Judaísmo. www.morasha.com.br.
A FORÇA DO ESPÍRITO. O Dr. Abraham J. Twerski (1930- ) é o fundador e
diretor-médico emérito do Centro de Reabilitação Gateway, na Pensilvânia,
Estados Unidos. A entidade, especializada no tratamento de dependentes
químicos, é citada por publicações americanas como um dos doze melhores centros
para tratamento anti álcool e drogas do mundo. Ele é, também, um dos fundadores
do JACS (Jewish, Alcoholics, Chemically Dependent Persons and Significant
Others). Twerski tem 31 livros publicados, dois deles com ilustrações de
Charles M. Schulz, que trazem os personagens Charlie Brown e Snoopy. É o
fundador do primeiro programa da Pensilvânia para enfermeiras com problemas de
álcool ou drogas, denominado Nurses Off Chemicals - Enfermeiras Longe de
Substâncias Químicas. Também participou do Conselho Governamental sobre Drogas
e Abuso de Álcool e foi presidente do Comitê da Sociedade Médica da Pensilvânia
sobre Médicos Incapacitados. Em 1997, recebeu a maior honraria da Sociedade
Médica da Pensylvania, o The Distinguished Service Award, por sua dedicação no
combate à dependência química. Em 1988 foi agraciado pela Fundação Filantrópica
Católica com o prêmio Charitas. No entanto, antes de se tornar um dos maiores
especialistas dessa área, o dr. Abraham J. Twerski, ordenou-se rabino.
Descendente de quarta geração do líder chassídico Baal Shem Tov e filho de um
rabino, Twerski um dia percebeu que queria fazer algo mais, durante sua vida,
do que oficiar serviços religiosos e cerimônias de Bar Mitzvá. Sua experiência
como líder espiritual já lhe vinha mostrando que, às vezes, quando as pessoas
procuram um rabino para conversar, querem algo mais. Na verdade, estão em busca
de alguém que as ouça e que procure entendê-las, uma espécie de psicólogo. E
foi no estudo da medicina e da psiquiatria que foi buscar as respostas para
tentar compreender e ajudar os indivíduos, sem no entanto, abrir mão, a nenhum
instante, de sua formação religiosa e de sua herança judaica. Ao contrário, o
Rabino Twerski, já então com o título de médico, fez de sua bagagem espiritual
um dos principais instrumentos de seu dia-a-dia profissional. Sua crença no ser
humano e em sua capacidade de superar desafios, desde que encarados de frente,
são os princípios que norteiam o seu trabalho junto a dependentes de álcool e
de drogas. Sua fé em que a vida espiritual dos indivíduos – não importa qual a
sua religião é fundamental para a recuperação dos dependentes, é um dos pilares
que sustenta, há décadas, suas teorias. A maior prova da eficiência destes
conceitos são os resultados obtidos pelo Centro de Reabilitação Gateway e em
outras instituições que usam o seu método. Em entrevista concedida ao Projeto
Morashá, algumas horas, após a sua chegada a São Paulo, recentemente, Twerski
falou um pouco sobre os seus primeiros anos como médico. “Logo percebi que nem
a universidade, nem mesmo a especialização em psiquiatria, iriam mostrar-me
qual o melhor caminho para lidar com os dependentes químicos. Isso era algo que
eu iria aprender gradativamente, no contato com os pacientes, através de longas
conversas, tentando descobrir e entender as razões que os haviam levado ao
vício. Mesmo sem nem sempre entendê-los, percebi que era muito importante
ouvi-los, para então tentar conhecer o porquê e ajudá-los a trilhar o caminho
da volta”, lembra Twerski. Através do contato com os pacientes, o rabino
psiquiatra reafirmou sua certeza de que o caminho da sobriedade - ou o fim de
qualquer dependência - passa necessariamente pela motivação dos indivíduos e
pelo seu desejo autêntico de mudança. Sua crença nesse princípio fortaleceu-se
após um contato mais estreito com a Associação Alcoólicos Anônimos (AAA), em
1961, uma entidade de autoajuda criada em meados de 1930 por duas pessoas que
não conseguiam deixar de beber. “Eu sempre acreditei que a maioria das pessoas
possui personalidade, força e recursos suficientes para lidar com os desafios
da vida. Se falhamos, é porque não temos consciência da nossa capacidade e de
nossos recursos. No meu contato com os pacientes, sempre trabalho no sentido de
fazer com que descubram sua força e também mostrar-lhes que, às vezes, é
preciso buscar uma ajuda externa com pessoas com as quais possam compartilhar
suas experiências. Com isso, sentem-se iguais e não inferiorizados por estarem
nessa situação. Instituições como a AAA desempenham um papel muito importante neste
contexto, pois, além de estimularem a autoajuda, enfatizam a igualdade entre
todos os membros. Lá, todo mundo é igual, todo mundo tem um problema que pode
resolver e todo mundo precisa de ajuda. Isto se chama ‘compartilhar’ e, de modo
geral, as pessoas dependentes são solitárias. O fato de compartilhar traz
resultados positivos”. Segundo Twerski, no entanto, o processo de recuperação
deve ser ordenado para que os objetivos sejam atingidos. Foi dentro deste
espírito que elaborou um programa de “doze passos” que conduz a uma vida mais
feliz e realizada. O método não possui nenhuma base religiosa específica, porém
tem um componente espiritual, já que a oração e fé são essenciais para o
sucesso do tratamento. “Acho fundamental que as pessoas acreditem em alguma
coisa, que tenham crenças e procuro transmitir isso aos meus pacientes. Ao
pensar em cada uma das etapas do programa de recuperação, eu tinha um objetivo
definido: ajudar os indivíduos a corrigir sua visão distorcida da realidade e a
obter uma conscientização plena da mesma e de si próprios”, ressalta o rabino
psiquiatra. Ele falou, também, sobre o papel da família e do contexto social no
processo de recuperação dos dependentes do álcool e das drogas. Segundo
Twerski, é muito comum que as pessoas mais próximas dos viciados,
inconscientemente, mascarem a realidade, preferindo ignorar a gravidade da
situação. “Este é um comportamento que só prejudica a todos. Por mais doloroso
que seja, é preciso enfrentar a situação e fazer com que o dependente confronte
a si mesmo e àqueles com os quais convive. O relacionamento sincero e aberto
entre todos os envolvidos, fazendo inclusive com que o dependente ouça e sinta
como seu comportamento afeta e preocupa os demais, é um dos pontos de partida
para o processo de recuperação. Sabemos que isto é muito difícil,
principalmente porque, em geral, o dependente não admite que tem o problema e
não reconhece sua impotência diante do elemento de dependência. Se conseguirmos
fazer com que ele aceite esse fato, o caminho já começou a ser trilhado”. O
caminho, no entanto, enfatiza Twerski, é longo e penoso e não termina nunca,
pois cada dia é um novo dia e os indivíduos não devem jamais se desviar de suas
metas. É neste processo constante de busca da sobriedade, que afirma ele, a crença
na força interior, uma vida espiritual rica e a fé são fatores de grande
importância. Em seu livro “Despertando na hora certa”, ele afirma que “as doze
etapas do programa são como degraus de uma escada que devemos estar
constantemente subindo, sempre reexaminando e colocando tudo em discussão.
Assim, percebemos tudo o que há de melhor em nós e damos o máximo possível de
nós mesmos”. Este programa, segundo Twerski, pode ser aplicado a qualquer tipo
de dependência, não apenas química, pois tudo que passa de um determinado
limite e que não pode mais ser controlado pelo indivíduo torna-se um vício.
Quando questionado se até a Internet não se encaixa nisto, respondeu que
provavelmente sim e mencionou o fato de ter descoberto, recentemente, um site
sobre este tema - netaddiction.com. “O ponto fundamental quando se analisa a
questão da dependência é justamente o que se refere à falta de controle. Ou
seja, quando o elemento da dependência exerce tanto controle sobre os
indivíduos que provoca mudanças significativas de comportamento, como
agressividade e até lapsos de memória. É aí que se deve estar atento e não
relevar qualquer mudança”. Como evitar comportamentos autodestrutivos. Especial
para a Revista Morashá meu envolvimento no tratamento de alcoólatras tem sido
uma forma de aprendizado muito valiosa. Indivíduos que levam a sério sua
recuperação, e que fazem grandes esforços para eliminar em seu caráter as
falhas que marcaram sua história com a bebida, podem ser vistos como uma rica
fonte de mussar - disciplina. São exemplos vivos do que deve se fazer para
evitar comportamentos autodestrutivos. Se substituirmos a palavra avera -
transgressão - por álcool, podemos ver que existe uma similaridade muito grande
entre um programa efetivo de recuperação para alcoólatras e muitos dos
ensinamentos do mussar. É muito comum, por exemplo, ouvir de um alcoólatra que
conseguiu se recuperar, a afirmação de que “na vida não há coincidências.
Coincidências nada mais são do que milagres nos quais D’ us quis ficar
anônimo”. A transição do alcoolismo para a sobriedade requer que o indivíduo
aceite o quanto ele tem sido impotente perante certos aspectos de sua vida. Ao
se conscientizar de sua própria falta de poder, ele poderá então aceitar a
existência de uma Força Superior. Ao mesmo tempo em que temos livre arbítrio
para termos comportamentais e morais, devemos compreender que existem muitas
coisas que são obras de D’us. Muitos acontecimentos em nossas vidas parecem ser
“fenômenos naturais”, mas na realidade são atos de D’us nos quais Ele prefere
permanecer anônimo. A Torá é repleta de milagres, mas é importante notar que
nem todos são comemorados. Não temos uma festa para celebrar a ocasião na qual
o profeta Yoshua parou o sol e a lua, para que o Povo de Israel pudesse
continuar guerreando numa sexta à noite, sem violar o Shabat. Mesmo Pessach é
celebrada como a Festa da Liberdade, e não como a Festa dos inúmeros milagres
descritos na Torá. Chanucá e Purim são celebradas como as Festas dos Milagres
porque os acontecimentos de ambas ocasiões podem ser facilmente interpretados
como eventos naturais. Afinal, não há nada de excepcional na história de um rei
bêbado se livrar de sua rainha e casar-se com uma mulher mais jovem que acaba
defendendo a causa de seu povo. O triunfo dos Macabeus, celebrado em Chanucá,
pode ser visto como o sucesso de guerrilhas numa luta. Mas, estes
“acontecimentos naturais” devem ser compreendidos como intervenções Divinas.
Mesmo se D’us preferiu permanecer anônimo em tais situações, não devemos
permitir que assim sejam considerados. Você deve estar se perguntando por que
um psicanalista está escrevendo sobre um assunto que a rigor deveria ser
deixado para os rabinos? Porque enquanto há ansiedades patológicas que requerem
tratamento médico ou psicológico, também há muitos tipos de estresse que são
decorrentes da realidade que nos cerca. Estes são acompanhados por ansiedade e
tensão que na realidade são respostas normais para eventos ou acontecimentos
que nos incomodam, nos pressionam e nos estressam. São condições normais que
não exigem “tratamento”. Este tipo de ansiedade pode ser atenuado pelo apoio de
amigos com os quais podemos contar, e pela segurança que podemos ter através da
fé e da confiança em D’us (emuná e bitachon). Devemos sempre lembrar que D’us
está “tomando conta” e que Ele é Infinitamente Bom. Um paciente cuja insônia
era resultante de uma situação que o deixava muito estressado me disse: “Eu
finalmente consegui dormir quando percebi que D’us está sempre acordado, e que
não há necessidade que ambos façamos o mesmo”. Tranquilizantes são remédios e
estes só servem em caso de doenças. Porém, quando as realidades de nosso
cotidiano nos deixam insatisfeitos e podem nos causar ansiedade e tensão, não
devemos recorrer imediatamente a medicamentos. Talvez, confiar em D’us e se
apoiar em um amigo que nos ouça e que compartilhe conosco nossa angústia, não
sejam “tratamentos”, mas acreditem, podem ser atitudes de extrema eficácia. www.morasha.com.br.
