segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

O Cristianismo e seus Reducionismos.



Leonardo Boff (1938-  ). “Toda encarnação  do cristianismo nas culturas significa concreção, mas também limitação e redução. Reducionismo na filosofia é uma tendência que consiste em reduzir os fenômenos complexos e seus componentes mais simples. Considerando esses últimos como mais fundamentais que os fenômenos complexos observados. Um dos principais inimigos da liberdade, no homem, é o reducionismo. Qualquer tipo de reducionismo é frustrante, principalmente os que reduzem o homem a um produto. Quanto do sonho de Jesus, de sua prática, de sua mensagem e de sua ética suporta o paradigma grego romano ocidental? Ele incorporou o cristianismo dentro de suas possibilidades, mas à custa de notáveis limitações e lamentáveis reduções. Importa libertar a experiência originária de Jesus e diminuir a arrogância institucional da Igreja Católica Romana que pretende apresentar a integralidade da herança de Jesus sem nenhum reducionismo e sem relativismo, pior ainda, condenando os reducionismo dos outros sem se dar conta do seu próprio reducionismo. Por isso, precisamos proceder a uma reflexão crítica. A questão não é o reducionismo. Ele  pertence a todo processo de encarnação; não é defeito, mas marca da história. A questão é estar cego a tal fato e apresentar-se arrogantemente como quem nada reduziu, confundindo a parte com o todo, como o seu reducionismo real, mas inconsciente fosse a totalidade do Evangelho e do sonho de Jesus. Elenquemos alguns desses reducionismos, pois desta forma libertaremos o cristianismo desta patologia a fim de que possa desimpedidamente implementar outros ensaios encarnatórios futuros. O cristianismo romano católico, ao invés de pregar o Deus Trindade, ficou no monoteísmo vétero testamentário e pré trinitário. A doutrina de um só e único Deus, dominante nas pregações e na própria reflexão teológica, se adequava e se adequa melhor à cultura do poder autoritário e do pensamento único, reinante na cultura patriarcal. Ao invés de prolongar o sonho de Jesus, do Reino de Deus, anunciou a Igreja fora da qual não há salvação, não raro aliada aos poderosos e distanciada dos pobres e oprimidos. Ao invés de pregar a ressurreição como o evento maior da história, um verdadeiro tremendum na linguagem do Pierre Teilhard de Chardin (1881-1955), preferiu o anúncio da imortalidade da alma, crença platônica vastamente popularizada na cultura romana, grega e ocidental até os dias de hoje.  Ao invés de apresentar o Jesus real, histórico, preferiu um Jesus definido em termos filosóficos e teológicos dos Concílios de Niceia (325), de Constantinopla (381), de Éfeso (431) e de Calcedônia (451) como aparece no atual credo. Nele é professado como “Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro, engendrado, não criado, da mesma natureza que o Pai”. E logo se diz que “se fez homem e por nossa salvação foi crucificado sob Pôncio Pilatos, padeceu e foi sepultado”. Nada se diz de sua vida, mensagem, obra e por que o mataram. No fundo apenas se diz que “nasceu e morreu”. Portanto, um reducionismo que esvazia totalmente a realidade humana de Jesus, aquela que realmente importa, sem perceber o altíssimo risco de esvaziar o Mistério da Encarnação. Ao invés de reforçar a comunidade, na qual todos participavam de tudo, introduziu a hierarquia de pessoas e a divisão das funções, criando dois corpos nas igrejas, o corpo clerical (religiosos, teólogos e oficiantes dos ritos) que tudo sabe e tudo pode e o corpo laical (o povo participante em geral) ao qual cabe apenas ouvir e executar. Ao invés da comunhão dos bens, apanágio das comunidades cristãs primitivas, atestadas pelos Atos dos Apóstolos (capítulos 2 e 4), prevaleceu o espírito individualista pelo qual cada um vive para si e cuida de salvar a sua alma. Mas há ainda um outro tipo de reducionismo, este ainda mais profundo, que atingiu a substância da novidade trazida por Jesus. Assim, a experiência do cristianismo de experimentar Deus como Trindade de Pessoas, sempre em pericórese (é a relação entre a Santíssima Trindade, Triunidade; Deus Pai, Deus Filho e Deus Espírito Santo), comunhão de vida e de amor mútuos, não logrou impor-se historicamente. Esta intuição fundamental e original face às demais religiões foi logo capturada por polêmicas derivadas do paradigma grego de pensamento. Este se caracteriza, com raras exceções, por uma visão substancialista, identitária e não processual da vida e da história, pouco adequada a pensar a Trindade como jogo de relações entre as três divinas Pessoas. Esta, por sua própria natureza, demanda um outro paradigma que vê a