fato. O que ela deu ao mundo não foi apenas um conjunto de princípios ou ideias teóricas, mas toda uma experiência, rica em momentos de puros encantamentos com o Islam e de um amor penetrante por Deus e Seu Mensageiro. Os árabes pagãos tinham um sentido de honra distorcido. Era esse "sentimento de honra" que os levava a matar suas filhas. O Islam, é claro, pôs um fim a essa prática bárbara, transformando-a em pecado contra Deus e em crime contra a humanidade. Além de acabar com o infanticídio feminino, o Islam também concedeu dignidade, honra e direitos a todas as mulheres, garantindo esses direitos. Deus quis demonstrar que as leis do Islam eram todas praticáveis. Para demonstrar a praticabilidade dessas leis e mostrar esse "Projeto de Vida" islâmico, Ele escolheu a casa de seus servos Mohammad e Khadija. Sem Khadija, as leis do Islam teriam permanecido sem sentido. Na verdade, é até possível que Mohammad não pudesse promulgar aquelas leis sem ela. Uma das grandes bênçãos que Mohammad e Khadija receberam de Deus foi sua filha, Fatima Zahra. Ela nasceu após a morte de seus irmãos, Qasim e Abdullah. Ela tinha apenas 11 anos quando sua mãe morreu e Mohammad se transformou em pai e mãe para ela. Foi educando sua filha que o Mensageiro de Deus demonstrou a aplicabilidade das leis do Islam. Uma vez que ele é o modelo para todos os muçulmanos, eles devem imitá-lo em todos os seus atos. Ele dedicou um amor extremado e mostrou o maior respeito por sua filha. Tanto em Meca como em Medina, muitas pessoas importantes, líderes de tribos poderosas, vinham ver o Mensageiro de Deus. Ele jamais se levantava do chão para cumprimentá-los. Mas se ele sabia que sua filha Fatima estava chegando para vê-lo, ele corria para cumprimentá-la, acompanhava-a e lhe dava o lugar de honra para se sentar. Jamais ele mostrou tanta estima e respeito por qualquer um em toda a sua vida - homem ou mulher. É inegável que o Islam significa a prática da casa de Khadija e sem dúvida o Alcorão foi o "dialeto" de sua família. Sua filha Fatima, e seus netos Hasan e Husain, cresceram falando o Alcorão. Não existem palavras adequadas que possam expressar os méritos de Khadija. Mas Deus prometeu sua recompensa aos Seus servos amados, como Khadija, nos seguintes versículos de Seu livro: "Por outra, os fiéis, que praticam o bem, são as melhores criaturas, cuja recompensa está em seu Senhor: Jardins do Éden, abaixo dos quais correm os rios, onde morarão eternamente. Deus se comprazerá com eles e eles se comprazerão n'Ele. Isto acontecerá com quem teme o seu Senhor." (Alcorão 98:7-8). O Mensageiro de Deus honrava e estimava Khadija. Jamais discordou dela antes de receber a revelação. Mesmo após a sua morte, ele sempre se lembrar dela e não se cansava de exaltá-la. Certa vez, Aisha enciumada, disse ao Profeta: "Na verdade, Deus não lhe deu nada melhor do que uma velha." O Profeta se irritou e disse: "Não, por Deus, juro que Allah jamais me concedeu nada melhor do que ela. Ela foi a esposa que acreditou em mim quando ninguém acreditava. Ela confirmou minha honestidade quando todos me acusavam de mentiroso. Ela me sustentou quando todos me despojaram. Através dela, Allah me concedeu os filhos que nenhuma outra mulher me deu." O Profeta estava tão irritado que sua testa tremia e então eu disse para mim mesma: "O Deus, se a raiva do Profeta se aplacar nunca mais repetirei o que disse." E Aisha também disse: "Nunca tive ciúmes das outras esposas do Profeta como tive de Khadija. Eu não a conheci mas o Profeta costumava se lembrar sempre dela. Quando ele sacrificava um carneiro, era comum ele cortar algumas partes e mandar para os amigos de Khadija. Algumas vezes eu dizia a ele: “É como se não houvesse outra mulher no mundo além de Khadija.' E ele respondia: 'Como posso esquecê-la? Ela me deu os filhos mais amados." Aisha (605-678) também disse: "O Mensageiro de Deus quase sempre antes de deixar a casa citava Khadija e a louvava." Khadija, a Mãe dos Crentes, morreu ajudando o Mensageiro de Deus a transmitir o chamado do Islam. Tinha, então, 65 anos e sua morte se deu três anos antes da migração para Medina. O próprio Profeta a enterrou com suas mãos. Sua morte representou uma grande perda para ele. Fatimah Bint Muhammad. Fátima foi o quinto filho de Mohammad e Khadija. Ela nasceu na época em que seu pai começou a passar longos períodos em solidão nas montanhas perto de Macca, meditando e refletindo sobre os grandes mistérios da criação. Sua irmã mais velha tinha se casado com seu primo, al-Aas ibn ar-Rabiah. Em seguida veio o casamento de suas duas outras irmãs, Ruqayah e Umm Kulthun, com os filhos de Abu Lahab, um tio paterno do Profeta. Tanto Abu Lahab quanto sua esposa, Umm Jamil, tornaram-se inimigos ferozes do Profeta quando este iniciou sua missão. Assim, a pequena Fátima viu suas irmãs deixaram a casa paterna, uma após a outra, para irem viver com seus maridos. Ela era muito nova para compreender o significado do casamento e as razões pelas quais suas irmãs estavam indo embora. Fátima devotava grande amor às irmãs e se sentiu muito só. Conta-se que uma certa tristeza se abateu sobre ela. É claro que naquele tempo, mesmo depois do casamento de suas irmãs, ela não ficou sozinha em casa de seus pais. Barakah, a serva de Aminah, mãe do Profeta, que tinha cuidado dele desde o seu nascimento, Zayd ibn Harithah e Ali, o filho de Abu Talib, faziam parte da casa de Mohammad. É claro que tinha sua amada mãe, Khadija. Fátima encontrou em Barakah e em sua mãe grande consolo. Em Ali, que era dois anos mais velho do que ela, encontrou um "irmão" e amigo que, de alguma forma, havia ocupado o lugar de seu irmão al-Qasim, que havia morrido cedo. Abdullah, seu outro irmão, conhecido como o Bom e Puro, que nasceu depois dela, também havia morrido ainda criança. No entanto, ninguém da casa de seu pai lhe dera tanta alegria e felicidade como suas irmãs. Ela era uma criança muito sensível para a sua idade. Quando estava com 5 anos, soube que seu pai tinha se tornado Rasul Allah, o Mensageiro de Deus. Os primeiros a receberem as boas novas do Islam foram sua família e os amigos mais chegados. Eles deviam adorar a Deus Todo Poderoso somente. Sua mãe, que era um baluarte de força e amparo, explicou a Fátima o que seu tinha que fazer. A partir daquele momento ela ficou mais intimamente ligada a ele, devotando-lhe um profundo e respeitoso amor. Muitas vezes ela sairia pelas ruas estreitas de Meca, visitando a Caaba ou assistindo aos encontros secretos dos primeiros muçulmanos que haviam abraçado o Islam e prometido fidelidade ao Profeta. Um dia, quando ainda não tinha dez anos, ela acompanhou seu pai à mesquita de al-Haram. Ele ficou no lugar conhecido como al-Hijr, de frente para a Caaba e começou a rezar. Fátima ficou de pé a seu lado. Um grupo de coraixitas mal intencionados começou a confabular sobre ele. Entre aquelas pessoas estavam Abu Jahl ibn Hisham, tio do Profeta, Uqbah ibn Abi Muayt, Umayyah ibn Khalaf, e Shaybah e Utbah, filhos de Rabi'ah. Ameaçadoramente, o grupo se dirigiu ao Profeta e Abu Jahl, líder do grupo, perguntou: "Quem de vocês pode trazer as tripas de um animal morto e atirá-las sobre Mohammad?" Uqbah ibn Abi Muayt, um dos mais infames do grupo, se apresentou como voluntário e saiu correndo para providenciar. Voltou trazendo a porcaria e a atirou sobre os ombros do Profeta que jazia prostrado em adoração. Abdullah ibn Masud, um companheiro do Profeta a tudo assistiu, impotente para fazer ou dizer qualquer coisa. Imagine-se os sentimentos de Fátima, vendo seu pai ser tratado desta maneira! O que podia uma menina de 10 anos fazer? Aproximou-se do pai, retirou aquela sujeira e, então, firme e furiosamente ficou diante do grupo de fascínoras e começou a gritar com eles. Não disseram uma palavra. O Profeta levantou sua cabeça completando a prostração e seguiu com a oração. Então disse: "Ó Senhor, que os coraixitas sejam punidos!" e repetiu esta imprecação por três vezes. Depois continuou: "Que Utbah, Abu Jahl e Shaybah sejam punidos." (Esses três morreram mais tarde na Batalha de Badr). Em outra ocasião, Fátima estava com o profeta enquanto ele fazia tawaf em volta da Caaba. Uma turba de coraixitas se juntou em volta dele. Eles o agarraram e tentaram estrangulá-lo com suas próprias roupas. Fátima gritou por socorro. Abu Bakr correu até eles tentando libertar o Profeta, enquanto implorava: "Vocês querem matar um homem que diz 'Meu Senhor é Deus?' " Longe de desistir, o grupo se voltou para Abu Bakr e começou a bater nele até que o sangue começou a escorrer de sua cabeça e rosto. Tais cenas de oposição feroz e perseguição contra seu pai e os primeiros muçulmanos foram testemunhadas pela jovem Fátima. Jamais ficou impassível a tudo isso, pelo contrário, partiu para a luta na defesa de seu pai e de sua nobre missão. Ela era ainda uma menina e ao invés das brincadeiras alegres, próprias das crianças de sua idade, Fátima presenciou e participou de tais provações. É claro que ela não estava sozinha. Toda a família do Profeta sofreu com essa insana violência dos coraixitas. Suas irmãs, Ruqayyah e Umm Kulthum, também sofreram. Nessa época elas estavam morando no ninho de ódio e intriga contra o Profeta. Afinal, os maridos eram Utbah e Utaybah, filhos de Abu Lahab e Umm Jamil. Umm Jamil era conhecida por ser uma mulher mesquinha e inflexível, que tinha uma língua ferina. Tinha sido exatamente por causa dela que Khadija não tinha ficado satisfeita com o casamento das filhas. Deve ter sido doloroso para Ruqayyah e Umm Kulthum viver na casa desses inimigos que, ao invés de se juntarem ao seu pai, empreenderam uma terrível campanha para destruí-lo. Como sinal da desgraça sobre Mohammad e sua família, Utbah e Utaybah foram obrigados por seus pais a se divorciarem das esposas. Isto fazia parte do processo de lançar Mohammad ao total ostracismo. O Profeta, na verdade, recebeu suas filhas de volta com alegria, felicidade e alívio. Fátima, com certeza, mais feliz ainda, por estar de novo com suas irmãs. Agora todos na família queriam que a irmã mais velha, Zaynab, também se divorciasse do marido. De fato os coraixitas fizeram pressão para que Abul Aas se divorciasse da filha do Profeta, mas ele se recusou. Quando os líderes dos coraixitas vieram ter com ele e lhe prometeram a mais bela e mais rica mulher como esposa se ele se divorciasse de Zaynab, ele respondeu: "Amo minha esposa profunda e apaixonadamente e tenho grande respeito por seu pai, muito embora eu não tenha entrado para a religião do Islam." Tanto Ruqayyah quanto Umm Kulthum estavam felizes com o retorno para a casa dos pais e por estarem livres da insuportável tortura mental a qual foram submetidas na casa de Umm Jamil. Um pouco depois, Ruqayyah se casou de novo com o jovem Uthman ibn Allan, que estava entre os primeiros a aceitar o Islam. Eles seguiram para Abissínia juntamente com os primeiros muhajirin que buscaram refúgio naquelas terras e ficaram por lá muitos anos. A perseguição ao Profeta, sua família e seguidores continuou, piorando depois da migração dos primeiros muçulmanos para a Abissínia. No sétimo ano de sua missão, o Profeta e sua família foram forçados a deixar a casa e buscar refúgio num pequeno e escarpado vale circundado por montanhas por todos os lados e um desfiladeiro, que só podia ser alcançado através de uma passagem estreita. Neste vale árido, Mohammad e os clãs de Banu Hashim e al-Muttalib foram forçados a viver com alimentação racionada. Fátima era um dos membros mais jovens dos clãs - cerca de 12 anos - e teve que suportar meses de sofrimento e privação. O choro das mulheres e crianças famintas podia ser ouvido em Macca. Os coraixitas não permitiam qualquer contato com os muçulmanos, cujo sofrimento diminuía um pouco durante