Abraço. Davi
quarta-feira, 31 de outubro de 2018
terça-feira, 30 de outubro de 2018
A COMPREENSÃO DO SOFRIMENTO
Teosofia.
Revista Teosófica. Texto de Jiddu Krishnamurti (1895-1986). Palestra proferida
em Saanen – Suíça, 18 de julho de 1963. A COMPREENSÃO DO SOFRIMENTO. Se não há
compreensão do sofrimento, não há sabedoria; o fim do sofrimento é o começo da
sabedoria. Para se compreender o sofrimento e dele se ficar livre
completamente, requer-se compreensão, não só do sofrimento individual,
particular, mas também do imenso sofrer humano.
Para mim, se não estamos totalmente livres do sofrimento, não pode haver
sabedoria e tampouco terá a mente possibilidade de investigar deveras essa
imensidade que se pode chamar Deus, ou outro nome qualquer. A maioria de nós
está sujeita ao sofrimento em diferentes formas: nas relações, quando ocorre a
morte de alguém, quando não podemos preencher-nos e decaímos até nos reduzirmos
a nada, ou quando tentamos realizar algo, tornar-nos importantes e tudo redunda
em completo malogro. E temos também o “processo” do sofrimento no plano físico:
doença, cegueira, invalidez, paralisia, etc. Por toda a parte se encontra essa
coisa extraordinária chamada “sofrimento” – com a morte à espreita em cada
volta do caminho. E não sabemos enfrentar o sofrimento e, assim, ou o
divinizamos ou o racionalizamos, ou, ainda, tratamos de evita-lo. Ide a
qualquer IGREJA CRISTÃ e vereis que lá se diviniza o sofrimento, tornam-no algo
de grandioso, de sagrado, e fala-se que só pelo sofrimento, só pela mão de
CRISTO, o Crucificado, se pode encontrar Deus. No Oriente, há métodos próprios
de fuga, outras maneiras de evitar o sofrimento; e é, para mim, um fato
singular serem tão raros – tanto no Oriente como no Ocidente – os que estão
verdadeiramente livres do sofrimento. Seria maravilhoso se, no processo de
nosso escutar – sem emocionalismo nem sentimentalismo – o que nesta manhã se
está dizendo, pudéssemos, antes de sairmos daqui, compreender realmente o
sofrimento e dele ficar completamente livres; porque, então, já não haveria
automistificação, nem ilusões, nem ansiedades, nem medo, e o cérebro poderia
funcionar clara, penetrante, logicamente. E, então chegássemos a conhecer o
amor. Ora, para se compreender o sofrimento é necessário investigar todo o
“processo” do tempo. Tempo é sofrimento, não só sofrimento do passado, mas
também sofrimento que inclui o futuro – a ideia de chegar, a esperança de algum
dia nos tornarmos algo, com sua inevitável sombra de frustração. Para mim, essa
ideia de consecução, de “vir a ser” algo no futuro (e isso é tempo psicológico)
representa o sofrer máximo – e não o fato de perder um filho, de ser abandonado
pela mulher ou marido, ou de se não alcançar êxito na vida. Tudo isso me parece
bastante trivial, se me é permitido pregar esta palavra, que espero não seja
mal compreendida. Há um sofrimento muito mais profundo, que é o tempo
psicológico: o pensar que mudarei em anos futuros, que, se houver tempo, me
transformarei, quebrarei as cadeias do hábito, alcançarei a liberdade, a
sabedoria, Deus. Tudo isso exige tempo – e este, para mim, é o sofrimento
máximo. Mas, para podermos aprofundar o problema, temos de descobrir porque há
sofrimento em nós – essa onda de sofrimento que nos envolve e aprisiona.
Compreendendo, primeiramente, o sofrimento existente em nós, talvez possamos
também compreender o sofrimento humano coletivo, o desespero da humanidade. Por
que sofremos? E tem fim sofrimento? Há tantas maneiras de sofrermos! A doença é
uma forma de sofrimento – a incapacidade de pensar, por debilidade do cérebro,
e tantas outras variedades da dor física. Temos, depois, todo o campo do
sofrimento psicológico – o sentimento de frustração, por não se poder realizar
nada, ou a falta de capacidade, de compreensão, de inteligência, e também está
constante batalha dos desejos antagônicos, da autocontradição, com suas ânsias
e desesperos. E há, ainda, a ideia de nos transformarmos através do tempo, de
tornar-nos melhores, mais nobres, mais sábios – ideia que também encerra
infinito sofrimento. E, por último, o sofrimento ocasionado pela morte, o
sofrimento da separação, do isolamento, o sofrimento de nos vermos
completamente sós, isolados e sem relação com coisa alguma. Todos conhecemos
essas variadas formas de sofrimento. Os eruditos, os intelectuais, os
virtuosos, os religiosos de todo o mundo veem-se tão torturados como nós pelo
sofrimento, e se dele existe alguma saída, ainda não a encontraram. Investigar
bem profundamente em nós mesmos é saber que esta é a primeira coisa que
desejamos: pôr fim ao sofrimento. Mas não sabemos de que maneira começar.
Estamos muito bem familiarizados com o sofrimento, vemo-lo em outros e em nós
mesmos, e ele se acha no próprio ar que respiramos. Ide a qualquer parte, recolhei-vos
a um mosteiro, caminhai pelas ruas apinhadas – o sofrimento está sempre
presente, declarado ou oculto, expectante, vigilante. Ora, de que maneira
enfrentamos o sofrimento? Que fazemos em relação a ele? E como teremos
possibilidade de nos libertarmos dele, não apenas superficialmente, porém
totalmente, de modo que se torne completamente inexistente? Estar completamente
livre de sofrimento não significa ausência de sentimento, de amor, de
compaixão, falta de bondade, de compreensão de outrem. Pelo contrário, na
completa liberdade, nesse estado livre de sofrimento não há indiferença. É uma
liberdade que traz grande sensibilidade, receptividade; e, como se alcança essa
liberdade? Todos conheceis o sofrimento, não vos tornais estranho. Ele está
sempre presente. E como o enfrentais? Apenas superficialmente, verbalmente?
Tende a bondade de seguir isto. Passo a passo, caminhemos juntos, até o fim.
Tentai nesta manhã, escutar com atenção completa, estar bem cônscios de vossas
reações e penetrar profundamente, junto comigo, este problema do sofrimento.
Mas isto não significa seguir-me – coisa extremamente absurda. Mas se, juntos,
pudermos compreender esta coisa, investiga-la ampla e profundamente, então,
talvez, ao sairdes daqui, possais olhar para o céu e nunca mais serdes
atingidos pelo sofrimento. Então, não mais haverá medo: e, uma vez livres de
todo temor, aquela imensidade poderá tornar-se vossa companheira. Assim, como
enfrentais o sofrimento? Parece-me que, em geral, o enfrentamos muito
superficialmente. Nossa educação, nossa instrução, nosso conhecimento, as
influências sociológicas a que estamos expostos – tudo isso nos torna muito
superficiais. A mente superficial é aquela que se refugia na igreja, em alguma
conclusão, conceito, crença ou ideia. Tudo isso são refúgios para a mente em
sofrimento. E, quando nenhum refúgio encontrais, construís em torno de vós uma
muralha e vos tornais acrimoniosos (sabor ácido, azedo; cor acre), duros,
indiferentes, ou buscais a fuga em alguma reação neurótica, fácil. Todas essas
fugas ao sofrimento impedem a investigação mais aprofundada. Espero me estejais
acompanhando, porque é justamente isto o que faz a maioria de nós. Pois bem;
observai um cérebro superficial – ou mente; notai, por favor que, quando digo
“mente” ou “cérebro”, refiro-me à mesma coisa. Outro dia estivemos considerando
a distinção entre “mente” e “celebro”, mas tal distinção é só verbal, sem
importância. Empregarei a palavra “mente” e espero que sigais e compreendais o
que se irá dizer. A mente superficial não pode resolver este problema do
sofrimento, porque sempre procura evitar o sofrimento. Foge ao fato – o
sofrimento – por meio de uma reação fácil e imediata. Se tendes uma forte dor
de dentes, naturalmente logo tratais de procurar o dentista, porque desejais
livrar-vos dessa dor física. E isso é uma reação normal e correta. Mas, a dor
psicológica é muito mais profunda e sutil, e não há médico, não há psicólogo,
não há nada que vos possa extingui-la. No entanto, vossa reação instintiva é
fugir dela. Tratais de ligar o rádio, de ver televisão, de ir ao cinema –
sabeis quantas distrações a civilização moderna inventou. Qualquer espécie de
entretenimento, seja uma cerimônia religiosa, seja uma partida de futebol, é
essencialmente a mesma coisa, mera fuga à vossa aflição, ao vosso vazio
interior; e é isto o que estamos fazendo em toda a parte: buscando em
diferentes formas de entretenimento o auto esquecimento. E, também, é a mente
superficial que procura explicações. Diz: “Desejo saber por que sofro. Por que
devo eu sofrer, e vós não?” Está cônscia de não ter praticado, na vida, nenhuma
iniquidade e, assim, aceita a teoria de vidas passadas e a ideia disso que na
Índia se chama Karma – causa e efeito. Diz ela: “Pratiquei antes alguma ação
injusta, e agora estou passando por ela”, ou “Estou agora fazendo algo de bom,
e colherei no futuro os correspondentes benefícios”. É assim que a mente
superficial se deixa enredar nas explicações. Observai, por favor, vossa
própria mente, observai como vos livrais de vossos sofrimentos com explicações,
como vos absorveis no trabalho, em ideias, ou vos apegais à crença em Deus ou
numa vida futura. E, se nenhuma explicação ou crença tiver sido satisfatória,
recorreis à bebida, ao sexo ou vos tornais mordaz, duro acrimonioso, melindroso.
