domingo, 30 de agosto de 2020

A ORAÇÃO NOS LEVA AO EQUILÍBRIO EMOCIONAL

 

Islamismo. www.ligaislamica.org.br. Texto de Sheikl Mohamad Al Bukai. A ORAÇÃO NOS LEVA AO EQUILÍBRIO EMOCIONAL E AO BEM-ESTAR. Louvado seja Allah, o Senhor do Universo. Testemunho que não outra divindade além de Allah e testemunho que o Muhammad é Seu servo e Mensageiro. Queridos irmãos e irmãs, início este sermão com as palavras de Deus reveladas por meio do Alcorão sagrado: “Em verdade, o homem foi criado com suscetibilidade ao medo e desespero. Quando o mal o toca, se irrita e o acomete o desanimo. Mas quando o bem o toca,torna-se avarento”. (Alcorão, 70:19-21). Irmãos e irmãs na fé, esse nobre versículo contém uma verdade comprovada em relação ao ego humano. O ser humano, quando passa por dificuldades, sente um medo que pode chegar aos extremos e levá-lo ao desequilíbrio emocional, fazendo com que tome decisões incoerentes e fora do real foco e contexto de valores. Essa verdade que nos é informada no Alcorão, faz parte de nosso dia a dia. A cada raiar do sol, o ser humano fica exposto a diversas situações, adversas ou não, num só dia. Algumas situações o fazem momentaneamente felizes, e outras o transportam para um mundo de tristeza profunda. A pessoa sai de casa para o seu trabalho com disposição e ânimo até se deparar com o acúmulo de atividades que a levam à impaciência com as outras pessoas, fazendo com que sentimentos nocivos se apoderem de seu coração, por exemplo, a raiva, a tristeza e a desolação. Caso venha a fechar um negócio rentável, fica radiante de alegria, mas se logo depois recebe a notícia de que seu filho adoeceu, se entristece novamente e, havendo a cura, volta a vibrar de alegria... e ,com esta sucessão de situações e emoções em um mesmo dia, as pessoas se tornam reféns e vulneráveis a tudo, muitas delas durante uma vida inteira. Vemos as pessoas, em geral, preocupadas em manter certo padrão de vida, com muito medo de perder o que conquistaram em termos materiais; os comerciantes e empresários preocupados com eventuais prejuízos e recessão da economia; empregados de todas as categorias com receio de perderem seus postos de trabalho; todos com muita preocupação referente à saúde, temendo a moléstias que os incapacitem de cumprir suas tarefas e responsabilidades; temem em ver a juventude do corpo se esvaindo e entrar na terceira idade, os aproximando da morte; e, além de tudo, temem que seus bens ou fortunas caiam em mãos estranhas após sua morte! Ao ser acometido por qualquer infortúnio, o ser humano empalidece, entra em estado de medo ou pavor, não se aguenta sobre os calcanhares, acumulando as preocupações, mas quando recupera os bens e a saúde perdidos, volta a se regozijar! Para que o ser humano fique imune as intempéries do cotidiano, preservando assim o seu estado emocional, ele deve compreender a tênue linha que separa os conceitos referentes ao bem e ao mal e rever os padrões de pensamentos que regem sua mente e se apoderam de seu estado de humor. Quais os seus parâmetros para definir o que é bom e o que é ruim para a sua existência? As vidas das pessoas são repletas de situações que são rotuladas como boas e ruins, auspiciosas e mal agouradas; a rotulação não tem nenhum fundamento real. A pobreza ou a vida modesta, a doença e as dores, os infortúnios ou as privações, as provações e a morte, não podem ser vistas como algo ruim, assim como não podemos ver a riqueza material e o conforto, o prestigio social e o poder sem limites como algo bom. Todas essas condições devem ser vistas como uma massa a ser modelada, são elementos e matéria-prima que foram colocadas em nossas mãos. O que fazemos com essas situações é o verdadeiro critério que deve ser usado para definirmos o que é bom ou ruim. A pergunta correta não se inicia com “por que”, mas “para quê”. Se você é um daqueles que costuma rotular as situações da forma descrita anteriormente, preste atenção nas palavras de Deus, o Altíssimo: “Quanto ao homem, quando seu Senhor o coloca à prova, honrando-o e agraciando-o, diz (empertigado): ‘Meu Senhor me honrou!’. Porém, quando o coloca à prova, restringindo a sua graça, diz: ‘Meu Senhor me humilhou!’”. (Alcorão, 89:15-15). A abundância não é concedida por Deus para nos honrar, assim como a privação que nos alcança não vem de Deus para nos humilhar. Ambas situações têm de ser recebidas e aceitas como provações. A abundância e a privação são páginas em branco, uma dádiva de Deus, para que façamos uso de nosso livre-arbítrio, uma oportunidade para escrever a nossa história, criarmos a nossa realidade em todos os sentidos nas quais podemos anexar mais páginas ou rasgá-las tomados de raiva e inconformismo. Com a abundância, poderemos nos afastar do caminho e acumular más ações, empobrecendo assim a nossa bagagem carregada conosco na passagem para a outra vida; mas também poderemos organizá-las ou mesmo fazê-las transbordar de boas ações que levam a prosperidade a muitos lares, por exemplo. A pobreza também pode nos levar para fora do caminho, ao nos entregarmos à ilusão de que na abundância material mora a felicidade, podemos chegar a cogitar em ter atitudes que nos levam, por exemplo, a cometer delitos e destruir lares. O chefe e o subordinado, o dono do poder e o oprimido, o belo e o destituído de beleza, o esperto e o humilde, o famoso e o anônimo, todos têm as condições necessárias para transformar as condições e circunstâncias em que se encontram, em ferramentas que os ajudarão a trilhar seus próprios caminhos rumo ao bem ou ao mal. Tudo na vida depende da forma e da perspectiva de nossa visão. O ideal é procurarmos a trilha que nos leva a ter uma visão de 360º, mas isso só é possível se aceitarmos as palavras de Deus, que nos garante que o tempo em que vivemos na Terra e ínfimo se comparado à eternidade, se basearmos nossas vidas na certeza de que sim, existe o Paraíso e o inferno, de que sim, o Juízo Final já existe e está a nossa espera; os conceitos mundanos de bom e ruim se diluem, pois assim entramos na esfera do conhecimento dessas verdades. Ao analisarmos o versículo que dá sequência ao nobre versículo mencionado no início deste sermão, constatamos que a pessoa que é crente fica imune às suscetibilidade e não se desespera. Deus definiu, por meio do Alcorão Sagrado, oito características que diferenciam o crente. Voltemos ao início para meditarmos sobre o seu conteúdo de forma profunda e com razoamento. O Altíssimo diz: “Em verdade, o homem foi criado com suscetibilidade ao medo e desespero. Quando o mal o toca, se irrita e o acomete o desanimo, mas quando o bem o toca, torna-se avarento. Exceto os que oram e perseveram nas orações e parte de seus bens destinam, como por direito, para o mendigo e o desafortunado. São aqueles que creem no Dia do Juízo e são reverentes, por temor ao castigo do Senhor, pois, desse castigo, ninguém está seguro. São aqueles que protegem a castidade, salvo com as suas esposas ou aquelas que estiverem cativas ou escravas - e, nisso não são censuráveis. Mas os que cobiçam mais mulheres, serão culpados de transgressão. Os que respeitam as suas obrigações e os seus compromissos, que são sinceros em seus testemunhos, e os que preservam as suas orações, estes serão honrados com jardins”. (Alcorão, 70:19-35 ). Percebemos que as características se iniciam com a menção dos que fazem as orações e se encerra novamente com eles, englobando as orações prescritas e voluntárias. A oração é o cordão que nos liga a Deus, o Louvado, o Altíssimo e, por meio dela, alcançamos o bem-estar espiritual, o equilíbrio emocional e a pacificação do coração. GRAÇAS A DEUS, O SENHOR DOS MUNDOS. Sheikh Mohamad Al Bukai. www.ligaislamica.org.br.
14/10/2011

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

DOCUMENTO DE ABU DHABI SOBRE A FRATERNIDADE HUMANA

 