realidade em permanente processo de realização e de emergência como é próprio do Mistério, como o temos meditado anteriormente, e típico de fenômenos como a vida, a natureza e o espírito. A maioria dos pensadores cristãos, incapaz de captar a singularidade do modo cristão de dizer Deus, fez com que o discurso pastoral das igrejas se mantivesse no clássico monoteísmo pré trinitário, comum ao judaísmo e às religiões do mundo. A Santíssima Trindade ficou sendo o símbolo do Mistério dos Mistérios e, por isso, tido como inacessível à razão humana e objeto de pura fé. Os intentos de aprofundamento, nos quadros do logos grego, produziram intrincadas discussões com inúmeras heresias, o que isolou mais ainda esta verdade da vida e da prática dos cristãos. Restou sua presença na liturgia mais de forma ritual do que existencial. Outro reducionismo diz respeito ao eclipse da figura do Pai como Pai do Filho. No Credo se professa que Ele é “Pai Todo Poderoso, criador do céu e da Terra”, onisciente e juiz supremo, Senhor absoluto da vida e da morte. Ao lado de tal Pai não resta lugar para um Filho, por isso não é vivido trinitariamente como o Pai do Filho, mas como o Criador de todas as coisas. Esta religião do Pai serviu e continua servindo de justificação ideológica a todo tipo de paternalismo e autoritarismo pelos quais as pessoas são mantidas na dependência e no servilismo. Um Pai no céu, Deus; um pai na Terra, o monarca ou o presidente; um pai na Igreja, o papa; um pai na comunidade, o chefe; e um pai na família; o pai como a autoridade máxima. Esta continua sendo a representação dominante. A exaltação excessiva da figura do Filho. O esquecimento da visão trinitária ocasionou uma concentração exacerbada da figura do Filho encarnado em Jesus Cristo. Surgiu o cristomonismo (predominância exclusiva de Cristo), como se Cristo fosse a única e exclusiva realidade e não houvesse junto com Ele o Pai e o Espírito Santo. Ele é visto como o único Salvador universal, um líder libertador, solitário, ornado com todos os símbolos do poder, sempre exaltado como Senhor e Cristocrator, tendo o cetro numa das mãos, o mundo na outra e uma coroa de ouro e joias na cabeça, coisa que o Jesus histórico, possivelmente, jamais teria visto com os próprios olhos e rejeitaria, indignado, ser ornado com semelhante parafernália. A figura do Servo Sofredor e companheiro na caminhada humana, o Cristo do casal de caminhantes de Emaús é assim poderosamente ofuscada. A exacerbação da figura do Cristo, cabeça invisível da Igreja visível,  reforça as figuras autoritárias e as instituições fundadas no poder centralizador. Este tipo de cristologia reducionista criou seu oposto compensatório que é a cristologia juvenil elaborada em função dos jovens. Ai Jesus aparece como um formoso e entusiasta líder e um herói vigoroso, como qu saído de alguma academia de ginástica, a ser seguido e exaltado. Mas esta imagem hollywoodiana é quase sempre desvinculada dos conflitos inerentes à vida  e à história. Ou então, romanticamente, emerge um Jesus da pastoral familiar, apresentado no meio de Maria e José ou como o doce Jesus de Nazaré, abençoando crianças, ou como o Bom Pastor, cercado de ovelhas em pastos verdejantes ou tristemente olhando para a cidade de Jerusalém que o rejeitou. Uma religião só do Filho se encapsula sobre si mesma como se nada mais existisse para além dela mesma. Torna-se incapaz de ver a presença do Espírito e valores do Reino em outros caminhos espirituais que não nos cristãos, e está a um passo do exclusivismo e do fundamentalismo com referência a revelação e a salvação. O terceiro reducionismo concerne ao esquecimento da figura do Espírito Santo. Tardiamente, na reflexão teológica, o Espírito Santo foi admitido como terceira Pessoa da Trindade, ficando refém das disputas teológicas entre a Ortodoxia e a Igreja Latina com referência ao filioque, quer dizer, a relação de origem do Espírito. Ele é espirado unicamente pelo Pai, assim como o Filho é gerado (Ortodoxia), ou é espirado pelo Pai e pelo Filho ou através do Filho (o filioque da Igreja latina). Esta discussão teológica que parece, no fundo, irrelevante, oculta, na verdade, disputas de poder entre os dois  polos da Cristandade, o Ocidente e o Oriente, cindiu as duas igrejas fundamentais até os dias de hoje. Tal fato produziu um deslocamento: no lugar do Espírito entraram as igrejas. Ele acabou tendo uma função lateral e secundária. Quer queiram as igrejas ou não, o Espírito é fonte de criatividade e de inovação, sopra onde quer, antecipa-se ao missionário, pois se faz presente nos povos pelo amor, pelo perdão e pela convivência solidária. As instituições, no entanto, o veem como