Consciente ou inconscientemente, é isso o que de fato ocorre com cada um de
nós. Mas a ferida do sofrimento é muito profunda. Ela vem sendo transmitida de
geração em geração, de pais a filhos, e a mente superficial nunca retira a
atadura que cobre essa ferida: ela não sabe, em verdade, o que é o sofrimento,
não o conhece intimamente. Tem apenas uma ideia a seu respeito. Tem uma imagem,
um símbolo do sofrimento, mas nunca se encontra com ele próprio, só se encontra
com a palavra “sofrimento”. Compreendeis? Ela conhece a palavra “sofrimento”,
mas não estou certo se conhece o sofrimento. Conhecer a palavra “fome” e sentir
realmente fome são duas coisas muito diferentes, não? Quando sentis fome, não
vos satisfazeis com palavras “comida”. Quereis comida – o fato. Ora, quase
todos nos satisfazemos com palavras, símbolos, ideias, e com as nossas reações
a essas palavras, de modo que nunca estamos em intimidade com o fato. Quando
subitamente nos vemos frente a frente com o fato do sofrimento, isso nos causa
um choque, e nossa reação é a fuga a esse fato. Não sei se já notastes isso em
vós mesmos. Tende a bondade de observar o estado de vossa própria mente, e não
fiqueis meramente escutando as palavras que estão sendo proferidas. Nunca nos
encontramos com o fato, nunca “vivemos com ele”. Vivemos com uma imagem, com a
memória do que foi, e não com o fato. Vivemos com uma reação. Ora, se ao
enfrentar o sofrimento a mente tem um motivo, isto é, se deseja fazer algo a
respeito do sofrimento, não é possível compreendê-lo, assim como também não é
possível haver amor, se há motivo para amar. Entendeis? Em geral, temos um
motivo quando encaramos o sofrimento; desejamos fazer alguma coisa em relação a
ele. Isto é, suponhamos que eu tenha perdida alguém, por morte: profundamente,
psicologicamente, já não posso obter o que dessa pessoa desejava, e vejo-me a
sofrer. Se nenhum motivo tenho, ao olhar o sofrimento, ele é ainda sofrimento,
ou coisa totalmente diferente? Estais seguindo? Digamos que meu filho morre, e
eu estou a sofrer porque me vejo só. Nele eu depositara todas as minhas
esperanças e, agora, todo o meu mundo desabou. Desejara estabelecer para mim
próprio uma certa espécie de imortalidade, uma continuidade, através de meu
filho: ele deveria herdar meu nome, meus haveres, continuar com o meu negócio,
e o acabar de tudo isso causou-me choque. Ora, posso compreender o sofrimento
em que me acho, se algum motivo existe, que me impele a olhá-lo? E, se existe,
atrás de amor, algum motivo, isso é amor? Por favor, não concordeis comigo:
observai-vos, apenas. Por certo, não deve haver motivo algum, se desejo
compreender o sofrimento, se desejo descobrir a profundeza plena e a
significação do sofrimento – ou do amor, pois os dois andam sempre juntos. A morte, o amor e o sofrimento são
inseparáveis, estão sempre juntos, e também os acompanha a criação: mas esta é
outra questão, que examinaremos noutra oportunidade. Se desejo compreender
profundamente, completamente, o fato do sofrimento, não posso ter um motivo a
ditar minha reação ao fato. Só posso viver com o fato e compreendê-lo, quando
nenhum motivo tenho. Entendeis? Se não, podeis fazer-me perguntas, depois, a
respeito deste ponto. Se vos amo porque podeis dar-me alguma coisa – vosso
corpo, vosso dinheiro, vossa lisonja, vossa companhia, ou o que quer que seja –
isso por certo, não é amor, e é claro que também vós obtendes algo de mim, e
essa permuta, para a maioria de nós se chama amor. Sei que encobrimos isso com
palavras bonitas, mas atrás dessa fachada, está a ânsia de ter, possuir, ser
dono. Agora, sofrimento não é autocompaixão? De certa maneira, fostes despojado
de alguma coisa, vossas relações com outro redundaram em fracasso, não vos
preenchestes do sentido de serdes reconhecido como pessoa importante, em
atividades de reforma social, em atividades artísticas e tantas outras coisas
mais – e todas as correspondestes frivolidades; assim, há sofrimento.
Compreender o sofrimento é viver com ele, olhá-lo, conhece-lo como realmente é;
mas não tendes possibilidade de conhece-lo quando o olhais com um motivo – que
supõe o tempo. A mente superficial, incessantemente ocupada em melhorar-se, em
lastimar-se, em torturar-se numa dada relação; desejosa de libertar-se do
sofrimento sem enfrentar o fato – essa mente prosseguirá sofrendo
indefinidamente. O fato é que estais sozinho. Em virtude de e vossa educação,
de vossas atividades, pensamentos e sentimentos, vos isolastes profundamente em
vosso interior e não sois capaz de viver com esse extraordinário sentimento de
solidão, não sabeis o que ele significa, porque dele sempre vos abeirais com
uma palavra que desperta o medo. Estais vendo, pois, a dificuldade – as
maneiras sutis com que a mente preparou suas vias de fuga, tornando-se incapaz
de viver com essa coisa extraordinária que chamamos “sofrimento”. Para se ser
livre do sofrimento, é necessário compreender, consciente e inconscientemente,
todo o seu “processo”, e isso só é possível vivendo-se com o fato, olhando o
sem motivo. Deveis perceber as manhas de vossa mente, suas fugas, as coisas
aprazíveis a que estais apegado e as coisas desagradáveis de que desejais
livrar-vos com rapidez. Cumpre observar o vazio, o embotamento e a estupidez da
mente que só trata de fugir. E pouca diferença faz, se se foge para Deus, para
o sexo, ou para a bebida, porquanto todas as fugas são essencialmente a mesma
coisa. Compreendeis? Que sucede quando perdeis alguém, arrebatado pela morte? A
reação imediata à uma sensação de paralisia, e ao sairdes desse estado vos
encontrais com o sofrimento. Ora, que significa esta palavra – “sofrimento”? A
camaradagem, os colóquios ditosos, os passeios e tantas outras coisas
agradáveis que fizestes e planejastes fazer em companhia um do outro – tudo
isso vos foi arrebatado num segundo, e ficastes vazio, desamparado, sozinho. É
contra isso que estais protestando, é contra isto que vossa mente se revolta:
ter ficado a sós consigo, isolada, vazia, sem amparo. Ora, o que
verdadeiramente importa é viver com esse vazio, com ele viver sem reação
alguma, sem racionalizá-lo, sem dele fugir com recorrer a médiuns espíritas, à
doutrina da reencarnação, e outras futilidades, viver com ele, com todo
sofrimento – um findar real, e não simplesmente verbal, não o findar
superficial, resultante de fuga, de identificação com um conceito ou
devotamento a uma ideia. Vereis que nada há para proteger, porquanto a mente
está toda vazia e já não reage no sentido de preencher o seu vazio; e quando
assim o sofrimento termina completamente, tereis encetado uma outra jornada –
jornada sem fim e sem começo. Existe uma imensidade que ultrapassa todas as
medidas, mas nesse mundo não ingressareis sem a prévia e total extinção do
sofrimento. Revista Teosófica. Abraço. Davi
segunda-feira, 29 de outubro de 2018
II. A PRÁTICA DA MEDITAÇÃO E A SABEDORIA NO COTIDIANO
Budismo. www.budavirtual.com.br.
Texto de Jetsunma Tenzin Palmo (1943- ).
II. A PRÁTICA DA MEDITAÇÃO E SABEDORIA NO COTIDIANO. Prajna Paramita, Ou
SABEDORIA. Demos uma olhada em shamatha, essa ideia de deixar a mente mais
quieta e calma, mais concentrada. Também consideramos o fato de que shamatha
ajuda a mente a enxergar o fundo do lago. Mas ela não remove o lodo, não remove
todo o lixo e todas as ervas daninhas que estão no fundo. Quando eu estava em
Lahaul, fora da minha caverna, havia uma área plana que parecia um pátio. Era
de terra endurecida e na superfície havia moitas de florzinhas bonitas.
Quando chovia, tudo ficava barrento, e decidi assentar algumas pedras grandes e
planas. Isso significava que eu teria que arrancar as florzinhas. Decidi que a
única maneira de me livrar daquelas flores delicadas era não apenas cortá-las,
mas arrancar todas as raízes para que não crescessem novamente. Imaginei que
puxaria e elas sairiam. Porém, quando comecei a rastrear às raízes das
florizinhas, descobri que literalmente estendiam-se por todo o pátio. Estavam
espalhadas e interconectadas em uma enorme rede subterrânea, embora apenas
algumas pequenas moitas fossem visíveis na superfície. As ervas daninhas da
nossa mente são assim. Além de tudo, parecem atraentes. ”Ah, eu amo chocolate”
ou ”Eu adoro roupas novas”. Tão inocente. Mas essas raízes de nosso desejo são
profundas e grossas, espalham-se e estão na base de tudo. Esse é o problema.
Essas raízes de negatividades, nossas ilusões, nossa má vontade e nossa
ganância são tão profundamente arraigadas em nossa mente que permeiam tudo, e muitas
vezes nem sequer as reconhecemos pelo que realmente são. Podemos questionar
para que arrancá-las fora. Puxamos, um pouco aqui, cortamos e aparamos um pouco
ali, mas não enfrentamos esse sistema de raízes penetrantes. A mim parece que a meditação vipassana lida com a mente em duas
frentes que, ao fina, se unem na realização da natureza vazia da mente.
Primeiro, lidamos com o fato de que nossa mente é permeada por impulsos
negativos muito profundos, que criam muita dor e muitos problemas em nossa vida,
para nós mesmos e para os outros. Além disso, há toda a questão de quem afinal
experimenta essa doer e esses problemas. Trataremos disso resumidamente, pois é
um assunto vasto. Por meio da pratica de shamatha, nossa mente
se acalma. E, à medida que a mente se aquieta, o fluxo de pensamentos passa por
3 estágios. Primeiro é como uma cachoeira, uma queda d’água estrondosa. Depois,
torna-se como um rio turbulento, tornando-se gradualmente mais plácido conforme
vai correndo. Eventualmente o rio deságua no oceano. Talvez em nossa prática de
meditação da permanência serena, nossa mente tenha chegado ao ponto em que não
é mais uma cachoeira, é como um rio correndo calmamente. Neste ponto não
precisamos entrar no oceano de samadhi, ou absorção profunda. Isso não é
tão importante. Precisamos apenas deixar a mente mais quieta, precisamos apenas
adquirir a capacidade de nos concentrarmos em um único ponto, ter concentração
uni direcionada. Essas duas condições são necessárias, mas não precisamos ficar
em um estado sem quaisquer pensamentos. Anteriormente, como estávamos
desenvolvendo a concentração uni focada, ignorávamos os pensamentos. Não
dávamos qualquer atenção a eles. Dávamos atenção ao ponto focal de nossa
concentração, que era a respiração. Agora, no entanto, aplicamos a concentração
aos próprios pensamentos. Pode-se dizer que isso é como alguém sentado na beira
de um rio apenas observando- o fluir. Não tentamos represar o rio, ou alterar
seu fluxo de forma alguma, estamos apenas sentados as margens de nosso rio
mental, observando os pensamentos fluírem. Não tentamos interferir. Não fazemos
nada a respeito. O importante é não ficarmos fascinados ou sermos capturados
pelos pensamentos – ”Óh! que ideia interessante”. Hmm sim certo”. – e no minuto
seguinte nossa mente é carregada rio abaixo. Precisamos apenas observar os
pensamentos fluindo. No entanto, se observamos a mente muito tensos, mantendo
todos pensamentos, acabamos nos desequilibrando. O mestre zen Suzuki Roshi
(1904-1971) disse que a maneira de controlar uma vaca é dar-lhe um amplo pasto.
Quando tentamos desenvolver as qualidades da consciência, da atenção plena e da
observação da mente, é muito importante dar a mente um bom pasto bem amplo e
não a mantendo muito apertada. Essa tensão extrema não é o que desejamos. Em
vez disso, queremos a sensação de permitir que nossos pensamentos venham e
flutuam, e, enquanto isso, tomamos conhecimento, observamos, vemos os
pensamentos, e se perderemos alguns não faz mal. Assim,
esta é a etapa que vem depois de termos praticado com a respiração, ou algum
objeto a nossa frente. Quando os pensamentos se acalmaram um pouco e não estão
caóticos, e quando o foco, a concentração e a consciência se tornaram um pouco
mais fortes e bem definidos, aí sim levamos a atenção da respiração para a
própria mente. Segundo a psicologia budista, não podemos ter dois pensamentos
ao mesmo tempo. Dois estados mentais não podem surgir em nossa consistência ao
mesmo tempo. Os estados mentais são incrivelmente rápidos, e no entanto,
sequenciais. Portanto, a medida que temos mais momentos de consciência, temos
menos momentos de pensamento discursivo. Os pensamentos começam a desacelerar,
começa a haver menos pensamentos, [..] quando chegamos a esse ponto, começamos
a desenvolver o que é chamado de insight. Começamos a usar essa inteligência
para observar a própria mente. Como eu disse antes, vivemos a partir da
mente, experienciamos qualquer coisa apenas por meio da mente. No entanto, não
a conhecemos. Nunca olhamos para ela. Dizemos ”Eu acho”, ”eu me lembro”, ”na
minha opinião”, ”meu julgamento é”. Estamos cheios de julgamentos, intenções,
ideias, pensamentos, fantasias, sonhos e memórias, mas o que é um pensamento?