Documento de Abu Dhabi – Emirados Árabes Unidos. www.ihu.unisinos.br. ABU DHABI: DECLARAÇÃO CONJUNTA DO PAPA FRANCISCO E O GRANDE IMAM DE AL-AZHAR. No dia 04-02-2019, Papa Francisco e o Grande Imam de Al-Azhar Ahmed Al-Tayyib assinaram uma declaração conjunta que marca a história das relações entre a Igreja e o Islã. Nesta declaração conjunta, os dois líderes religiosos chamam atenção para questões importantes como a miséria, a exploração e a degradação moral e traçam um caminho, baseado no trabalho conjunto, capaz de reverter esses males e amenizar suas consequências. Eis a declaração. A fraternidade humana. Em prol da paz mundial e da convivência comum. Prefácio. A fé leva o crente a ver no outro um irmão que se deve apoiar e amar. Da fé em Deus, que criou o universo, as criaturas e todos os seres humanos – iguais pela Sua Misericórdia –, o crente é chamado a expressar esta fraternidade humana, salvaguardando a criação e todo o universo e apoiando todas as pessoas, especialmente as mais necessitadas e pobres. Partindo deste valor transcendente, em vários encontros dominados por uma atmosfera de fraternidade e amizade, compartilhamos as alegrias, as tristezas e os problemas do mundo contemporâneo, a nível do progresso científico e técnico, das conquistas terapêuticas, da era digital, dos mass-media, das comunicações; a nível da pobreza, das guerras e das aflições de tantos irmãos e irmãs em diferentes partes do mundo, por causa da corrida às armas, das injustiças sociais, da corrupção, das desigualdades, da degradação moral, do terrorismo, da discriminação, do extremismo e de muitos outros motivos. De tais fraternas e sinceras acareações que tivemos e do encontro cheio de esperança num futuro luminoso para todos os seres humanos, nasceu a ideia deste «Documento sobre a Fraternidade Humana». Um documento pensado com sinceridade e seriedade para ser uma declaração conjunta de boas e leais vontades, capaz de convidar todas as pessoas, que trazem no coração a fé em Deus e a fé na fraternidade humana, a unir-se e trabalhar em conjunto, de modo que tal documento se torne para as novas gerações um guia rumo à cultura do respeito mútuo, na compreensão da grande graça divina que torna irmãos todos os seres humanos. Documento. Em nome de Deus, que criou todos os seres humanos iguais nos direitos, nos deveres e na dignidade e os chamou a conviver entre si como irmãos, a povoar a terra e a espalhar sobre ela os valores do bem, da caridade e da paz. Em nome da alma humana inocente que Deus proibiu de matar, afirmando que qualquer um que mate uma pessoa é como se tivesse morto toda a humanidade e quem quer que salve uma pessoa é como se tivesse salvo toda a humanidade. Em nome dos pobres, dos miseráveis, dos necessitados e dos marginalizados, a quem Deus ordenou socorrer como um dever exigido a todos os homens e de modo particular às pessoas facultosas e abastadas. Em nome dos órfãos, das viúvas, dos refugiados e dos exilados das suas casas e dos seus países; de todas as vítimas das guerras, das perseguições e das injustiças; dos fracos, de quantos vivem no medo, dos prisioneiros de guerra e dos torturados em qualquer parte do mundo, sem distinção alguma. Em nome dos povos que perderam a segurança, a paz e a convivência comum, tornando-se vítimas das destruições, das ruínas e das guerras. Em nome da «fraternidade humana», que abraça todos os homens, une-os e torna-os iguais. Em nome desta fraternidade dilacerada pelas políticas de integralismo e divisão e pelos sistemas de lucro desmesurado e pelas tendências ideológicas odiosas, que manipulam as ações e os destinos dos homens. Em nome da liberdade, que Deus deu a todos os seres humanos, criando-os livres e enobrecendo-os com ela. Em nome da justiça e da misericórdia, fundamentos da prosperidade e pilares da fé. Em nome de todas as pessoas de boa vontade, presentes em todos os cantos da terra. Em nome de Deus e de tudo isto, Al-Azhar al-Sharif – com os muçulmanos do Oriente e do Ocidente - juntamente com a Igreja Católica – com os católicos do Oriente e do Ocidente – declaramos adotar a cultura do diálogo como caminho; a colaboração comum como conduta; o conhecimento mútuo como método e critério. Nós – crentes em Deus, no encontro final com Ele e no Seu Julgamento –, a partir da nossa responsabilidade religiosa e moral e através deste Documento, rogamos a nós mesmos e aos líderes do mundo inteiro, aos artífices da política internacional e da economia mundial, para se comprometer seriamente na difusão da tolerância, da convivência e da paz; para intervir, o mais breve possível, a fim de se impedir o derramamento de sangue inocente e acabar com as guerras, os conflitos, a degradação ambiental e o declínio cultural e moral que o mundo vive atualmente. Dirigimo-nos aos intelectuais, aos filósofos, aos homens de religião, aos artistas, aos operadores dos mass-media e aos homens de cultura em todo o mundo, para que redescubram os valores da paz, da justiça, do bem, da beleza, da fraternidade humana e da convivência comum, para confirmar a importância destes valores como âncora de salvação para todos e procurar difundi-los por toda a parte. Partindo duma reflexão profunda sobre a nossa realidade contemporânea, apreciando os seus êxitos e vivendo as suas dores, os seus dramas e calamidades, esta Declaração acredita firmemente que, entre as causas mais importantes da crise do mundo moderno, se contam uma consciência humana anestesiada e o afastamento dos valores religiosos, bem como o predomínio do individualismo e das filosofias materialistas que divinizam o homem e colocam os valores mundanos e materiais no lugar dos princípios supremos e transcendentes. Nós, embora reconhecendo os passos positivos que a nossa civilização moderna tem feito nos campos da ciência, da tecnologia, da medicina, da indústria e do bem-estar, particularmente nos países desenvolvidos, ressaltamos que, juntamente com tais progressos históricos, grandes e apreciados, se verifica uma deterioração da ética, que condiciona a atividade internacional, e um enfraquecimento dos valores espirituais e do sentido de responsabilidade. Tudo isto contribui para disseminar uma sensação geral de frustração, solidão e desespero, levando muitos a cair na voragem do extremismo ateu e agnóstico ou então no integralismo religioso, no extremismo e no fundamentalismo cego, arrastando assim outras pessoas a render-se a formas de dependência e autodestruição individual e coletiva. A história afirma que o extremismo religioso e nacional e a intolerância geraram no mundo, quer no Ocidente quer no Oriente, aquilo que se poderia chamar os sinais duma «terceira guerra mundial aos pedaços»; sinais que, em várias partes do mundo e em diferentes condições trágicas, começaram a mostrar o seu rosto cruel; situações de que não se sabe exatamente quantas vítimas, viúvas e órfãos produziram. Além disso, existem outras áreas que se preparam a tornar-se palco de novos conflitos, onde nascem focos de tensão e se acumulam armas e munições, numa situação mundial dominada pela incerteza, pela decepção e pelo medo do futuro e controlada por míopes interesses econômicos. Afirmamos igualmente que as graves crises políticas, a injustiça e a falta duma distribuição equitativa dos recursos naturais – dos quais beneficia apenas uma minoria de ricos, em detrimento da maioria dos povos da terra – geraram, e continuam a fazê-lo, enormes quantidades de doentes, necessitados e mortos, causando crises letais de que são vítimas vários países, não obstante as riquezas naturais e os recursos das gerações jovens que os caracterizam. A respeito de tais crises que fazem morrer à fome milhões de crianças, já reduzidas a esqueletos humanos por causa da pobreza e da fome, reina um inaceitável silêncio internacional. A propósito, é evidente quão essencial seja a família, como núcleo fundamental da sociedade e da humanidade, para dar à luz filhos, criá-los, educá-los, proporcionar-lhes uma moral sólida e a proteção familiar. Atacar a instituição familiar, desprezando-a ou duvidando da importância de seu papel, constitui um dos males mais perigosos do nosso tempo. Atestamos também a importância do despertar do sentido religioso e da necessidade de o reanimar nos corações das novas gerações, através duma educação sadia e da adesão aos valores morais e aos justos ensinamentos religiosos, para enfrentarem as tendências individualistas, egoístas, conflituais, o radicalismo e o extremismo cego em todas as suas formas e manifestações. O primeiro e mais importante objetivo das religiões é o de crer em Deus, honrá-Lo e chamar todos os homens a acreditarem que este universo depende de um Deus que o governa: é o Criador que nos moldou com a Sua Sabedoria divina e nos concedeu o dom da vida para o guardarmos. Um dom que ninguém tem o direito de tirar, ameaçar ou manipular a seu bel-prazer; pelo contrário, todos devem preservar este dom da vida desde o seu início até à sua morte natural. Por isso, condenamos todas as práticas que ameaçam a vida, como os genocídios, os atos terroristas, os deslocamentos forçados, o tráfico de órgãos humanos, o aborto e a eutanásia e as políticas que apoiam tudo isto. De igual modo declaramos – firmemente – que as religiões nunca incitam à guerra e não solicitam sentimentos de ódio, hostilidade, extremismo nem convidam à violência ou ao derramamento de sangue. Estas calamidades são fruto de desvio dos ensinamentos religiosos, do uso político das religiões e também das interpretações de grupos de homens de religião que abusaram – nalgumas fases da história – da influência do sentimento religioso sobre os corações dos homens para os levar à realização daquilo que não tem nada a ver com a verdade da religião, para alcançar fins políticos e econômicos mundanos e míopes. Por isso, pedimos a todos que cessem de instrumentalizar as religiões para incitar ao ódio, à violência, ao extremismo e ao fanatismo cego e deixem de usar o nome de Deus para justificar atos de homicídio, de exílio, de terrorismo e de opressão. Pedimo-lo pela nossa fé comum em Deus, que não criou os homens para ser assassinados ou lutar uns com os outros, nem para ser torturados ou humilhados na sua vida e na sua existência. Com efeito Deus, o Todo-Poderoso, não precisa de ser defendido por ninguém e não quer que o Seu nome seja usado para aterrorizar as pessoas. Este Documento, de acordo com os Documentos Internacionais anteriores que destacaram a importância do papel das religiões na construção da paz mundial, atesta quanto segue: • A forte convicção de que os verdadeiros ensinamentos das religiões convidam a permanecer ancorados aos valores da paz; apoiar os valores do conhecimento mútuo, da fraternidade humana e da convivência comum; restabelecer a sabedoria, a justiça e a caridade e despertar o sentido da religiosidade entre os jovens, para defender as novas gerações a partir do domínio do pensamento materialista, do perigo das políticas da avidez do lucro desmesurado e da indiferença baseadas na lei da força e não na força da lei. • A liberdade é um direito de toda a pessoa: cada um goza da liberdade de credo, de pensamento, de expressão e de ação. O pluralismo e as diversidades de religião, de cor, de sexo, de raça e de língua fazem parte daquele sábio desígnio divino com que Deus criou os seres humanos. Esta Sabedoria divina é a origem donde deriva o direito à liberdade de credo e à liberdade de ser diferente. Por isso, condena-se o facto de forçar as pessoas a aderir a uma determinada religião ou a uma certa cultura, bem como de impor um estilo de civilização que os outros não aceitam. • A justiça baseada na misericórdia é o caminho a percorrer para se alcançar uma vida digna, a que tem direito todo o ser humano. • O diálogo, a compreensão, a difusão da cultura da tolerância, da aceitação do outro e da convivência entre os seres humanos contribuiriam significativamente para a redução de muitos problemas econômicos, sociais, políticos e ambientais que afligem grande parte do gênero humano. • O diálogo entre crentes significa encontrar-se no espaço enorme dos valores espirituais, humanos e sociais comuns, e investir isto na propagação das mais altas virtudes morais que as religiões solicitam; significa também evitar as discussões inúteis. • A proteção dos locais de culto – templos, igrejas e mesquitas – é um dever garantido pelas religiões, pelos valores humanos, pelas leis e pelas convenções internacionais. Qualquer tentativa de atacar locais de culto ou de os ameaçar através de atentados, explosões ou demolições é um desvio dos ensinamentos das religiões, bem como uma clara violação do direito internacional. • O terrorismo execrável que ameaça a segurança das pessoas, tanto no Oriente como no Ocidente, tanto no Norte como no Sul, espalhando pânico, terror e pessimismo não se deve à religião – embora os terroristas a instrumentalizem – mas tem origem no cúmulo de interpretações erradas dos textos religiosos, nas políticas de fome, de pobreza, de injustiça, de opressão, de arrogância; por isso, é necessário interromper o apoio aos movimentos terroristas através do fornecimento de dinheiro, de armas, de planos ou justificações e também a cobertura midiática, e considerar tudo isto como crimes internacionais que ameaçam a segurança e a paz mundial. É preciso condenar tal terrorismo em todas as suas formas e manifestações. • O conceito de cidadania baseia-se na igualdade dos direitos e dos deveres, sob cuja sombra todos gozam da justiça. Por isso, é necessário empenhar-se por estabelecer nas nossas sociedades o conceito de cidadania plena e renunciar ao uso discriminatório do termo minorias, que traz consigo as sementes de se sentir isolado e da inferioridade; isto prepara o terreno para as hostilidades e a discórdia e subtrai as conquistas e os direitos religiosos e civis de alguns cidadãos, discriminando-os. • O relacionamento entre Ocidente e Oriente é uma necessidade mútua indiscutível, que não pode ser comutada nem transcurada, para que ambos se possam enriquecer mutuamente com a civilização do outro através da troca e do diálogo das culturas. O Ocidente poderia encontrar na civilização do Oriente remédios para algumas das suas doenças espirituais e religiosas causadas pelo domínio do materialismo. E o Oriente poderia encontrar na civilização do Ocidente tantos elementos que o podem ajudar a salvar-se da fragilidade, da divisão, do conflito e do declínio científico, técnico e cultural. É importante prestar atenção às diferenças religiosas, culturais e históricas que são uma componente essencial na formação da personalidade, da cultura e da civilização oriental; e é importante consolidar os direitos humanos gerais e comuns, para ajudar a garantir uma vida digna para todos os homens no Oriente e no Ocidente, evitando o uso da política de duas medidas. • É uma necessidade indispensável reconhecer o direito da mulher à instrução, ao trabalho, ao exercício dos seus direitos políticos. Além disso, deve-se trabalhar para libertá-la das pressões históricas e sociais contrárias aos princípios da própria fé e da própria dignidade. Também é necessário protegê-la da exploração sexual e de a tratar como mercadoria ou meio de prazer ou de ganho econômico. Por isso, devem-se interromper todas as práticas desumanas e os costumes triviais que humilham a dignidade da mulher e trabalhar para modificar as leis que impedem as mulheres de gozarem plenamente dos seus direitos. • A tutela dos direitos fundamentais das crianças a crescer num ambiente familiar, à alimentação, à educação e à assistência é um dever da família e da sociedade. Tais direitos devem ser garantidos e tutelados para que não faltem e não sejam negados a nenhuma criança em nenhuma parte do mundo. É preciso condenar qualquer prática que viole a dignidade das crianças ou os seus direitos. Igualmente importante é velar contra os perigos a que estão expostas – especialmente no ambiente digital – e considerar como crime o tráfico da sua inocência e qualquer violação da sua infância. • A proteção dos direitos dos idosos, dos vulneráveis, dos portadores de deficiência e dos oprimidos é uma exigência religiosa e social que deve ser garantida e protegida através de legislações rigorosas e da aplicação das convenções internacionais a este respeito. Por fim, através da cooperação conjunta, a Igreja Católica e a al-Azhar anunciam e prometem levar este Documento às Autoridades, aos Líderes influentes, aos homens de religião do mundo inteiro, às organizações regionais e internacionais competentes, às organizações da sociedade civil, às instituições religiosas e aos líderes do pensamento; e empenhar-se na divulgação dos princípios desta Declaração em todos os níveis regionais e internacionais, solicitando que se traduzam em políticas, decisões, textos legislativos, programas de estudo e materiais de comunicação. Al-Azhar e a Igreja Católica pedem que este Documento se torne objeto de pesquisa e reflexão em todas as escolas, nas universidades e nos institutos de educação e formação, a fim de contribuir para criar novas gerações que levem o bem e a paz e defendam por todo o lado o direito dos oprimidos e dos marginalizados. Ao concluir, almejamos que esta Declaração: seja um convite à reconciliação e à fraternidade entre todos os crentes, mais ainda, entre os crentes e os não-crentes, e entre todas as pessoas de boa vontade; seja um apelo a toda a consciência viva, que repudia a violência aberrante e o extremismo cego; um apelo a quem ama os valores da tolerância e da fraternidade, promovidos e encorajados pelas religiões; seja um testemunho da grandeza da fé em Deus, que une os corações divididos e eleva a alma humana; seja um símbolo do abraço entre o Oriente e o Ocidente, entre o Norte e o Sul e entre todos aqueles que acreditam que Deus nos criou para nos conhecermos, cooperarmos entre nós e vivermos como irmãos que se amam. Isto é o que esperamos e tentaremos realizar a fim de alcançar uma paz universal de que gozem todos os homens nesta vida.

Abu Dabhi, 4 de fevereiro de 2019.

