Compartilharei
um pequeno trecho das escrituras encontrado em Lucas 10:38-42. “E aconteceu
que, indo eles de caminho, entrou Jesus numa aldeia; e certa mulher por nome
Marta, o recebeu em sua casa. E tinha esta uma irmã chamada Maria, a qual
assentando-se aos pés de Jesus, ouvia a sua palavra. Marta, porém, andava
distraída em muitos serviços; e, aproximando disse: Senhor, não se te dar de
que minha irmã me deixa servir só? Dize-lhe que me ajude. E respondendo Jesus
disse? Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas, mas uma só é
necessária. E Maria escolheu a boa, melhor parte, a qual não lhe será
tirada”. Essa narrativa conta uma
particularidade familiar entre Marta e Maria relatada no evangelho de Lucas,
mas introduzirei o tema na perspectiva inconsciente da personalidade humana.
Essa ideia depreende-se da psicologia analítica de Carl Gustav Jung
(1875-1961), onde é conceituado que o animus, é o aspecto inconsciente da
personalidade masculina contido na mulher e o anima, o aspecto inconsciente da
personalidade feminina, contida no homem. “Esses termos foram adotados por
Jung para simbolizar característica contra sexual de cada indivíduo, parte do
princípio da complementariedade, através do qual a psique se move. São imagens
psíquicas, configurações originárias de uma estrutura arquetípica básica,
provenientes do inconsciente coletivo. São subliminares a consciência e
funcionam a partir de dentro da psique inconsciente, influindo sobre o
princípio psíquico dominante de um homem ou de uma mulher. Jung diz: A anima,
sendo feminina, é a figura que compensa a consciência masculina. Na mulher, a
figura compensadora é de caráter masculino, e pode ser designada pelo nome de
animus. Mais tarde, Jung enriqueceu sua definição de anima e animus chamando-as
de Não Eu, um conceito apreendido do budismo, tipificando está fora de si próprio,
pertencente à sua alma ou espírito. Para o homem, tem a característica de
reações, impulsos e posicionamentos baseados em conhecimento não
suficientemente justificado; e para a mulher assume à forma de compromissos,
crenças e inspirações. É algo que induz a tomar conhecimento do que é
espontâneo e significativo na vida psíquica”. http://www.sandplay.jogodeareia.com.br.
Esse conceito jungiano é importante para generalizarmos ambos os sexos dentro
da perspectiva bíblia, e especificamente entre Marta e Maria. Também podemos
supostamente explicar a luz dessa teoria, porque pessoas de sexo igual, os homo
afetivos, tem atração recíproca. Um possível interesse entre ambos, imagino,
além do aspecto genético discutido pela ciência, seria a proporção do
inconsciente animus em paridade com o animus de outra pessoa. O contrário é
recorrente, quando o anima equivalente no inconsciente da pessoa tem a mesma
intensidade psíquica que na outra. Os heterossexuais hipoteticamente, nessa teoria, individualizam atrações diferenciadas de animus e anima em
suas convivências. Não tenho intenção de provar o que estou falando; apenas são argumentos de uma possível discussão no campo de psicologia analítica relacionada a esse assunto. Assim, somos num certo sentido, homem e mulher ao mesmo
tempo. Isso é justificado pela ciência oculta com a noção do Adan Cadmo, ou
Adão primordial; o ser primitivo que deu origem evolucionária ao homo erectus a
milhões de anos atrás. O Adan Cadmo era considerado um hermafrodita (pessoa que possui concomitantemente ambos os sexos masculino e feminino),
mitologicamente criado pela divindade em série; colocado em vários lugares da terra,
com um problema, precisava perpetuar sua espécie. Assim a alegoria bíblia da criação de Adão e
Eva, que eram um e não dois, e Deus os separou fazendo-os macho e fêmea.