Qual a sua aparência? De onde vem? Onde permanece? Para onde vai? Qual é a
sensação? Se parece com o que? ”Estou com raiva”, ”Estou feliz”, ”estou triste”
– que aparência tem uma emoção? De onde vem? É dessa forma que usamos a mente
para olhar para ela mesma. Tentamos ver o que é um pensamento – qual a sua
aparência. O que é? Podemos pensar a respeito de um pensamento, mas podemos
realmente experienciá-lo? Podemos continuar a investigar
a mente. ”Tudo bem, há momentos em que há pensamentos. E depois há momentos em
que não há pensamentos”. É igual ou diferente? E que tal a consciência que observa
os pensamentos – a consciência é igual aos pensamentos ou é diferente? E a
consciência se parece com o que? Podemos ver o observador? Podemos observa-lo?
E então, é claro, podemos nos fazer a pergunta das perguntas:
”’Quem é o observador?”. Não vou dar a resposta a vocês! Nós dizemos: ”Eu
acho”, ”eu me lembro”, ”eu gosto”, ”eu não gosto”, ”sou boa pessoa” ”sou má
pessoa, mas quem é esse ”eu”? Nunca nos questionamos, nunca olhamos. Isso é
essencial, porque estamos agarrados às nossas identificações, o que nos causa
confusão e angústia. Nós nos identificamos
primeiramente com o corpo que temos neste momento: ”Eu sou uma mulher”, ”eu sou
um homem”, ”eu sou branca, ”eu sou negra”, ”eu sou europeia” ”eu sou americana,
”eu sou bonita”, ”eu sou feia”, ”eu sou gorda, ”eu sou magra”, esta sou eu”.
Mas é claro que não somos os nossos corpos. […]. Nos identificamos com nossos
pensamentos, com nossas opiniões e com nossos julgamentos, e nos identificamos
com nossas memórias, especialmente as tristes, especialmente as difíceis. Nos
agarramos, e nossa identidade orbita em torno do sofrimento. Somos seres tão
perversos, mas, quando olhamos para nossa mente, vemos que as memórias são
apenas pensamentos – e isso é tudo. Os eventos que estamos recordando
terminaram, aconteceram anos atrás. Não estão aqui, não existem. Tudo o
que nos restou são os pensamentos, mas, quando olhamos para os pensamentos
vemos que eles, em si mesmos, são bastantes transparentes. Um pensamento não é
uma coisa. Então por que nos identificamos tanto com eles? Nossas percepções criam a realidade que percebemos. Mas é claro
que isso não quer dizer que a totalidade de fenômenos externos é puramente
ilusão. Os tibetanos dizem que é como uma ilusão porque projetamos e não
estamos conscientes de que é uma projeção nossa. Uma vez que nossas percepções
são impuras e distorcidas pelo ego, não vemos as coisas como são, percebemos
apenas a nossa própria versão, baseada na delusão (engano). Estamos olhando para a mente. Estamos olhando para o fluxo de
pensamentos. Enquanto observamos os pensamentos e a consciência está em firme,
os pensamentos começam a desacelerar. É como um filme: se começa a ser passado
mais devagar e mais lentamente, reconhecemos quadro por quadro em vez do filme
projetado. Da mesma forma, se nossa consciência é clara e firme, os pensamentos
começam a desacelerar e podem ser reconhecido como unidades interligadas. E,
quando nossa consciência estiver muito clara, pode acontecer o fluxo de
pensamentos ser interrompido por uns instantes, havendo um intervalo entre o
último pensamento e o seguinte. Quando existe esse intervalo, o observador se
funde diretamente com aquilo que está subjacente ao pensamento, a natureza de
clara luz da mente. Neste momento, surge a intuição direta e a realização da natureza
da mente- não dual, não conceitual, não condicionada, além dos pensamentos.
Não somos capazes de pensar sobre isso, mas podemos experienciar. Neste tipo de meditação, a ideia é conseguir o maior número
possível de lampejos de visão não dual como esses e prolonga-los. A medida que
a mente repousa naturalmente nessa consciência não nascida com mais frequência
e por períodos mais longos, ao final o praticante irá permanecer nesse estado
desperto o tempo todo. É um nível de consciência que não tem fronteiras. Não
existe o eu e o outro. O céu não tem centro e o céu não tem circunferência, é
ilimitado. O céu permeia tudo, não apenas o espaço acima de nós, mas todos os
lugares. É o espaço. Sem o espaço, não poderíamos ser nada porque o espaço é
tudo. Quando falamos sobre o nosso verdadeiro eu, temos a ideia de alguém
sentado dentro de nós – maior, o melhor e mais maravilhoso eu. Mas não é disso
que estamos falando, de maneira alguma. Quando realizamos a verdadeira natureza
do nosso ser, onde está o ”eu”, onde está o ”outro”? Quanto ao espaço,
não posso dizer que este é o meu espaço e aquele é o seu. É apenas espaço. E a
verdadeira natureza da mente é assim. E essa natureza pode ser
experienciada e realizada. É a mente de um buda. E esta qualidade vasta e ampla
da mente está preenchida com todas as qualidades de sabedoria, compaixão e
pureza. É a clara consciência por trás do funcionamento dos nossos sentidos que
nos permite conhecer as coisas, que ilumina nosso pensamento e nossas emoções.
Por trás do movimento da mente conceitual está o vasto conhecer silencioso. É
tão simples. Mas não acreditamos. E de fato é triste que isso escape-nos.
Ignoramos a simplicidade que está a nossa frente. Isso pode parecer muito frio,
mas, as vezes, quando olhava nos olhos das outras pessoas ao meu redor, podia
ver que estavam extremamente envolvidas com o que ouviam, viam e pensavam, e
que não havia qualquer espaço interno. Por conta disso, suas mentes eram muito
turbulentas, assim como minha própria mente também costumava ser. Uma compaixão
imensa brotou dentro de mim porque entendi nossa situação difícil de forma
muito clara. A compaixão genuína surge do insight.
Normalmente, quando olhamos e quando experimentamos alguma coisa, acreditamos
para valer no que estamos vendo e experimentando. Ficamos envolvidos. É como se
não houvesse espaço interno. Porém, quando desenvolvemos a consciência pura,
não ficamos mais submersos em nossos pensamentos. A consciência está sempre por
trás do pensamento, e dos sentimentos. E assim nós praticamos.
Praticamos a habilidade de dar um passo atrás para ver os pensamentos memórias,
sentimentos e emoções apenas como pensamentos, memórias e sentimentos,
meramente como estados mentais, e não como algo sólido ou real. ”Eu” e
”meu” são apenas estados mentais. Eles vêm, permanecem por um tempo e vão. Isso
é tudo o que realmente está acontecendo, mas por não termos espaço em nossa
mente, não conseguimos ver. A meditação nos permite ter espaço para ver que
pensamentos e sentimentos não são algo sólido, opaco. São vazios em sua
natureza, como uma bolha. Não podemos agarrá-los. Se olhamos para o pensamento
em si, ele evapora. Em última análise, esta é a maneira mais hábil para
lidarmos com as emoções, porque, quando qualquer emoção vem à tona, podemos
olhá-la diretamente e, no momento em que a vemos, ela simplesmente desaparece.
Tomemos uma emoção negativa como a raiva, por exemplo. No exato instante em que
o pensamento de raiva se transforma espontaneamente em uma forma sutil de
energia clara e aguda. Os venenos da mente, em suas raízes, são uma fonte de
grande energia de sabedoria. O problema é que permitimos que se desenvolvam sem
reconhecê-los, e surgem em formas muito distorcidas, como ganância, raiva e
ciúme. Contudo, se conseguimos pegá-los no exato momento em que emergem na
consciência, têm vibração e clareza. É uma forma extremamente clara de energia.
Nos ensinamentos mais elevados se diz que quanto maiores as nossas
impurezas emocionais, maior a nossa sabedoria. Entretanto, até que possamos
pegar o pensamento em sua forma incipiente, no momento em que nasce – a menos
que possamos fazer isso e transformá-lo naquele instante -, será melhor tentar
lidar com as emoções negativas de outras maneiras. Porém, uma vez que possamos
fazer isso, uma vez que tenhamos essa consciência poderosa que você as coisas
de forma clara a cada momento, não há nada a temer, porque cada
pensamento que aparece é transformado em energia de sabedoria. Nos textos tibetanos é dito: ”Olhe, onde está a mente? Está no
estomago? Está no pé? No coração?”. Nesses textos, nunca se pergunta: ”Está na
cabeça?” Não é interessante? Talvez nunca tenha ocorrido a eles que fosse
possível a mente estar na cabeça. Certa vez, lembro que meu lama, Khamtrul
Rinpoche, disse que era muito curioso que os ocidentais pensarem que a mente
está na cabeça. Disso que o cérebro está na cabeça, mas o cérebro não é a
mente. ”Já sabemos muito sobre o cérebro, mas ainda não encontramos a mente”,
disse um famoso neurocirurgião. Quando os ocidentais, que dão muito valor a cabeça,
meditam, acontece frequentemente de a meditação ficar localizada na cabeça. Às
vezes, as pessoas, tem dores de cabeça por causa disso. Se alguém me dissesse: ”Eu sei que esta manhã você roubou minha
carteira. Você é uma ladra!”. Eu diria: ”Quem? Eu?”, e apontaria para meu
peito. Eu não diria ”Quem? Eu?”. Apontando para cabeça. A perfeição da
sabedoria tem a ver com a qualidade de vacuidade. Os budistas falam muito
sobre a vacuidade. Porém, quando os budistas dizem que tudo é vazio, estão falando
basicamente de 2 coisas: uma é que nada existe por si mesmo, nada existe em si
e por si só. Tudo pode surgir apenas em relação com todo o resto. É bastante
óbvio. Não podemos pensar sobre a escuridão a menos que pensemos sobre a luz.
Não podemos ter a esquerda a menos que tenhamos a direita. Só podemos pensar em
termos relativos. A filosofia ocidental também lida com isso. Existem
estudiosos na tradição budista que analisam tudo em termos de seus componentes.
Esse relógio, por exemplo. Se eu disser: ”O que é isso?” Vocês vão responder ”É
um relógio”. Então podemos questionar: ”Qual parte é o relógio?” A da frente? A
de trás? A pulseira? O mecanismo interno?”‘ . Continuamos investigando para
tentar encontrar a ”relogiedade”, o que faz o relógio um relógio, mas nunca
poderemos encontrar o relógio em si. É apenas um rótulo que damos a uma
combinação de muitas coisas. A coisa em si não existe. É vazia de
existência intrínseca. Nunca conseguimos encontrar a coisa em si e por si. Tudo
o que vemos e experienciamos é um rótulo convencional. As pessoas passam 30
anos estudando esta abordagem. Vocês têm sorte – conseguiram em apenas algumas
frases! O outro significado de vacuidade é o que abordamos anteriormente,
essa qualidade de espaço de todas as coisas que permite que sejam preenchidas,
mas aquilo que preenche é intrinsecamente vazio. E isso se aplica também a e
mente. Os filósofos e estudiosos passam muitos anos analisando a realidade
externa. Os iogues analisam a realidade interna. Durante
minha primeira lição de meditação com o meu velho professor iogue, ele apontou
para uma mesinha e perguntou ”Aquela mesa é vazia?”. ”Sim”, eu disse. Tinha feito meus estudos budistas. ”Você vê que ela é vazia?”. ”Não”, respondi. ”Sua mente é vazia?”. Disse ele. ”Sim”, disse, com um pouco mais
de confiança. ”Você vê que ela é vazia?”. ”Não”. […] uma vez entendida a vacuidade da mente, entendemos
tudo. Quando realizamos a natureza da mente, não apenas pensamos a respeito,
mas vemos diretamente como ela funciona e como projeta a realidade externa.