fator de perturbação da ordem estabelecida e, por isso, marginalizado e até esquecido. Em razão desta compreensão conservadora e reducionista, os homens e mulheres do Espírito, os místicos e fundadores de novos caminhos espirituais, tiveram sempre dificuldade de reconhecimento por parte da instituição eclesiástica que os manteve e ainda os mantém sob severa vigilância, quando não os marginaliza e até condena. Esquecem a severa advertência de Paulo: “não afogueis o Espírito” (I Ts 5:19). Uma comunidade eclesial sem a presença consciente do Espírito, geralmente é dominada por autoridades eclesiástica, ávidas de ordem e de poder, enrijecidas e burocratizadas. Por outra parte, os movimentos carismáticos, que buscam alimentar uma experiência pessoal de Deus, encontraram no Espírito Santo a sua fonte de inspiração. Dai se explica a proliferação de igrejas carismáticas populares, sejam evangélicas, sejam católicas, mas com formas muito afins de piedade e de organização. Esta expressão carismática ajudou a socializar a palavra na Igreja, reservada somente à hierarquia, abrindo espaço para a criatividade ritual e simbólica, antes negada pela rigidez canônica da liturgia oficial. Mas ela padece de clara insuficiência ao não articular os temas da injustiça, dos pobres e da transformação social, como o Evangelho e com a criatividade própria do Espírito. Por isso, uma religião só do Espírito facilmente cai no sentimentalismo, no entusiasmo juvenil e na alienação face à conflitividade da vida e até no fanatismo e na anarquia espiritual. A Cristandade não encontrou até hoje um ponto de equilíbrio quanto a assunção das divinas Pessoas como o verdadeiro Deus da experiência cristã. Distanciou-se de sua identidade originária de um Deus comunhão amor que deveria se expressar na história, por comportamentos e iniciativas que incentivassem o caráter comunitário, a participação igualitária de todos e a compreensão da cristianismo como uma realidade sempre aberta a novas manifestações e encarnações nas mais diferentes culturas, mas não foi o que predominou. Na Igreja Romana católica ocorreu uma inversão hilária: aquilo que na doutrina da Trindade é verdade (a ausência de hierarquia, pois todas as Divinas Pessoas são igualmente eternas, infinitas e onipotentes) se torna heresia na Igreja (não há igualdade entre os cristãos, mas uma hierarquia só de homens, pretensamente querida por Deus e uma diferença essencial entre clérigos e leigos). Do Livro Cristianismo o Mínimo do Mínimo. Abraço. Davi.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Yasodhara. A Esposa de Sidharta Gautama.



De um modo geral, a maioria das pessoas já ouviu falar do Buddha ou conhece algumas das suas frases ou ensinamentos. Yasodhara foi a sua esposa e conheci uma versão da sua história, quando frequentava a Biblioteca do Monastério Amaravati do Budismo Theravada, a 50 Km de Londres, no Reino Unido. Durante a minha última estadia neste Monastério procurei incessantemente informações sobre alguma “lay women” (mulher que não fosse freira) que me inspirasse, no meu retorno à vida lá fora. Estava longe de pensar que o exemplo mais inspirador que iria encontrar seria o da mulher de Siddhartha Gautama, uma mulher lindíssima exteriormente e interiormente, tal como é relatado na sua história. Buddha e Yasodhara foram considerados como dois nascimentos auspiciosos, próspero, esperançoso na sua época. Eles não eram duas crianças normais, mas sim crianças que tinham dentro de si o potencial para serem grandes líderes e sair da roda de Samsara, ou seja não voltar a nascer na forma humana. Por isso, havia a crença de que seriam duas crianças do sexo masculino. No entanto, numa das famílias nasceu uma menina a quem deram o nome de Yasodhara. Yasodhara era uma mulher muito generosa e justa. Apesar de viver numa família abastada, uma das suas maiores interrogações era porque razão os empregados não podiam comer da mesma comida que os membros do palácio. Ela não conseguia compactuar com o fato de uns viverem com tanto e outros com tão pouco. Siddhartha era o seu primo e por volta dos seus 16 anos chegou a hora dele se casar. Assim, muitas mulheres foram até ao seu palácio para se apresentarem como candidatas. O que atraiu a atenção de Yasodhara para Siddhartha foi um episódio que o seu irmão lhe contou. Ele contou uma história de como Buddha reclamou um cisne como sendo seu, sem o matar. Ele disse: O pássaro pertence aquele que salvar a sua vida e não aquele que a tirar. Estes eram os mesmos valores de Yasodhara e foi a atitude compassiva e a coragem em questionar a tradição de caçar daquela época, que a levou a ir ao palácio apresentar-se como candidata. O