Gênesis 2:21,22 “Então o Senhor fez cair um pesado sono sobre Adão, e este
adormeceu; e tomou uma das suas costelas, e cerrou a carne em seu lugar. E da
costela que o Senhor Deus tomou do homem, formou uma mulher, e trouxe a Adão”.
Platão (428-347) no diálogo Teeto fala sobre a separação entre Mytos e Logos;
uma possível figura de linguagem que faz referência ao Adan Cadmo. Desse modo, O Logos Divino, O
Sempiterno, nos ama como somos; seu amor e misericórdia alcança nosso ser
completo, nada fugindo de sua graça e bondade. Deixemos esse assunto para
posterior elaboração mais detalhada. No texto citado Marta reclamava com Maria que enquanto
ficava aos pés do Mestre, ouvindo seus preciosos ensinamentos, ela desdobrava-se nos afazeres domésticos para
deixar as coisas em ordem; talvez com a intenção de proporcionar mais conforto
ao Mestre nos momentos de descanso e comunhão com aquela família tão amada e
querida. Ela até pede a intervenção do Mestre para que a irmã pudesse
auxiliá-la, voltando depois a escutá-lo. Jesus amava muito estes três amigos;
Lázaro aquele que ele ressuscitara dentre os mortos não estava presente neste encontro. Tinha geralmente com eles uma convivência mais humana que espiritual.
Apesar do texto sugerir que ele discorria assuntos espirituais como Maria,
prefiro acreditar no contrário; como eram momentos descontraídos e relacionais
que vivia em Betânia na casa deste amados, conversavam sobre a vida, as
dificuldades que ele tinha para desenvolver seu ministério. Como atravessar o rio
Jordão, chegando a região da Galileia e Samaria com as boas novas; talvez
refletisse sobre seus país; José segundo a tradição católica morreu antes dele
começar seu apostolado, e sua mãe Maria morreu bem depois de sua morte.
Tendemos a excessivamente espiritualizar Jesus, colocando sua humanidade
sobreposta ao seu ser divino; como se ele não tivesse sentimentos e emoções. Esquecemos que em Hebreus 4:15 é falado “(...) mas temos o Sacerdote Supremo
que, a nossa semelhança foi tentado de todas as formas, porém sem pecado
algum”. O Mestre responde que Maria
escolheu a melhor parte e essa não lhe seria tirada. A melhor parte aqui não
necessariamente seria uma porção de sabedoria mística advinda dos santos lábio
do Mestre, mas também a companhia de uma amiga e um diálogo franco, onde
possivelmente era confidenciado o temor e medo em continuar a luta espiritual.
Principalmente porque nesse momento da história, o Império Romano começava a se
incomodar com as pregações de Jesus, que se contrapunha a ordem estabelecida
quando falada em Mateus 3:2 “Arrependei-vos porque está próximo o reino dos
céus”. A Corte em Roma, não entendia está mensagem do Mestre, imaginando que ele
estaria planejando a tomada do poder, tornando-se um novo César
para estabelecer seu reino terreno; libertando os judeus do jugo romano. Talvez o Mestre compartilhasse com Maria,
naquela agora, sua preocupação quanto a avidez dos judeus em relação aos milagres,
já que esses produziam mais incredulidade que confiança e fé. A multidão ia
atrás de Jesus apenas por causa do pão e dos milagres, mas ele disse em João
6:33 “O pão de Deus é aquele que desce do céu e da vida ao mundo”. Agora
aprofundemos alguns conceitos provenientes dessa passagem. As duas irmãs Marta
e Maria são a tipificação do humano em seu aspecto espiritual e terrenal. Isso
demonstra que nossa existência individual precisa constantemente evoluir, à
níveis mais altos, até chegarmos a união completa com o divino. A meu ver está claro que os conflitos serão
uma tônica nos relacionamentos; que digam os casais. Mas devemos aprender a conviver com eles de
forma pacífica, procurando caminhos à soluções que tragam benefício aos