Considere que qualquer físico diria que esta mesa é basicamente
vazia. É espaço com uns prótons e nêutrons esvoaçando. Mas não vemos assim.
Nossa experiência não é essa. Experienciamos a mesa como algo muito sólido. Ela
pesa quando tento erguê-la. Embora essa seja a minha experiencia, não é assim
que um físico vê a matéria, não é? Portanto, o que estou experimentando é o que
a minha mente projeta. Agora, se eu tivesse sentidos muito diferentes e um tipo
diferente de mente, é provável que experienciasse a mesa de uma forma
completamente distinta. Se fosse um daqueles insetos que fazem furos na
maneira, minha percepção da mesa seria diferente, mas também seria real. Para o
cupim, seria real. Nós acreditamos em nossos
sentidos, temos uma espécie de consenso e conspiração para ver as coisas
conforme nossas percepções sensoriais nos apresentam. Está ótimo, porque é
assim que funcionamos, e não há nada de errado com isso em um nível relativo. É
assim que estamos equipados para lidar com a vida em um plano convencional. Mas
o problema surge quando pensamos que isso é verdadeiro. O problema surge porque
acreditamos que nossos pensamentos condicionados estão nos dizendo a verdade.
Acreditamos implicitamente em nossas identidades muito
transitórias. O problema não é o ego – o problema é nossa identificação com o
ego. A solução é saber que estamos apenas desempenhando um papel, como um ator.
Para ser convincente, o ator precisa desempenhar o papel de forma mais
persuasiva possível. O ator se identifica com o papel. Mas que problemão se o
ator sai do palco e pensa que ainda é o personagem! O termo ”personalidade” vem
da palavra latina persona, que era a máscara que os atores usavam no palco para
representar os diferentes personagens. O problema é que nunca tiramos as nossas
máscaras, mesmo na privacidade do nosso quarto. Pensamos: ”Este é quem
realmente sou”. […] Por trás de tudo com o que nos identificamos está a
consciência vasta e aberta que não é apenas o conhecimento, mas é em si a
plenitude da sabedoria e compaixão. Sabedoria significa vermos as coisas como
realmente são. Compreendemos as coisas com clareza, sem distorções. Quando
falamos sobre sabedoria e vacuidade, não nos referimos a algo frio e distante.
Esta consciência ampla e aberta contém tudo. A mente de Buda é vazia, por
isso, pode estar repleta de todas as qualidades. Estamos plenos de todas as
qualidades do Buda. Neste momento, elas estão apenas encobertas pelo
esquecimento. A única maneira de descobri-las é olhar para dentro e começar a
remover os falsos véus que cobrem o que sempre esteve presente, esperando ser
encontrado. “Vocês têm a oportunidade de treinar a
mente. Não estão pensando o tempo todo em como poderão conseguir a próxima
refeição para os seus filhos. Têm tempo livre e oportunidade para pensar além.
Vocês nunca terão um momento melhor do que este de agora para usar esta vida de
maneira significativa”. “A compaixão é extraordinariamente importante no
caminho espiritual. É o outro lado da moeda — temos a sabedoria e a compaixão.
Quanto maior a compreensão da dor inerente aos seres — quanto mais clara se
torna a mente, como se limpando a poeira dos olhos —, mais se vê a dor
subjacente à vida das pessoas e mais compaixão surge. Mesmo que as pessoas não
aparentem explicitamente estar sofrendo, vemos que por trás da fachada há muita
dor e muitos problemas.
Naturalmente, então, surge a compaixão
e uma nutre a outra. Compaixão sem sabedoria é estéril, é cega. É como ter
pernas, mas não ter olhos. Sabedoria sem compaixão é como ser mutilado, não se
consegue ir a lugar algum. Então, precisamos das duas e elas se apoiam
mutuamente, porque não apenas o intelecto tem que estar aberto, mas também o
coração. Elas são indivisíveis. Sabedoria e compaixão são como duas asas. Não
conseguimos voar com uma só”. — Tenzin Palmo, em “No Coração da Vida”. Estes textos acima fazem parte
do livro ‘No coração da vida: Sabedoria e compaixão para o
cotidiano”. O primeiro livro de Jetsunma Tenzin Palmo em português. Para
adquirir, clique aqui. Trata-se de um verdadeiro presente e
oportunidade ter uma obra destas em português. O conteúdo deste livro
refere-se a praticantes comuns preocupados em traduzir as instruções do Dharma
para uma experiência de vida em andamento. Um aspecto importante do Dharma
trata da transformação de nossa mente e atitudes ordinárias em algo altamente
positivo, que traga benefícios não só para nós mesmos, como para todos que
tenham contato conosco. O problema básico que encaramos é como mudar uma mente
cheia de pensamentos e emoções negativos – ganância, raiva, ansiedade, inveja e
por aí vai – em uma mente mais pacífica e cordial, com a qual seja um prazer
para todo mundo (inclusive nós mesmos) viver. Este livro estabelece de forma
simples alguns indicadores para ajudar praticantes comuns a usar o Dharma para
levar uma vida mais significativa. Nossa mente, com seu fluxo
incessante de pensamentos, memórias, opiniões, esperanças e medos, é nossa
companhia constante, da qual não conseguimos escapar nem mesmo em sonhos. Assim,
faz sentido cultivar para nossa jornada uma companhia de viagem que valha a
pena. www.budavirtual.com.br.
Abraço. Davi
sexta-feira, 26 de outubro de 2018
I. PRÁTICA DA MEDITAÇÃO
Budismo. www.budavirtual.com.br. Texto de Jetsunma
Tenzin Palmo. I. PRÁTICA DA MEDITAÇÃO E SABEDORIA NO COTIDIANO. “Vamos começar
de onde estamos. E vamos começar com o que somos. Não adianta querer ser outra
pessoa, não é bom fantasiar sobre como seria se fôssemos assim ou assado. Temos
que começar do aqui e do agora, na situação em que estamos. Temos que lidar com
nossa família, com os amigos e com todos que encontramos. Esse é o desafio. Às vezes evitamos as circunstâncias atuais e
achamos que seguramente encontraremos a situação perfeita em algum outro lugar.
Mas isso nunca vai acontecer. Nunca haverá um momento e um lugar ideais, porque
levamos conosco a mesma mente a todos os lugares. O problema não está lá fora,
em geral o problema está dentro de nós. E por isso precisamos cultivar a transformação
interior. Uma vez que tenhamos
desenvolvido a mudança interna, podemos lidar com o que quer que aconteça”. Jetsunma Tenzin Palmo (1943- ) no livro NO CORAÇÃO DA VIDA. COMEÇANDO
A MEDITAR, PRIMEIRO PASSO. Quer esteja sentado em uma
almofada ou em uma cadeira, sente-se ereto. O importante é manter as costas
retas e os pés apoiados no chão. Erga os ombros, leve-os para trás e baixe-os
novamente, dessa maneira você fica em uma boa postura. Agora, apenas relaxe.
Caso contrário, irá se cansar. Concentre a sua atenção do vai
e vem da respiração. A respiração é um bom foco para a prática porque existe
uma forte ligação entre a respiração e o nosso estado mental. Fique
ciente de sua respiração conforme ela vem e vai. Com a respiração como
foco, você estará presente. Você não consegue respirar no passado ou no futuro.
Você só pode respirar no agora. Normalmente, não temos consciência dela,
trazemos a nossa mente para o presente. Esse é um meio hábil. Você pode tomar
consciência da sua respiração durante o dia a dia, a qualquer momento:
dirigindo, andando, sentado no computador, mesmo enquanto estiver falando.
Inspirando, expirando. E isso em si é uma meditação. Nem é necessário sentar-se
ereto, mantendo uma postura formal. De acordo com a tradição
tibetana, deve-se ser capaz de manter a mente unifocada em 21 respirações, sem
se distrair. Os pensamentos não são o problema. Seguir e identificar-se com os
pensamentos é o problema. Pensamentos podem ser como um rio e nós, muitas
vezes, ficamos no meio desse rio, sendo jogados para cima e para baixo. Tomar
consciência dos pensamentos é uma forma de sair desse rio. Quando sai da
corrente do rio, você pode concentrar a sua atenção no que está em primeiro
plano: na respiração, na entrada e na saída do ar, e especialmente na
expiração. Você pode contar um quando inspira, dois quando expira. Não dê
nenhuma atenção aos pensamentos que estão no fundo da mente. Se, por acaso,
você pular de volta no rio e for arrastado, vá para a margem e comece de novo.
Um quando inspira, dois quando expira. Mantenha a mente bem relaxada, centrada,
concentre-se apenas na respiração, conforme o ar entra e sai. E isso é tudo o
que você tem que fazer. Agora, nada mais no mundo importa, a não ser inspirar e
expirar, e saber disso. Começando a Meditar, SEGUNDO
PASSO. Agora, tome esse foco de
consciência que está centrado na respiração e volte-o para dentro, para os seus
próprios pensamentos. Nossos pensamentos estão constantemente fluindo, a cada
momento. O conteúdo do rio muda o tempo todo. Mas, agora, como estamos muito
relaxados, podemos sair do rio e descansar na margem. Podemos apenas observar o
rio passar sem mergulhar nele. Nessa ocasião não julgamos os
nossos pensamentos. Não ficamos pensando que esse é um pensamento inteligente,
ou um pensamento terrível, estúpido ou interessante – são apenas pensamentos.
Quaisquer que sejam os pensamentos que surjam dentro de nós, quaisquer que
sejam os sons que surjam fora de nós, são apenas pensamentos, apenas sons, e
não são importantes. O que é importante é a qualidade conhecedora, a qualidade
conhecedora que está centrada no fluxo de pensamentos. Normalmente, quando
estamos pensando, nós somos os pensamentos. Mas agora recuamos e nos tornamos
testemunhas dos pensamentos, observadores. Portanto, há a corrente de
pensamentos e há aquele que está ciente da corrente de pensamentos. Mantenha a mente bem relaxada, mas muito centrada, apenas observe
os pensamentos conforme eles fluem e não se envolva com eles. Tente isso por
cinco minutos e veja o que acontece. Seja qual for o som que você
ouça, é apenas um som, e não é importante. Não siga. Seja qual for o pensamento
que surja em sua mente, é apenas um pensamento. Não fique, fascinado pelos
pensamentos, não os siga. Continuei apenas sentado na margem. Veja se consegue
realizar uma espécie de separação na mente, entre o fluxo de pensamentos e a
consciência conhecedora. Começando a
Meditar, TERCEIRO PASSO. O terceiro passo é o mais fácil de todos. Simplesmente, repouse
nessa consciência. Pode ser que você pense que não tem consciência de
nada, mas o próprio fato de poder pensar e saber que está pensando é uma
manifestação da consciência. No entanto, normalmente, não estamos conscientes
de estarmos conscientes. Basta sentar-se e ter consciência de estar consciente.
Não há absolutamente nada para fazer. Queremos estar sempre fazendo
alguma coisa, e esse é o problema. Sempre pensamentos ”O que eu faço agora”?