palácio estava cheio de mulheres, pois Buddha era conhecido como sendo um homem muito bonito e inteligente. Mas, logo que Buddha vê Yasodhara, ele escolhe-a como sua noiva. Ele sabia que já a tinha amado durante muitas vidas e sentiu esse reconhecimento e um amor profundo por ela. Buddha ajoelhou-se aos pés de Yasodhara e pediu para ela ser a sua mulher. Yasodhara aceitou e tornou-se na esposa de Siddhartha Gautama. O ponto mais interessante desta história é que Yasodhara depois também reconheceu Buddha. Ela não aceitou o seu pedido de forma passiva. Ambos escolheram permanecer um com o outro mais uma vida, pois sabiam que esta seria a sua última vida e queriam fazê-lo juntos. Mesmo tendo sido avisada que Buddha poderia deixá-la no futuro, Yasodhara não recuou. A lealdade, o amor e o apoio que sempre tinham dado um ao outro em outras vidas foi mais forte. Além disso, eles tinham o mesmo sonho para o mundo e partilhavam das mesmas ideias e causas. O amor deles transformou-se numa missão e numa parceria espiritual. Yasodhara fez a vida de Siddhartha muito feliz e trouxe sentido para a vida dele. Nutriu-o, amou-o e fortaleceu-o durante 13 anos. Repartiram alegrias, planos, projetos e fizeram um filho. Na altura em que Buddha sentiu o impulso para um desenvolvimento espiritual maior, ele compartilhou-o com Yasodhara que prontamente o apoiou. Ela encorajou-o a sair do palácio e a começar a sua jornada. Antes da sua partida fizeram amor pela última vez, e depois Buddha foi atrás do objetivo que ambos partilhavam. A história que me contaram, de que Buddha tinha abandonado a sua mulher e o seu filho, e que tinha existido rancor, não ressoou muito comigo. No meu íntimo eu sempre senti que não tinha havido abandono nem rancor. Buddha era um homem sério e amoroso e sempre acreditei que ele fez o que fez pela sua mulher, pelo seu filho, e por um amor universal a todos os seres deste e de outros mundos. Yasodhara era uma mulher muito compreensiva, sabia da missão do seu amor e apesar de ir sentir muito a sua falta, apoiou a sua decisão. Desde o momento que Buddha saiu do palácio Yasodhara seguiu os seus passos. Quando soube que a sua roupa era uma túnica, ela trocou os seus lindos vestidos e vestiu uma túnica também. Quando ele tirou todos os ornamentos que trazia consigo e passou a comer apenas uma refeição por dia, Yasodhara fez o mesmo. Quando Buddha trocou o luxo por uma vida simples, Yasodhara deixou de dormir num local luxuoso, e transformou o seu quarto, de forma a seguir os passos do seu amado. Buddha tornou-se num ascético e Yasodhara também. Recusou todas as propostas de casamento que recebeu posteriormente, rapou o cabelo e tornou-se celibatária. Enquanto Buddha foi atrás da iluminação fora do palácio, Yasodhara ficou no palácio, mas não esqueceu a iluminação nem o filho de ambos. Os dois sabiam que esta seria a sua última vida e estavam dispostos a fazer tudo para isso acontecer. A intenção, a determinação e o foco de ambos estava alinhada, porque era o amor que os unia. O pai de Yasodhara pediu-lhe para ela governar o seu reino, mas ela respondeu que não, e continuou o seu caminho espiritual. Quando Buddha apareceu de novo no palácio como Desperto, Yasodhara formou a ordem de monjas e o filho de ambos entrou para a ordem dos monges. Yasodhara tornou-se discípula do seu marido, continuou a desenvolver a sua espiritualidade e iluminou bastante rápido. No dia em que soube que ia morrer, Yasodhara chegou ao pé de Buddha e agradeceu-lhe por ele lhe ter mostrado o caminho. Ajoelhou-se aos pés do homem que tinha sido seu marido e seu mestre e disse: Eu sou o meu único refúgio. Depois da despedida deixou o corpo físico e entrou no reino imortal, do Nirvana. Yasodhara faleceu dois anos antes de Buddha, com 78 anos. Esta versão da história de Yasodhara e Buddha é contada na tradição Sarvastivada, a Escola inicial do Budismo. Também há relatos em textos antigos, como o Pali Vinaya, o Mulasarvastivada, o Lokottaravada, o Dharmaguptaka, e o Mahisasaka Vinaya. O livro Buddha Mom: A Journey Through Mindful Mothering” de Jacqueline Kramer (1951-  ) dá dicas preciosas para as mulheres desenvolverem uma prática espiritual enquanto mães e mulheres de família. Apaixonei-me por esta versão da história assim que a li e tal como acontece na maioria das histórias dos salvadores do mundo, o papel da mulher não ganha muito destaque. No entanto, sem a presença do feminino será que o masculino tinha conseguido materializar a sua missão? Será que não foi o amor que impulsionou a determinação e a coragem necessária para que Buddha não desistisse do que sabia que tinha que fazer? Será que todos aqueles anos que Buddha e Yasodhara