o período da peregrinação. Esse boicote durou três anos. Quando foi suspenso, o Profeta teve que enfrentar mais provas e dificuldades. Khadija, a amada e fiel esposa, morreu um pouco depois. Com sua morte, o Profeta e sua família perdeu uma das suas maiores fontes de conforto e força, que os sustentou durante os dias de grandes dificuldades. O ano em que Khadija, e logo depois Abu Talib, morreram é conhecido como o "Ano da Tristeza". Fátima, agora uma adolescente, sofreu com a morte de sua mãe. Ela chorou muito e durante algum tempo ficou tão abalada que isso teve repercursões sobre sua saúde. Temia-se até que ela pudesse morrer de tristeza. Embora sua irmã mais velha, Umm Kulthum, estivesse em casa, Fátima percebeu que agora ela tinha uma responsabilidade maior com a morte da mãe. Ela sentia que tinha que dar um apoio maior a seu pai. Com ternura e carinho ela se dedicou a cuidar de suas necessidades. Ela era tão preocupada com o seu bem estar que chegou a ser chamada de "Umm Abi-ha" (a mãe de seu pai). Ela também o amparou nos difíceis tempos de provas e crises. Muitas vezes as provações eram demais para ela. Certa vez, uma turba de insolentes atirou poeira e terra sobre a cabeça do Profeta. Quando ele entrou em casa, Fátima chorou muito, enquanto tiram a poeira da cabeça de seu pai. "Não chore, minha filha, porque Deus protegerá seu pai." O Profeta tinha um carinho especial por Fátima. Uma vez ele disse: "Quem quer que agrade Fátima, na verdade agrada a Deus e quem quer que lhe cause tristeza na verdade desagrada Deus. Fátima é uma parte de mim. O que quer que lhe agrade me agrada e o que quer que lhe desagrade me desagrada." Também disse: "As melhores mulheres do mundo são quatro: a Virgem Maria, Aasiyaa, esposa do Faraó, Khadija, Mãe dos Crentes, e Fátima, a filha de Mohammad." Assim, Fátima conquistou um lugar especial no coração do Profeta, antes ocupado apenas por sua esposa Khadija. Por causa de seu rosto brilhante, que parecia uma luz radiante, Fátima recebeu o título de "az-Zahraa", que significa "a resplandescente". Conta-se que quando ela ia rezar, o mihrab refletia a luz de seu semblante. Também era conhecida por "al Batul" por causa de seu asceticismo. Ao invés de ficar na companhia das mulheres, passava a maior parte do seu tempo em oração, lendo o Alcorão e assistindo os pobres. Fátima tinha uma forte semelhança com seu pai. Aisha, a esposa do Profeta, disse sobre ela: "Jamais vi nada na criação de Deus que lembrasse mais o Mensageiro de Deus na palavra, nas conversas e no modo de sentar, do que Fátima. Quando o Profeta a via chegar, ele a cumprimentava, se levantava e a beijava, tomava-a pela mão e a fazia sentar-se no lugar onde ele estava sentado." Ela fazia a mesma coisa quando ele ia visitá-la. Ela se levantava, cumprimentava-o com alegria e o beijava. O modo fino e gentil de falar era parte de sua personalidade afetuosa e amorosa. Ela era especialmente amável com os pobres e indigentes e algumas vezes distribuía toda a comida que tinha para aqueles necessitados, ainda que ela mesma ficasse com fome. Não tinha desejos pelas coisas deste mundo nem almejava uma via luxuosa e confortável. Vivia de maneira simples, embora em certas ocasiões, que veremos adiante, as circunstâncias pareciam ser muito difíceis para ela. Ela herdou de seu pai uma eloquência persuasiva, cheia de sabedoria. Quando falava, as pessoas muitas vezes chegavam às lágrimas. Tinha a habilidade e a sinceridade de despertar as emoções, levar as pessoas às lágrimas e encher seus corações com louvor e gratidão a Deus por Suas graças e inestimáveis bênçãos. Fátima migrou para Medina poucas semanas após o Profeta. Ela foi com Zayd ibn Harithah, que havia sido mandado pelo Profeta para trazer o resto de sua família. O grupo incluía Fátima e Umm Kulthum, Sawdah, a esposa do Profeta, Barakah, a esposa de Zayd e seu filho Usamah. Viajando com eles, também estava Abdullah, o filho de Abu Bakr, que acompanhava sua mãe e tia, Aisha e Asma. Em Medina, Fátima viveu com seu pai numa casa simples que tinha sido construída perto da mesquita. No segundo ano depois da Hégira, ela recebeu várias propostas de casamento. Ali, o filho de Abu Talib, armou-se coragem e foi pedir ao Profeta a mão de sua filha em casamento. No entanto, quando na presença do Profeta, Ali ficou paralisado. Olhava para o chão e não conseguia dizer nada. O Profeta, então, lhe perguntou: "Por que você veio? Está precisando de alguma coisa?" Mas Ali não conseguia dizer uma palavra e então o Profeta sugeriu: "Talvez você tenha vindo para propor casamento a Fátima." "Sim", ele respondeu. Em seguida, de acordo com relatos, o Profeta disse simplesmente "Marhaban wa ahlan" (seja bem-vindo). Um outro relato conta que o Profeta aprovou e perguntou a Ali se ele tinha alguma coisa para dar como dote. Ele respondeu que não tinha. O Profeta o fez lembrar-se de que tinha um escudo que podia ser vendido. Ali vendeu-o a Uthman por 400 dirhams e voltou correndo ao Profeta dando a ele a quantia apurada como dote. Uthman interrompeu-o e disse: "Devolvo-lhe seu escudo como meu presente de casamento." Fátima e Ali se casaram provavelmente no início do segundo ano após a Hégira. Ela devia ter perto de 19 anos e Ali 21. O próprio Profeta celebrou a cerimônia de casamento. Os convidados foram servidos com tâmaras, figos e "hais" (uma mistura de tâmaras e manteiga). Um membro dos ansar deu de presente um carneiro e os outros ofertaram grãos. Toda Medina se rejubilou. Diz-se que o Profeta presenteou o casal com uma cama de madeira, entrelaçada com folhas de palmeira, uma manta de veludo, uma almofada de couro, uma pele de carneiro, um vaso e um moedor de grãos. Pela primeira vez Fátima deixou a casa de seu amado pai para começar uma nova vida com o marido. O Profeta estava nitidamente preocupado com ela e mandou Barakah para ajudá-la em caso de necessidade. Sem dúvida, Barakah foi uma inestimável fonte de conforto e consolo para Fátima. E o Profeta rezou por eles: "Ó Senhor, abençoe a ambos, a sua casa e a sua descendência." Na casa humilde de Ali, só havia uma pele de carneiro para a cama. Na manhã seguinte ao casamento, o Profeta foi até lá e bateu na porta. Barakah veio atender e o Profeta lhe disse: "Ó Umm Ayman, chame meu irmão para mim." "Seu irmão? Aquele que se casou com sua filha?" perguntou Barakah algo incrédula, como se quisesse dizer: Por que o Profeta chama Ali de seu irmão? (Ele se referia a Ali como seu irmão porque depois da Héjira os muçulmanos estavam ligados numa fraternidade, assim o Profeta e Ali estavam ligados como "irmãos"). O Profeta repetiu o que tinha dito numa voz mais alta. Ali chegou e o Profeta invocou as bênçãos de Deus sobre ele. A seguir, ele perguntou por Fátima. Ela apareceu quase que se encolhendo, entre espantada e tímida, e o Profeta lhe disse: "Eu casei você com o mais querido de minha família." Desta forma, ele procurou tranquilizá-la. Ela não estava começando uma vida nova com alguém estranho, mas sim com um que havia sido criado na mesma casa, que estava entre os primeiros a abraçarem o Islam ainda muito novo, que era conhecido por sua coragem, bravura e virtude, e a quem o Profeta descrevia com seu "irmão neste mundo e no outro." A vida de Fátima com Ali foi tão simples e frugal como havia sido em casa de seu pai. Na verdade, ao invés de conforto material foi uma vida de dificuldades e privações. Durante toda a vida em comum, Ali permaneceu pobre e não conseguiu fazer uma fortuna material. Fátima era a única de suas irmãs que não tinha se casado com um homem rico. Pode-se dizer que a vida de Fátima com Ali foi até mais severa do que a que levava em casa de seu pai. Pelo menos, antes do casamento, enquanto vivia na casa do Profeta, não lhe faltavam inúmeras mãos sempre prontas para ajudar. Mas agora, ela tinha que administrar tudo por conta própria. Para diminuir a extrema pobreza, Ali trabalhava como carregador de água enquanto ela moía o milho. Um dia ela disse a Ali: "Tenho trabalhado a terra até fazer bolhas em minhas mãos". "Eu tenho tirado água até meu peito doer." respondeu. Ali, então, sugeriu a Fátima: "Deus deu a seu pai alguns prisioneiros de guerra, portanto, vá e peça a ele para lhe ceder um servo." Relutante, ela foi ter com o Profeta, que disse: "O que a traz aqui, minha filhinha?" "Vim lhe apresentar minhas saudações de paz," ela respondeu, porque, com vergonha dele, não conseguiu dizer o que estava pretendendo. "O que você fez?", perguntou Ali quando ela voltou sozinha. "Eu fiquei envergonhada de pedir a ele", ela disse. Então, os dois foram juntos, mas o Profeta sentiu que eles tinham menos necessidade do que os outros. "Não lhes darei", ele disse, "os Ahlas Suffah (muçulmanos pobres que ficavam na mesquita) estão atormentados pela fome. Não tenho o bastante para (...)" Ali e Fátima retornaram para casa, sentindo-se um pouco rejeitados, mas naquela noite, após terem ido para cama, eles ouviram a voz do Profeta pedindo permissão para entrar. Puseram-se de pé e ele lhes disse: "Fiquem onde estão" e sentou-se ao lado deles. "Posso dizer-lhes alguma coisa melhor do que aquela que vocês me pediram?" Eles responderam "Sim" e ele disse: "As palavras que Gabriel me ensinou, que vocês devem dizer "Subhana Allah" (Glorificado seja Deus) dez vezes depois de cada oração, e dez vezes "Alhamdul lillah "Louvado seja Deus) e dez vezes "Allahu Akbar" (Deus é o maior). E que quando vocês forem para a cama devem dizer trinta e três vezes cada uma." Alguns anos mais tarde, Ali costumava dizer: "Desde que o Mensageiro de Deus nos ensinou aquelas palavras, nunca deixei de dizê-las uma única vez." Existem muitos relatos sobre os tempos difíceis que Fátima enfrentou. Muitas vezes não havia comida em sua casa. Certa vez o Profeta estava com fome. Ele foi a casa de cada uma de suas esposas, mas não havia comida. Então, foi até a casa de Fátima, e, também lá não havia comida. Quando finalmente ele conseguiu alguma coisa, ele mandou dois pães e um pedaço de carne para Fátima. Uma outra vez, ele foi a casa de Abu Ayyub al-Ansari e, da comida que lhe deram, ele separou um pouco para ela. Fátima tanbém sabia que o Profeta ficava sem alimento por longos períodos e, em troca, lhe mandava comida quando conseguia alguma. Uma vez ela lhe levou um pedaço de pão de cevada e ele lhe disse: "Este é o primeiro alimento que seu come em três dias." Através desses gestos de delicadeza, ela mostrava como amava o pai e ele a amava também. Uma vez, ele voltava a Medina de uma de suas viagens, e se dirigiu primeiro para a mesquita, rezou duas "rakat", como era de seu costume. Em seguida, como sempre fazia, foi à casa de Fátima antes de ir ver suas esposas. Ela o recebeu, beijou seu rosto e sua face e chorou. "Por que você está chorando?" perguntou o Profeta. "Estou olhando para você, ó Rasul Allah, amarelo, pálido, suas roupas estão gastas e esfarrapadas." "Ó Fátima" o Profeta respondeu ternamente, "não chore, porque Deus enviou seu pai com uma missão que influenciará cada casa sobre a face da terra, seja nas cidades, vilas ou tendas (no deserto), trazendo glória ou humilhação até que esta missão esteja completa, como a noite, que sempre chega (inevitavelmente)." Com tais comentários, Fátima muitas vezes se esquecia da realidade dura da vida diária e conseguia vislumbrar a grandeza da missão confiada a seu nobre pai. Finalmente, Fátima voltou a morar numa casa próxima à do Profeta. O lugar foi doado por um ansar que sabia que o Profeta ficaria contente em ter sua filha perto dele. Juntos, eles dividiram as alegrias e triunfos, as tristezas e dificuldades daqueles anos graves e turbulentos em Medina. Em meados do segundo ano após a Hégira, um pouco antes da campanha de Badr, sua irmã Ruqayyah ficou doente, com febre e sarampo. Uthman, seu marido, ficou com ela e acabou não indo para os campos de batalha. Ruqayyah acabou morrendo um pouco antes do retorno de seu pai. Quando ele chegou a Medina, um de seus primeiros atos foi o de visitar túmulo da filha, na companhia de Fátima. Esta foi a primeira perda de um parente próximo, desde a morte de Khadija. Fátima ficou profundamente triste com a morte da irmã. Ao chegarem ao túmulo de Ruqayyah, as lágrimas corriam de seus olhos e o Profeta a confortou e procurou enxugar suas lágrimas com a ponta de seu manto. O Profeta havia se manifestado anteriormente contra as lamentações pelos mortos, mas isto levou a uma interpretação errada e, quando eles retornavam do cemitério, a voz de Umar se fazia ouvir, imprecando contra mulheres que choravam pelos mártires de Badr e por Ruqayyah. "Umar, deixe-as chorar", ele disse e, em seguida, acrescentou: "O que vem do coração e do olho, é de Deus e de Sua Misericórdia, mas o que vem da mão e da língua, é de Satanás." Por mão, ele queria se referir àquelas pessoas que batem no peito e arranham o rosto, e por língua queria se referir aos lamentos das carpideiras.  