Não há nada a fazer, não há nada em que se concentrar, não há nada, além de
estar neste momento, do jeito que ele é. Tecnicamente falando, se quiser um
nome oficial para esse tipo de meditação, ela é chamada de ”repousar na
natureza da mente”. A maneira mais rápida de parar
de sofrer é reconhecer a ausência de identificação com pensamentos e
sentimentos. Normalmente, tentamos superar nossa insatisfação subjacente nos
distraindo. Tentamos fortalecer nosso senso de ego, alimentando-o com o
máximo de prazer possível. Nos distraímos interminavelmente para não
precisarmos ver que por baixo de tudo há uma insatisfação profunda. Nos EUA por
exemplo, país que tem um alto grau de prosperidade material, é notória a
impressão de que praticamente todas as pessoas que podem pagar parecem ter seu
próprio terapeuta ou psiquiatra particular, da mesma forma que teu seu próprio
dentista ou médico. Então, está claro que ter muito prazer e conforto não basta
para encobrir o desconforto subjacente ou o que Buda chamou de dukkha. Na verdade, ”desconforto” é uma boa tradução para dukkha, que é o
oposto de sukha, ou seja, ”conforto”, aquilo que é aparentemente suave e
agradável. Quando reconhecemos dukkha, o desconforto, dentro de nós mesmos,
passamos a reconhecer o quanto estamos doentes com os 3 venenos do desejo, ódio
e confusão. A renúncia é uma questão de soltar. E a renúncia absoluta é liberar
a fixação a um eu autônomo, duradouro e separado, que está no centro do
universo. Uma das maneiras mais rápidas de obter a realização é realmente
observar a mente – observar os pensamentos e ver que não somos nossos
pensamentos. Existe algo por trás dos pensamentos: existe
uma consciência por trás das idas e vindas dos pensamentos. E é a isso que
devemos prestar mais atenção, especialmente durante a prática. Nossa mente é
como um computador inteligente. Podemos programa-lo muito bem, mas essa não é a
energia motriz do computador. Precisamos reconectar com a energia que está por
trás do computador, e a meditação é uma maneira de nos trazer de volta a isso.
A fonte de energia é imensa. Nosso computador é apenas um pequeno computador,
mas essa energia é vasta e todo-abrangente. DHYANA
PARAMITA, OU MEDITAÇÃO. Basicamente, a meditação é
dividida em duas correntes: shamatha, ou permanência serena, que vamos discutir
aqui, e vipassana, ou insight, que é tradicionalmente explicada em relação a
última das seis perfeições, e da sabedoria. Externa e internamente, somos capazes de conhecer alguma coisa
apenas por meio da mente. Vivenciamos tudo através da mente. Se a mente
não estiver funcionando, estaremos mais ou menos mortos, ou como um zumbi. Tudo
o que experienciamos e conhecemos nos chega através dos seis sentidos. Nossos
seis sentidos são não apenas os cinco sentidos habituais, mas incluem a mente,
o que significa que todas as coisas que pensamos são processados pela mente.
Todavia, quantos de nós tema alguma ideia do que é amente? Quantos de nós tem a
experiencia da mente em si? Estamos sempre a procura de algo fora de nós, e
mesmo quando falamos a respeito da mente, falamos do ponto de vista
intelectual. Ouvimos todos tipos de teorias, ideias e tipos de psicologia, mas
quase nunca nos perguntamos como é experimentar um pensamento como um
pensamento, uma emoção como uma emoção. No entanto, tudo – nossas alegrias e
tristezas, nossas esperanças e medos -, que sentimos e poderíamos possivelmente
sentir só é possível através da mente. Atenção
Plena. Antes de estudarmos a meditação em mais detalhes, é
útil discutirmos a atenção plena, que, no contexto das perfeições, é
tecnicamente um fator que contribui para o desenvolvimento shamatha. No
entanto, pode também ser entendida de forma mais geral como uma qualidade da
consciência que podemos desenvolver na vida diária e que traz grande benefício.
Assim, embora a atenção plena, nesse sentido, não seja estritamente parte das
paramitas, gostaria de aprofundar nossa investigação sobre como podemos
incorporar essa prática espiritual em nossa vida diária. O que significa atenção plena? ”Atenção plena”, em sânscrito, é
smriti e em tibetano, drenpa. Ambas, tem o mesmo significado, que é ‘lembrar’.
Isso é muito próximo da ideia católica de relembrar, de recordar, ou de auto
recordação. É a qualidade de estar aqui e agora, que em geral é exatamente onde
não estamos. Normalmente, nós nem sequer estamos conscientes de que estamos
aqui ou de que estamos um pouco aqui e um pouco em outro lugar. É
extraordinário o quanto ignoramos nossa mente. No budismo a prática da atenção
plena também está ligada a estados mentais positivos. Por exemplo, um ladrão de
banco pode estar muito atento e consciente de suas ações, mas não se diria que
ele possui atenção plena porque sua motivação não é virtuosa e se baseia em
ganância e desejo. Quando começamos a treinar a atenção plena,
vemos o quanto nossa mente de fato está totalmente fora de controle. Uma das
maneiras de perceber isso é tentar permanecer no aqui e agora. Se dizemos:
”Tome consciência do corpo neste momento, apenas perceba”, nesse momento
conseguimos, podemos sentir – não julgamos, apenas percebemos. Porém, quando pensamos,
”Isso é fácil! Olhe, estou consciente do meu corpo estou plenamente atento,
entendi tudo”, já nos perdemos. Porque estamos apenas pensando em estar
plenamente atentos, e não estamos mais plenamente atentos. Então é
complicado. A qualidade de estarmos atentos ao que fazemos
no momento é muito importante, porque o momento presente é tudo o que temos.
Todo o resto é passado, já foi. Nosso futuro ainda não chegou. A única coisa
que está acontecendo é o momento presente, tão rápido que já quase o perdemos
antes mesmo de ele chegar. Está fluindo, certo? Se não estivéssemos presentes
apenas de vez em quando, não teria importância, mas o fato é que não estamos
presentes na maior parte de nossa vida. Ficamos presentes por alguns segundos e
saímos em seguida. Por isso nossa vida se torna aborrecida, rotineira e chata.
Os franceses têm uma expressão para estar entediado – je mennuie – que
significa literalmente, ”eu entedio a mim mesmo”. Exatamente. Não tem nada a
ver com o que está acontecendo ao nosso redor. Nossa mente nos
entedia. Vejamos como podemos estar presentes. Porque, se pudermos
aprender a desenvolver algum grau básico de atenção plena, daremos mais vida a
tudo, a todas as coisas que fizermos durante o dia. Isso é muito importante,
portanto, não durma! Thich Nhat Hanh (1926- ), mestre zen vietnamita, fala sobre duas
maneiras de lavar pratos. Uma maneira é lavar os pratos para obter pratos
limpos, e a outra maneira é lavar os pratos para lavar os pratos. Normalmente,
quando lavamos pratos, como em qualquer outra atividade que fazemos, queremos
um resultado. Lavamos pratos para termos pratos limpos e depois seguimos para
próxima tarefa. A tarefa real, de lavar pratos em si, é irrelevante. Enquanto
lavamos os pratos, estamos pensando no que foi dito no café da manhã, ou no
programa de televisão que vimos na noite passada, ou pensamos ”Bem, depois
disso, vou tomar um pouco de café e a seguir tenho que ir ao supermercado – o
que preciso comprar”? Pensamos em algo que faremos naquela noite, ficamos presos
em algum mundo de fantasia ou o que seja. Só não estamos pensando naqueles
pratos. Certo? E, quando terminamos de lavar os pratos, que agora estão limpos
e empilhados, vamos tomar o nosso café com uma fatia de bolo. Tomamos o café.
Normalmente estamos bastante conscientes no primeiro gole; julgamos se gostamos
ou não gostamos. Mas, já no segundo gole, não estamos mais conscientes. E, no
terceiro gole, estamos totalmente inconscientes de que estamos tomando café
porque estamos pensando no que temos que comprar no supermercado, isto é, antes
de surgir uma memória de anos atrás – ”e então ele me disse isso, e eu respondi
aquilo…”. Quando comemos o bolo ou qualquer outra coisa boa, decidimos se está
gostoso na primeira mordida, na segunda mordida já perdemos o interesse, e na
terceira mordida estamos mastigando e nem sequer sabemos. Toda nossa vida é
levada assim. Um dos significados da palavra buda é
”despertar”. Ele é O Desperto. Ele despertou do sonho da ignorância. Mas o
resto de nós ainda está sonhando. Sonhos bons ou pesadelos – é tudo um sonho.
Somos sonâmbulos. Parecemos muito brilhantes, mas estamos dormindo. Onde está
nossa mente? As vezes realmente acho que seria interessante – horrível, mas
interessante – se tivéssemos alto-falantes conectados a nossa mente, para que
todos pudessem ouvir nossos pensamentos. Todo mundo iria correr para aprender a
meditar, não iriam?! Porque, quando olhamos para dentro e vemos o que está
acontecendo em nossa mente, encontramos conversas sem fim, trivialidades sem
fim, e não é nem mesmo divertido. Se observarmos, veremos como tudo é chato. Os
mesmos pensamentos, opiniões e memórias velhos e rançosos são constantemente
reciclados. Enquanto tagarelamos sozinhos, temos o rádio ligado ou a televisão
berrando ao fundo. Não há silêncio. Atenção plena tem a ver com estar em
silêncio. Diz respeito a ter uma mente completamente quieta e presente no que
está acontecendo. A outra maneira é lavar pratos para lavar pratos. Dessa
maneira também obtemos pratos limpos. Porém, quando lavamos a louça desse
jeito, estamos fazendo a coisa mais importante que poderíamos fazer nesse
momento. Estamos lavando os pratos. É o que estamos fazendo. Este é o momento.
Se não estivermos presentes, nós o perdemos. Se ficamos alertas, conscientes da
água, das próprias mãos e dos pratos, podemos perceber e apenas estar
presentes. Essa sensação de presença, de conhecimento, é o ponto vital. Porque,
se realmente aprendermos a fazer isso, quando tivermos terminado não teremos
apenas lavado os pratos – teremos lavado nossa mente. Nossa mente será
agradável limpa e brilhante assim como a louça. É muito fácil. Mas o problema é
que esquecemos. O verdadeiro significado de atenção plena é lembrar, e seu
inimigo direto é o esquecimento. A inércia de nossa mente é
muito grande. Às vezes, quando ouvem ensinamentos sobre atenção plena, as
pessoas pensam: ”É, isso parece bom, deixa eu experimentar um pouquinho”.
Realmente tentam estar presente com o que estão fazendo. Tentam ouvir a si
mesmas quando falam e saber o que estão pensando, tentam estar presentes e
saber como estão se movendo e como estão aqui, no momento, o máximo possível.
Logo que começamos, pensamentos basicamente em ficar presentes, e isso é muito
difícil. Prosseguimos de onde estamos. As pessoas tentam ficar
presentes, e a seguir dizem: ”Isto foi ótimo, realmente gostei. Tenho tentado
praticar a dois ou 3 dias e é muito divertido estar atento. Meus amigos já
estão dizendo que me tornei uma pessoa muito mais agradável e me sinto muito
bem. Isso é ótimo”. E pensamos ”Ah, sim, vamos
aguardar”. Dentro de 6 semanas perguntamos como vai à
atenção plena. ”Atenção plena? Opa, esqueci! Esqueceu. Não porque não
estivesse funcionando. Não porque fosse incrivelmente difícil. Na verdade, a
atenção plena é razoavelmente fácil. Mas a inércia, a preguiça da mente e a
relutância em estar no presente são muito profundas. O Buda disse que a atenção plena era como o sal nos molhos curry.