passaram juntos, não foram imprescindíveis para que Buddha pudesse concretizar o seu objetivo, que não era mais do que o objetivo de ambos? Será que a fidelidade de Yasodhara não foi essencial para que Buddha fosse energizado pela força do amor? Buddha não teve mais nenhuma mulher, Yasodhara não teve mais nenhum homem. Mesmo fisicamente separados, eles sempre estiveram espiritualmente unidos. Será que o amor mundano que ambos viveram com total entrega, dedicação e profundidade não foi fundamental para que o amor Universal pudesse existir? Yasodhara era uma mulher muito poderosa e inteligente, tal como Buddha. Ambos partilharam a mesma missão e os mesmos sinais promissores de que dois líderes iam surgir para ajudar a humanidade. Buddha ficou conhecido como o Desperto, tem todo o seu mérito e valor, mas por trás dele existia uma grande mulher Yasodhara, que mais uma vez foi devota ao seu amor, o apoiou e no final também Despertou. No catolicismo também Jesus teve o apoio de uma amiga íntima, Maria Madalena, uma peça chave no seu percurso, mesmo que a Igreja Católica não o queira reconhecer. Em tantas outras histórias existe a presença do feminino. Se não é um grande amor é uma mãe ou uma irmã, mas não tenho dúvidas que sem esta presença o desfecho podia ter sido bem diferente. O masculino precisa do feminino para se desenvolver e se fortalecer. Nenhuma destas mulheres procurou reconhecimento e muito menos sobressair. A oportunidade de poderem ser devotas ao seu amor pela última vez era tudo o que elas desejavam. Talvez tenha sido o seu altruísmo e a sua profundidade no amor, que ensinou o masculino a ser profundo na sua forma de amar. Tal como Buddha disse ao seu pai, quando este elogiou Yasodhara pela devoção que ela demonstrou durante todos os anos em que ele esteve fora: Não só neste último nascimento, mas também em anteriores, Yasodhara era dedicada e fiel a mim. Admito que sinto uma pontinha de inveja de Yasodhara. Para mim esta é uma parceria que vale a pena viver. Tem amor, tem sexo, tem espiritualidade e a mesma causa e no fim tem solicitude, cuidado e iluminação. É original, é única e não é para qualquer um. Que esta versão possa trazer mais dignidade às mulheres no budismo e a lembrança de que o feminino também é um símbolo de devoção e de iluminação. www.clarissecunha.com.br. Abraço. Davi.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Ausência de Desejos.



Filosofia Oriental. Jiddu Krishnamurti (1895-1986). Há muitas pessoas para quem a qualidade da Ausência de Desejos (abnegação, desapego) é difícil, por pensarem que os seus desejos são elas próprias, e que, se esses desejos peculiares, simpatias e antipatias lhes forem tirados, nada mais lhes restará. Essas, porém, são somente as que ainda não viram o Mestre; à luz de Sua Santa Presença, todo desejo sucumbe, exceto o de se assemelhar a Ele. No entanto, antes mesmo de teres a ventura de encontra-lo face a face, podes conquistar a ausência de desejo, se o quiseres. O discernimento já te demonstrou que as coisas que os homens mais desejam, tais como a riqueza e o poder, não merecem o trabalho de ser possuídas. Quando isto realmente é sentido, e não apenas enunciado, cessa todo o desejo por elas. Tudo isto é simples: necessitas apenas compreender. Há, porém, algumas pessoas que recusam-se a prosseguir em objetivos terrenos, somente no intuito de alcançar o céu, ou para atingir a libertação pessoal dos renascimentos. Não deves cair neste erro. Se te esqueceste completamente de ti mesmo, não te podes preocupar com a época da libertação do teu Ego ou com a espécie de céu que lhe caberá. Lembra-te que todo desejo egoísta é um liame e, por muito elevado que seja o seu objetivo, enquanto dele te não desembaraçares, não estarás completamente livre para te devotares à obra do Mestre. Quando tiverem desaparecido todos os desejos pessoais, poderá ainda restar o de apreciares o resultado do teu trabalho. Se auxiliares alguém, quererás ver até que ponto o tens ajudado. Talvez mesmo queiras que ele o reconheça também e se te mostre grato. Isto, porém é ainda o desejo e também uma falta de confiança. Quando aplicares a tua energia em auxiliar alguém, há de advir dai um resultado, quer possas vê-lo quer não. Se conheces a Lei, sabes que deve ser assim. Precisas, pois, fazer o bem por amor ao bem, e não com a esperança da recompensa. Trabalha por amor ao trabalho e não para ver o resultado. Deves entregar-te ao serviço do mundo porque o amas e não podes deixar de fazê-lo. Não desejes os poderes psíquicos, eles virão quando o Mestre achar que melhor te será possuí-los. Forçá-los muito cedo traz consigo muitas perturbações. Frequentemente o seu