Uthman mais tarde se casou com a outra filha do Profeta, Umm Kulthum, e por causa disso, ficou conhecido como Dhu-n Nurayn, o possuidor de Duas Luzes. O luto sofrido pela família com a morte de Ruqayyah foi seguido de grande felicidade, quando Fátima deu à luz um menino, no mês de Ramadã do terceiro ano após a Hégira. O Profeta disse as palavras de Adhan no ouvido do recém-nascido e deu-lhe o nome de Al-Hasan, que significa o Belo. Um ano mais tarde, nasceu outro menino que se chamou Al-Husayn, que significa "o pequeno Hasan". Seguidamente Fátima trazia seus dois filhos para visitarem o avô, que era extremamente carinhoso com eles. Mais tarde, ele os levava à Mesquita e eles subiam em suas costas enquanto estava prostrado. Ele também fazia o mesmo com a neta Umamah, filha de Zaynab. No oitavo ano após a Hégira, Fátima deu à luz uma menina, a quem ela deu o nome de sua irmã mais velha, Zaynab, que havia morrido um pouco antes de seu nascimento. Esta filha de Fátima ficou famosa como a "Heroína de Karbala". O quarto filho de Fátima foi uma menina a quem ela deu o nome de Umm Kulthum, em homenagem à irmã que havia morrido depois de uma doença. Foi apenas através de Fátima que a descendência do Profeta se perpetuou. Todos os filhos de Mohammad morreram ainda na infância e os dois filhos de Zaynab, de nome Ali e Umamah, morreram jovens. O filho de Ruqayyah também morreu quando ainda não tinha dois anos de idade. Esta é mais uma razão de reverência que é concedida à Fátima. Embora Fátima fosse muito ocupada cuidando das crianças, ela tomou parte, na medida do possível, nos assuntos afetos ao crescimento da comunidade muçulmana de Medina. Antes de seu casamento, ela era uma espécie de protetora dos pobres e desvalidos. Assim que a Batalha de Uhud terminou, ela foi com outras mulheres ao campo de batalha e chorou pelos mártires mortos e ainda arrumou tempo para cuidar das feridas de seu pai. Na Batalha de Ditch, ela desempenhou um papel muito importante, juntamente com outras mulheres, preparando comida durante o longo e difícil cerco. Ela orientou as mulheres nas orações e naquele lugar existe uma mesquita com o nome de Masjid Fatimah, uma das setes em que os muçulmanos guardavam e praticavam suas devoções. Fátima também acompanhou o Profeta quando ele fez a Umrah, no sexto ano após a Hégira, depois do Tratado de Hudaybiyyah. No ano seguinte, ela e sua irmã Umm Kulthun estavam entre os muçulmanos que participaram, junto com o Profeta, da libertação de Macca. Diz-se que naquela ocasião, tanto Fátima como Umm Kulthun, visitaram a casa de sua mãe, Khadija, e rememoram os tempos da infância e da jihad, das longas lutas nos primeiros anos da missão do Profeta. No Ramadã do décimo ano, um pouco antes de ela fazer a Peregrinação do Adeus, o Profeta confidenciou à Fátima, como segredo que ainda não podia ser revelado aos outros: "Gabriel recitava o Alcorão para mim e eu para ele, uma vez a cada ano, mas este ano ele recitou duas vezes. Acho que minha hora chegou." Na sua volta da Peregrinação do Adeus, o Profeta ficou seriamente doente. Seus últimos dias foram passados na casa de sua esposa Aisha. Quando Fátima vinha visitá-lo, Aisha deixava os dois sozinhos. Um dia ele chamou Fátima. Quando ela chegou, ele a beijou e sussurrou algumas palavras em seu ouvido. Ela chorou. De novo ele sussurrou em seu ouvido e ela sorriu. Aisha viu e perguntou: "Você chorou e sorriu ao mesmo tempo, Fátima. O que o Mensageiro de Deus lhe disse?" Ela respondeu: "Primeiro ele me disse que irá se encontrar com o seu Senhor daqui a pouco, e eu chorei. Depois ele me disse: 'Não chore porque você será a primeira de minha casa a se juntar a mim', e eu sorri." Não demorou muito e o nobre Profeta morreu. Fátima ficou muito abalada e muitas vezes ela foi vista chorando profusamente. Um dos companheiros percebeu que nunca mais viu Fátima sorrir depois da morte de seu pai. Uma manhã, no início do mês de Ramadã, um pouco menos de 5 meses depois da morte do pai, Fátima acordou parecendo muito feliz e cheia de alegria. Na tarde desse dia, conta-se que ela chamou Salma bint Umays, que cuidava dela, e pediu para se banhar. Depois vestiu roupas novas e se perfumou. Em seguida pediu a Salma que levasse sua cama para o quintal da Casa. Com o rosto voltado para o céu, ela pediu que chamasse o marido Ali. Ele se surpreendeu quando viu a cama no meio do quintal e perguntou a ela o que havia de errado. Ela sorriu e disse: "Tenho um encontro hoje com o Mensageiro de Deus." Ali chorou e ela tentou consolá-lo. Ela lhe disse para cuidar dos filhos al-Hasan e al-Husayn e pediu para ser enterrada sem cerimônias. Olhou para cima mais uma vez e então fechou os olhos e entregou sua alma ao Criador Todo Poderosos. Fátima, a Resplandescente, tinha apenas 29 anos de idade. Aishah Bint Abu Bakr. A vida de Aisha é a prova de que uma mulher pode ser bem mais instruída do que os homens e que ela pode ser a mestra de pensadores e sábios. Sua vida também é a prova de que uma mulher pode exercer influência sobre homens e mulheres e proporcionar-lhes inspiração e liderança. Além disso, sua vida também é uma prova de que uma mesma mulher pode ser totalmente feminina e fonte de prazer, alegria e conforto para seu marido. Ela não se formou por qualquer universidade. Na sua época não elas não existiam pelo menos da forma como conhecemos hoje. Mas suas expressões são estudadas nas faculdades de literatura, seus pronunciamentos legais são estudados nas faculdades de direito e sua vida e trabalhos são estudados e pesquisados por professores e alunos de história muçulmana da forma como aconteceram há mais de 1000 anos. Esse vasto tesouro de conhecimentos foi obtido quando ela era ainda muito jovem. Ela foi criada por seu pai, que era muito querido e respeitado por ser um homem de grande conhecimento, maneiras gentis e presença agradável. Além do mais, ele foi o amigo mais próximo do nobre Profeta, que era um frequentador assíduo de sua casa desde os primeiros dias de sua missão. Na juventude, já conhecida por sua beleza impressionante e sua formidável memória, ela chamou a atenção do Profeta. Como sua esposa e companheira chegada, ela adquiriu dele conhecimento e compreensão tais como nenhuma outra mulher jamais teve. Aisha se tornou a esposa do Profeta em Macca, quando provavelmente tinha 10 anos mas seu casamento só aconteceu no segundo ano depois da hijrah, quando devia ter uns 14 ou 15 anos. Antes e depois de seu casamento, ela manteve uma jovialidade e inocência naturais e não parecia nada intimidada com o fato de estar casada com Mohammad, o Mensageiro de Deus, a quem todos os companheiros, incluindo seus próprios pais, tratavam com o máximo de amor e reverência. A respeito de seu casamento, ela contou que um pouco antes de ela deixar a casa de seus pais, ela saiu para o quintal para brincar com uma amiga que passava. "Eu estava brincando de balanço e meus longos cabelos ondeados estavam despenteados", ela disse. "Eles vieram e me tiraram da minha brincadeira e me aprontaram." Eles a vestiram com um vestido de casamento feito de um tecido listrado de vermelho do Bahrein e então sua mãe a levou para a casa recentemente construída, onde algumas mulheres dos Ansar estavam esperando do lado de fora da porta. Todas a cumprimentaram com as palavras "Que tudo corra bem para a felicidade!" A seguir, na presença do Profeta sorridente, uma tigela com leite foi trazida. O Profeta bebeu e ofereceu a Aisha. Ela timidamente recusou mas quando ele insistiu ela bebeu e ofereceu a sua irmã que estava sentada a seu lado. As outras pessoas também beberam o leite este foi o momento solene e simples de seu casamento. Não houve festa de bodas. O casamento com o Profeta não mudou seus modos alegres. Suas amigas jovens vinha frequentemente visitá-la em sua própria casa. "Eu estava brincando com minhas bonecas" ela disse, "com as meninas que eram minhas amigas e o Profeta chegou. Elas se retiraram da casa e ele foi atrás delas e as trouxe de volta, porque ele ficava contente por minha causa de tê-las ali." Algumas vezes ele dizia "Fiquem onde estão" antes que elas tivessem tempo de se retirar e também se juntava à brincadeira. Aisha disse: "Um dia, o Profeta chegou quando eu estava brincando com as bonecas e ele disse: 'Ó Aisha, que brincadeira é essa?' 'Cavalos de Salomão' eu disse e ele riu." Algumas vezes ele chegava e se escondia em seu manto para não perturbar Aisha e suas amigas. O início de vida de Aisha em Medina também teve seus momentos críticos e de apreensão. Certa vez seu pai e dois companheiros que estavam com ele ficaram doentes com uma febre perigosa, o que era comum em Medina em certas estações do ano. Certa manhã, Aisha foi visitá-lo e ficou consternada ao encontrar os três homens deitados, completamente fracos e exausto. Ela perguntou a seu como estava passando e ele lhe respondeu com um versículo mas ela não entendeu o que ele estava dizendo. Os outros dois também lhe responderam com algumas estrofes de um poema que lhe pareceu mais um murmúrio sem sentido do que qualquer outra coisa. Ele ficou tão profundamente preocupada que foi procurar o Profeta, dizendo: "Eles estão delirando, fora de si, por causa da febre alta." O Profeta lhe perguntou o que eles haviam dito e ficou de alguma forma tranquilo quando ela repetiu quase que palavra por palavra das estrofes que eles haviam proferido e que faziam sentido, muito embora ela não os compreendesse muito bem. Esta foi uma demonstração da grande capacidade de retenção de sua memória, que com o passar dos anos foi de inestimável valor para preservar os inúmeros ditos do Profeta. Das esposas do Profeta em Medina, está claro que Aisha foi a que ele mais amou. De tempos em tempos, um ou outro de seus companheiros lhe perguntava: "Ó Mensageiro de Deus, a quem você mais ama neste mundo?" Nem sempre ele dava a mesma resposta para esta pergunta porque ele sentia grande amor por muitas de suas filhas e netos, por Abu Bakr, por Ali, Zayd e seu filho Usamah. Mas, de suas esposas, a única que ele citava era Aisha. Ela também o amou demais e muitas vezes buscou nele a certeza de seu amor por ela. Certa vez ela lhe perguntou: "Como é seu amor por mim?" "Como o nó da corda", ele respondia, querendo com isso dizer que era forte e seguro. De tempos em tempos, Aisha perguntava-lhe: "Como vai o nó?" e ele respondia "do mesmo jeito." Como ela amasse muito o Profeta, ela sentia ciúmes e não suportava que as atenções dele se voltassem para as outras mais do que lhe parecia suficiente. Ela lhe perguntou: "Óh Mensageiro de Deus, diga-me, se você estivesse entre duas