Em outras palavras, é o que dá sabor a tudo o que fazemos. Dá vida a tudo,
porque é como se estivéssemos fazendo as coisas pela primeira vez. O mundo se
torna vívido e claro. Normalmente, é como se olhássemos através de uma lente e
tudo estivesse embaçado. Não conseguimos ver com clareza. Assim é com a mente.
Mas, quando ajustamos a lente, tudo entra em foco e parece recém-lavado, como
os pratos, e não como a velha mente rançosa com a qual normalmente vivemos.
Esta é uma noa mente. A qualidade da atenção plena é muito importante no
desenvolvimento das qualidades espirituais em nossa vida diária. E é ago que
todos nós podemos cultivar dia e noite. O Buda dividiu a atenção plena
em quaro aspectos: atenção plena ao corpo, atenção plena as sensações, atenção
plena a própria mente e, na interpretação do Mahayana, atenção plena aos darmas
ou fenômenos externos. Ou seja, tudo o que é recebido por meio dos 5 sentidos –
imagens, sons, sabores, toques e odores. Vamos começar com a atenção
plena ao corpo. O corpo é o mais tangível dos aspectos. Os tibetanos usualmente
enfatizam a atenção plena a própria mente, mas isto é bastante difícil nessa
fase inicial, visto que nossa mente flui de forma muito rápida e turbulenta, e
é bem difícil acompanhá-la. Talvez seja melhor começarmos com algo bem mais
estável e sólido, como o corpo. O Buda diz que começamos pensando: ”Quando
estou em pé, sei que estou em pé; quando estou sentado, sei que estou sentado;
quando estou deitado, sei que estou deitado, quando estou caminhando, sei que
estou caminhando”. Pense sobre isso. Quantas vezes ficamos em pé
ou sentamos sem nem mesmo estarmos conscientes de que estamos em pé ou sentados
porque nossa mente está correndo lá na frente? Normalmente nem sequer sabemos o
que nosso corpo está fazendo. No entanto, isto é algo muito simples de trazer
para o presente – basta sabermos que estamos sentados quando estamos sentados.
Experienciar como o corpo se sente no momento: isto é consciência corporal.
Ficar ciente da respiração. Inspirar e expirar com consciência é uma maneira de
ficar instantaneamente centrado. Não podemos respirar no passado ou no futuro –
só podemos respirar agora. Existem infinitas oportunidades
ao longo do dia para a prática da atenção plena ao corpo. Alguns anos atrás, em
Nova Délhi, em cima da luz vermelha dos semáforos, escreveram em grandes letras
brancas: RELAXE. Quando paramos no farol vermelho, relaxamos, inspiramos e
expiramos, sentindo gratidão pelo sinal estar fechado, dando a oportunidade de
nos centrarmos novamente. Se ligamos para alguém e temos que ouvir a gravação
interminável da secretária eletrônica, ótimo – inspiramos e expiramos, nos
centramos, e então estamos prontos para deixar uma mensagem após o sinal. Ao
longo do dia, existem inúmeras oportunidades para voltarmos ao nosso centro, ao
nosso ser consciente – escovando os dentes, comendo e bebendo, penteando o
cabelo, fazendo a barba etc. Use esse momento, essa ação simples – e saiba o
que está fazendo nesse momento. Não escove os dentes pensando em mil outras
coisas. Apenas escove os dentes para escovar os dentes, e perceba. Tudo
faz parte do treinamento para estar presente. Porque o presente é tudo o que
temos. Se aprendermos como usar o nosso dia para desenvolver a qualidade
de atenção plena e consciência, quando nos sentarmos para meditar tais
problemas não existirão. Em vez de a mente não ser nada mais que um obstáculo,
nós a utilizamos para nos ajudar. Aqueles que são sérios quanto ao cultivo
dessa prática devem ler livros sobre o assunto e, se possível, participar de
cursos de meditação e perguntar a quem tem mais experiência na prática da
atenção plena. Porque essa é uma qualidade muito importante, e não tem nada a
ver com orientação espiritual. Todo mundo pode utiliza-a. Durante essa prática
profunda, ninguém sequer sabe que estamos praticando! Podemos leva-la conosco a
todos os lugares em qualquer circunstância, até mesmo para o banheiro. Não
importa onde – cada ação, cada pensamento, e cada palavra pode ser um objeto
para nossa consciência, para nosso conhecimento. Shamatha, ou permanência serena. Nossa mente costuma ser muito agitada pelos seis sentidos –
imagens, sons, odores, sabores, tato e pelo sexto sentido da própria mente, com
seus pensamentos, julgamentos, memórias, ideias e opiniões. Tudo isso revolve a
nossa mente de maneira contínua. E, por causa disso, não vemos as coisas com
clareza. Não retratamos o ambiente externo como realmente é. Apenas temos a
nossa versão, a nossa interpretação do que está acontecendo, que é distorcida
por todo esse tumulto que ocorre dentro de nós. Respondemos apenas a nossa
versão, a nossa interpretação do que está acontecendo, e não aos fatos
propriamente. Quando tentamos observar a própria mente, ela está tão revolta
que não conseguimos enxergar nada além dos pensamentos e da tagarelice
superficiais. Por meio da meditação de shamatha, a mente começa a se acalmar.
Os sentidos externos se tornam menos reativos. E o sexto sentido interior, a
própria mente, torna-se mais tranquila, calma e unifocada. Torna-se clara. E,
quando está clara, a mente enxerga com muita precisão porque já não está mais
interpretando. Ao mesmo tempo, temos condições de usar essa mente calma e
unifocada para olhar para si mesma e enxergar por entre camadas cada vez mais
sutis da psique. Portanto, atingir esse primeiro estado de calma e concentração
é realmente importante. Certa vez, um lama me disse que se tivermos uma boa
prática de shamatha, todo o Darma estará na palma de nossa mão. Qualquer que seja a prática que façamos, se fizermos com uma mente
distraída não funcionará. Há livros que dizem que, ainda que passemos uma
centena de éos (imensurável período de tempo) recitando mantras, se recitarmos
com uma mente distraída não atingiremos o objetivo. Mas, se recitarmos alguns
poucos mantras com a mente concentrada e fundida na prática, então os
resultados virão com rapidez. Portanto, vale a pena treinar nossa mente, tanto
quanto pudermos, para torna-la quieta, focada e calma. Este é o estágio número
um. Nossa prática não termina aqui. […]. Embora esse tipo de
meditação seja muito importante como preparação, desfrutar dele por muito tempo
poderia ser contraproducente. As vezes os praticantes entram em estados de
bem-aventurança e acham que estão liberados, tudo é tão claro. Mas pode acontecer
que esse estado de bem-aventurança atue como um escudo que esconde as emoções
negativas. As delusões (enganos), a avareza, a luxúria, a raiva e a má vontade
estão todas ainda ali de forma latente. Isso é perigoso porque nos delude a
pensar que estamos muito mais avançados espiritualmente e que todas as nossas
emoções negativas foram erradicadas. Podemos imaginar que não temos mais
nenhuma emoção negativa porque estamos neste estado de bem-aventurança e
clareza, onde todas as coisas são uma e tudo é muito maravilhoso. Olhamos e não
conseguimos ver nada de negativo porque está encoberto, mas as contaminações
estão todas ali, crescendo debaixo da superfície e, se surgir a oportunidade,
interromperão, muitas vezes de forma incontrolável. […]. Há, também, o problema
de permanecermos no estado de calma e os apegarmos a ele. Podemos nos apegar a
qualquer coisa, e isso é, em última análise, um obstáculo. No entanto, como o
primeiro passo, é muito importante desenvolver a qualidade de acalmar e
concentrar a mente. Existem muitas maneiras de fazer isso. Quando
começamos a meditar, é importante que não consideremos a prática como uma
espécie de teste de resistência. Podemos pensar na mente como um cavalo
selvagem, e existem basicamente duas maneiras de lidar com a questão de
domá-lo. Podemos prendê-lo e espancá-lo até que se submeta, forçando-o a
realizar a nossa vontade; por fim, o cavalo irá sucumbir e ficar dócil. O que
teremos então será um animal surrado, triste e ressentido. As vezes podemos ver
cavalos assim na Índia. Eles puxam carroças, e podemos imaginar a maneira como
são tratados. São infelizes, desanimados, tentam tudo o que podem para fugir de
seus trabalhos, mas são submetidos de novo por espancamento. No entanto, há
outra maneira. Podemos domar o cavalo de forma mais suave, lentamente.
Induzindo-o, e tentando aos poucos conquistar sua boa vontade. Acalmando o seu
medo, fazemos com que saiba que nada de ruim vai acontecer. Pacientemente o
conquistamos, e por fim ele começa a confiar em nós e se dispõe a fazer o que
queremos. Da mesma forma, existem duas abordagens para domar a mente. Uma
delas é realmente a força, por meio de longas sessões sentados, sem nos
movermos por um instante, coagindo-a a se concentrar. Pode funcionar. Pode ser
que a mente nunca mais queira meditar novamente, o u que se sinta muito
triunfante por ter sido capaz de se acomodar e se concentrar durante horas e
horas a fio, e fique disposta a seguir em frente. De maneira geral, a forma como meu mestre ensinou é mais hábil,
por meio da conquista da cooperação da mente. Se estamos assistindo a um filme
ou programa de TV interessante, se estamos lendo um livro muito fascinante,
ninguém precisa nos coagir a nos concentrarmos. Estamos absortos, fundidos com
o que estamos fazendo, as horas passam e nem notamos. A mente está muito
concentrada. Todos temos a capacidade de nos mantermos
concentrados e absortos em um único fluxo de eventos. Nosso desafio é trazer
esse tipo de interesse e absorção para algo que inicialmente não é
absolutamente fascinante, como observar a inspiração e a expiração minuto após
minuto, hora após hora, dia após dia, ano após ano. Portanto, caso não se tenha praticado muito antes, é uma boa ideia
começar com sessões curtas. Isso porque, quando damos início a meditação, se
começarmos a ficar mais concentrados e calmos, está ótimo. Se paramos quando
ainda estamos apreciando a prática e ainda poderíamos seguir um pouco mais,
nossa mente se lembra de que a prática foi divertida, e ficamos dispostos a
tentar novamente. Se forçamos, amente se cansa e perdemos a concentração. Se
continuarmos forçando, na próxima vez em que nos sentarmos a mente se lembrará
de que se sentiu cansada e entediada e haverá um sentimento de aversão.
Não estamos travando uma batalha. Não é uma questão de sub julgar, de
espancar a mente até que finalmente obedeça. É uma questão de estimulá-la a
cooperar e compreender que existe felicidade genuína em estar calma,
concentrada e clara. As dificuldades iniciais são as distrações internas que
experienciamos, que não são realmente um problema se pudermos utilizá-las como
parte do processo. As pessoas imaginam que, quando se sentam para
meditar, deveriam imediatamente ser capazes de acessar níveis profundos de
silêncio, calma, e concentração, mas, quando se sentam e descobrem que parecem
ter mais pensamentos do que seria normal, ficam desencorajadas. Todo mundo
experimenta mais ou menos os mesmos problemas. Estou certa de que até mesmo o
próprio Senhor Buda jamais se sentou e imediatamente deixou de ter pensamentos.