Sua Santidade o Papa Francisco e o Grande Iman de Al-Azhar Ahmed Al- Tayyib

 www.ihu.unisinos.br. Abraço. Davi

 

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

OS ANALECTOS - LIVRO XVI

 

Confucionismo. www.https//rt.br. OS ANALECTOS – LIVRO XVI. 1. O chefe da família Chi estava prestes a atacar Chuan Yü. Jan Yu e Chi-lu foram falar com Confúcio e disseram: “Os Chi vão atacar Chuan Yü”. Confúcio disse: “Ch’iu, com certeza isso é culpa sua. Outrora, um ancestral real nosso deu a Chuan Yü a responsabilidade de fazer sacrifícios à montanha Tung Meng; além disso, o território deles agora localiza-se nos nossos domínios. São nossos vassalos. Que razão pode haver para atacá-los?”. Jan Yu disse: “É o que o nosso senhor deseja. Nenhum de nós é a favor disso”. Confúcio disse: “Ch’iu, há um ditado de Chou Jen que diz o seguinte: que os homens que têm força juntem-se às fileiras e que aqueles a quem falta força cedam seus lugares. Que utilidade tem para um cego um assistente que não o apoia quando ele tropeça ou que não o segura quando ele cai? Além disso, o que você disse está errado. De quem é o erro quando o tigre e o rinoceronte escapam de suas jaulas ou quando o casco de uma tartaruga e o jade são destruídos dentro de seus estojos?”. Jan Yu disse: “Mas Chuan Yü é fortemente fortificada e próxima a Pi. Se não for tomada agora, com certeza será uma fonte de problemas para os descendentes de nossos senhores no futuro”. Confúcio disse: “Ch’iu, o cavalheiro detesta aqueles que, em vez de dizerem claramente que querem alguma coisa, ficam inventando desculpas. Sempre ouvi dizer que o chefe de um reino ou de uma família nobre preocupa-se não com subpopulação, mas com a distribuição desigual; não com a pobreza, mas com a instabilidade. [174] Pois onde há distribuição igualitária não há pobreza, onde há harmonia não há subpopulação e onde há estabilidade não há golpes de estado. É por essa razão que, quando súditos de outras regiões sublevam-se, o governante deve atraí-los por meio de sua força moral e, uma vez que eles se aproximem, satisfazê-los. Mas você e Yu sequer foram capazes de ajudar o seu senhor a atrair os súditos de outras regiões quando estas se sublevam ou a preservar o reino quando este está se desintegrando. Em vez disso, você propõe que se recorra ao uso das armas contra uma província do próprio reino. Receio que os problemas de Chi-sun estejam não em Chuan Yü, mas dentro do próprio palácio”. 2. Confúcio disse: “Quando o Caminho prevalece no Império, os ritos, a música e as expedições militares são determinados pelo Imperador. Quando o Caminho não prevalece no reino, eles são determinados pelos senhores feudais. Quando são determinados pelos senhores feudais, dificilmente o poder permanecerá nas mãos do imperador por mais de dez gerações. Quando são determinados pelos ministros, dificilmente o poder permanecerá nas mãos dos senhores feudais por mais de cinco gerações. Quando a prerrogativa de comando em um reino está a cargo de oficiais dos ministros, dificilmente o poder permanecerá nas mãos dos ministros por mais de três gerações. Quando o Caminho prevalece no Império, não é aos ministros que cabe a iniciativa política. Quando o Caminho prevalece no Império, as pessoas comuns não expressam críticas”. 3. Há cinco gerações a autoridade saiu do controle da casa ducal. Há quatro gerações o governo passou para o controle dos ministros. Por essa razão os descendentes das três casas de Huan estão em declínio. [175] 4. Confúcio disse: “Beneficia-se aquele que faz amizade com três tipos de pessoa. Igualmente, prejudica-se aquele que faz amizade com outros três tipos de pessoa. Fazer amizade com os retos, com aqueles que são fiéis às próprias palavras e com os bem-informados é beneficiar-se. Fazer amizade com aqueles que são subservientes em suas ações, agradáveis na aparência e eloquentes no discurso é prejudicar-se”. 5. Confúcio disse: “Beneficia-se aquele que tem prazer em três tipos de coisas. Igualmente, prejudica-se aquele que tem prazer em outros três tipos de coisas. Ter prazer com a correta realização dos ritos e da música, em tecer loas à bondade de outros homens e ao ter um grande número de homens excelentes como amigos é beneficiar-se. Ter prazer em exibir-se, em levar uma vida dissoluta e em comer e beber é prejudicar-se”. 6. Confúcio disse: “Na presença de um cavalheiro, corre-se o risco de cometer três erros. Dirigir a palavra antes que a palavra lhe tenha sido dirigida é temerário; não dirigir a palavra quando a palavra lhe foi dirigida é ser evasivo; falar sem observar a expressão na face do cavalheiro é ser cego”. 7. Confúcio disse: “Há três coisas das quais um cavalheiro deveria se resguardar. Na juventude, quando o sangue e o ch’i [176] ainda não estão estabilizados, ele deve se resguardar da atração da beleza feminina. No princípio da vida, quando o sangue e o ch’i estiverem em pleno vigor, ele deve se resguardar da belicosidade. Na velhice, quando o sangue e o ch’i estiverem em declínio, ele deve se resguardar da vontade de ter propriedades”. 8. Confúcio disse: “O cavalheiro teme três coisas. Teme o Decreto do Céu. Teme grandes homens. Teme a palavra dos sábios. O homem vulgar, sendo ignorante do Decreto do Céu, não o teme. Trata grandes homens com insolência e as palavras dos sábios com ironia”. 9. Confúcio disse: “Aqueles que nascem com conhecimento são os mais elevados. A seguir vêm aqueles que atingem o conhecimento por meio do estudo. A seguir vêm aqueles que se voltam para o estudo depois de terem passado por dificuldades. No nível mais baixo estão as pessoas comuns, por não fazerem esforço algum para estudar mesmo depois de terem passado por dificuldades”. 10. Confúcio disse: “Há nove coisas às quais o cavalheiro deve dedicar seu pensamento: enxergar claramente ao usar os olhos, escutar acuradamente ao usar os ouvidos, ter uma atitude cordial, ter um comportamento respeitoso, ser consciencioso ao falar, ser reverente ao cumprir seus deveres, buscar conselho quando estiver em dúvida, prever as consequências ao ficar com raiva e, à vista de uma vantagem a ser obtida, saber o que é correto”. 11. Confúcio disse: “‘Ao contemplar o que é bom, ajo como se estivesse correndo o risco de ser deixado para trás; Sao contemplar que não é bom, ajo como se estivesse bebendo água fervente. ’Conheci tal homem; ouvi tal declaração. “‘Vivo retiradamente para atingir meu propósito e praticar o que é direito com o intuito de realizar o meu caminho. ’Ouvi tal declaração, mas ainda não conheci tal homem”. 12. O duque Ching de Ch’i tinha mil carruagens com quatro cavalos cada, mas, à sua morte, as pessoas comuns foram incapazes de encontrar qualquer coisa pela qual elogiá-lo, ao passo que Po Yi e Shu Ch’i morriam de fome ao pé do monte Shou Yang e até hoje as pessoas comuns os admiram. Isso provavelmente é o que significa. [177] 13. Ch’en Kang perguntou a Po-yü: “Foi-lhe ensinado algo fora do comum por seu pai?”. “Não, não foi. Uma vez meu pai estava sozinho. Enquanto eu cruzava o jardim com passos apressados, [178] ele disse: ‘Você estudou as Odes?’. Respondi: ‘Não’. ‘Amenos que estude as Odes, não será capaz de sustentar uma conversa.’Eu me retirei e estudei as Odes. “Outro dia, meu pai estava novamente sozinho. Enquanto eu atravessava o jardim com passos apressados, ele disse: ‘Você estudou os ritos?’. Eu respondi: ‘Não.’‘Amenos que estude os ritos, não será capaz de assumir teu lugar no mundo.’Eu me retirei e estudei os ritos. Foram-me ensinadas essas duas coisas.” Ch’en Kang retirou-se, encantado, e disse: “Fiz uma pergunta e recebi três respostas. Aprendi sobre a importância das Odes, aprendi sobre a importância dos ritos e aprendi que um homem mantém reserva para com seu filho”. 14. O governante de um reino usa o termo “senhora” para sua esposa. Ela usa o termo “pequena criada” para si própria. O povo do reino refere-se a ela pela expressão “a senhora do senhor”, mas, quando no estrangeiro, usa a expressão “a pequena senhora”. As pessoas de outros reinos também se referem a ela por “a senhora do senhor”. [179]. www.https//rt.br. OS ANALECTOS LIVRO XVI. Abraço. Davi.

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A ESTRUTURA DO MUNDO IV

 