vertentes de um vale, e uma delas não tivesse sido roçada e outra sim, para qual delas você levaria seus rebanhos"? "Para aquele que não tivesse sido roçado", ele respondeu. "Mesmo assim", ela disse, "eu não sou como as suas outras esposas. Todas tiveram um marido antes de você, menos eu. O Profeta sorriu e não disse nada. De seu ciúme, Aisha diria anos mais tarde: "Jamais tive ciúmes de qualquer das esposas do Profeta como eu tive de Khadija, porque constantemente ele falava nela e porque Deus lhe havia ordenado comunicar a ela a boa nova de uma mansão de pedras preciosas no Paraíso. E sempre que ele sacrificava um carneiro ele mandava uma boa parte para aqueles que haviam sido seus amigos íntimos. Muitas vezes eu disse a ele: "É como se nunca tivesse havido outra mulher no mundo além de Khadija." Uma vez, quando Aisha se queixou e perguntou por que ele falava tanto de "uma velha coraixita", o Profeta se ofendeu e disse: "Ela foi a esposa que acreditou em mim quando os outros me rejeitaram. Quando as pessoas me chamaram de mentiroso e confirmou minha sinceridade. Quando fui abandonado ele gastou de sua fortuna para aliviar o peso de minha tristeza (...)" Apesar de seus sentimentos de ciúme, que não eram de forma alguma destrutivos, Aisha era realmente uma alma generosa e paciente. Ela suportou, juntamente com a família do Profeta, pobreza e fome que, muitas vezes, duravam longos períodos. Vários dias se passavam sem que o fogo fosse aceso para cozinhar ou assar o pão e eles viviam apenas de tâmaras e água. A pobreza não lhe provocou tristeza ou humilhação e não corrompeu seu estilo de vida. Uma vez o Profeta ficou afastado de suas esposas por um mês, porque elas o haviam aborrecido, exigindo dele o que não tinha. Este fato aconteceu após a expedição de Khaybar, quando um aumento das riquezas despertou a cobiça dos muçulmanos. Retornando de retiro auto imposto, ele foi primeiro à casa de Aisha. Ela ficou muito contente em vê-lo mas ele lhe disse que havia recebido uma revelação, na qual lhe era pedido que colocasse para ela duas opções. E ele recitou os versículos: "Ó Profeta! Diga a suas esposas: Se você desejar a vida deste mundo com todos os seus adornos, então venha e Eu concederei esses bens sobre você e a libertarei. Mas, se você preferir Deus e Seu Mensageiro e a morada no Paraíso, então Deus guardou uma imensa recompensa por isso, porque você escolheu o melhor." A resposta de Aisha foi: "Na verdade, eu escolho Deus e Seu Mensageiro e a morada no céu", e sua resposta foi seguida por todas as outras esposas. Ela manteve sua escolha tanto durante a vida do Profeta como depois. Certa vez os muçulmanos foram favorecidos com enormes riquezas e lhe deram de presente 100.000 dihams. Ela estava jejuando quando recebeu o dinheiro e distribuiu toda a quantia entre os pobres e necessitados, meuito embora em sua casa não houvesse qualquer provisão. Um pouco depois, uma serva lhe disse: "Você não poderia ter comprado carne com 1 dirham e assim quebrado o jejum?" E ela respondeu: "Eu poderia ter feito isso, mas não me lembrei." A afeição do Profeta por Aisha permaneceu até o fim. Durante sua doença, foi na casa de Aisha que ele ia por sugestão das outras esposas. Lá, ele ficava muito tempo, deitado num sofá, com a cabeça descansando em seu colo. Foi ela quem pegou uma escova de dentes de seu irmão, mordeu cuidadosamente e a deu para o Profeta. Apesar de sua fraqueza, ele escovou os dentes com bastante vigor. Um pouco mais tarde, ele perdeu a consciência e Aisha achou que ele estava morrendo, mas, após uma hora, ele abriu os olhos. Foi Aisha quem preservou para nós estes últimos momentos de nosso amado Mensageiro. Quando ele abriu seus olhos de novo, Aisha lembrou-se de Iris ter dito a ela: "Nenhum Profeta é levado pela morte até que lhe tenha sido mostrado seu lugar no Paraíso e então ele escolha entre viver ou morrer." "Ele não nos escolherá", ela disse para si mesma. Então, ela o ouviu murmurar: "Com a comunhão suprema no Paraíso, com aqueles a quem Deus derramou seus favores, os profetas, os mártires e os justos (...)" De novo ela o ouviu murmurar: "Ó Senhor, em comunhão suprema" e estas foram as últimas palavras que ela ouviu ele dizer. Aos poucos, sua cabeça foi ficando mais pesada sobre seu peito até que os outros na sala começaram a lamentar e Aisha deitou sua cabeça sobre um travesseiro e se juntou aos lamentos. No chão do cômodo de Aisha, próximo ao sofá onde ele estava deitado, foi aberta uma cova na qual o último dos profetas foi enterrado em meio a muita tristeza e grande dor. Aisha ainda viveu quase 50 anos depois da morte do Profeta. Ela foi sua esposa por cerca dez anos. Muito desse tempo ela passou estudando e adquirindo conhecimento das duas mais importantes fontes da orientação de Deus, o Alcorão e a Suna de Seu Profeta. Aisha foi uma das três esposas do Profeta (as outras fuas foram Hafsah e Umm Salamah) a memorizar a Revelação. Assim como Hafsah, ele tinha seu próprio exemplar do Alcorão, escrito depois que o Profeta morreu. Segundo os ahadith e ou ditos do Profeta, Aisha foi uma das quatro pessoas (as outras foram Abu Hurayrah, Abdullah ibn Umar e Anas ibn Malik) a transmitir mais de 2000 ditos. Muitos deles se referem a aspectos íntimos do comportamento pessoal do Profeta, que somente uma pessoa que ocupasse a posição que ela ocupou poderia ter legado. O que é mais importante é o fato de que seu conhecimento foi passado sob a forma escrita por pelo menos três pessoas, inclusive seu sobrinho Urwah, que se tornou um dos maiores pensadores da geração seguinte à dos companheiros. Muitos dos companheiros do Profeta e seus seguidores se beneficiaram do conhecimento de Aisha. Abu Musa al-Ashari certa vez disse: "Se nós, os companheiros do Mensageiros de Deus tínhamos alguma dificuldade sobre qualquer assunto, nós perguntávamos à Aisha." Seu sobrinho Urwah assegura que ela foi competente não só em fiqh como também na medicina e na poesia. Muitos dos companheiros mais velhos do Profeta costumavam procurá-la para pedir orientação a respeito de questões de herança, matéria que exigia grande habilidade matemática. Os pensadores islâmicos a respeitam como uma das primeiras fuqaha, juntamente com pessoas como Umar ibn al-Khatab, Ali e Abdullah ibn Abbas. Conta-se que o Profeta, referido ao seu grande conhecimento sobre Islam teria dito: "Aprendam uma parte de sua religião (din) com esta humayra." Aisha não só possuía um grande conhecimento como teve participação ativa na educação e na reforma social. Como professora ela tinha um modo claro e persuasivo de falar e seu poder de oratória foi descrito em termos superlativos por al-Ahnaf, que disse: "Já ouvi discursos de Abu Bakr e Umar, Uthman e Ali, mas jamais ouvi algo mais persuasivo e mais bonito da boca de qualquer pessoa do que da boca de Aisha." Homens e mulheres vinham de longe para se beneficiarem de seu conhecimento. Diz-se que o número de mulheres era maior do que os homens. Tomou para si o cuidado e a orientação de meninos e meninas, alguns órfãos, a quem ministrava ensinamentos. Sua casa se transformou numa escola e numa academia. Alguns de seus estudantes foram notáveis. Seu sobrinho Urwah se destacou como um grande narrador de hadith. Entre as mulheres que foram suas alunas, está o nome de Umrah bint Abdur Rahman. Ela é respeitada pelos pensadores islâmicos como uma das mais fiéis narradoras de hadith e diz que ajudava Aisha recebendo e respondendo às cartas que endereçadas a ela. O exemplo de Aisha na promoção da educação, principalmente na educação da mulher muçulmana, deve ser seguido. Depois de Khadija (a Grande), e de Fátima (a Resplandescente), Aisha (aquela que afirma a Verdade) é respeitada como a melhor mulher do Islam. Por causa da força de sua personalidade, ela foi uma líder em diversos campos do conhecimento, na sociedade, na política e na guerra. Muitas vezes se arrependeu de seu envolvimento na guerra, mas viveu o bastante para reconquistar a posição de a mulher mais respeitada de seu tempo. Ela morreu no ano de 58, depois da Hégira, no mês de Ramadã, e quis ser enterrada em Medina, ao lado de outros companheiros do Profeta. Umm Salamah. Umm Salamah! Que vida notável ela teve! Seu nome verdadeiro era Hind. Ela era a filha de um dos notáveis da tribo Makhzun, apelidada de "Zad ar-Rakib", porque ela era conhecida por sua generosidade, principalmente com os viajantes. O marido de Umm Salaman era Abdullah ibn Abdulasad e ambos estavam entre os primeiros a aceitar o Islam. Apenas Abu Bakr e uns poucos, que podiam ser contados nos dedos da mão, se tornaram muçulmanos antes deles. Assim que a notícia da conversão deles ao Islam se espalhou, os coraixitas reagiram com uma raiva incontida. Começaram a perseguir ferozmente Umm Salamah e o marido, mas o casal não vacilou nem se desesperou, permanecendo firme em sua nova fé. A perseguição ficou mais e mais intensa e a vida em Macca tornou-se insuportável para muitos dos novos muçulmanos. O Profeta, então, deu-lhes permissão para emigrarem para a Abissínia. Umm Salamah e seu marido estavam na dianteira daqueles muhajirun que buscaram refúgio em terra estrangeira. Para Umm Salamah, isto significava deixar sua casa espaçosa e abandonar os laços tradicionais de família e honra por uma nova esperança e uma recompensa de Allah. Apesar da proteção que Umm Salamah e seus companheiros receberam do monarca da Abissínia, o desejo de voltar para Macca persistia, para estar perto do profeta e fonte de revelação e orientação. Finalmente, notícias chegadas de Macca davam conta de que o número de muçulmanos estava aumentando. Entre os novos convertidos estavam Hamzah ibn Abdulmuttalib e Umar ibn al-Khattab. A fé tinha fortalecido a comunidade e diziam que os coraixitas, de alguma forma, estavam relaxando a perseguição aos muçulmanos. Assim, um grupo de muhajirun, animados por ardente desejo em seus corações, decidiram voltar a Macca ou Meca. No entanto, o relaxamento da perseguição foi breve, conforme o grupo logo logo descobriu. O aumento dramático do número de novos muçulmanos, seguido da aceitação do Islam por Hamzah e Umar só serviu para enfurecer os coraixitas ainda mais. Intensificaram a perseguição e a tortura de uma forma nunca vista antes. Em razão disso, o Profeta deu permissão a seus companheiros para emigrarem para Medina. Umm Salamah e seu marido estavam entre os primeiros a deixarem Meca. No entanto, a hijrah de Umm Salamah e de seu marido não foi tão fácil como eles haviam imaginado. Na verdade, foi a mais amarga e dolorosa experiência, e, principalmente, a mais dilacerante para ela. Que Umm Salamah conte a sua estória: Quando Abu Salamah (meu marido) decidiu ir para Medina, ele preparou um camelo para mim, me colocou em cima dele e o nosso filho Salamah em meu colo. Ele foi na frente, sem parar ou esperar por qualquer coisa. Ainda não tínhamos deixado Macca ou Meca quando alguns homens de minha tribo nos pararam e disseram para meu marido: "Embora você seja livre para fazer o que quiser com sua vida, você não tem poder sobre sua esposa. Ela é nossa filha e você não pode esperar que lhe demos nossa permissão para que ela nos deixe." Então, lançaram-se sobre ele e me arrebataram dele. A tribo de meu marido, Banu Abdulasad, presenciou tudo, vermelhos de raiva. "Não, por Deus", gritaram, "não vamos abandonar o menino. Ele é nosso e temos direitos sobre ele." Pegaram a criança pela mão e a arrancaram de mim. De repente, em fração de segundos, me encontrei sozinha e abandonada. Meu marido tinha ido para Medina e sua tribo tinha arrebatado meu filho. Minha própria tribo, Banu Makhzum, tinha me subjugado e forçado a ficar com eles. Desde aquele dia em que meu marido e meu filho se separaram de mim, passei a ir todo dia, à tarde, até