possuidor é desencaminhado por falazes espíritos da natureza, ou então se torna vaidoso e se julga isento de cair em erro. Em todo caso, o tempo e a força necessários para adquiri-los poderiam ser gastos em trabalhar para os outros. Eles virão no decurso do teu desenvolvimento, porque devem vir, e se o Mestre entender que te será útil possuí-los mais cedo, te ensinará como desenvolvê-lo com segurança. Até então, melhor será que os não possuas. Deves precaver-te, também, contra certos pequenos desejos comuns na vida diária. Nunca desejes sobressair nem parecer instruído; não desejes falar. É bom falar pouco; melhor ainda é nada dizer, a não ser que estejas seguro de que o que pretendes dizer é verdadeiro, amável e útil. Antes de falar, pensa cuidadosamente se o que pretendes dizer preenche essas três qualidades; se assim não for, não o digas. É bom que te habitues desde agora a refletir cuidadosamente antes de falar pois, quando alcançares a Iniciação, terás de vigiar cada palavra a fim de não dizeres o que não deve ser dito. Muitas das conversações ordinárias são desnecessárias e insensatas; e, quando chegam à maledicência, tornam-se perversas. Assim, acostuma-te antes a ouvir do que a falar. Não emitas opinião senão quando diretamente solicitada. Um enunciado das qualidades requeridas é assim formado: saber, ousar, querer, calar, e a última das quatro é a mais difícil de todas. Um desejo vulgar que deves severamente reprimir é o de te imiscuíres (envolver) nos negócios de outrem. O que um homem faz, diz ou crê, não é de tua conta e precisas aprender a deixa-lo absolutamente entregue a si próprio. Ele tem pleno direito à liberdade de pensamento, palavra e ação, até ao ponto em que não interfira no que concerne a outrem. Tu próprio reclamas a liberdade de fazer o que julgas bom. Deves outorgar a mesma liberdade aos outros e, quando a usarem, não tens o direito de te pronunciares a respeito. Se julgas estar alguém fazendo o mal e encontras uma oportunidade de dizer em particular, e muito delicadamente, porque assim pensas, talvez consigas convencê-lo; porém, em muitos casos, isto mesmo não passaria de uma interferência (indevida) indébita. De modo algum deverás murmurar com uma terceira pessoa sobre o assunto, pois isso seria uma ação extremamente má. Se observares um caso de crueldade para com uma criança ou um animal, é teu dever intervir. Se vires alguém violando as leis do país, deves informar as autoridades. Naturalmente em casos manifestamente graves, como o da prática da crueldade, ou quando intimado a fazê-lo. Se tiveres incumbido de instruir uma outra pessoa, pode tornar-se teu dever adverti-la suavemente de suas falhas. Exceto em tais casos, ocupa-te de teus próprios negócios e aprende a virtude do silêncio. Do Livro Aos Pés do Mestre. Abraço. Davi.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Filme Samsara - 2001.



"Samsara é uma produção independente de 2001, indiana, italiana, francesa e alemã. Dirigido pelo cineasta indiano Pan Nalin. Conta a historia de um monge budista que busca a iluminação. Desde os 5 anos de idade ele viveu sob a vida num monastério, até o momento em que se torna um homem e decide conhecer a vida "mundana" material. Desse modo, ao se apaixonar, sente grande atração por uma camponesa chamada Pema. O filme mostra uma faceta do misterioso mundo da região do Tibete, em uma instigante história de uma busca profunda, que ocorre entre o dilema: procurar a verdade única do nirvana ou satisfazer a 1000 desejos do corpo e da mente de um homem comum (...). Aclamado em toda a Europa vencedor de diversos festivais de cinema". Samsara não é um filme que digamos nos comove do início ao fim, mas por ser uma produção independente se descola de alguns conceito da filosofia budista sem perder de vista a essência desta rica tradição espiritual. Mesmo com uma proposta de questionar alguns milenares pressupostos dessa cultura religiosa, assume esses aspectos numa discussão filosófica e conscienciosa, ligada numa referência subjetiva com elementos de pesquisa histórica. Desse modo, os que já apreciam essa filosofia espiritual reconhecerão que esse foi, no âmago aquilo que o Iluminado, Budha disse a seus discípulos em particular, num de seus sermões "a verdade não está  fora, a verdade está dentro de você". O Budha nunca arrogou para si a posse única da verdade e nem encorajou seus discípulos a que o fizessem, mas em suas predicas pediu que seus seguidores aceitassem as verdades dos outros, sem censurá-los ou menosprezá-los, mas tendo um coração complacente e interagindo com essas opiniões divergentes. A proposta do diretor indiano, na perspectiva filosófica e cultural se reverte