Religião Afro Brasileira. O Candomblé da Bahia – Rito Nagô. Tradução de Maria Isaura Pereira de Queiroz (1918-2018). Capítulo III. A ESTRUTURA DO MUNDO IV. Finalmente, é preciso pedir a permissão de Ossaim para a colheita, e pagá-lo. Eis porque são deixadas junto à planta cortada algumas moedinhas ou um pedaço de fumo de corda. Para cortar o ramo, o cipó, o galho enfolhado, é utilizada uma faca especial, o obé. Ainda aqui encontramos certos enganos nas informações publicadas. Barbosa Rodrigues designa a faca de Ossaim com o nome de abébé, em lugar de obé. O abébé é um leque com o qual as divindades da água - Yemanjá ou Oxun - gostam de se divertir, e nunca uma faca. O babalosaim não se limita a colher as ervas, encarrega-se ainda de seu preparo. No entanto, enquanto dispomos para Cuba ou Haiti de boas descrições de como são confeccionados os "pacotes", no Brasil nada sabemos a respeito. A única informação que possuímos é de que os cânticos dos axé também são entoados no interior dos santuários, que as filhas de santo entoam o cântico da planta ei da divindade correspondentes, à qual pertencem; por exemplo, as filhas de Ogun cantam o cântico do axe de Ogun, as de Yemanjá o do axé de Yemanjá, etc.; e o coro de todas as filhas de santo reunidas responde em uníssono: Axé biu axé meu axé mio. Estas informações parecem indicar que o preparo das plantas dá lugar no Brasil, como nas outras partes da América negra, a cerimônias especiais. Mas não sabemos nem mesmo se esta preparação se faz ou não no pegi especial de Ossaim, pois Ossaim é "santo do ar livre". A planta de candomblé que apresentamos mostra bem para a Bahia este pegi separado dos outros, em pleno campo. No Recife e em Porto Alegre-RS, Ossaim (ou Ossanhe) me foi sempre indicado como uma das três principais divindades obrigatoriamente adoradas fora da casa principal; as outras duas são Exú (ou Bara) e Oxossi (ou Ode). Um de nossos informantes sublinhava que, para preparar os banhos e as lavagens, é preciso que a erva esteja viva. Eis porque, ajuntava, a dos ervanários não pode servir, ela perdeu a força (...) vendem-na "seca". É preciso também esfregá-la, espremê-la, triturá-la com as mãos, e não com um pilão ou outro instrumento; é preciso quebrá-la viva entre os dedos vivos. Naturalmente, também, a preparação varia com a função que as plantas devem desempenhar. Já dissemos que para o ritual da iniciação são necessárias 21 espécies de ervas, e que, para cada espécie é precisa empregar 16 folhas. Este número de 16 pode ser insuficiente para dar lugar ao êxtase; duplicam-no então, ou triplicam-no, mas tratar-se sempre de um múltiplo de 16. Outras vezes, ao contrário, o êxtase é por demais violento; utilizam-se então outras espécies de folhas, encarregadas de atenuar a virtude das precedentes, de suavizar a selvageria do Orixá, desencadeada no corpo de seu cavalo. Para a fabricação das pedras, dos ferros, para a lavagem das contas, etc., só se empregam as folhas do santo que deve se encarnar na pedra, no ferro, ou que devem fazer participar o colar à força da mesma divindade. Por exemplo, se é uma pedra de Xangô que se quer "fazer", ou se se lava o colar de contas vermelhas e brancas de um filho de Xangô, só serão utilizadas as ervas ligadas a Xangô, isto é, o puitoco, a manjerona, a nega nina etc., e nunca as que pertencem a Oxalá, como a "neve branca", ou as que pertencem a Oxun, como o orêpêpê. Pode ser também que, como em Cuba, o número de plantas varie com a divindade, 5 para Oxun, 7 para Yemanjá, 8 para Obatalá, etc. Finalmente, se o babalosaim foi chamado para cuidar de um doente com suas "ervas", empregará outras espécies vegetais diferentes das que utiliza nos banhos de amasi ou na lavagem da cabeça. Os folcloristas brasileiros se interessaram muito pela medicina popular e publicaram diversos livros contendo listas de plantas medicinais; a cidade da Bahia não foi esquecida. Mas (salvo Luís da Câmara Cascudo (1898-1986) e Gonçalves Fernandes (1909-1986) para o catimbó, que escapa ao objetivo de nosso trabalho, dadas suas origens ameríndias), todos partiram das informações dadas pelos ervanários e outros comerciantes. É muito possível que algumas dessas plantas medicinais sejam conhecidas dos babalosaim; é mesmo verossímil que os sacerdotes de Ossaim forneçam ao mercado da Bahia plantas que vão colher no mato e cuja virtude e modo de emprego conhecem (tisanas, pomadas, cataplasmas, etc.). Mas mesmo no caso de se confundirem as plantas dos ervanários e as dos Olosaim, as duas formas de medicina não se identificam; a primeira é empírica, a segunda é religiosa. Que folhas são essas? Um babalosaim da Bahia que se tomou de amizade por mim e que queria me transformar em aprendiz, iniciara o aprendizado, mas a morte devia levá-lo pouco depois. Procurei, é claro, completar a lista obtida, mas ao acaso, com dificuldade sempre e em terreiros ou cidades diferentes. Voltaremos mais adiante a algumas destas plantas; por enquanto, contentamo-nos em oferecer a lista por ordem alfabética: Alecrim, em suas três formas: alecrim de caboclo (Baccharis sylvestris, Linné), alecrim do campo (Lantana Microphilla, Martius), e alecrim do taboleiro ( Polygala paniculata, L.), usado nos banhos de iniciação. Nos banhos de amasi dos filhos de Oxalá, usado sem distinção de espécie. Alevante - ver Bradamundo. Alfavaquinha, ?, serve para os banhos de amasi dos filhos de Oxun. Segundo outros informantes, serve também para lavar as pedras de Oxossi. Algodão - planta consagrada a Oxalá, tanto na Bahia quanto no Recife-PE. Do mesmo modo em Cuba. Serve para os banhos lustrais dos filhos desse santo. Aroeira - Schinus Aroeira, Vellozo. Planta consagrada a Ogun. Utilizada também contra o reumatismo, o artritismo, a sífilis. Ariorô, ?, em Porto Alegre-RS, planta consagrada a Exú, terreiros oyo. Bradamundo, Amonum cardamon, Linné. O mesmo que Alevante. Planta consagrada a Xangô e a sua mulher Yansan, na Bahia. Consagrada a Exú em Porto Alegre-RS. Indicações terapêuticas: estranguria. Utilizada para aromatizar os banhos de amasi. Bambus, consagrados aos Eguns na Bahia. As casas dos mortos são algumas vezes feitas de bambus. Bananeira, Musa paradísica ?, suas folhas são utilizadas na fabricação dos Exú em Porto Alegre-RS. Em Cuba, a bananeira plátano é uma árvore de Xangô. Betis Cheiroso, Piper Eucaliptifolium, Rudge. Pertence a Xangô e a sua mulher Yansan. Indicações terapêuticas: sudorífero, estimulante, febrífugo. Bredo de Santo. Antônio ou Pega Pinto, Boerhavia hirsuta, Wedd. Pertence a Oxossi. Indicações terapêuticas: anasarca, febres intermitentes. Caicara, Croton, Euphorbiacea. Planta consagrada a Oxossi. Indicações terapêuticas: dermatoses. Cafarana, ?, planta consagrada a Ogun, no Recife-PE. Canela de Velho, Miconia Albicans, Trin. Planta consagrada a Omolú. Indicações terapêuticas: perturbações digestivas. Carrapateira (óleo de), Carica papaya. Em Recife-PE principalmente, fabrica-se este óleo com as sementes do mamoeiro para "fixar" Exú ou para regar o seu fetiche. Do ponto de vista terapêutico, serve para a cura das adenites. Com estas sementes, são fabricados na Bahia uma espécie de rosários que fazem secar o leite das mulheres ou desaparecer os papos. Casadinha, Susp. Mikania, composta. Planta consagrada a Omolú e também chamada vulgarmente Omolú. Indicações terapêuticas: perturbações estomacais. Caruru, feito com quiabos, hibiscus esculentus. Nome africano: Fetri. Embora o caruru seja o prato preferido de Xangô, em Porto Alegre-PE é relacionado com Exú. Propriedades terapêuticas: emoliente, laxante. Cipreste, Cupressis pyramidalis. Consagrado a Nanan, que devido à sua avançada idade, tem relações com a morte. Consagrado aos mortos em Cuba. Propriedades terapêuticas: antiblenorrágico. Dormideira, esta flor vermelha é consagrada a Yansan, no Recife. Espada de Ogun, Sansevieria ceylanica, Willd. Função religiosa: banhos de amasi dos filhos de Ogun. Parece ser utilizada também nos banhos de iniciação. Função terapêutica: diurética. Erva Santa, Peltodon Ricano? Consagrada a Yansan, no Recife. Folha da Costa, também chamada às vezes saio. Pryophillum Piematum. Nome africano: odudú. Banhos de amasi dos filhos de Oxun. Segundo outros, também para os filhos de Oxossi. Utilizada para a lavagem da cabeça no ritual de "dar de comer à cabeça". Folha de Fogo, chamada algumas vezes também folha de Yansan. Susp. Tournefortia, Borraginea. Banhos de amasi dos filhos de Yansan. Consagrada também a Xangô. Indicações terapêuticas: febrífugo. Flor da Fortuna, ?, erva de Exú em Porto Alegre-RS. Gameleira, Ficus doliaria, Mart. É a árvore adorada sob o nome de Irôko. No Recife-PE, é relacionada com Nanan. Todavia, as folhas da figueira comum são utilizadas na preparação dos Exú em Porto Alegre-RS. Acredita-se que estas folhas produzam verrugas ou pústulas. Guiné, Petiveria Tetranda, Gomes. Utilizada no ritual de iniciação, para lavar as futuras yauô. As raízes servem para fazer amuletos ou exorcismos. Malmequer, Weddelia paludosa. Consagrada a Oxun no Recife-PE. Indicações terapêuticas: cicatrizante, antisséptica, contra hemorragias. Manacá, Brunfelsia Hopeana, Hooker, Solanaceas. Consagrada a Nanan em Recife-PE. Depurativo, antiluético, contra os reumatismos. Manjericão, Ocium basilicum, L. Labiée. Utilizado nos banhos de purificação dos filhos de Oxalá. Indicações terapêuticas: febrífugo, estimulante, contra as cefaleias. Manjerona, Origanum majorona. Consagrada a Xangô para os banhos de amasi de seus filhos. Indicações terapêuticas: cicatrizante, estimulante, muito usada na cura de feridas. Nega Mina, ?, para os banhos de amasi dos filhos de Xangô. Neve Branca, ?, para os banhos de amasi dos filhos de Oxalá. Orepepe para os banhos de amasi dos filhos de Oxun. Urtiga, Urtica urens. Consagrada a Omolú. Indicações terapêuticas: diurético, afecções renais, dermatoses. Palmas d'Oxalá. É evidente que a palmeira, devido à sua beleza e utilidade, não podia ser consagrada senão ao maior dos deuses. Suas palmas são empregadas nos banhos de amasi dos filhos de Oxalá. Puitoco, ?, utilizado nos banhos lustrais dos filhos de Xangô. Tapete de Oxalá, Peltodon sp. Labiaceas. Planta consagrada ao culto de Oxalá, como seu nome indica. Indicações terapêuticas: cefaleias, má digestão. Uepepe ? entra na composição dos banhos de folhas nos rituais de iniciação. Velame, Croton, talvez campestris, Euphorbiacea. Pertence a Omolú. Um cântico recolhido por Edison Carneiro nos terreiros bantos faz alusão a esta planta: Era um velho muito velho, morava numa casa de palha. Na aldeia dele ,ele tinha velame e sanga e sanga e velame no mélungu,. E o A. acrescenta: "Informam-me os negros que sanga, velame e mélungu, são, respectivamente, as duas primeiras, plantas medicinais, a última, o velame misturado com mel", Indicações terapêuticas: depurativo. Olhos de Santa. Lúcia: Croton Antiriphiliticum. Planta que dá florzinha azuis consagradas a Yemanjá. Indicações terapêuticas: oftalmia. 3 - A SOCIEDADE DOS EGUN. Durante muito tempo acreditou-se que o culto dos antepassados tinha desaparecido no Brasil, uma vez que a escravatura destruíra as estruturas familiares tradicionais. Nina Rodrigues declara que somente os negros que tinham vivido na África e tinham sido trazidos como escravos guardavam a lembrança de que as almas "formavam uma maçonaria em que as mulheres não podiam tomar parte e em que a alma aparecia e passeava pela cidade muito à sua vontade", - declaração feita no primeiro livro que apareceu sobre os candomblés. Mas somente muito mais tarde foi reconhecida a sua sobrevivência na Bahia: "Em alguns destes candomblés funerários encontra-se ainda o Egungun, grotesca aparição da alma do finado. Não passa de uma farsa combinada entre os chefes e diretores de candomblé e pessoa de confiança que, vestida de longas roupas brancas, vem responder a invocações que em momento oportuno lhe são feitas. Nada mais curioso do que a ingênua credulidade dos circunstantes. Alguns me garantiram ter visto o morto comparecer à festa, em geral à noite, mas por vezes em pleno dia, comer, dançar e retirar-se como veio. É do mesmo gênero a aparição de Orô, que, entre nós, só existe nos terreiros mais afastados". A descrição de Manuel Querino (1851-1923) é ainda menos definida: "Na véspera da missa de ano, à noite, o africano medium que não exercia outra função na seita, (...) colocava no chão uma bacia com água e a folha correspondente ao santo do morto, pronunciava algumas palavras cabalísticas que eram repetidas pelas pessoas presentes. Com um pequeno cipó batia três vezes no chão, o que equivale a invocar o espírito do morto. Acudindo ao chamamento, o medium perguntava se o espírito fora chamado por Deus ou enviado por alguém. Depois da resposta, o espírito fazia revelações, dava consultas e conselhos, ditava ordens para serem cumpridas". Mas ninguém procurou levar mais longe estas observações. No entanto, mesmo um estudo breve do mundo do candomblé deveria ter chamado a atenção para a importância dos Egun. Pois não existia nos terreiros mais antigos, ao lado da "casa dos Orixá", uma "casa dos mortos"? E o padê de Exú não era, ao mesmo tempo, um padê dos mortos? Quer dizer que toda cerimônia começa obrigatoriamente por uma saudação a Exú, que exige as primeiras homenagens, e logo em seguida por outra aos antepassados: Egun Aiyê Ishibo órun Yojuba re Mortos Mundo Forte ? céu eu me inclino (diante) de vós que é, mais ou menos, a fórmula empregada na África pelo próprio Egun, quando aparece, envergando sua tanga, a saudar um dos Grandes, um personagem importante, encostando no chão o seu espanta-mosca:A consulta ao babalaô não constitui senão uma das obrigações do casamento; mas, no momento do nascimento, é necessário consultá-lo para conhecer o odu do recém-nascido. No casamento, porém, não basta saber se Ifa está de acordo, é preciso também verificar se os próprios antepassados aceitam aquelas núpcias. Segundo me disseram, em certas seitas chega-se a levar oferendas ao túmulo familiar. Nalguns terreiros, nos dias em que são sacrificados animais de quatro patas, cantam-se no início da festa cânticos dirigidos aos fundadores do candomblé, e assim o culto dos antepassados passa da família para a seita; mas trata-se sempre da homenagem que se rende aos mortos. O Padre Brazil sustenta igualmente que quando alguém está doente, deve fazer um sacrifício aos mortos e nós mesmos já vimos, no primeiro capítulo, que a iniciação compreende um sacrifício aos Egun. Todos estes fatos e outros mais deveriam ter levado os etnógrafos a se interessar mais particularmente pelos Egun. Se não o fizeram, é porque a pesquisa se apresenta como particularmente difícil. Efetivamente, quanto mais avançamos em nosso estudo da hierarquia sacerdotal, mais nos chocamos contra a lei do segredo. O culto dos Egun pertence, na Bahia, à Sociedade do Egun, e esta sociedade, aqui como na África, é uma "sociedade secreta". De duas uma: ou interroga-se exteriormente alguns dos membros, que não dão senão poucas informações e logo se refugiam no silêncio, ou então penetra-se na sociedade, mas fica-se prisioneiro da lei do segredo. A morte é a condenação de todos os que violam os mistérios dos Egun. De modo que até o momento não possuímos senão informações fragmentárias; uma descrição de cerimônia pública no Rio de Janeiro antigo, as informações nem sempre exatas fornecidas ao Protasius Frikel (1912-1978), e duas descrições de axêxê com aparição de Egun.  Início da página 170. Livro O Candomblé da Bahia – Rito Nagô. Abraço. Davi.

