Comentário
de Shri Mataji N. Devi (1923-2011). Nesse 14º capítulo do Bhagavad Gita o
Senhor Krishna afirma que é a natureza matriz universal na qual Ele coloca
sua semente. Dessa união, nascem todos os seres e, portanto, ele é a fonte de
toda a criação e seu gerador. O processo contínuo de criação é testemunhado
pelo Senhor. As três Gunas: Sattva, Rajas e Tamas, têm a sua origem em
Prakriti, natureza. As características de cada uma dessas três Gunas são:
Sattva, pureza e equilíbrio; Rajas, paixão e agitação; Tamas, inércia e
ignorância. Todas as coisas na vida são limitadas e dominadas por essas três
Gunas. A vida do ser humano e suas ações são influenciadas por elas. Sendo
Sattva a pureza, ela é luminosa e brilhante como um cristal. Está livre do mal
e das perturbações. Por isso, ela se vincula e se conecta à felicidade e ao
conhecimento. Rajas é a fonte do desejo, da luxúria e dos apegos. Por isso,
vincula-se à ação, dado que, a partir do desejo e dos apegos, surge a
necessidade de agir. Desejar significa ansiar por coisas ainda não alcançadas.
Ter apego significa apreciar e querer manter coisas já obtidas. Tamas,
vincula-se à inércia, à preguiça e ao sono. As consequências da atuação de cada
uma dessas Gunas são: pureza e equilíbrio que emergem de Sattva. Dor e
sofrimento surgem de Rajas e a ignorância e a estupidez se originam de Tamas. O
que acontece com aqueles que seguem essas Gunas? Os Sattvikas sobem para o Satyaloka, a morada
de Brahma. Os Raajasikas passam a morar num mundo intermediário e nascem no
mundo dos seres humanos. Os Taamasikas vão para os mundos inferiores e nascem
como criaturas inferiores. Aquele que se eleva acima dessas três Gunas é
chamado de Trigunaathitha. Ele não mais se identifica com os momentos
passageiros de felicidade ou de tristeza, porque compreende que isso não são
apenas emoções de um corpo físico impermanente e não emanam de seu verdadeiro
ser, dado que ele agora está identificado com Deus. Ele se comporta da mesma
maneira diante do prazer e da dor, e mantém a mesma atitude diante dos amigos e
inimigos. Jamais sente que é o verdadeiro executor do que quer que seja. O
Senhor conclui afirmando que somente um indivíduo que tenha uma fé completa e
uma devoção profunda, pode tornar-se um Trigunaathitha e ser capaz de alcançar Brahman.
Segue o texto sagrado. “Continua Krishna: Presta atenção, Oh Arjuna! Quero
dar-te ainda mais esclarecimentos e ensinar-te mais verdades da Suprema
Sabedoria. Esta Sabedoria é o melhor que se pode possuir. Os sábios e santos
que a possuíram chegaram as Alturas da Suprema Perfeição. Tendo alcançado o
Supremo Conhecimento vieram unir-se comigo, entrando em meu Ser. Eles não
renascerão, nem quando um novo Universo for criado, e a dissolução do Universo
não os tocará. Este Universo de matéria é a minha matriz, em que ponho o germe
de que provém todos os seres. Quaisquer que sejam as matrizes de que nascem os
seres, este Universo é a sua matriz, e Eu, o Pai inoculador. A Matéria tem três
qualidades, principais ou Gunas, que se chamam: Sattwa ou Harmonia. Rajas ou
movimento e Tamas ou inércia. Estes três atributos vinculam a alma ao corpo ou
Espírito à Matéria. Os seus vínculos são diferentes, mas todos são vínculos.
Sattwa, a harmonia, sendo pura e imaculada, vincula a alma pelo amor ao
conhecimento e a harmonia. Quem está em seu poder, renasce por causa dos
vínculos que o prendem ao saber e a beleza. Rajas, a emoção, é a natureza
passional, o desejo que vincula a alma, incitando-a a ocupar-se da ação e dos
objetos e levando-a ao renascimento pelo apego à ação. Tamas, a inércia,
vincula a alma pelos laços da negligência, apatia e preguiça. Sattwa, harmonia,
prende à felicidade; Rajas, emoção, ata a ação; mas Tamas, inércia,
obscurecendo a reta percepção, encadeia os mortais à indolência. Quando o homem
venceu Tamas e Rajas, reina nele Sattwa só. Quando desapareceu Rajas e Sattwa,
domina o Tamas. E quando desapareceu Tamas e Sattwa, governa Rajas. Vendo a
Sabedoria manifestada em alguém, sabe que Sattwa é a Guna que o domina. Onde se
vê avidez, obstinação, muita atividade, agitação e desejo. Ali Rajas exerce o
seu poder. Quando aparece estupidez, preguiça, vaidade e falta de ideias, Tamas
está no trono. Se na hora de sua morte prevalece a Harmonia, o homem vai, para
os imaculados, mundos dos grandes sábios. Mas se predomina a emoção, renasce o
homem, entre os inclinados à ação. E se na inércia desaparece, volta a nascer
entre os ignorantes. O fruto de uma boa ação é puro e harmônico, o fruto da
emoção é em verdade dor, mas o da inércia é ignorância. Da harmonia procede
o conhecimento, da emoção, o desejo, e
da inércia, o erro, a ignorância, a preguiça. Os que estão situados na
harmonia, ascendem ao alto. Os ativos moram na região intermediária, e os
inertes se afundam nas mais vis qualidades. Quando o vidente se apercebe de que
as qualidades são o único agente, e reconhece aquele que se sobrepõe as
qualidades, então participa de minha natureza. Quando a alma encarnada
ultrapassar essas três qualidades que aparecem com a formação de um corpo, e
quando se tornou consciente do que existe além delas, libertou-a dos vínculos
das Gunas. E, por conseguinte, também
dos vínculos do nascimento e da morte, da velhice e do sofrimento, e bebe o
néctar da imortalidade. Pergunta Arjuna: e como se pode conhecer, Oh Senhor!
Aquele que alcançou essa vitória? Como vive e como vence essas três qualidades?
Responde Krishna: diz-se que ultrapassou as qualidades quem, sentindo o efeito
que as qualidades produzem, percepção, ação ou ilusão, não lhe repugnam os maus
frutos advindos nem anseia pelos bons frutos frustrados. Aquele que, como
neutro espectador, não é comovido pelas qualidades, mas imperturbável se retrai
delas com o pensamento, as qualidades desempenham sua tarefa. Aquele que,
equânime no prazer e na dor, fixa-se no Eu, olhando indiferente a argila, a
pedra e o ouro. Que firme no louvor e no vitupério, recebe com a mesma
afabilidade as coisas agradáveis e desagradáveis. Aquele que com igual
indiferença aceita as honrarias e os vitupérios. Que por igual olha os amigos e
inimigos, e desprendido de todos os compromissos. Aquele que se consagra
exclusivamente a mim pela Yoga da devoção. Esse supera tais qualidades e
unifica-se com o Eterno. Pois Eu, sou a causa principal de se tornar alguém o
Eterno, imortal e imperecível; da conquista do sempre inesgotável poder, e da
bem aventurança obtida com sincera e pura devoção”. Abraço. Davi.
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