de coragem e importância, pois tendo uma caracterização, segundo penso, com ênfase mais na secularização do roteiro que no enfoque eminentemente espiritual. Este a meu ver, foi o diferencial que fez com que o filme recebesse diversos prêmios da crítica especializada, inclusive expandindo a cultura budista pela (Europa) velho mundo. O cenário é belíssimo, rodado nas majestosas paisagens do Ladakh, nas cordilheiras do Himalaia indiano. O filme começa com uma caravana com dezenas de pessoas indo para um monastério budista levando algumas crianças. Quando alguns olham para o céu percebem uma ave, ao alto voando em círculo, e logo depois algo cai em cima de uma espécie de pagode, altar budista. No Tibete antigo muitas crianças eram levadas à vida religiosa por suas famílias, quem sabe, na intenção de verem seus filhos, escolhidos como um Bodhisattva, uma encarnação do Budha. Já que o Budha disse; "Não sou o primeiro Budha que existiu na terra, e nem serei o último. No tempo devido outro Budha levantar-se-á no mundo, um santo, um ser divinamente Iluminado. Dotado de sabedoria em sua conduta, benigno, conhecendo o universo, um líder incomparável dos homens, um mestre dos anjos e dos mortais". Tashi o protagonista do filme, é encontrado pela caravana numa caverna, tendo meditado por mais de três anos. Retirado por seus pares cortam lhe os longos cabelos; toma um banho num rio vestindo um hábito (roupa religiosa), sendo por eles levado ao monastério. Ao chegarem percebe-se que o local é simples, mas seguro dentro das limitações da vida monástica. As crianças introduzidas brincam sem entenderem o que foram fazer por lá, e Taishi começa o cotidiano da rotina devocional. Em uma das salas há uma grande estátua retratando a face do Budha. O Budismo não têm dogmas, muito menos o conceito cristão de idolatria; a imagem do Budha têm o intuito de trazer a honra e reverência à seus ensinos, e a lembrança de que a ignorância produz sofrimento (Samsara), retardando a Iluminação.  Nesse ambiente é introduzido no personagem principal, a crise existencial, revelada no conflito se continuaria na vocação à alcançar a purificação completa e o estado desperto de iluminação ou retornaria a normalidade leiga e mundana renunciando a vida religiosa. Tashi tem sonhos, onde é acariciado por uma mulher; conversa com um monge sobre o ocorrido e este o consola mostrando que as tentações quando rejeitadas são forma de aperfeiçoar nosso dharma (missão divina), e o sofrimento advindo delas demonstram o ciclo do Samsara (sofrimento) pelo qual devemos passar. Tashi ao receber uma incumbência de seus superiores, fora do monastério, troca olhares com uma jovem conhecida ao entrar na propriedade de sua família. Refletindo sobre esse fato, ao dormir, pela manhã decide abandonar o monastério, seguindo seu próprio caminho pelo mundo. Esse fato é marcado por um belo "ritual" onde Tashi vai a um lago e despido de suas vestes monásticas toma um banho. Já com vestes normais montado num cavalo e acompanhado por um cão segue à uma região distante, mas já previamente determinada quando numa caverna conversa com um velho monge que lhe mostra uma antiga escritura (Sutra) budista. Depara-se com um campo de trigo, dormindo aos arredores. Uma linda jovem da propriedade, Pema, vendo o estranho naquele estado, se compadece dele, trazendo comida e cobertor para passa a noite. Acabam fazendo sexo. Fala sobre ele à seu pai, que convencido resolve contratá-lo, pois é tempo de colher a lavoura para ser comercializada. Na região existe um comprador das mercadorias dos fazendeiros, que desonesto, usando uma balança com aferição incorreta rouba na pesagem dos produtos. Além de ameaçar aqueles que não negociarem com ele. Uma situação que se perpetuava a dezenas de anos onde um rico produtor, intimidava e subornava a produção dos agricultores pobres. Tashi descobre essas falcatruas e junto com seu patrão decide negociar os produtos diretamente na cidade. Retorna com o valor da venda, agora correto, e casa-se com Pema tendo um filho. Quando este nasce para a felicidade da família, a parteira diz: "acaba de renascer mais uma vida". No budismo reencarnação e renascimento são coisas distinta; essa é uma questão de opinião nas tradições espiritualista orientais. O hinduísmo por falar em espírito universal, entende que a mônada, a centelha divina primordial do ser que evoluirá até alcançar a consciência cósmica, está presente em todas as consciência, desde a elemental até os avatares e mahatma. O budismo ao tratar do conceito da Vacuidade do Eu e do princípio da Não Existência, ou seja se a nossa própria individualidade (alma no cristianismo) é uma ilusão, Maia. Como essa