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

A VIDA E O ENSINAMENTO DO BUDHA

 

Budismo Theravada. www.nossacasa.net/shunya/. Texto de Hammalawa Saddhatissa (1914- ). A VIDA E O ENSINAMENTO DO BUDHA. O primeiro ponto a ser considerado, se desejarmos evitar qualquer confusão na discussão do budismo, é que o Budha em momento algum pretende ser mais do que um ser humano. Seu ensinamento resolve o problema do sofrimento humano e indica, ou pretende, um caminho, que o homem deve seguir para solucionar esse problema, sem a ajuda de qualquer força externa ou sobrenatural. Budha, significando o que é iluminado ou desperto, foi o nome descritivo dado a um príncipe indiano, Siddharta Gautama, após ter alcançado um estado de compreensão absoluta. É para um estado semelhante de compreensão, e para a libertação do medo e do sofrimento que tal compreensão traz, que a trajetória budista pretende conduzir. O budismo começou nas províncias do Norte da Índia, e simultaneamente veio a prevalecer em toda a Ásia. Durante vinte e cinco séculos, mesclou-se a crenças tradicionais de muitas terras. Atualmente, existem mais de quinhentos milhões de budistas na Índia, Nepal, Butão, China, Japão, Coréia, Tibete, Laos, Vietnam, Cambodja, Malásia, Birmânia, Tailândia e Ceilão; e há evidência de um crescente interesse na América e na Europa. Siddhãrta Gautama parece ter nascido em maio de 663 AC, num dia de lua cheia, em um lugar chamado Jardim Lumbini, atual Nepal, perto das fronteiras do Norte da Índia. Seu pai, Suddhodana, era soberano de Sãkya, um reino situado no sopé do Himalaia. Um dos muitos nomes pelos quais Gautama era conhecido era Sãkya Muni, o sábio dos Sãkyas. Sua mãe chamava-se Mahãmãyã. Muitas estórias miraculosas surgiram em relação ao nascimento da criança e seu desenvolvimento precoce. Essas estórias parecem ser um dos riscos profissionais dos líderes religiosos. Os relatos mais simples estabelecem meramente que, após uma infância exemplar, ele tornou-se um jovem de aspecto nobre, combinando a destreza de um atleta com a inteligência de um erudito. Aos dezesseis anos de idade, casou-se com sua prima, uma princesa de rara beleza chamada Yasodharã. Treze anos mais tarde, seu filho Rãhula nasceu. A estória de como aos vinte e nove anos de idade Siddhãrta Gautama deixou seu lar, sua jovem esposa e seu filho recém-nascido para levar a vida de um monge errante converteu-se, através dos tempos, em mito e lenda. Mais uma vez faremos o relato mais simples. Por aproximadamente trinta anos, o jovem viveu uma vida protegida e provavelmente bastante luxuosa. Sua família era rica e aparentemente culta; e ele era incentivado a buscar quaisquer distrações físicas ou intelectuais que o atraíssem. Gozava de todo esse conforto e segurança que dizem algumas vezes trazer a felicidade. Contudo, de vez em quando, perturbava-se com a doença e a miséria que via à sua volta, e começou a suspeitar de que seu modo de vida fosse vazio. Procurou o conselho daqueles que gozavam de grande reputação de sabedoria e descobriu apenas que estes não possuíam respostas adequadas para suas perguntas. O caminho que Siddhãrta Gautama, em sua inquietude mental, desejou seguir, renunciar ao mundo e viver como um asceta paupérrimo, pode parecer dramático e talvez irresponsável nos dias de hoje. Na Índia de seis séculos antes de Cristo, foi uma escolha extrema, mas não muito incomum. O que faz com que o caso de Gautama seja digno de estudo não é o fato de ele ter escolhido renunciar ao mundo, mas sim o fato de ter, em sua busca incessante da causa e cura da angústia e tensão humanas, renunciado aos caminhos do próprio ascetismo. No princípio sua aproximação foi bastante ortodoxa; consultava as mais altas autoridades sacerdotais da religião bramanista, hindu, de seu povo, embora nenhuma pudesse explicar ou instruir-lhe satisfatoriamente. Nessa época, era costume praticar mortificação corporal a fim de obter a libertação das doenças do corpo e da mente; consequentemente, ele também tentou esse método. Na floresta de Uruvela, perto de Gaya, Índia, praticou as mais intensas formas de austeridade durante seis anos, e foi finalmente trazido às beiras da morte. De repente, deu-se conta de que, em vez de proporcionar a paz e a clareza mental, as graves penalidades que se auto impunha haviam arruinado sua saúde e entorpecido sua mente. Para o desagrado de seus companheiros ascetas, resolveu rejeitar os caminhos da austeridade do mesmo modo que havia rejeitado os caminhos da luxúria, e decidiu, em vez disso, seguir um caminho intermediário entre os dois extremos. Após revitalizar seu corpo com alimento, sentou-se sob uma árvore e começou a meditar. Permaneceu em estado e intensa concentração durante toda a noite, e pela manhã havia vislumbrado duas coisas, que viriam a ser os fundamentos de seus ensinamentos, a verdade da existência do sofrimento e a verdade de que existe um meio de libertação, isto é, um caminho intermediário que evita os extremos. Passou os quarenta e cinco anos restantes de sua vida como um monge itinerante, expondo esse caminho intermediário à todos aqueles que procuravam seus conselhos. Os ensinamentos do Budha iniciaram-se em Benares, Índia, a cidade sagrada dos hindus, lugar para onde se dirigiu logo após sua experiência de Iluminação. Nos limiares da cidade, no parque dos cervos, em Sarnath, pronunciou seu primeiro discurso ou sermão, conhecido como O Giro da Roda da Lei, no qual explicitou em termos simples a estrutura quádrupla de seu ensinamento, geralmente traduzida como As Quatro Nobres Verdades. São elas:

1.A verdade da existência da infelicidade.

2.A verdade de que há uma causa para essa infelicidade.

3.A verdade de que a infelicidade pode cessar.

4.A verdade do caminho que conduz ao cessamento da infelicidade.

Discorreremos sobre alguns dos detalhes e implicações dessas quatro nobres verdades em capítulos posteriores deste livro. O Budha, como todos os verdadeiros líderes religiosos, ensinou que o desejo, a possessividade e a inveja são as causas de muitos males pessoais e sociais; pregou contra a guerra e a escravidão, e denunciou as chamadas práticas sagradas que envolviam o sacrifício de seres humanos ou de animais. Como um mestre, dirigiu-se aos ricos e poderosos bem como aos pobres e fracos. Desconsiderou as distinções de classe do sistema de castas e ajudava pessoas, fossem elas bem nascidas ou não; admitia no seu grupo de seguidores todos aqueles que escolhessem segui-lo. Apaziguava brigas entre proprietários de terra e príncipes. Ajudava aqueles que sofriam da mente ou do corpo a encontrarem uma cura para seus males. Não se tratava aqui de um Deus ou ser sobrenatural; o Budha não acreditava em milagres nem procurava desviar o curso natural dos eventos. Ao contrário, ensinava aos homens como reconhecer a interdependência de causa e efeito, e a compreender que, para erradicar um efeito indesejado, é necessário descobrir e erradicar a causa. O Budha advertiu que um estado de paz poderia ser alcançado e plenamente realizado aqui, nesta vida, não através de sacrifícios aos deuses, nem por meio de orações, mas através de um contínuo esforço e por um desprendimento lentamente aperfeiçoado. O budismo não é uma religião que possa ser aceita cegamente de uma vez por todas; dever ser compreendida e constantemente questionada. O Budha disse: Aceitai minhas palavras somente após haverdes examinado o seu sentido por vós mesmos; não as aceiteis apenas em nome do respeito que tendes por mim. Embora com o decorrer do tempo o budismo tenha sido, algumas vezes, afetado pela tradição, rituais, etc, seu criador não formulou mais do que um método a ser experimentado. A autoconfiança e a tolerância são as chaves do pensamento budista. O Budha afirmou repetidas vezes: Vós mesmos deveis esforçar-vos, o Budha apenas aponta o caminho. O budismo jamais poderia, portanto, ser uma fé proselitista. Na realidade, o seguidor dos ensinamentos do Budha é exortado a usá-los apenas como uma balsa para a travessia de um rio. Uma vez tendo atingido o objetivo, isto é, o Nibbãna, a balsa deve ser abandonada. As últimas palavras do Budha foram: Lute cautelosamente. Tolerar com cautela é ver o mundo e nossos companheiros claramente, sem julgamento, inveja ou ódio. Para sermos capazes disso, é necessário que nos conheçamos intimamente bem como a fonte de felicidade e infelicidade existente dentro de nós. http://www.nossacasa.net/shunya/. Abraço. Davi.

domingo, 23 de agosto de 2020

II OS CORPOS FÍSICOS DOS MESTRES

 