aquele vale e me sentava no lugar onde essa tragédia tinha ocorrido. Eu me lembrava daqueles terríveis momentos e chorava até a noite cair sobre mim. Continuei assim por um ano ou mais, até que um dia um homem da tribo Omíada passou e viu minha condição. Ele foi, então, até minha tribo e disse: "Por que vocês não libertam essa pobre mulher? Vocês são os responsáveis pelo aconteceu ao marido e ao filho dela." Aquele homem continuou tentando abrandar seus corações e sensibilizá-los. Por fim eles me disseram "Vá e junte-se a seu marido se esse é o seu desejo. "Mas, como podia me juntar a meu marido em Medina e abandonar meu filho em Meca com a tribo de Abdulasad, uma parte de meu próprio corpo, carne da minha carne, sangue do meu sangue? Como podia me libertar da angústia e os meus olhos das lágrimas e alcançar o lugar da hégira sem saber nada sobre meu filho, deixado para trás em Macca? Alguns deles perceberam o que eu estava sofrendo e seus corações se condoeram. Pediram, então, aos membros da tribo Abdulasad que me devolvessem meu filho. Agora eu já nem queria permanecer em Macca até encontrar alguém para viajar comigo, pois eu receava que alguma coisa pudesse acontecer que atrasasse ou me impedisse de encontrar meu marido. Assim, imediatamente arrumei meu camelo, coloquei meu filho no colo e parti em direção a Medina. Eu tinha acabado de alcançar Tan'im (cerca de 3 milhas de Macca) quando encontrei Uthman ibn Tallah. Ele era um dos guardiães da Caaba nos tempos pré-islâmicos e ainda não tinha abraçado o Islam. "Para onde você está indo, Bint Zad ar-Rakib?", ele perguntou. "Estou indo encontrar-me com meu marido em Medina." "E ninguém a acompanha?" "Não, exceto Deus e meu filho aqui." "Por Deus, não a abandonarei até que vocês cheguem a Medina." ele prometeu. Então ele pegou as rédeas de meu camelo e nos conduziu. Por Deus que jamais encontrei um árabe mais nobre e generoso do que ele. Quando fizemos uma parada para repouso, ele fez meu camelo se ajoelhar, esperou que eu desmontasse, levou-o até uma árvore e o prendeu ali. Então ele procurou a sombra de uma outra árvore e quando estávamos descansados ele aprontou o camelo e seguimos viagem. E assim ele fez todos os dias até chegarmos a Medina. Quando alcançamos um vilarejo próximo a Quba (cerca de 2 milhas de Medina), que pertencia à tribo Amr ibn Awf, ele me disse "Seu marido está nesta vila. Vá com as bênçãos de Deus." Deu meia volta e retornou a Macca. Seus caminhos finalmente haviam se encontrado após a longa separação. Umm Salamah ficou feliz em ver seu marido e ele maravilhado em abraçar sua esposa e o filho. Grandes e importantes eventos se seguiram um após o outro. Houve a batalha de Badr, onde Abu Salamah lutou. Os muçulmanos retornaram a Medina vitoriosos e fortalecidos. Então, veio a batalha de Uhud, na qual os muçulmanos foram duramente testados. Abu Salamah voltou dessa batalha seriamente ferido. De início parecia responder bem ao tratamento mas suas feridas nunca cicatrizaram completamente e ele ficou entrevado. Certa vez, quando Umm Salamah estava cuidando dele, ele lhe disse: "Ouvi o Mensageiro de Deus dizer. Sempre que uma calamidade nos afligir devemos dizer, 'Certamente viemos de Deus e para Ele com certeza retornaremos.' E ele orou. 'Ó Senhor, dai-nos em troca alguma coisa boa que somente Vós, o Exaltado, o Poderoso, podeis dar." Abu Salamah ficou de cama por muitos dias. Certa manhã, o Profeta veio vê-lo. A visita foi mais longa do que o habitual. E Abu Salamah morreu enquanto o Profeta estava a seu lado. Com suas mãos abençoadas, o Profeta fechou os olhos de seu companheiro morto, e em seguida levantou suas mãos aos céus e orou: "Ó Senhor, concedei o perdão a Abu Salamah. Levai-o para junto daqueles que estão próximos a Vós. Cuidai sempre de sua família. Perdoai-nos e a ele, Ó Senhor dos Mundos. Ampliai seu túmulo e tornai-o leve para ele." Umm Salamah se lembrava da oração que seu marido havia mencionado em seu leito de morte e começou a repeti-la: "Ó Senhor, deixo convosco esta minha aflição para Vossa consideração (...)" Mas, ela não conseguia continuar... "Ó Senhor, conceda-me algo de bom", porque ela continuava se perguntando "Quem pode ser melhor do que Abu Salamah?" Mas, não ficou muito tempo sem completar sua súplica. Os muçulmanos estavam muito condoídos da situação de Umm Salamah. Ela ficou conhecida como "Ayyin al-Arab", aquela que perdeu o marido. Ela não tinha ninguém em Medina exceto seu filho, era como uma galinha sem penas. Tanto os muhajirun quanto os ansar sentiam que tinham uma obrigação para com Umm Salamah. Quando ela completou o Iddah (três meses e dez dias), Abu Bakr pediu-a em casamento, mas ela recusou. Umar, então, pediu para se casar com ela mas também foi recusado. Então, o Profeta se aproximou e ela respondeu: "Ó Mensageiro de Deus, eu tenho três características. Sou uma mulher extremamente ciumenta e tenho medo de que veja em mim algo que o irrite e que provoque a punição de Deus sobre mim. Sou uma mulher de idade já avançada e tenho uma família jovem." O Profeta respondeu: "Com relação ao ciúme de que você fala, pedirei a Deus, o Todo Poderoso, para que o afaste de você. No tocante à idade, também eu sofro do mesmo problema que você. No que se refere à uma família dependente, sua família é a minha família." E eles se casaram e assim Deus respondeu às preces de Umm Salamah e lhe deu uma pessoa melhor do que Abu Salamah. Daquele dia em diante, Hind al-Makhumiyah não foi apenas a mãe de Salamah, mas a mãe de todos os crentes, Umm al-Mu'mineen. Zaynab al-Ghazali.  Zainab al-Ghazali é uma mulher especial. Assim como Aisha Abd al-Rahman, ela é uma egípcia que defende os direitos das mulheres muçulmanas, em consonância com o que ela percebe ser a doutrina islâmica correta. Foi uma ativista islâmica. Nasceu no Egito em 1917 e ainda na sua juventude, foi um membro ativo da União Feminista Egípcia, fundada por Huda al-Sha'rawi, em 1923. Renunciou ao cargo por discordar das opiniões e ideais do movimento de libertação das mulheres e, aos 18 anos, em 1936, ela fundou a Associação das Mulheres Muçulmanas, a fim de organizar as atividades femininas, de acordo com as normas e propostas islâmicas. Esta organização prestou serviços inestimáveis aos pobres, órfãos e desvalidos. Embora ela conhecesse Hasan al-Banna (1906-1949), o fundador da Fraternidade Muçulmana, desde os anos 30, e tivesse participado ativamente de muitos programas islâmicos, somente em 1948 ela vai se juntar à Fraternidade. Quando a Sociedade dos Irmãos Muçulmanos (Fraternidade) foi dissolvida, em 1948, ela se empenhou pessoalmente no compromisso de fidelidade a Hasan al-Banna, apoiando-o nos esforços de estabelecer um estado islâmico. Embora ele tenha sido assassinado logo em seguida, ela permaneceu fiel aos sucessores de Hasan al-Banna e ajudou seus membros, principalmente depois que foram jogados na clandestinidade, durante o regime de Gamal Abdel Nasser (1918-1970). Em 1965, ela foi presa sob alegação de conspirar contra Gamal Abdel Nasser e seu governo. Ela foi libertada durante o governo de Anwar Sadat em 1971. Além de ser muito ativa no trabalho de Da'wah, Zainab al-Ghazali foi uma escritora fecunda, contribuindo regularmente para a maioria dos jornais e periódicos islâmicos. Em seu último livro, "Return of the Pharoah", ela relata como, falsamente acusada de conspiração contra Nasser, foi detida e levada a prisão. Enquanto aguardava o julgamento na prisão, foi submetida às mais terríveis e desumanas torturas. Ao invés de diminuir seu entusiasmo pelo Islam e pelo movimento islâmico, a selvageria e abuso que lhe dispensaram só serviu para aumentar o seu compromisso e dedicação pela causa do Islam. Numa entrevista concedida em sua casa em Heliópolis, Egito, em 1981, Zainab disse: "O Islam concedeu tudo tanto a homens como a mulheres. Deu tudo às mulheres - liberdade, direitos econômicos, políticos, sociais, direitos públicos e privados. O Islam concedeu às mulheres direitos na família jamais assegurados por nenhuma outra sociedade. As mulheres podem falar de liberação nas sociedades cristã, judaica ou pagã, mas na sociedade islâmica é um grave erro falar da liberação das mulheres. A mulher muçulmana precisa estudar o Islam e assim ela saberá que foi o Islam quem lhe concedeu todos os direitos." Este é o cerne do pensamento de Zaynab al-Ghazali, com relação à condição das mulheres, conforme expressado em suas palestras públicas e em seus artigos para a revista al-Da'wa, na qual ela foi editora de uma seção voltada para os ideais de um lar muçulmano. O objetivo de seu ativismo e o de sua associação é educacional: incutir nas mentes femininas a doutrina do Islam, ensinar seus direitos e deveres e conclamá-las para mudanças na sociedade que levem ao estabelecimento de um estado islâmico, governado pelo Alcorão e pela Sunna do Profeta. Zainab al-Ghazali acredita que o Islam permite às mulheres uma participação ativa na vida pública, trabalhar, entrar na política e expressar suas opiniões. Ela crê que o Islam permite que elas tenham seus próprios bens, façam transações comerciais e que podem ser o que queiram a serviço da sociedade islâmica. Acredita, ainda, que a primeira obrigação da mulher muçulmana é ser mãe e esposa e que nenhuma outra atividade deve interferir no desempenho desse papel, porque esta deve ser a sua prioridade acima qualquer outra. Se ela dispuser de tempo para participar da vida pública, tendo sempre em vista a obrigação primeira, ela pode porque o Islam não a proíbe. Zainab al-Ghazali acredita firmemente no dever social e religioso do casamento. Em seu primeiro casamento, seu marido discordava de seu ativismo religioso e por causa disso ela se divorciou. Seu segundo marido era mais compreensivo, auxiliou-a em sua missão e jamais a impediu de lutar pela causa islâmica. Em seu livro autobiográfico, ela conta como, embora preocupado com ela, seu marido continuou a apoiá-la em suas atividades. No entanto, ela enfatiza que jamais deixou de lado suas obrigações para com a família, ainda que continuasse a exercer a presidência da Associação das Mulheres Muçulmanas, a trabalhar longas horas em seu escritório e a estar pessoalmente envolvida nas atividades clandestinas da Sociedade dos Irmãos Muçulmanos. Após a morte de seu segundo marido, ela sentiu que havia cumprido com os seus deveres no casamento e que, por isso, estava livre para se devotar integralmente à causa do Islam. Desencantada com os rumos da revolução egípcia de 1952, que havia contado com o apoio de muitos muçulmanos no seu início, Zainab al-Ghazali (1917-2005) passou a considerar Gamal Abdel Nasser e seu regime como inimigos do Islam. Depois que alguns membros da Sociedade dos Irmãos Muçulmanos foram sentenciados à morte e muitos outros condenados à prisão, ela criou programas para amparar os órfãos e viúvas daqueles ativistas, para alimentar os necessitados e desempregados entre os libertados, para ajudar suas famílias e, fortalecer sua posição como presidente da Associação das Mulheres muçulmanas no sentido de fazer o trabalho social tão necessitado. Ela também intensificou suas atividades educacionais e participou de grupos secretos de estudos islâmicos, orientados pelos irmãos muçulmanos que se encontravam na prisão. Em 1962, ela entrou em contado com Sayyid Qutb (1906-1966) na prisão através de duas irmãs e obteve a sua concordância para a realização de um curso de leitura de comentários sobre o Alcorão e os Hadith, assim como sobre jurisprudência islâmica. Ele também lhe deu partes de um livro que ele estava escrevendo na prisão para ser publicado mais tarde sob o título Ma'alim fil Tariq. Páginas deste livro e instruções de Sayyid Qutb, ainda na prisão, além de um conjunto de versículos do Alcorão, seriam