Se tivesse sido assim, nunca poderia ter ensinado a meditação porque não teria
conhecido os problemas. Mas, como deu muitos ensinamentos sobre as dificuldades
de meditação, imagino que deve tê-las experimentado. Todo mundo tem problemas, dificuldades, e os que finalmente
atingem realizações são os que perseveram. Mas, ás vezes, quando sentimos que
não vamos conseguir, manter as sessões por um tempo não muito longo pode
ajudar. Nós praticamos, então descansamos e recomeçamos, praticamos,
descansamos e recomeçamos. Aos poucos, a mente começa a se acostumar. É como
fazer exercícios físicos. Se queremos fazer ioga ou ginástica aeróbica e
começamos com uma sessão de duas horas, sem nunca ter feito exercício antes, ou
temos um colapso durante a sessão, ou não conseguiremos nos mexer no dia
seguinte. Claro que não conseguiremos nos mexer porque tudo estará doendo! Nós
pensamos: ”Ah yoga nem fale disso”. Não queremos tentar de novo. Porém, se
fizermos uma sessão curta, alongando o quanto conseguimos, mas não demais,
pensamos: ”Isso não é tão ruim, vamos tentar de novo”. Seguimos adiante, e as
sessões se tornam mais e mais longas, e, sem que percebamos, de repente
estaremos fazendo aqueles exercícios que os alunos de ioga mais avançados fazem
e que pareciam impossíveis. Por que seria diferente com a
mente que nunca foi treinada? Claro que no início haverá problemas de
resistência. Por isso precisamos ser habilidosos. Precisamos tranquilizar a
mente. ”Esse é seu refúgio genuíno. É uma coisa maravilhosa! Se minha mente
puder ficar só um pouco mais calma, um pouco mais quieta, centrada, focada e
concentrada – Ah, é aí que mora a felicidade, este é o caminho”! Temos que
continuar e continuar. Em algumas sessões a mente começa a cooperar, tudo é
mais fácil, agradável e calmo. ”Agora consegui”, pensamos, mas na sessão
seguinte os pensamentos estão por toda parte. Tudo bem. Não tem problema. Se a
mente quer ser selvagem e distraída, deixa-a ser selvagem e distraída, mas
lentamente traga-a de volta – esse é o caminho a seguir. Claro que a mente
tem pensamentos, a natureza da mente é essa. Pensemos na mente como o oceano,
cuja superfície tem ondas. Sem problemas. Se pensarmos na mente como o céu, o
céu tem nuvens. Não se preocupe com os pensamentos! Solte-os, sem dar a eles
nenhuma energia. Além do fato de a mente ter pensamentos, encontramos
basicamente dois problemas na nossa prática. O primeiro é chamado de sonolência
ou afundamento. Significa que, quando sentamos, começamos a nos sentir
sonolentos – um afundamento grosseiro e muito comum. Quando Milarepa
(1052-1135), o grande iogue tibetano do século XI, começou a meditar, colocou
uma lamparina de manteiga acesa sobre a cabeça. Obviamente também teve seus
problemas. Uma amiga minha utilizava uma tigela pequena com água até a borda
sobre a cabeça. São estratégias que nos impedem de cochilar! Precisamos ser
criativos e não ceder a sonolência. O afundamento sutil é mais
perigoso porque é menos obvio. Podemos entrar em um estado calmo e pacífico,
mas com pouca consciência, e ficar assim durante horas. A mente meditativa
genuína é relaxada e espaçosa, mas completamente alerta, brilhante e clara.
Portanto, se estamos em um estado em que nos sentimos calmos e espaçosos, mas
em que não há clareza vívida ou consciência alerta, estamos afundando. É
perigoso, pois podemos permanecer nesse estado por muito tempo e acharmos que
estamos em profunda meditação. Mas não. É apenas um estado sutil de
afundamento, e depois, quando saímos da meditação, meio que vagamos ou
flutuamos por aí – tudo é lindo e pacífico, a síndrome da nuvem de
bem-aventurança. Estamos nos desviando gravemente porque deveríamos sair da
prática nos sentindo bastante centrados e presentes, conscientes e despertos.
Meditação é o processo de despertar, e não de colocarmos a dormir. O outro problema principal, claro, é a nossa velha companheira, a
distração. Se a mente está hiperativa e distraída, o antidoto é praticar em uma
sala um pouco mais quente, usar roupas pesadas, comer mais, e de maneira geral
ficar mais aterrado. As vezes visualizamos um ponto escuro logo abaixo do
umbigo para trazer a mente para baixo. Diz se também que devemos pensar no
sofrimento do samsara, na impermanência e na morte inevitáveis, e que não temos
tempo a perder, para que possamos nos sentar com um senso de urgência. Visto
que já desperdiçamos muito tempo, não devemos continuar desperdiçando. É hora
de meditarmos. Está na hora de sermos sérios e de colocarmos todo o nosso
esforço nessa prática. Não devemos simplesmente dissipar nossas energias novamente
seguindo muitos pensamentos, ficando agitados, querendo levantar e ir para
outro lugar. Temos que ser enérgicos, firmes e claros sobre o que vamos fazer.
A tarefa importante que temos é apenas trazer a qualidade de saber
e atenção a respiração. Inspirar, expirar – só isso, não para modificar a
respiração ou comentar a respeito, não para pensar a respeito ou analisar,
apenas para ter conhecimento da respiração e experiencia-la a cada momento,
tanto quanto possível. Tão logo começamos a comentar mentalmente, não estamos
mais conectados com a respiração, estamos só pensando nela novamente. Todos os
pensamentos que vêm a mente sao comparados a visitantes indesejados. Ficam à
espera de serem convidados a se sentar, mas ninguém os convida. Certamente não
oferecemos chá, nem perguntamos como vão as coisas. Ignoramos. Por fim, eles se
sentem envergonhados e vão embora. Nossa atenção se concentra
apenas na inspiração e na expiração – é tudo o que devemos fazer. Se nossa
mente se desviar e for novamente apanhada por pensamentos, apenas os soltamos e
voltamos para a respiração. Se passamos todo o tempo com a respiração, nos
perdendo e trazendo a mente de volta, nos perdendo novamente e trazendo a mente
de volta, está ótimo, não tem problema. Pouco a pouco, a respiração começa a se
destacar mais, tornando-se mais clara e vívida, enquanto todas as outas coisas
passam para o segundo plano. Pensamentos e sons tornam-se ruídos distantes. Ao
final, é claro que eles começarão a se acalmar por si, mas isso não acontecerá
de imediato. As qualidades mais necessárias para a vida espiritual são
paciência e perseverança. www.budavirtual.com.br.
Abraço. Davi
quinta-feira, 25 de outubro de 2018
26 RAZÕES PARA PARAR DE VER PORNOGRAFIA
Cristianismo. www.internautascristaos.com.
Consequências destrutivas que a pornografia tem sobre um homem. As seguintes consequências são o que acontece quando
um cristão vê pornografia. A lista cobre
uma grande área dos resultados negativos que a pornografia tem sobre um homem
que é seguidor de Jesus: 01. Alienação de Deus. Você não mais se sente próximo de Deus. Você não experimenta o
poder de Deus. Você não mais tem a alegria de sua salvação. 02. Cega você para as
consequências. Temporariamente
te desliga da sua caminhada com Deus, de seus relacionamentos com sua esposa,
seus filhos e outros. Te cega sobre o que te acontecerá espiritual, física,
emocional, mental, social, vocacional e relacionalmente. 03. Cria expectativas
irrealistas. Os homens
começam a pensar que toda mulher deveria se parecer com aquelas e que esse tipo
de relação é como seu relacionamento com sua esposa deve ser. 04. Distorce sua visão do
sexo. A pornografia te faz
acreditar que o sexo é somente para o prazer do homem e que as mulheres são
simplesmente objetos a serem usados, ao invés de criações de Deus que devem ser
honradas e respeitadas. 05. Nunca é o bastante. A pornografia tem um efeito crescente. Como uma
droga, você precisa de mais e mais para satisfazer a lascívia. Ela te leva
rapidamente a um caminho de destruição e para bem longe da paz, alegria, e
relacionamentos saudáveis. 06. Liberdade sobre o que você pensa e faz é perdida. Você se torna escravo de seus pensamentos pecaminosos
que levam a atos pecaminosos. 07. A culpa depois que você vê pornografia. Mas a culpa não é o suficiente para te prevenir
de fazer na próxima vez. 08. A sexualidade saudável é obscurecida pela pornografia. Sexo saudável é somente o sexo marital, que inclui
sexo regular, sexo altruísta e sexo amoroso. 09. Te isola e faz você se sentir totalmente sozinho e como o
único que luta contra a pornografia e a lascívia. 10. Ameaça seu relacionamento
com sua esposa ou futura esposa (se
você é solteiro), seu testemunho de Jesus Cristo, e tudo em sua vida que é
importante para você. Você põe tudo isso em risco pela pornografia. 11. Te mantém em um ciclo de
autodestruição. A
pornografia parece medicar a dor em sua vida, mas somente adiciona mais dor à
dor. A pornografia te leva a fazer coisas que você nunca pensou que faria. O
pecado te levará para mais longe que você gostaria. Ele te manterá mais longe
que você gostaria. E te custará mais do que você gostaria de pagar. 12. Lascívia – lascívia sexual
pecaminosa – te leva a atos sexuais pecaminosos. Pornografia posta em sua mente é como colocar
gasolina no fogo do desejo sexual errôneo, resultando em pensamentos e ações
destrutivas. 13. Mascara a verdadeira ferida. Você está procurando a cura e torna as coisas
piores. 14. Nunca é uma experiência neutra. Você não pode ver pornografia e não ser afetado
por isso. Essa experiência é sempre inconsistente com a Palavra de Deus.
15. Objetifica
as mulheres. A pornografia
as transforma em objetos sexuais. Ela sequestra a capacidade do homem de ver
uma mulher mais velha como uma figura materna, uma mulher da mesma idade como
uma irmã e uma mulher mais nova como a figura de uma filha. 16. Traz um prazer muito curto, seguido por dor e mais dor. 17. Abandonar torna-se a luta
de uma vida. Uma vez que
você permite que a pornografia entre, há uma batalha violenta com Satanás e com
sua velha natureza para se vigiar. Uma vez que você permite que a pornografia
entre em sua vida, sempre haverá uma batalha. É uma batalha vencível, mas uma
batalha diária. 18. Permanece em sua mente para sempre. Satanás mantém aquela imagem repetindo em sua
mente para criar um ciclo de luxúria pecaminosa e te levar de volta à
pornografia. Você se torna ligado a uma imagem, não a uma pessoa. 19. A vergonha entra em sua
vida. Culpa é sentir-se mal
por algo que você fez. A vergonha, no entanto, é baseada em sentir-se mal por
quem você é. A pornografia traz vergonha. Deus nunca traz vergonha. Satanás
sempre traz vergonha. 20. A confiança é perdida com as pessoas que você mais ama e respeita.
21. Abre a
porta para todo pecado sexual. A
pornografia é um portal, uma entrada que traz nada de bom e tudo de doloroso,
como masturbação compulsiva, desejos, práticas sexuais perigosas, visita a
lugares adultos, uso de prostituição, práticas sexuais pervertidas e abuso
sexual. 22. Viola mulheres. Como? Você está colocando seu selo de aprovação em uma indústria
que degrada e desumaniza mulheres. 23. Um convite para olhar para outras mulheres.
24. Extingue
a verdade. A pornografia
promove a mentira. Você mente para os outros, mente para Deus e mente para si
mesmo. Você mente mais para cobrir velhas mentiras. Você se torna uma mentira
viva. 25. Te liga
a uma imagem. Você fica
preso e ligado à imagem ao invés de sua esposa ou futura esposa se você é
solteiro. 26. Fecha seus lábios para o louvor a Deus, falar sobre sua fé, contar aos outros como eles
podem experimentar Deus. www.internautascristaos.com.
Abraço. Davi
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