Teosofia. Livro Os Mestres e a Senda. Texto de Charles Webster Leadbeater (1854-1934). OS MESTRES. Capítulo Dois. II OS CORPOS FÍSICOS DOS MESTRE. OUTRAS CASAS – A casa do Mestre Mora fica do outro lado do vale, porém muito mais abaixo – na verdade, bem próximo do pequeno templo e da entrada das cavernas. Ela tem um estilo arquitetônico inteiramente diferente, com ao menos dois andares. A frente que dá para a estrada tem varandas em cada nível, quase totalmente envidraçadas. O método geral e a organização de sua vida são bem próximos dos já descritos no caso do Mestre Kuthumi. Se seguirmos a estrada no lado esquerdo do riacho, subindo gradualmente ao lado do vale, passaremos à direita da casa do Mestre Kuthumi, e mais à frente na colina encontraremos, no mesmo lado da estrada, uma pequena choupana ou cabana construída pelo Mestre Djwal Kul com suas próprias mãos, para uso nos dias em que ainda era discípulo, a fim de ter morada permanente bem próximo de seu Mestre. Nessa caba existem várias placas sobre as quais um dos discípulos ingleses do Mestre Kuthumi, a seu pedido, precipitara há muitos anos uma visão interior da sala maior da casa do Mestre, exibindo as figuras de diversos Mestres e discípulos. Isso foi feito em comemoração a uma tarde especialmente feliz e frutífera na casa do mestre. OS ADEPTOS DO PRIMEIRO RAIO – Consideremos agora a aparência pessoal destes Grandes Seres, que se modifica até certa medida de acordo com o Raio ou tipo ao qual cada um deles pertença. O Primeiro Raio tem o poder em suas características mais proeminentes, e aqueles que nascem sob ele são os reis, os soberanos e os governadores do mundo, em primeiro lugar no mundo interno e espiritual, mas também do mundo físico. Qualquer homem que possua em si um grau mesmo inusitado de qualidades que lhe permitam dominar e guiar os homens sutilmente pelo curso desejado é provavelmente ou um homem de Primeiro Raio ou está tendendo para esse Raio. Tal é a augusta figura do Senhor Vaivasvata Manu, o Governante da quinta Raça-Raiz, que é o mais alto de todos os Adeptos, tendo 2 metros de altura em perfeita proporção. Ele é o Homem Representativo de nossa Raça, seu protótipo; sendo todos os membros dessa Raça descendentes diretamente dele. O Manu tem um rosto notadamente de grande poder, com um nariz aquilino (característica de águia), uma vasta e ondulada barba castanha, olhos pardos e uma magnífica cabeça de porte leonino. “Ele é alto”, diz a doutora Anne Besant (1847-1933), “e tem a majestade de um rei, com olhos penetrantes como os de uma águia, fulvos e brilhantes como luzes de ouro”. Ele vive atualmente nas montanhas do Himalaia, não longe da casa de seu grande Irmão, o Senhor Maitreya (designação dada ao futuro renovador do Budismo, o próximo Budha, que reiniciará o ciclo iniciado por Sidharta Gautama. Quando o ensinamento deste estiverem sido esquecidos neste mundo. Especula-se que ele se reencarnará daqui a 30.000 anos). O Mestre Morya também é uma figura assim, o tenente e sucessor do Senhor Vaivasvata Manu (é um ser divino e sua missão é formar novas raças. Há vários Manus. Quando um Manu forma uma raça e termina sua obra, recebe a oitava iniciação de Maiores, passando ao grau de Budha Pratyeca que significa Budha Solitário. O Manu de nossa Raça Ariana é Vaivasvata há uns 70.000 anos. Seu Bodhisattva é o veículo é o veículo da sabedoria deste Mestre que é da sétima de Maiores, assim como Maha-chohan) e o futuro Manu da sexta Raça-Raiz. Ele é um Rei Rajput por nascimento; possui uma barba escura dividida em duas partes, cabelos quase negros que lhe caem sobre os ombros, e olhos negros e penetrantes, cheios de poder. Ele tem 2 metros de altura e se comporta como um soldado, comunicando-se por frases curtas e concisas, como quem está acostumado a ser prontamente obedecido. Em sua presença há um sentido de poder e força irrefutáveis, e ele tem uma dignidade imperial que compele a mais profunda reverência. Madame Blavatsky nos contou muitas vezes como ela conheceu o Mestre Mora no Hyde Park, em Londres, Inglaterra no ano de 1851, quando ele veio com vários  outros príncipes indianos para participar da primeira grande Exibição Internacional. De modo bastante inusitado, eu mesmo, naquela época um pequeno garoto de quatro anos, também o vi, sem saber. Eu me recordo de ter sido levado para ver um deslumbrante cortejo, no qual dentre várias outras maravilhas havia uma ala de cavaleiros indianos ricamente trajados. Quão magníficos cavaleiros, cavalgando tão bem seus corcéis (cavalos) como ninguém mais no mundo, eu imaginava. Assim, era natural que meus olhos de criança estivessem fixados neles em grande deleite, e que eles fossem talvez o melhor daquela maravilhosa e mágica apresentação. Mesmo enquanto eu os via passar, segurando a mão de meu pai, um dos mais altos daqueles heróis me fitou com reluzentes negros olhos, o que me deixou meio assustado, mas ao mesmo tempo me encheu de exaltação e felicidade indescritíveis. Ele passou com os demais, e eu não mais o vi; no entanto, muitas vezes a visão daqueles olhos brilhantes retornou à minha memória de criança. É obvio que então eu nada sabia sobre quem ele era, e eu jamais o teria identificado não fosse por um amável comentário que ele me fez anos depois. Ao falar certo dia em sua presença sobre os primeiros anos da Sociedade, comentei que a primeira vez que eu tivera o privilégio de vê-lo em forma materializada havia sido em uma ocasião quando ele veio até o quarto de Madame Blavatsky, em Adyar – Índia, com o propósito de dar força a ela e lhe emitir certas instruções. El próprio, que estava engajado em uma conversa com outros Adeptos, voltou-se subitamente para mim e disse: “Não, essa não foi a primeira vez. Você já havia me visto antes em meu corpo físico. Você não se lembra, quando era uma pequena criança, assistindo o desfile dos cavaleiros indianos passar no Hyde Park – Londres - Inglaterra, e não viu como então eu o distingui?” Eu me recordei instantaneamente, é claro, e disse: “OH, Mestre, era você? Mas eu deveria tê-lo sabido”. Eu não mencionei esse incidente nas ocasiões em que encontrei e falei com o Mestre, estando ambos em corpos físicos, porque eu não sabia àquela época que o grande cavaleiro era o Mestre e porque o testemunho de uma criança tão pequena poderia muito bem ser duvidoso ou desencorajado. O senhor S. Ramaswami Iyer, em seu relato da experiência mencionada no Capítulo 1, escreve: “Eu estava seguindo a estrada para a cidade, de onde – como fui assegurado por pessoas que encontrei no caminho – eu poderia cruzar o Tibete facilmente com minhas vestimentas de peregrino, quando de repente avistei um cavaleiro solitário, galopando em direção a mim, vindo do sentido oposto. Por sua estatura alta e pela habilidade como cavaleiro, imaginei que ele fosse algum oficial militar do Sikkhim Rajah (...). Quando me alcançou, ele freou. Eu olhei para ele e o reconheci instantaneamente (...). Eu estava em sua impressionante presença, do mesmo Mahatma, meu próprio reverenciado Guru, que eu havia visto antes em seu corpo astral na varanda da sede da Sociedade Teosófica. Foi ele, o irmão do Himalaia na noite sempre memorável de dezembro passado, que tão docemente precipitara uma carta em resposta a uma que eu tinha dado há apenas uma hora em um envelope fechado para Madame Blavatsky, a qual eu não havia perdido de vista nem por um momento durante o intervalo. No mesmo instante me vi prostrado ao chão a seus pés. Eu me levantei ao seu comando e, olhando seu rosto demoradamente, esqueci-me de mim mesmo em contemplação da imagem que eu tão bem conhecia, tendo já visto seu retrato (aquele que está em posse do Coronel Henry Steel Olcott (1832-1907) inúmeras vezes. Eu não sabia o que dizer; júbilo e reverência prenderam a minha língua. A majestade de seu semblante, que me pareceu ser a personificação do poder e do pensamento, me manteve arrebatado em admiração. Eu estava finalmente face a face com o Mahatma do Himavat, e ele não era um mito, não era uma criação da imaginação de um médium, como alguns céticos haviam sugerido. Não se tratava de um sonho noturno – eram entre nove e dez horas da manhã. Havia o Sol brilhando e silenciosamente testemunhando a cena acima. Eu o vi diante de mim em carne e osso, e ele me falou com expressões de carinho e gentileza. O que mais eu poderia querer? Minha abundância de felicidade me deixou mudo. Somente após ter se passado algum tempo eu fui capaz  de proferir algumas palavras, encorajado por seu tom e palavras gentis. Sua compleição não tem o primor do Mahatma Kuthumi, mas eu jamais vira um semblante tão bonito, uma estatura tão alta e tão majestosa. Como em seu retrato, ele tem uma barba negra curta e longos cabelos negros balançando até o peitoral. Apenas as suas roupas eram diferentes. No lugar de uma toga branca e solta, ele usava um manto amarelo forrado com pelos, e em sua cabeça, no lugar do turbante, um capuz de feltro amarelo tibetano, tal como eu havia visto alguns butaneses (os nascidos no Butão) usando em seu país. Passados os primeiros momentos de arrebatamento e surpresa, eu serenamente compreendi a situação e tive uma longa conversa com ela”. Outra figura régia é o senhor Chakshusha Manu, o Manu da quarta Raça-Raiz, chinês por nascimento e pertencente a uma alta casta. Ele tem as maçãs do rosto dos altos mongóis, e sua face parece ter sido delicadamente esculpida em marfim velho. Ele geralmente veste magníficas togas de esvoaçantes tecidos bordados a ouro. Em regra, não entramos em contato com ele durante nossos trabalhos regulares, exceto quando temos que lidar com um aspirante pertencente à sua Raça-Raiz. OS ADEPTOS DO SEGUNDO RAIO. A influência que é especialmente notável nas pessoas de nosso Senhor Bodhisattva, o Instrutor do Mundo, e do Mestre Kuthumi, seu principal tenente, é a radiação de seu Amor todo envolvente. O Senhor Buddha Maitreya está usando um corpo da Raça céltica no presente momento. Sua face é de admirável beleza, forte e ao mesmo tempo suave, com abundante cabeleira fluindo como ouro vermelho sobre seus ombros. Sua barba é adelgaçada, como em alguns quadros antigos, e seus olhos, de um violeta maravilhoso, são como flores gêmeas, como estrelas, como profundas  e sagradas piscinas cheias de águas de paz eterna. Seu sorriso é deslumbrante além das palavras, e uma ofuscante glória de Luz o envolve, entremeada a uma incandescência maravilhosa cor-de-rosa, que sempre brilha do Senhor do Amor. Podemos imaginá-lo sentado na grande sala da frente em sua casa no Himalaia, uma sala com muitas janelas, com vista para os jardins e terraços, muito abaixo das planícies indianas onduladas; ou podemos imaginá-los em togas que fluem em branco, com bordas de ouro, enquanto ele caminha em seu jardim no frio da tarde, entre as flores gloriosas cujo perfume enche o ar ao redor com uma fragrância rica e doce. Maravilhoso além de qualquer medida é o nosso Santo Senhor o Cristo, maravilhoso acima de qualquer poder de descrição, pois por ele flui o Amor que conforta milhões e dele é a Voz que fala, como os homens nunca falaram, as palavras de ensinamento que trazem paz para anjos e homens. O Mestre Kuthumi usa um corpo de Brahman da Caxemira (região montanhosa ao norte da Índia e do Paquistão), e tem a cor da pele clara como o inglês comum. Ele também tem cabelos ondulados, e seus olhos são azuis e plenos de alegria e amor. Seus cabelos e barba são castanhos, de tal forma que, à luz do Sol, eles se tornam ruivos com reflexos de ouro. É difícil descrever sua face, pois sua expressão está sempre mudando quando ele sorri: seu nariz é finamente formado, e seus olhos são grandes e de um maravilhosos azul transparente. Como o Grande Senhor, ele também é um Instrutor e um Sacerdote; e daqui a muitos séculos ele irá substituí-lo em seu grande Ofício, assumirá o cetro de Instrutor do Mundo e se tornará o Bodhisattva da Sexta Raça-Raiz. OS OUTROS RAIOS – O Maha-Chohan é uma espécie de Homem de Estado, o grande Organizador, apesar de também ter muitas qualidades militares. Ele tem um corpo indiano e é alto e negro, com um perfil afilado, muito elegante e com silhueta bem marcada, imberbe. Sua face é bastante severa, com um queixo forte e quadrado, seus olhos são profundos e penetrantes, e ele fala de uma forma um tanto quanto abrupta, como um soldado. Ele geralmente veste uma toga indiana e usa um turbante