estudados por grupos de 5 a 10 jovens em encontros durante à noite na casa de Zainab al-Ghazali. As discussões se seguiram e pontos de vista foram estabelecidos e opiniões formadas. Com a concordância de Sayyd Qutb e das lideranças da Fraternidade, decidiu-se que este programa de treinamento islâmico deveria continuar por 30 anos, que foi o tempo de duração do chamado do Profeta Mohammad em Macca, antes de ele se mudar para Medina e instituir o estado islâmico. Decidiu-se também que, ao fim deste período, uma pesquisa deveria ser realizada no Egito para saber se pelo menos 75% dos egípcios estavam convencidos da necessidade de se estabelecer um estado islâmico. Em caso positivo, eles deveriam providenciar a realização dessa pesquisa, e em caso negativo, deveriam continuar com os estudos e aprendizado por mais 30 anos, que deveria ser repetido até que a nação estivesse pronta para aceitar um governo islâmico, implementando a lei islâmica, de acordo com o Alcorão e a Sunnah do Profeta. Quando o governo egípcio começou a suspeitar desses grupos e a tratá-los como células políticas revoltosas, aconteceu um racha na Fraternidade em 1965. As Irmãs Muçulmanas não foram poupadas, a Associação das Mulheres Muçulmanas foi dissolvida e Zaynab al-Ghazali, entre outros, foi presa. Em 1966, ela foi levada a julgamento com muitos outros e sentenciada a trabalhos forçados por toda a vida. Mas, em 1971, ela foi libertada. No ressurgimento islâmico no Egito, que se tornou mais forte após a morte de Nasser, em 1970, e depois que Sadat assumiu a presidência, ela continuou a ser uma oradora ativa e professora de Islam, conclamando o estabelecimento de um estado islâmico com o ideal de que todos os muçulmanos deviam se empenhar, a fim instituir uma sociedade que fosse guiada pelo Alcorão e pela Sunna do Profeta. As ideias de Zaynab al-Ghazali em relação a um estado islâmico são muito gerais e carecem de especificidade em muitos pontos. Sua crença nesse ideal, no entanto, não é menos fraca por causa disso. Ela acha que não existe um estado verdadeiramente islâmico sob a face da terra no momento, isto é, onde a shari'ah esteja completamente implementada, nem mesmo o Paquistão ou a Arábia Saudita podem se dizer islâmicos em seu modo de ver. Ela apoia a revolução iraniana e espera que seu regime logo esteja implantado, a fim de que os iranianos possam canalizar seus esforços na solução de seus problemas externos e internos. O código penal da shari'ah islâmica não deve ser aplicado agora, mas sim quando o estado estiver completamente estabelecido e a shari'ah puder ser aplicada. A fidelidade ao governante islâmico deve ser obtida através de eleições gerais ou por um grupo composto de pessoas sábias, experientes e justas. Ela acha que o Islam proíbe que a chefia do estado islâmico seja uma herança que passa de pai para filho. O chefe de estado pode ser chamado de califa ou presidente e é possível a existência de dois califas de uma só vez por causa da expansão do mundo islâmico, mas os dois devem estar unidos e seus exércitos devem lutar pela mesma causa. Um califa deve ter um conselho cujos membros devem ser peritos em vários campos, a fim de que ele possa permanecer leal e querido pelas pessoas que o elegeram. De acordo com ela, o Islam não aceita um sistema pluripartidário porque o sistema em si já é completo, com os muçulmanos tendo o direito de escolher seu governante e o dever de obedecê-lo enquanto ele permanecer fiel ao Islam. Outros sistemas ou regimes foram feitos pelo homem e são inferiores ao Islam, que foi feito por Deus. Não muçulmanos de outras religiões ou ateus serão tratados pelo estado islâmico de acordo com as prescrições do Alcorão e da Sunna. Zaynab al-Ghazali pensa que o sistema islâmico trará justiça a todos, mas os muçulmanos precisam primeiro permanecer unidos. Pode haver diferenças de opiniões entre os muçulmanos a respeito de questões desde que não haja divisões em suas fileiras: eles podem divergir nos meios mas não nos fins, onde a meta deverá sempre ser a unidade. A poligamia e suas vantagens. A poligamia é uma prática muito antiga, encontrada em muitas sociedades humanas. A Bíblia não condenou a poligamia. Pelo contrário, o Velho Testamento e os escritos rabínicos frequentemente atestam a legalidade da poligamia. Dizem que o Rei Salomão teve 700 esposas e 300 concubinas (Reis 11:3). Também o Rei Davi teve muitas esposas e concubinas (2 Samuel 5:13). O Velho Testamento tem algumas injunções em como distribuir a propriedade de um homem entre seus filhos de diferentes mulheres (Deuteronômio 22:7). A única restrição com relação à poligamia é a proibição de tomar uma irmã da esposa como uma esposa rival (Levítico 18:18). O Talmud aconselha a um máximo de 4 esposas. Os judeus europeus continuaram a praticar a poligamia até o século XVI. Os judeus orientais praticavam a poligamia regularmente até a chegada a Israel, onde ela foi proibida por lei. Contudo, na lei religiosa, que sobrepuja a lei civil em tais casos, a poligamia é permitida. E com relação ao Novo Testamento? De acordo com o padre Eugene Hilman (1923-  ), em seu penetrante livro, a poligamia é reconsiderada, "Em parte alguma do Novo Testamento há uma orientação expressa de que o casamento deve ser monogâmico ou qualquer orientação que proíba a poligamia". Além disso, Jesus não falou contra a poligamia, embora ela fosse praticada pelos judeus de sua época. O padre Hillman chama a atenção para o fato de que a Igreja de Roma proibiu a poligamia, a fim de se adequar à cultura Greco-romana (que prescrevia somente uma esposa legal, enquanto que tolerava o concubinato e a prostituição). Ele citou Santo Agostinho (354-430), "Agora, em nosso tempo, e de acordo com o costume romano, não é mais permitido tomar uma outra esposa". As igrejas africanas e os cristãos africanos muitas vezes lembram a seus irmãos europeus que a proibição da poligamia é mais uma tradição cultural do que uma autêntica injunção cristã. O Alcorão também permitiu a poligamia, mas não sem algumas restrições: "Se vós temeis não serdes capazes de conviver justamente com os órfãos, casai com mulheres de sua escolha, 2 ou 3 ou 4 vezes; mas se temerdes que não sereis capazes de conviver justamente com elas, então casai somente com uma" (4:13). O Alcorão, ao contrário da Bíblia, limitou o número de esposas a 4, sob a estrita condição de que as esposas sejam tratadas igualmente. Isto não deve ser entendido como uma exortação a que os crentes pratiquem a poligamia, ou que a poligamia seja considerada como um ideal. Em outras palavras, o Alcorão "tolera" ou "permite" a poligamia. Por que a poligamia é permitida? A resposta é simples: há lugares e épocas em que razões morais e sociais compelem para a poligamia. Como os versos do Alcorão acima indicam, a questão da poligamia no Islã não pode ser entendida como parte das obrigações da comunidade com relação aos órfãos e viúvas. O Islã, como uma religião universal, aplicável para todos os lugares e tempos, não poderia ignorar essas pressões. Em muitas sociedades humanas, as mulheres superam os homens em quantidade. Em um país como a Guiné, há 122 mulheres para cada 100 homens. Na Tanzânia, há 95,1 homens para 100 mulheres . O que uma sociedade deve fazer para resolver esse desequilíbrio? Existem várias soluções, e alguns podem sugerir o celibato, outros preferem o infanticídio feminino (que ainda acontece no mundo de hoje em alguns lugares). Outros, ainda, podem achar que a única saída é a sociedade tolerar todas as formas de permissividade sexual: prostituição, sexo fora do casamento, homossexualismo, etc. Para outras sociedades, como a maior parte das sociedades africanas de hoje, a saída mais honrosa é permitir o casamento poligâmico, como uma instituição culturalmente aceita e socialmente respeitada. A questão, que é muitas vezes incompreendida no ocidente, é que muitas mulheres de outras culturas necessariamente não vêm a poligamia como um sinal de degradação da mulher. Por exemplo, muitas jovens noivas africanas, sejam cristãs ou muçulmanas, prefeririam se casar com um homem casado, que tenha provado a ele mesmo, ser um marido responsável. Muitas esposas africanas persuadem seus maridos a tomar uma segunda esposa e assim eles não se sentem sozinhos. Uma pesquisa realizada na segunda maior cidade da Nigéria com 600 mulheres, com idades entre 15 e 59 anos, mostrou que 60% dessas mulheres não se importariam que seus maridos tivessem uma outra esposa. Somente 23% expressaram raiva ante a ideia de dividirem seus maridos com outras mulheres. 76% das mulheres que se manifestaram numa pesquisa realizada no Quênia, viram a poligamia positivamente. Em outra pesquisa realizada no campo, 25 de 27 mulheres consideraram a poligamia melhor do que a monogamia. Estas mulheres sentiram que a poligamia pode ser uma experiência feliz e benéfica se as co esposas cooperarem umas com as outras. A poligamia, na maior parte das sociedades africanas é uma instituição tão respeitada, que algumas igrejas protestantes começaram a tolerá-la, "Embora a monogamia possa ser ideal para a expressão do amor entre o marido e a esposa, a igreja deve considerar que em certas culturas a poligamia é socialmente aceitável e que a crença de que a poligamia é contrária ao cristianismo não se sustenta por muito tempo". Depois de um cuidadoso estudo sobre a poligamia africana, o Reverendo David Gitari (1937-2013), da Igreja Anglicana, concluiu que a poligamia, como idealmente praticada, é mais cristã do que o divórcio e o novo casamento, porque há uma preocupação com as esposas e crianças abandonadas. Eu pessoalmente conheço algumas esposas africanas, finamente educadas, que apesar de terem vivido no Ocidente por muitos anos, não fazem qualquer objeção à poligamia. Uma delas, que mora nos USA, solenemente estimula seu marido a tomar uma segunda esposa para ajudá-la na criação das crianças. O problema do desequilíbrio entre os sexos começa na verdade nos problemáticos tempos de guerra. Os índios nativos americanos costumavam sofrer com essa desigualdade de número entre homens e mulheres, principalmente após as perdas dos tempos de guerra. As mulheres dessas tribos, que na verdade desfrutavam de uma alta posição, aceitavam a poligamia como a melhor proteção contra a tolerância por atividades indecentes. Os colonos europeus, sem oferecerem qualquer outra alternativa, condenavam a poligamia indiana como "incivilizada" .Após a segunda guerra mundial, havia na Alemanha 7.300.000 mais mulheres do que homens (3.3 milhões delas eram viúvas). Havia 100 homens na idade de 20 a 30 anos para cada 167 mulheres naquele mesmo grupo de idade. Muitas dessas mulheres necessitavam de um homem, não apenas como uma companhia mas, também, como um mantenedor para a casa, num tempo de miséria e injustiça sem precedentes. Os soldados do exército aliado vitorioso exploravam a vulnerabilidade dessas mulheres. Muitas jovens e viúvas tinham ligações com membros das forças de ocupação. Muitos soldados americanos e britânicos pagavam por seus prazeres com cigarros, chocolates e pães. As crianças ficavam felizes com os presentes que os estrangeiros traziam. Um menino de 10 anos, vendo esses presentes com outras crianças, desejava ardentemente um "inglês" para a sua mãe e assim, ela não precisaria passar fome por tanto tempo. Devemos perguntar para nossa consciência sobre esta questão: O que dignifica mais uma mulher? Uma segunda esposa, aceita e respeitada, ou uma prostituta virtual, como no caso da abordagem "civilizada" das forças aliadas na Alemanha? Em outras palavras, o que dignifica mais uma mulher, a prescrição Alcorânica ou a teologia baseada na cultura do império romano? É interessante notar que, em uma conferência da juventude internacional, acontecida em Munique, em 1948, o problema alemão do desequilíbrio no número de homens e mulheres foi discutido. Quando ficou claro que não havia solução consensual, alguns participantes sugeriram a poligamia. A reação inicial da reunião foi uma mistura de choque e repugnância. Contudo, após um estudo cuidadoso da proposta, os participantes concordaram que a poligamia era a única solução possível. Consequentemente, a poligamia estava incluída entre as recomendações finais da conferência.  