ilusão pode existir e transferir-se para outro corpo? Assim preferem o termo transmigração ou renascimento. Isso parece fazer mais sentido na cultura budista, pois os renascimentos nem sempre acontecem o reino humano, podendo também, conforme as consequências cármicas surge no reino animal, mineral ou vegetal. Uma cena que aparentemente pode chocar-nos, é quando Tashi e Pema tem relações sexuais, e seu filho garoto assiste a esse fato. Isso não é comum entre casais cristãos, tão pouco recomendado, se pensarmos numa ética religiosa. Tashi pela terceira vez tem relacionamento sexual, agora com a melhor amiga de Pema, quando esta vai resolver algumas questões na cidade. Decididamente Tashi não tem escrúpulos morais. Essa foi a característica criada pelo diretor para definir o mundanismo do personagem, quando abandona o compromisso da santidade e pureza que a busca pela iluminação proporciona no bhikku, discípulo. Essa impureza lasciva está latente em todos os homens, uma essência impregnada em nosso comportamento que mesmo com a meditação nirvânica não é possível debelar. Isso cabe ao discípulo pela busca do autoconhecimento e a resignação com coragem e determinação de rejeitar os desejos e apegos da transitoriedade temporal. É percebido que Tashi confundia as três joias do Budismo. O Budha, aquele que está desperto. O Dharma, o caminho da compreensão é do amor. A Sangha, a comunidade que vive em consciência e harmonia com os poderes da natureza e as forças do cosmo. Tinha consciência de seu Budha interior (que infelizmente evoluiu pouco), mas quanto aos outros dois itens, seus conceitos eram elementares, e desprovido de argumentação espiritual. Tanto que sua fala, como monge, é pobre e sua prática do Dharma não se sobressai em sua experiência particular. Assim, os conflitos e desviou morais se acentuavam comprometendo sua busca pela verdade e compreensão do Samsara existencial. No meio desse descontrole emocional e mental, resolve retornar para o monastério. Na visão de quem assiste o filme, uma decisão temerária e irrefletida. Sem comunicar à sua esposa, na calada da noite, Tashi, foge de sua responsabilidade de marido, abandonando mulher e filho. Esse ponto do roteiro, foi brilhantemente explorado pelo diretor, pois implicitamente, traz à luz o tema de Sidharta Gautama deixando seu palácio, com sua esposa Yashodhara e seu filho Rahul, enquanto eles estavam dormindo, para compreender porque o homem sofre (Samsara), e como libertá-lo dessa situação. É interesse que, se prestarmos atenção aos fatos subsequente a esse evento, reconheceremos que o indiano diretor Pan Nalin, deixa claro a diferença da atitude de Tashin em relação ao Gautama. Pois Yashodhara em sua sabedoria e espiritualidade, aceita a decisão de seu marido Sakiamuni, se "sacrificando"  para que ele, siga o caminho da iluminação para libertar todos os seres do cativeiro do Samsara. Budha compartilhou antes com Yashodara sua decisão de encontrar a libertação para o sofrimento humano. Ela prontamente o apoiou, inclusive anos depois quando o Budha retorna ao palácio, ela torna-se discípula dele, instituindo uma ordem religiosa budista para mulheres. O Budha foi perguntado, depois que alcançou o Nirvana, se ele ainda amava seu filho Rahul, pois Yashodhara havia falecido. Ele disse que o amava muito mais agora. O diálogo ao final de Tashi e Pema, que não entende tal atitude tomada pelo marido, é uma expressão do desconsolo e inconsequência daquele que desrespeitando o outro, desonradamente fere o sentimento daquela que dividiu com ele o leito nupcial. Tashi com essa desrespeitosa atitude assume sua covardia e tardiamente derrama lágrimas que não trazem consolo nem são capazes de perdoá-lo da infâmia do abandono do lar. A cena que o diretor produziu, é linda, pois em Tashi não se apresenta nenhuma lembrança em relação ao fato com o Budha. Desse modo concluímos que ele estava mergulhado em seu egoísmo e desilusão. Na verdade pensando nele mesmo e não em sua querida família. Não poderia terminar diferente a trajetória de Tashi em busca de prazeres transitórios, e sua irresponsabilidade em tratar com as emoções e sentimentos humanos. Um péssimo exemplo que nunca deve ser imitado e uma lição de que os que acompanham essa trajetória cairão num desprezo da alma e num caminho de desconsolo. Segue solitário por uma longa estrada, com a intenção de novamente voltar ao monastério. E por sua mesquinhez de caráter, implicitamente, o roteirista deduz que isso não ocorreu para sua tristeza e desgosto. O filme está disponível no http://www.youtube.com.br, com legenda em português e várias traduções. Recomenda-se indicativo de idade de 18 anos. Abraço. Davi.