branco. O Mestre Conde de Saint Germain é semelhante ao Maha-Chohan de várias maneiras. Embora ele não seja especialmente alto, é bastante esguio e militar em seu porte, com a cortesia e a dignidade requintadas de um grande senhor feudal do século XVIII. Percebemos de imediato que ele pertence a uma família muito antiga e nobre. Seus olhos são grandes e castanhos, e são plenos de ternura e graça, apesar de que neles há um brilho de poder. O esplendor de seus cabelos castanhos, curtos, são partidos ao meio e escovados para trás a partir da testa, e ele tem uma barba curta e delgada. Frequentemente veste um uniforme negro com adornos em cordões de ouro; também amiúde usa um magnífico manto militar vermelho. Isso acentua sua aparência militar. Ele usualmente reside no Leste Europeu, em um antigo castelo pertencente à sua família há muitos séculos. O Mestre Serapis é alto e claro em compleição. El e é grego por nascimento, embora todo o seu trabalho esteja sendo feito no Egito, em conexão com a Loja Egípcia. Ele é muito distinto e tem feições ascéticas, de alguma forma lembrando o falecido Cardeal Newman. Talvez o Chohan veneziano  seja o mais bonito de todos os Membros da Fraternidade. Ele é bem alto, cerca de 1,95 metros, tem barba ondulada, cabelos dourados, parecidos com os do Manu, e seus olhos são azuis. Embora ele tenha nascido em Veneza, sua família indubitavelmente tem sangue gótico nas veias, pois ele é um homem distintamente deste tipo. O Mestre Hilarion é grego e, exceto pelo fato de ele ter um nariz levemente aquilino, é do tipo grego antigo. Sua testa é baixa e larga, lembrando a de Hermes de Praxiteles. Ele também é admiravelmente belo e parece bem mais jovem que a maioria dos dos Adeptos. Ele, que fora o discípulo Jesus, tem agora um corpo sírio, pele e olhos escuros e a barba negra de um árabe; geralmente veste togas brancas e usa um turbante. É o Mestre dos devotos, e a principal característica de usa presença é uma intensa pureza e um tipo ardente de devoção que não admite obstáculo. Ele vive entre os drusos do Monte Líbano (cadeias de montanhas no Líbano). Dois dos Grandes Seres com quem tivemos contato divergem levemente daquilo que nós talvez, com toda a reverência, possamos chamar de tipo comum de corpo físico de um Adepto. Um deles é o Regente Espiritual da Índia, aquele sobre quem o Coronel Olcott muitas vezes escreveu, para o qual o nome Júpiter foi designado no livro Man: Whence, How com Whither (O Homem donde e como veio e para onde vai?. Ele é mais baixo que a maioria dos membros da Fraternidade e é o único dentre eles, até onde sei, cujos cabelos mostram faixas de cinza. Ele se porta de forma muito retilínea, e se move com prontidão e precisão militares. É um proprietário de terras; e durante a visita que eu lhe fiz juntamente com o Swami T. Subba Row, eu o vi várias vezes fazendo transações comerciais com homens que pareciam mestres de obras, trazendo-lhe relatórios e recebendo dele instruções. O outro é o Mestre Djwal Kul, que ainda está vestindo o mesmo corpo em que ele alcançara o Adeptado, há apenas alguns anos. Talvez por esse motivo não tenha sido possível fazer desse corpo uma reprodução perfeito do Augoeides (corpo luminoso). Sua face é nitidamente tibetana nas suas características, com as maçãs do rosto altas e com aparência um tanto enrugada, mostrando sinais de envelhecimento. VEÍCULOS FÍSICOS PERFEITOS – Aqueles que, ao atingirem o nível de Adeptado, escolhem como futuro curso de vida permanecer nesse mundo e ajudar diretamente na evolução de sua própria humanidade, consideram conveniente reter corpos físicos para o seu trabalho. Para que sejam adequados para os seus propósitos, esses corpos não podem ser de tipo comum. Eles não apenas devem ser absolutamente sadios, mas também, a expressão do Ego mais perfeita possível no plano físico. A construção de tal corpo não é tarefa fácil. Quando o Ego de um homem comum desce ao seu novo corpo de bebê, ele o vê sob os comandos de um elemental artificial, criado de acordo com seu karma, como eu descrevi em A Vida Interna, livro do autor desse texto. Esse elemental está habilidosamente ocupado em modelar a forma que logo nascerá no mundo exterior, ele permanece após o nascimento e continua esse processo de modelagem geralmente até que o corpo tenha seis ou sete anos de idade. Durante esse período, o Ego vai gradualmente adquirindo contato mais próximo com seus novos veículos, emocional e mental, e também com o físico, e vai se familiarizando com eles; porém o trabalho que ele realmente executa nesses novos veículos, até que o elemental se retire, é na maioria dos casos insignificante. Ele certamente está em conexão com esses corpos, mas geralmente dá pouca atenção a eles, preferindo esperar até que atinjam um estágio em que sejam mais responsivos aos seus esforços. O caso de um Adepto é bem diferente disso. Como não há karma para ser trabalhado, não há o elemental artificial, e é o próprio Ego que fica responsável em desenvolver o corpo desde o início, limitando-se apenas pela hereditariedade. Isso permite a construção de um instrumento muito mais refinado e delicado, mas também dá mais trabalho ao Ego e ocupa por alguns anos uma considerável quantidade de seu tempo e de sua energia. Em consequência disso, e sem dúvida por outras razões também, um Adepto não quer repetir o processo com maior frequência do que o estritamente necessário e, portanto, faz com que seu corpo físico dure o máximo possível. Nossos corpos envelhecem e morrem por muitas razões, desde fraquezas hereditárias, doenças, acidentes, autoindulgência, preocupações e excesso de trabalho, porém, no caso de um Adepto, nenhuma dessas causas está presente. Dessa forma, é claro, devemos nos lembrar de que seu corpo está preparado para o trabalho e é capaz de resistência imensuravelmente além daquela suportada pelo homem comum. Sendo os corpos dos Adeptos como nó os descrevemos, eles usualmente são capazes de retê-los por muito mais tempo do que um homem comum pode fazê-lo. A consequência é geralmente muito maior que as aparências nos fazem supor. O Mestre Mora, por exemplo, parece ser um homem absolutamente no apogeu de sua vida – possivelmente com trinta e cinco ou quarenta anos de idade; entretanto, muitas das histórias que seus discípulos contam sobre ele lhe conferem uma idade quatro ou cinco vezes maior do que essa. A própria Madame Blavatsky nos contou que quando ela o viu pela primeira vez em sua infância ele tinha a mesma aparência que apresenta no momento atual. Igualmente, o Mestre Kuthumi aparenta ter a mesma idade de seu amigo e constante companheiro, o Mestre Mora. Mesmo assim, diz-se que ele fez uma graduação universitária na Europa um pouco antes da metade do século passado (na referência ao século XIX), o que certamente faria dele algo como um centenário. Não temos, no presente momento, os meios para saber qual seria o limite de prolongação, embora haja evidências que mostram que poderia facilmente se estender para mais que o dobro dos 70 anos do Salmista (o rei Davi, personagem bíblico). Um corpo assim preparado para trabalhos elevados é inevitavelmente sensitivo, e por essa mesma razão ele requer tratamento cuidadoso para permanecer sempre em seu melhor estado. Ele se desgastaria, como acontece com os nossos, se fosse submetido às inumeráveis fricções triviais do mundo externo e suas constantes torrentes de vibrações incompassíveis. Por isso, os Grandes Seres usualmente vivem em relativa reclusão e raramente aparecem no caos ciclônico que chamamos vida diária. Se eles trouxessem seus corpos para o turbilhão de curiosidade emoções veementes, certamente a vida desses corpos seria imensamente encurtada e também, por conta de sua extrema sensitividade, haveria muito sofrimento desnecessário. VEÍCULOS EMPRESTADOS – Ocupando temporariamente o corpo de um discípulo, o Adepto evita esses inconveniente e, ao mesmo tempo, dá um ímpeto incalculável à evolução do discípulo. Ele habita o veículo apenas quando é necessário – para dar um ensinamento, talvez, ou para projetar um fluxo especial de bênçãos. Assim que ele conclui o que pretendia, ele desocupa o corpo, e o discípulo, que esteve durante todo o tempo assessorando-o retorna para ele, enquanto o Adepto volta ao seu próprio veículo para continuar seu trabalho usual de ajuda ao mundo. Dessa forma, seus afazeres habituais são pouco afetados, e ele terá ainda a seu dispor um corpo com o qual poderá operar, quando precisar, no plano físico. Podemos facilmente imaginar de que maneira isso afetará o discípulo que tão favoravelmente tem a oportunidade de emprestar seu corpo dessa forma a um dos Grandes Seres, embora a extensão de suas ações possa estar além de nossos cálculos. Ter um veículo em sintonia com tal influência será para ele verdadeiramente uma assistência, não uma limitação; e enquanto o seu corpo estiver em uso, ele sempre terá o privilégio de banhar-se no maravilhoso magnetismo do Adepto, já que deverá ficar por perto para reassumir o controle de seu corpo tão logo o Mestre tiver terminado de utilizá-lo. Esse plano de pegar emprestado um corpo adequado sempre é adotado pelos Grandes Seres quando eles entendem ser benéfico descer entre os homens, como nas condições que temos agora no mundo. O Senhor Gautama empregou esse método quando veio conquistar o Budhado, e o Senhor Maitreya tomou o mesmo curso quando visitou a Palestina dois mil anos atrás. A única exceção que conheço é quando um novo Bodhisattva assume o ofício de Instrutor do Mundo depois que seu antecessor se torna Budha – em sua primeira aparição no mundo com essa qualificação, ele nasce como uma pequena criança na forma convencional. Assim fez o nosso Senhor, o atual Bodhisattva, quando ele nasceu como Shri Khrisna nas planícies brilhantes da Índia para ser reverenciado e amado com inigualável apaixonada devoção. Essa ocupação temporária do corpo de um aspirante não deve ser confundida com o uso permanente, por uma pessoa avançada, de um veículo preparado para ele por outra pessoa. Nossa grande Fundadora, Madame Blavatsky, quando abandonou o corpo no qual a conhecemos, ocupou outro que fora recém-desocupado por seu inquilino original. Sobre o fato de esse corpo ter sido preparado especialmente para seu uso, não tenho informação, entretanto, outras circunstâncias são conhecidas em que isso foi feito. Há sempre, nesses casos, certa dificuldade em adaptar o veículo às necessidades e idiossincrasias do novo ocupante, e é provável que ele nunca se torne um traje perfeitamente ajustado. Para o Ego entretanto, há uma escolha entre dedicar uma considerável quantidade de tempo e trabalho para superintender o crescimento de um novo veículo, que seria sua expressão perfeita, na medida do possível no plano físico, ou evitar toda essa dificuldade entrando no corpo de outra pessoa – um processo que proverá um instrumento razoavelmente bom para todos os propósitos ordinários, porém ele nunca cumprirá em todos os aspectos tudo aquilo que seu possuidor deseja. Em todos os casos, um discípulo está naturalmente ansiosos em ter a honra de dar o seu corpo a seu Mestre, mas de fato poucos são veículos puros o suficiente para terem esse uso. Sempre se levanta a questão sobre o porquê de um Adepto, cujo trabalho parece estar quase inteiramente em planos superiores, precisar de um corpo físico. Realmente não é da nossa conta, mas se a especulação sobre tais questões não forem irreverentes, há várias razões que podem ser sugeridas. O Adepto gasta a maior parte de seu tempo projetando correntes de influência, e embora, até onde se tem observado, elas estejam mais frequentemente no nível mental superior ou acima dele, é provável que eventualmente haja a necessidade de projeção de correntes etéricas, e para sua manipulação a posse de um corpo físico é, sem dúvida, uma vantagem. Além disso, a maioria dos Mestres que eu tenho visto tem alguns discípulos ou assistentes que vivem com eles ou perto deles no plano físico, e um corpo físico pode ser necessário em seu benefício. Podemos ter certeza de que, se um Adepto optar ter o trabalho de manter tal corpo, ele tem uma boa razão para isso, pois conhecemos o bastante sobre seus métodos de trabalho para estarmos completamente cientes de que eles sempre fazem tudo da melhor maneira possível e com os meios que envolvem o menor gasto de energia. Livro Os Mestres e a Senda. Abraço. Davi.