Atualmente, o mundo possui mais armas de destruição em massa do que jamais houve em qualquer tempo e as igrejas europeias podem, mais cedo ou mais tarde, se ver obrigadas a aceitar a poligamia como o único caminho. O Padre Hillman, após muito pensar, admitiu este fato, "É quase concebível que aquelas técnicas genocidas (nuclear, biológica, química...)” podem produzir um desequilíbrio tão drástico entre os sexos que o casamento plural poderia ser um meio necessário de sobrevivência (...). Em tal situação, os teólogos e os líderes das igrejas deveriam rapidamente produzir razões importantes e textos bíblicos que justifiquem um novo conceito de casamento". Nos dias atuais, a poligamia continua a ser a solução viável para alguns males das sociedades modernas. As obrigações comunitárias a que o Alcorão se refere, juntamente com a permissão da poligamia, são mais perceptíveis atualmente nas sociedades ocidentais do que na África. Por exemplo, nos USA de hoje, há uma séria crise na comunidade negra. Um em cada 20 jovens rapazes negros podem morrer antes de atingir a idade de 2l anos. Para aqueles que estão entre os 20 e 35 anos, o homicídio lidera a causa da morte. Além disso, muitos rapazes negros estão desempregados, na prisão ou são viciados. Como consequência, uma em 4 mulheres negras, na idade de 40 anos, nunca se casaram, enquanto que este número é de 1 para 10 mulheres brancas. Além do mais, muitas jovens negras se tornam mães solteiras antes dos 20 anos e se encontram na situação de serem mantidas. O resultado final dessas trágicas circunstâncias é que há um aumento no número de mulheres negras comprometidas com "homem-partilhado". Isto é, muitas dessas infelizes mulheres negras solteiras estão envolvidas em casos com homens casados. As esposas muitas vezes não têm consciência do fato de que outras mulheres estão dividindo seus maridos com elas. Alguns observadores da crise do "homem-partilhado" na comunidade africana na América têm recomendado a poligamia consensual, como uma resposta temporária para a diminuição do número de homens negros, até que reformas mais abrangentes na sociedade americana sejam tomadas. Esses observadores entendem poligamia consensual como a poligamia sancionada pela comunidade e na qual todas as partes envolvidas concordem, em oposição ao segredo dos casos com homens casados, os quais sempre prejudicam tanto a esposa como a comunidade em geral. O problema do "homem-partilhado" na comunidade africana da América foi ponto de discussão em um painel realizado na Universidade de Temple, na Filadélfia, em 27.01.93 . Alguns dos palestrantes recomendaram a poligamia como um remédio potencial para a crise. Eles também sugeriram que a poligamia não podia ser banida por lei, particularmente em uma sociedade que tolera a prostituição e o concubinato. O comentário de uma das mulheres participantes, de que os negros americanos precisavam aprender com a África, onde a poligamia era praticada responsavelmente, conseguiu entusiásticos aplausos. Philip Kilbride, um antropólogo americano, de tradição católica romana, em seu livro provocativo, "Casamento Plural para o Nosso Tempo", propõe a poligamia como solução para alguns dos males da sociedade americana. Ele argumenta que o casamento plural pode servir como uma alternativa potencial para o divórcio em muitos casos, a fim de eliminar o impacto danoso do divórcio sobre as crianças. Ele afirma que muitos divórcios foram causados pelo excessivo número de casos extraconjugais ocorridos na sociedade americana. De acordo com Kilbride, transformar um caso extraconjugal em um casamento poligâmico, ao invés do divórcio, é melhor para as crianças. Além disso, ele sugere que outros grupos também se beneficiarão do casamento plural, tais como: mulheres mais velhas, que enfrentam uma crônica diminuição de homens e os negros americanos, que estão envolvidos com o "homem-partilhado". Em 1987, uma votação conduzida por um estudante de jornalismo da Universidade de Berkeley, perguntava aos estudantes se eles concordavam que os homens poderiam ser autorizados, por lei, a terem mais de uma esposa, tendo em vista a visível diminuição do número de candidatos masculinos para o casamento na Califórnia. Quase todos os votantes aprovaram a ideia. Uma estudante chegou a declarar que o casamento poligâmico preencheria suas necessidades físicas e emocionais, porque lhe daria maior liberdade do que uma união monogâmica. Na verdade, o mesmo argumento foi usado por alguns poucos remanescentes das mulheres praticantes Mormom, que ainda praticam a poligamia nos USA. Elas acreditam que a poligamia é um caminho ideal para a mulher ter, tanto profissão como crianças, uma vez que as esposas se ajudam umas às outras no cuidado com os filhos. Deve-se acrescentar que a poligamia no Islã é questão de consenso mútuo. Ninguém pode forçar a mulher a se casar com um homem casado. Além disso, a esposa tem o direito de estipular que seu marido não deve se casar com outra mulher. A Bíblia, pôr outro lado, algumas vezes vale-se da poligamia forçada. Uma viúva sem filhos deve se casar com o seu cunhado, mesmo que ele já seja casado (ver a seção "A condição das Viúvas") e independente de seu consentimento (Gênesis 38:8-10). Deve-se notar que, em muitas sociedades muçulmanas de hoje, a prática da poligamia é rara, uma vez que a diferença entre os sexos não é grande. Pode-se dizer que o número de casamentos poligâmicos no mundo muçulmano é muito menor do que o de casos extraconjugais no ocidente. Em outras palavras, os homens no mundo muçulmano são muito mais monogâmicos do que os homens no mundo ocidental. Billy Graham (1918-2018), o eminente evangélico cristão, reconheceu este fato: "O cristianismo não pode se comprometer com a questão da poligamia. Se hoje o cristianismo não pode fazer isso, é em seu próprio detrimento. O Islã permitiu a poligamia como uma solução para os males sociais e reconheceu um certo grau de latitude da natureza humana, mas, somente dentro da estrutura estritamente definida na lei. Os países cristãos fazem um estardalhaço sobre a monogamia, mas, na verdade, eles praticam a poligamia. Ninguém ignora a existência das amantes na sociedade ocidental. A esse respeito, o Islã é fundamentalmente uma religião honesta, que permite a um muçulmano se casar uma segunda vez se ele precisar, mas proíbe rigorosamente todas as associações clandestinas, a fim de salvaguardar a probidade moral da comunidade". Nota-se que a nova lei civil brasileira já admite a poligamia ao estabelecer a lei de concubinato onde estabelece direitos para tais amantes depois de provarem a existência de enxergar, como filhos ou tempo de convivência com homens já casados, isto na minha visão é uma poligamia não declarada e hipócrita. Releva notar que muitos países no mundo de hoje, muçulmanos ou não, proibiram a poligamia. Tomar uma segunda esposa, ainda que com o livre consentimento da primeira, é uma violação da lei. Por outro lado, trair a esposa, com ou sem o seu conhecimento e/ou consentimento, é perfeitamente legitimada. Qual é a sabedoria legal por detrás de tal contradição? A lei foi feita para premiar a decepção e punir a honestidade? Este é um dos paradoxos fantásticos de nosso mundo "civilizado". www.ccib.org.br. Abraço. Davi

quinta-feira, 28 de junho de 2018

O QUE É O ZOHAR.


Judaísmo. www.morasha.com.br. O QUE É O ZOHAR. O Sefer ha-Zohar - o Livro do Esplendor - É, sem sombra de dúvida, a obra principal e mais sagrada da Cabalá, a dimensão mística do judaísmo. De autoria do grande Rabi Shimon bar Yochai, permanece inacessível até os dias de hoje para a grande maioria dos que tentam transpor o mistério que encerra. Quem sabe se por esta razão, ou apesar desta, nenhuma outra obra mística jamais despertou tanta curiosidade e exerceu tão grande influência? O Zohar é a coluna vertebral da Cabalá, também chamada de Chochmat ha-Emet - a Sabedoria da Verdade. Na língua hebraica, Cabalá significa "recebimento" ou "o que foi recebido". Por ser parte integral da Torá, tem origem e natureza Divina. Apesar de seus ensinamentos terem sido transmitidos a Adão e aos patriarcas do povo judeu, foi Moisés quem os recebeu diretamente de D'us durante a Revelação no Monte Sinai e os instituiu formalmente como parte da história do povo de Israel. Desde então, está sabedoria mística vem sendo repassada de geração em geração para uns poucos escolhidos entre os líderes espirituais do povo judeu. Chamados de nistarim (literalmente "os ocultos"), os primeiros cabalistas preservaram zelosamente esses ensinamentos, transmitindo-os oralmente às gerações seguintes. Somente no século II da era comum, surgiria no seio de Israel um homem que possuía os dons espirituais e intelectuais que lhe permitiram dar forma a essa sabedoria milenar. Seu nome era Rabi Shimon bar Yochai, uma das personalidades mais reverenciadas na história judaica. A ele coube o zechut, o honroso mérito de revelar a Luz Divina em todo a sua majestade e esplendor. Grande líder e um dos maiores sábios talmúdicos, Rabi Shimon viveu em uma época muito conturbada. Durante sua geração, Israel penava sob o jugo romano, tendo que se sujeitar à proibição do estudo da Torá, esta apenas uma entre as inúmeras imposições de Roma. A gravidade da situação levou os mestres da Lei a adotarem medidas excepcionais. Preocupados que a perseguição e a dispersão dos judeus pudessem resultar na perda parcial dos ensinamentos da Torá Oral, os sábios deram seu consentimento para que os fundamentos de seu conteúdo fossem transcritos. Portanto, o Talmud, seus comentários, o Midrash e os ensinamentos cabalísticos começaram a ser compilados e escritos. E foi Rabi Shimon bar Yochai quem estruturou a tradição mística através do Zohar. No entanto, havia um grande problema na transcrição dos segredos da Cabalá. Os sábios temiam que pessoas sem preparo espiritual tivessem acesso aos segredos da Criação e do Universo. Para evitar que isso acontecesse, O Livro do Esplendor foi escrito de forma praticamente indecifrável para os não iniciados. E a primeira condição para se fazer parte desse grupo pequeno e seleto era possuir um vasto e profundo conhecimento sobre a Torá e sobre a tradição cabalística. Livro fechado. O Sefer ha'Zohar é um livro fechado e as chaves para sua compreensão permanecem em mãos de um número reduzido de sábios. Esta obra pode ser comparada a um sistema codificado, de extrema complexidade, que esconde tesouros inestimáveis. Rabi Shimon era um daqueles seres pertencentes a um plano espiritual tão elevado que, entre os que estudam a sua obra, são poucos os que conseguem assimilar parte de seus ensinamentos. Não obstante, mesmo com apenas um pouco desse conhecimento, constroem-se montanhas de sabedoria. Como vimos, para os não iniciados, o Zohar é misterioso e praticamente impenetrável. As dificuldades de compreensão estão presentes em quase todos os níveis da obra. Além da insondável profundidade de seus preceitos, seu estilo literário peculiar e sua dialética dificultam a compreensão. Seus textos, escritos em hebraico ou em aramaico antigo, estão "codificados", impossibilitando, assim, que pessoas leigas entendam seu significado. Imagens simbólicas são usadas no lugar de uma terminologia racional e tópicos independentes