envolvidos. Sabendo que nesses casos, sempre uma parte deverá ceder, para que a
harmonia se restabeleça na diferença e diversidade. No exemplo referido das
duas irmãs, como todos temos nossas particularidades e individualidades, o
desconforto estava no âmbito das emoções, sentimentos e prioridades que cada
uma tinha, tanto no aspecto espiritual como no material. A resposta dada por
Jesus à Marta, “Maria escolheu a melhor parte”,
geralmente é vista na teologia como reprovando a atitude ordinária,
doméstica, de Marta. Inclinamo-nos a supra valorizar a espiritualidade em
relação a humanidade, mas atentando com mais precisão, intuiremos que esse
texto parece resumido, faltando, se é que posso me expressar assim, elementos que justifiquem também a conduta
positiva de Marta. A tradição cristã aqui aproveitou para evidenciar a
importância das palavras do Mestre em seu aspecto contemplativo e
meditativo, entretanto, diminuiu o
trabalho cotidiano de Marta. Isso inferimos da cultura legada pela comunidade
judaica e os escritos do Torah, Tanake e Talmud, que tinha no trabalho secular uma forma de expressão com o divino,
pois o Mestre no evangelho de João 5:17 diz: “Meu pai trabalha até agora e eu
também trabalho”. Assim não se justifica a depreciação do trabalho de Marta que
a ortodoxia propõe, pois esta, atenta ao lar, colocava as necessidades
doméstica em ordem. Aqui podemos por em desconfiança, o porque dos
clérigos não trabalharem no sustento de suas famílias? Apesar de I Coríntios
9:14 “Assim ordenou também o Senhor aos que anunciam o evangelho, que vivam do
evangelho”, relacionar o evangelho como um trabalho, isso é usado hoje como
sabemos em muitos casos como desculpa à ociosidade e preguiça. Nesse ponto, resguarda-se o interesse daqueles que vocacionados em monastérios ou conventos, desenvolvem a vida religiosa ao bem do próximo e da humanidade. Preservando a cultura e tradição mística dos povos relacionada as suas diversas divindades, e devido a precípua atuação fazem-na de forma integral. A sabedoria do Mestre é divina, pois não se percebe ele entrando no mérito da
questão entre Marta e Maria, imputando razão à nenhuma das partes. Esse juízo
acabamos fazendo nos conflitos em que enfrentamos, tentando descobrir quem está
certo ou errado. Isso cria obstáculos a harmonizarmos o relacionamento, não
contribuindo ao diálogo construtivo, apenas acirrando os ânimos, aumentando o
ressentimento e mágoa. A ideia aqui apresentada, penso, seja o equilíbrio entre
o espiritual (Maria) e o terrenal (Marta). Todo extremismo enrijece os
conceitos, nos fechando à ponto de vistas excludentes, discriminando as
opiniões divergentes da nossa; criando a falsa impressão de superioridade em
relação a outros modelos de vida e espiritualidade. Imagino que o Mestre
resolveu a pendência, mesmo não relatado nas páginas sagradas, mostrando a
importância da estabilidade nas convivência, onde o mais sábio sede ao de menos
conhecimento; e o espiritual não se mostra dominante ou superior ao terrenal. A
atitude de Maria estando aos pés do Mestre, não é passada na narrativa como
supremacia ou preeminência, mas respeito e consideração pelo Mestre, uma
pessoa querida e amada por aquela família. Na verdade todos estamos no processo
de desenvolvimento espiritual e chegaremos ao estágio da perfeição, como é dito
em Efésios 4:13 “Até que todos cheguemos a unidade da fé, e ao conhecimento do
filho de Deus, a homem perfeito, a medida da estatura completa de Cristo”. O
homem perfeito é a expressão deificada do divino no humano, isso claramente
visto nas atitudes e fala do Mestre Jesus nesse pequeno trecho bíblico Abraço. Davi.
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