sexta-feira, 21 de agosto de 2020

I OS CORPOS FÍSICOS DOS MESTRES

 

Teosofia. Livro Os Mestres e a Senda. Texto de Charles Webster Leadbeater (1854-1934). OS MESTRES. Capitulo Dois. I OS CORPOS FÍSICOS DOS MESTRES. SUA APARÊNCIA – Tem havido entre os estudantes de Teosofia, uma grande quantidade de ideias vagas e incertezas sobre os Mestres. Portanto, talvez seja útil entender o quão natural são as suas vidas e como há um lado físico trivial a respeito deles, mencionando algumas poucas palavras sobre suas vidas diárias e sobre a aparência de alguns deles. Não há uma característica física pela qual um Adepto possa ser infalivelmente distinguido de outros homens, mas ele sempre parece impressionante, nobre, dignificado, santo e sereno; e quem quer que o tenha encontrado dificilmente poderia falhar em reconhecer que esteve na presença de um homem notável. Ele é um homem enérgico, mas silenciosos, falando apenas quando tem um objetivo definido em vista, para encorajar, ajudar ou acalentar; maravilhosamente benevolente e pleno de um senso de humor perspicaz – humor sempre de ordem gentil, nunca usado para injuriar, mas sempre para aliviar as dificuldades da vida. O Mestre Mora uma vez disse que é impossível fazer progresso na Senda oculta sem senso de humor, e certamente todos os Adeptos que tenho visto possuem essa qualificação. A maioria deles é, notoriamente, composta de homens de boa aparência; seus corpos físicos são praticamente perfeitos, pois eles vivem em completa obediência às leis da saúde e, sobretudo, eles nunca se preocupam com nada. Todo o seu carma há muito tempo se exauriu; dessa forma, seus corpos físicos são uma expressão perfeita do Augoeides (em ocultismo é a radiação luminosa divina do Ego, que, quando encarnado, não é mais do que sua sombra pura), ou corpo glorificado do Ego, tanto quanto as limitações do plano físico permitam. Assim, usualmente, não apenas o presente o corpo de um Adepto é esplendidamente formoso, como também o novo corpo que ele virá a ter em uma encarnação subsequente será provavelmente quase uma reprodução exata do anterior, permitindo diferenciações raciais e familiares, pois não há nada a modificar nele. Quando por alguma razão escolhem ter novos corpos, essa independência em relação ao karma lhes dá inteira liberdade para selecionar um nascimento em qualquer país ou raça que possa ser conveniente para o trabalho que tenham a fazer. Dessa forma, a nacionalidade do corpo específico que eles eventualmente estejam usando, a qualquer tempo, não tem uma importância primária. Para saber se um homem é um Adepto, seria necessário ver seu corpo causal, pois seu desenvolvimento seria demonstrado pela ampla dimensão e por um arranjo especial de suas cores em esferas concêntricas, tal como está indicado em certa medida na ilustração do corpo causal de um Arhat no Livro O Homem Visível e Invisível do mesmo autor. UM DESFILADEIRO NO TIBETE – Há um vale, ou melhor, um desfiladeiro, no Tibete, onde três desses Grandes Seres – o Mestre Morya, o Mestre Kuthumi e o Mestre Djwal Kul – vivem atualmente (o autor se refere ao ano de 1925, data da publicação desse livro que estudamos agora). O Mestre Djwal Kul, por solicitação de Madame Helena P. Blavatsky (1831-1891), certa vez fez para ela um quadro precipitado da entrada desse desfiladeiro. A ilustração dada aqui é uma reprodução de uma fotografia de seu quadro. O original, precipitado em seda, está preservado no santuário da sede da Sociedade Teosófica em Adyar – Índia. À esquerda do quadro, o Mestre Morya é visto montando a cavalo perto da porta de sua casa. A morada do Mestre Kuthumi não aparece no quadro, pois está mais acima no vale, em volta da curvatura à direita. Madame Blavatsky pediu ao Meste Kuthumi para colocar a si mesmo na gravura. A princípio, ele recusou, mas afinal adicionou a si mesmo como um pequeno vulto dentro d’água segurando uma estaca, mas com as costas para o espectador! Este original está fracamente colorido –as cores são azul, verde e preto. Tem a assinatura do artista, com o apelido Gai Ben-Jamin, que ele carregava nos primórdios da Sociedade Teosófica, muito antes de ele alcançar o Adeptado. A cena é evidentemente tomada de manhã cedo, já que a névoa ainda está escalando a encosta (o Mosaico omitiu a gravura no texto devido a dificuldades de imprimi-la). Os Mestres Morya e Kuthumi ocupam em lados opostos desse estreito desfiladeiro, cujas encostas estão cobertas com pinheiros. As trilhas correm desfiladeiro abaixo passando por suas casas e se encontram ao fundo, onde há uma pequena ponte. Perto da ponte, uma pequena porta, que pode ser vista à esquerda no fundo da gravura, leva a um vasto sistema de corredores subterrâneos que inclui um museu oculto, do qual o Mestre Kuthumi é o Guardião, em nome da Grande Fraternidade Branca. O conteúdo desse museu é de caráter bastante variado. A intenção parece ser ilustrar todo o processo de evolução. Por exemplo, nele há as mais vívidas imagens de cada tipo de homem que já existiu neste planeta desde o começo dos gigantes lemurianos (povo de Lemúria, um suposto continente perdido localizado no Oceano Índico ou Pacífico. A ideia teve origem no século XIX, pela hipótese geológica do catastrofismo. Desde então adotado por estudiosos do ocultismo, assim como pelo povo Tâmil da Índia) desconjuntados a minúsculos restos até mesmo de raças primitivas e menos humanas. Modelos em alto relevo mostram todas as variações da superfície da Terra – as condições de antes e depois dos grandes cataclismos que tanto a modificaram. Imensos diagramas ilustram as migrações das diferentes Raças do mundo, mostrando exatamente o quão longe elas se espalharam desde suas respectivas origens. Outros diagramas similares referem-se à influência das várias religiões do mundo, mostrando onde cada uma foi praticada em sua pureza original, e onde se misturou com  e foi distorcida pelos remanescentes de outras religiões. Admiráveis estátuas em tamanho real perpetuam a aparência física de certos grandes líderes e instrutores de Raças há muito tempo esquecidas e vários objetos de interesse, relacionados a importantes e mesmo despercebidos avanços na civilização, estão preservados para investigação na posteridade. Os manuscritos originais de incrível antiguidade e valor inestimável estão aqui para serem vistos – por exemplo, um manuscrito feito pelas mãos do próprio Senhor Budha em sua derradeira vida como o Príncipe Sidartha, e outro escrito pelo Senhor Cristo durante sua encarnação na Palestina. Aqui é mantido o maravilhoso original do Livro de Dzyan, que Madame Blavatsky descreve na introdução de A Doutrina Secreta. Nele também há estranhas escrituras de mundos diferentes do nosso. Formas animais e vegetais também são retratadas, algumas das quais conhecemos como fosseis, embora a maioria delas seja inimaginável para nossa ciência moderna. Modelos  reais de algumas das grandes cidades de antiguidade remota e esquecida estão lá para o estudo dos discípulos. Todas as estátuas e modelos são vividamente coloridos exatamente reunida no seu tempo, para preservar para a posteridade os estágios precisos pelos quais a evolução ou civilização da época estava passando. Dessa forma, ao invés de meros fragmentos incompletos, tal como nossos museus tão frequentemente nos apresentam, temos na totalidade uma série intencionalmente educativa de apresentações. Lá encontramos modelos de todos os tipos de maquinário que as diferentes civilizações desenvolveram, e também há ilustrações elaboradas e abundantes dos tipos de magia em uso nos vários períodos da história. Na antecâmara que leva a estes vastos salões, estão guardadas as imagens vivas dos discípulos dos Mestres Morya e Kuthumi em provação àquele tempo, que descreverei mais adiante. Essas imagens estão enfileiradas em volta das paredes como estátuas, e são representações perfeitas dos respectivos discípulos. Não é provável, no entanto, que sejam visíveis aos olhos físicos, pois a matéria mais baixa que entra em sua composição é etérica. Perto da ponte há também um pequeno. Templo com torres de forma birmanesa, para o qual alguns poucos camponeses vão para fazer oferendas de frutas e flores, queimar cânfora e recitar o Pancha Sila (são as cinco virtudes, moralidades ou preceitos universais do Budismo). Uma trilha acidentada e irregular leva ao vale pelo lado do riacho. De ambas as casas dos Mestres, acima da ponte, pode-se ver o Templo; porém, a partir dele, nenhuma das duas pode ser vista, já que o desfiladeiro faz uma curva. Se seguirmos o caminho acima do vale, passando pela casa do Mestre Kuthumi, chegaremos a um grande pilar de pedra, para além do qual, o desfiladeiro dando outra volta, fica esse caminho fora de vista. Alguma distância depois o desfiladeiro se abre em um planalto onde há um lago, no qual, a tradição nos conta. Madame Blavatsky  costumava tomar banho. Dizem que ela o achou muito frio. O vale é protegido e aponta para o sul: embora a região em volta fique coberta de neve durante o inverno, não me lembro de tê-la visto perto das casas dos Mestres. Estas casas são de pedra, de construção forte e pesada. A CASA DO MESTRE KUTHUMI – A casa do Mestre Kuthumi é dividida em duas partes por um corredor que passa ininterrupto por dentro dela. Como visto em nosso diagrama I (o Mosaico não imprimiu o diagrama citado), que mostra a planta baixa da parte sul da casa, ao entrar no corredor; a primeira porta à direita leva à sala principal da casa, na qual nosso Mestre usualmente se assenta. Ela é larga e alta (cerca de 16 por 9 metros), mais parecendo um saguão do que uma sala, e ocupando toda a frente da casa desse lado do corredor. Atrás dessa grande sala  há dois outros aposentos quase quadrados, um dos quais ele usa como biblioteca e o outro como quarto. Isso completa esse lado ou divisão da casa, que aparentemente é reservada para uso pessoal do Mestre e é cercada por uma grande varanda. O outro lado da casa, no lado esquerdo do corredor, quando se entra, parece estar dividido em quartos menores e escritórios de vários tipos. Nós não tivemos oportunidade de examiná-lo de perto, mas notamos que do lado oposto ao quarto há um banheiro bem equipado. O aposento maior é bem suprido de janelas, tanto na frente quanto atrás, de forma que ao entrar tem-se a impressão de uma vista quase contínua; abaixo das janelas há grandes assentos. Também há algo um tanto quanto não usual para aquele país: uma grande lareira aberta no meio da parede oposta às janelas da frente. Ela está posicionada de tal forma a possibilitar o aquecimento de todos os três cômodos, e tinha uma curiosa tampa forjada em ferro, que, segundo me disseram, é única no Tibete. Acima da abertura da lareira há uma prateleira, e perto dela a poltrona do Mestre, esculpida em madeira muito antiga, escavada para caber aquele que que se senta, de maneira a não precisar de almofadas. Espalhados pela sala, há mesas e cadeiras ou sofás, a maioria sem encosto; e em um dos cantos fica o teclado do órgão. O teto tem aproximadamente 6 metros de altura e é muito bonito, com feixes bem esculpidos, que descem em pontos ornamentais onde se encontram e o dividem em seções retangulares. Uma abertura arqueada com um pilar ao centro, em estilo gótico, mas sem vidros, se abre na viga, e uma janela similar se abre no quarto. Este último quarto é mobiliado de forma muito simples. Há uma cama comum e uma rede de balanço entre dois suportes de madeira esculpidos e fixados na parede (um deles imitando a cabeça de um leão e o outro a de um elefante). A cama, quando não está em uso, dobra-se contra a parede. A biblioteca é uma elegante sala, contendo milhares de volumes. Correndo nas paredes, há altas prateleiras, repletas de livros em muitas línguas, alguns deles trabalhos europeus modernos; no topo, há prateleiras abertas para manuscritos. O Mestre é um grande linguista, e além de ser um excelente erudito da língua inglesa tem também um completo conhecimento do francês e do alemão. A biblioteca dispõe ainda de uma máquina de escrever, que foi presenteada ao Mestre por um de seus discípulos. Sobre a família do Mestre, sei muito pouco. Há uma senhora, evidentemente uma aspirante, que ele chama de “irmã”. Se ela é realmente sua irmã, não sei; possivelmente ela é uma prima ou uma sobrinha. Ela parece ser muito mais velha que ele, mas isso não tornaria improvável a relação, já que ele tem aparentado a mesma idade por um extenso prazo. Ela se parece com ele em alguma medida, e vez ou outra, quando houve assembleias, ela se juntou à reunião, embora seu principal trabalho pareça ser cuidar dos serviços domésticos e administrar os empregados. Dentre esses, há um velho home e sua esposa, que tem estado a serviço do Mestre por um longo tempo. Eles nada sabe sobre a real dignidade de seu empregador, mas o tem como um patrão muito indulgente e amável e, naturalmente, eles muito se beneficiam por estar a seu serviço. AS ATIVIDADES DO MESTRE – O Mestre tem um grande jardim pessoal. Possui também uma extenso de terras  e emprega trabalhadores para cultivá-la. Próximo à casa há arbustos floridos e arranjos de flores crescendo livremente, com samambaias entre eles. Pelo jardim flui um riacho, que forma uma pequena cachoeira e, sobre ela, uma pequena ponte foi construída. Ele frequentemente se senta lá quando está enviando correntes de pensamento e bênçãos para seu povo. Sem dúvida, ao observador casual, iria parecer que ele está parado olhando a Natureza, ouvindo de forma descuidada o som dos pássaros e as quedas d’água. Às vezes, também, ele descansa em sua grande poltrona; e quando seu povo o vê assim, eles sabem que não devem perturbá-lo. Eles não entendem exatamente o que ele está fazendo, mas supõem que ele esteja em samadhi (concentração, tranquilidade, calma, quietude; a prática de aquietar a mente). O fato de as pessoas do Oriente compreenderem e respeitarem este tipo de meditação pode ser uma das razões pelas quais os Adeptos preferem viver por lá, e não no Ocidente. Dessa forma, nós recebemos as consequências do sereno repouso do Mestre por uma parte considerável de seu dia e, como se diria, de sua meditação. Porém, enquanto ele parece estar descansando calmamente, ele está, na realidade, engajado todo o tempo no mais vigoroso  trabalho em planos superiores, manipulando várias forças naturais de almas simultaneamente, pois os Adeptos são as pessoas mais ocupadas do mundo. O Mestre, no entanto, também faz muitos trabalhos no plano físico. Ele compôs algumas músicas e tem escrito notas para vários propósitos. Ele também está muito interessado no crescimento da ciência física, embora isso seja competência especial de outro grande Mestre de Sabedoria. De tempos em tempos o Mestre Kuthumi cavalga um grande cavalo baio, e ocasionalmente, quando têm trabalho conjunto, ele é acompanhado pelo Mestre Mora, que sempre cavalga um magnífico cavalo branco. Nosso Mestre visita regularmente alguns monastérios, e às vezes sobe por um grande desfiladeiro até um monastério isolado nas colinas. Cavalgar no curso de suas tarefas parece ser seu principal exercício, mas ocasionalmente ele caminha com o Mestre Kjwual Kul, que mora em uma pequena cabana que ele próprio construiu com suas mãos, bem próximo ao grande penhasco no caminho para o planalto. De quando em quando, nosso Mestre toca o órgão que está no grande cômodo de sua casa. Ele o encomendou no Tibete, sob suas orientações; na verdade é uma combinação de piano com órgãos, com um teclado como aquele que temos no Ocidente, no qual ele pode tocar todas as nossas músicas ocidentais. Não se parece com nenhum outro instrumento a que sou familiarizado, pois ele possui dupla face, podendo ser tocado tanto da sala quanto da biblioteca. O teclado principal do órgão (ou melhor, os três teclados, grande órgão, expressivo e positivo) está na sala de estar, enquanto o teclado do piano está na biblioteca. Esses teclados podem ser usados tanto conjuntamente quanto separados. O órgão completo, com seus pedais, pode ser tocado de forma usual a partir da sala de estar, mas ao mover uma manivela tal qual um registro, o mecanismo do piano pode ser ligado ao órgão, de maneira que ambos possam ser tocados de forma simultânea. Desse ponto de vista, de fato, o piano é considerado como um terminal adicional ao órgão. Do teclado da biblioteca, no entanto, o piano pode ser tocado isoladamente, como um instrumento separado, completamente dissociado do órgão, mas por algum complexo mecanismo, os teclados do órgão também estão ligados àquele teclado, de forma que se pode tocar o piano em separado, precisamente como se fosse um piano comum, ou pode-se tocar o piano acompanhado pelo órgão, em qualquer proporção, a partir de determinado registro desse órgão. Também é possível, como mencionei, separá-los completamente e, dessa forma, com um artista em cada teclado, tocar um dueto piano órgão. Os mecanismos e tubos desse estranho instrumento ocupam quase tudo aquilo que pode ser chamado de andar de cima dessa parte da casa do Mestre. Por magnetização, ele o colocou em comunicação com os Gandhrarvas, ou Devas da música, de forma que sempre que tocado eles operam conjuntamente, e assim o Mestre obtém combinações de som jamais ouvidas no plano físico. Há ainda um efeito produzido pelo próprio órgão, como se houvesse um acompanhamento por instrumentos de corda e sopro. A música dos Devas (anjos) está sempre sendo entoada no mundo, sempre soando aos ouvidos dos homens, mas eles não ouvem sua beleza. Há o intenso baixo do mar, o suspiro do vento nas árvores, o rugido da torrente da montanha, a música das correntes, rios e cascatas, que juntos com muitos outros sons formam o poderoso canto da Natureza vivente. Esse é apenas o eco no mundo físico de um som muito mais grandioso, o som da Existência dos Devas. Como dito em Luz no Caminho, livro escrito por Mabel Collins “Só fragmentos da grande canção te chegarão aos ouvidos enquanto fores apenas um homem. Se, porém, a escutares, recorda-te fielmente, de modo que nada do que chegue dela a ti seja perdido, e empenha-te emaprender assim o significado do Mistério que te rodeia. Com o tempo não necessitarás de instrutor. Pois assim como o indivíduo tem voz, aquilo em que ele existe também tem voz. A própria vida tem uma fala e nunca está silenciosa. E o que ela emite não é um grito, como tu, que és surdo, poderias supor: é uma canção. Aprende da vida que és parte da harmonia; aprende dela a obedecer às leis da harmonia. Todas as manhãs, m certo número de pessoas – não exatamente discípulos, mas seguidores – vêm à casa do Mestre e se sentam na varanda e do lado de fora. Algumas eles ele lhes dirige uma pequena conferência, uma curta preleção, mas frequentemente ele segue adiante com seu trabalho e não dá atenção a eles, afora um amistoso sorriso, com o qual eles parecem ficar igualmente contentes. Eles evidentemente se aproximam para se harmonizarem em sua aura e venerá-lo. Algumas vezes o Mestre faz suas refeições em presença deles, sentado na varanda, com esse aglomerado de tibetanos (moradores da região do Tibete no Himalaia) e outros no chão à sua volta, mas normalmente ele come sozinho em uma mesa em seu quarto. É possível que ele mantenha as regras dos monges budistas e não se alimente depois do meio-dia, pois eu não me lembro de tê-lo visto comer à tarde. É até possível que ele nem necessite de alimento todo dia; é mais provável que ele, quando se sinta disposto, peça a comida que gostaria, e não que tome suas refeições em horários estabelecidos. Eu o tenho visto comer pequenos bolos redondos, marrons e adocicados, são preparados com trigo, açúcar e manteiga, do tipo comum, por sua irmã. Ele também se alimenta de molho curry e arroz, sendo o molho em forma de sopa, como dhal (iguaria da culinária indiana, feita de lentilha, grão de bico ou legumes batidos). Ele usa uma singular e bela colher de ouro, com uma imagem requintada de um elefante ao final do cabo, cujo bojo fica em um ângulo não usual da haste. ´uma herança de família, muito antiga e provavelmente de grande valor. Ele geralmente veste roupas brancas, mas eu não me lembro de tê-lo visto usando nenhum tipo de chapéu, exceto nas raras ocasiões em que ele usa a túnica amarela da escola ou clã Gelugpa (turbante amarelo, a mais importante e mais ortodoxa das linhagens do Budismo), que inclui um capuz de forma parecida ao elmo romano. O Mestre Mora, entretanto, geralmente usa um turbante. Livro Os Mestres e a Senda. Abraço. Davi.