são tratados em conjunto, colocando lado a lado assuntos aparentemente sem relação entre si. Muitas das passagens do Zohar são compostas por combinações de alusões fragmentadas, que somente podem ser conectadas por associações secretas. Mas, na realidade, as conexões existem e são bastante claras para aqueles que entendem seu simbolismo e significado. Um sábio familiarizado com os segredos místicos da Torá entende perfeitamente seu conteúdo, seu estilo e sua estrutura aparentemente ilógica. Se para os não iniciados muitos de seus ensinamentos carecem de significado, estes mesmos preceitos são, para os que podem decifrá-los, a chave para desvendar os maiores e mais profundos segredos da existência e do universo. Apesar de terem sido traduzidos para o hebraico moderno e para outros idiomas, os verdadeiros ensinamentos do Sefer ha-Zohar continuam sendo praticamente incompreensíveis. Mesmo para a maioria dos eruditos na Torá, o Livro do Esplendor continua sendo um enigma. O Talmud e outras obras da lei judaica são acessíveis e compreensíveis; não apenas é permitido o seu estudo, como também é incentivado e é uma obrigação colocar-se em prática os seus ensinamentos. Já o Zohar continua além do alcance intelectual e espiritual da maioria dos judeus - pelo menos por enquanto. Grandes cabalistas sempre alertaram que o privilégio de estudar e entender esta obra era reservado para muito poucos. O cuidado e o resguardo em relação ao Zohar sempre foram impostos com o propósito de preservar não só a obra, mas também a alma daqueles que se aventurassem a estudá-la. Temia-se que seus ensinamentos e revelações pudessem ser mal interpretados ou usados de forma inadequada. Infelizmente, esses temores se confirmaram no decorrer da história. Houve vários casos de indivíduos e até mesmo de grupos que, após mergulharem nas águas do misticismo judaico sem o preparo adequado, acabaram por se perder. Ainda mais grave: seus ensinamentos místicos foram utilizados por falsos messias e distorcidos por místicos não-judeus e por adeptos da ciência do ocultismo. Os resultados foram catastróficos. Por isso, cabe alertar o leitor que o estudo do Zohar e da Cabalá somente deve ser conduzido na companhia de um professor que, além de instruído, tenha atingido um equilíbrio espiritual e mental; que entenda e siga a Lei Judaica em todos os seus minuciosos pormenores. Seu conteúdo. O Zohar é fonte de inspiração e sabedoria para os iniciados que ousam adentrar seus segredos. Seus principais focos são a teosofia - a interação das sefirot e seus mistérios, a conduta humana e o destino dos judeus neste mundo bem como no mundo das almas. São raras as ocasiões em que discute de forma explícita a meditação ou a experiência mística. Ao penetrar na superfície literal da Torá, O Livro do Esplendor revela as profundezas místicas de suas histórias, leis e segredos. Transforma a narrativa bíblica em uma "biografia de D'us". Toda a Torá é lida como permutações de Nomes Divinos. Cada uma de suas palavras ou de suas mitzvot simbolizam algum aspecto das sefirot - que representam as maneiras pelas quais D'us interage com Sua Criação. O Zohar revela que o real significado da Torá reside em sua parte oculta - chamada de nistar - e em seus segredos místicos. Mas esta obra grandiosa não trata apenas de assuntos esotéricos e místicos. Não há uma única preocupação sobre a existência humana que permaneça intocada em suas páginas. Apesar da aura de mistério que a cerca, muitos de seus ensinamentos têm servido de guia para várias gerações de judeus. De um lado, o Zohar se aprofunda nos maravilhosos mistérios da alma e do Criador; do outro, aborda assuntos como o poder do mal e a necromancia, proibida pelo judaísmo. Nele encontram-se visões da Redenção Messiânica, assim como soluções para as complexas relações entre seres humanos e os problemas de seu cotidiano. Alicerçado principalmente na Torá, o Zohar é uma obra imensa, dividida em três trabalhos principais que são, por sua vez, subdivididos em outros segmentos. Trata-se principalmente de uma exegese - uma dissertação de homilias - e suas idéias emergem através de comentários e discursos. Nele estão as interpretações místicas e os comentários das sidrot - as leituras semanais da Torá. A obra não se restringe aos Cinco Livros de Moisés; também aborda outros livros da Torá, inclusive o Cântico dos Cânticos, o Livro de Ruth e as Lamentações. Não cabe enfatizar em demasia que a Cabalá é a parte secreta da Torá e, portanto, não poderia ser estudada ou seguida à parte da Torá revelada. Acreditar ou estudar a Cabalá sem o respaldo da Torá Escrita e Oral é, no mínimo, incongruente, pois não há um único trabalho cabalístico que não contenha citações dos 24 livros da Torá Escrita, do Talmud e do Midrash. Assim como o Talmud, o Zohar cobre todas as manifestações do espírito judaico. Porém, enquanto o primeiro é essencialmente uma obra sobre a Lei Judaica, com pitadas de misticismo, o segundo é principalmente um trabalho místico que aborda e elabora sobre algumas leis do Torá. O Zohar descreve a realidade esotérica subjacente à experiência cotidiana. Nele, temas e histórias, tópicos legais e assuntos litúrgicos são vistos e expostos através de uma interpretação mística. Um breve histórico. Como vimos acima, os ensinamentos da Cabalá começaram a assumir uma forma estruturada através do Livro do Esplendor, de Rabi Shimon bar Yochai. Segundo o Talmud, após ter fugido das autoridades romanas que queriam matá-lo, Rabi Shimon e seu filho, Rabi Eleazar ben Azariah, esconderam-se em uma caverna nas montanhas da Galileia. Pai e filho lá permaneceram durante treze anos, dedicando-se completamente ao estudo da Torá. Certamente Rabi Shimon já havia sido exposto aos ensinamentos místicos judaicos. Mas, enquanto estavam na caverna, ele e seu filho foram visitados pelas almas de Moisés e do profeta Eliahu, que lhes revelaram muitos outros preceitos cabalísticos. É possível que outros sábios, antes e depois dele, também tenham tido os dons intelectuais e espirituais para transmitir os ensinamentos da Cabalá. Mas foi Rabi Shimon, devido à sua luz, à pureza de sua alma e aos seus méritos, o escolhido por D'us para fazê-lo. Como atesta a própria obra, coube a Rabi Abba, um dos alunos de Rabi Shimon, a tarefa de registrar por escrito os ensinamentos de seu mestre. Parte do Zohar não foi transcrita na época; foi preservada e transmitida de forma oral pelos discípulos de Rabi Shimon, conhecidos como "a Chevraiá". Mas apesar de transcrito, ainda não havia chegado a hora de ser divulgado o seu conteúdo. Segundo a tradição, seus manuscritos originais ficaram escondidos durante mil anos e foram descobertos apenas no século XIII. Durante as décadas de 1270 e 1280, estes manuscritos ficaram restritos a círculos cabalistas. Finalmente, chegaram às mãos de um místico judeu espanhol, Rabi Moshe de Leon (1238-1305), que os editou e publicou na década de 1290. Por que teria essa obra magna permanecido escondida por tanto tempo? O próprio Livro do Esplendor revela a razão ao afirmar que sua sabedoria e luz seriam reveladas como preparação para a Redenção Final, que deveria ocorrer 1.200 anos após a destruição do Templo Sagrado. E é exatamente o que aconteceu ! O Grande Templo de Jerusalém foi destruído no ano 70 da nossa era, o que significa que, segundo as previsões do Zohar, seu conteúdo deveria ser revelado no ano de 1270. O estudo da Cabalá floresceu na Espanha e na Provença, mas até a expulsão dos judeus da Península Ibérica, o Zohar só era conhecido no meio de restritos círculos de sábios e cabalistas. Após a expulsão, ele emerge desses círculos e passa a exercer uma grande influência sobre os judeus sefaraditas. Perseguidos e expulsos, os judeus da Espanha encontraram em seus ensinamentos sobre a Redenção Messiânica uma grande fonte de conforto e esperança e tanto a obra como seu autor passaram a ser reverenciados por eles. Até hoje, o Zohar está presente no dia-a-dia dos judeus dessa origem, pois seus ensinamentos moldaram grande parte de suas tradições e seus costumes religiosos. Muitos dos cabalistas forçados a sair da Península Ibérica se estabeleceram na cidade sagrada de Safed, em Israel, que se tornou um centro de estudos místicos. Em Safed, o Sefer ha'Zohar serviu de base para os ensinamentos de dois dos maiores cabalistas - ambos sefaraditas - da era moderna: Rabi Moshe Cordovero (falecido em 1570), conhecido como o Ramak; e o grande Rabi Yitzhak Luria (1534-1572), o Arizal. Foi em Safed – Israel, que o Arizal transmitiu seus conhecimentos sobre o Livro do Esplendor e a Cabalá. Desenvolveu um novo sistema para a compreensão de seus mistérios, chamado de Método Luriânico. Seus ensinamentos são reconhecidos como a autoridade máxima da Cabalá, tendo sido estudados pelas gerações de cabalistas que o seguiram. A partir de seus ensinamentos, a Cabalá se tornou mais acessível e passou a ser disseminada por sábios e místicos judeus. O próprio Arizal afirmara que havia chegado a era na qual não só seria permitido revelar a sabedoria da Cabalá, mas tornar-se-ia uma obrigação fazê-lo. Mas, foi na primeira metade do século XVIII, com o surgimento do chassidismo - como passou a ser chamado o movimento iniciado no leste da Europa pelo Rabi Baal Shem Tov - que a Cabalá que fora ensinada pelo Arizal passou a atingir um número ainda maior de judeus. A principal contribuição do chassidismo foi sua adaptação da doutrina da Cabalá a uma linguagem cotidiana e de fácil compreensão. Desta maneira, a profunda sabedoria de Rabi Shimon bar Yochai passou a influenciar as massas de judeus asquenazitas do leste Europeu. Com a expansão do chassidismo os ensinamentos do Zohar passaram a influenciar um número cada vez maior de judeus. A santidade da obra. Chamada também de Ha'Zohar ha-Kadosh - O Sagrado Zohar - esta obra é envolta por uma aura de suprema santidade. Sua natureza misteriosa e seu conteúdo inacessível só acrescentaram reverência ao respeito que provoca entre judeus e não-judeus. Como vimos anteriormente, o Zohar é a suprema autoridade no campo do misticismo judaico, é a face mística da Revelação Divina manifestada por meio da Torá. Em termos de santidade, o Zohar foi posto em um nível ainda maior do que o Talmud, pois enquanto as leis deste último representam o corpo da Torá, os mistérios do Zohar representam sua alma. Mas, o Livro do Esplendor nunca se opõe à autoridade do Talmud nem às suas leis. Assim como alma e corpo são interdependentes; apenas quando unidos e em harmonia podem proporcionar ao homem uma vida significativa. Da mesma forma, o Zohar e o Talmud não podem cumprir sua missão, nem sobreviver de forma separada e sem uma mútua interligação. O Zohar tem sido aceito por todo o povo judeu, independentemente de seu passado e tradições. Embora apenas um número limitado de judeus o tenha estudado de fato, continua a influenciar de maneiras que sequer podem ser imaginadas. Uma história do Baal Shem Tov revela o amor dos chassidim pelo Zohar e é também um exemplo de sua santidade e poder. Sabe-se que o Baal Shem Tov (1698-1760) sempre levava uma cópia desta obra com ele, sendo capaz de realizar milagres e prever o futuro através da força espiritual do livro. Um dia lhe perguntaram como tinha sido capaz de, simplesmente olhando para o Zohar, descrever os passos de um homem que havia desaparecido. E ele respondeu com uma citação do Talmud: "A luz que D'us fez em seis dias de Criação permitiria ao homem enxergar de um lado do mundo para o outro, mas esta luz tem sido guardada para os justos no Mundo Vindouro". E onde está esta luz guardada", perguntou o Baal Shem Tov, respondendo ele próprio: "Na Torá. Então, quando eu abro o Zohar, eu posso ver o mundo todo". www.morasha.com.br. Abraço. Davi