terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

NO MUNDO - MAS NÃO DO MUNDO.



Teosofia. Texto de Mary Anderson e tradução de Izar G. Tauceda. Muitas vezes ouvimos a expressão: “NO MUNDO, MAS NÃO DO MUNDO” (no evangelho de João 17,15-16 é dito: ”Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal. Não são do mundo, como eu do mundo não sou”), e perguntamos: Qual é a diferença? A diferença está somente em duas pequenas palavras, duas preposições: “no” e “do” que fazem muita diferença! Vejamos essas preposições. “Em” quer dizer em algum lugar. Alguma coisa ou alguém pode estar temporária ou permanentemente em algum lugar. Em certo sentido é um termo neutro, sem cor, sem paixão. Mas “do” indica posse, pertencer a algo. Não é neutro, e pode até ter uma conotação de paixão. Até mesmo uma criança fala de “meus brinquedos”, “meu ursinho”, “minha boneca” e os defende como sua posse. Quando dizemos “no mundo”. Quando dizemos “no mundo” e “do mundo”, como consideramos “o mundo”? A preposição “no” ou “do” muda o significado de “mundo”. No “mundo” significa estar localizado no mundo físico, o mundo material. Isso não é aviltante (desonroso). Não esqueçamos que a matéria é tão divina como o espírito e não deve ser diminuída, como é ou era por várias tradições ascéticas que dizem que “o mundo da carne e do demônio” deve ser evitado e condenado. Por outro lado, “do mundo” significa a identificação com certos valores chamados de “mundanos”, que não são materiais, mas materialistas. Da mesma maneira, ao falarmos de “sabedoria mundana” que não é sabedoria no sentido mais profundo, mas uma habilidade para descobrir a melhor maneira, muitas vezes uma maneira impiedosa, de obter o que se quer ou conseguir seus próprios fins, sejam eles materiais ou imaginados “espirituais”. Quem aspira à espiritualidade pode pensar que o primeiro passo é afastar-se do mundo e de suas tentações, retirar-se, tornar-se um ermitão (asceta) e viver fora do mundo. Ainda assim essa pessoa ainda pode ser “do mundo”, assaltada por tentações na solidão, mais ainda do que quando estava no mundo, porque ser “do mundo” é um estado mental e não apenas um lugar. Às vezes é sábio abandonar coisas e circunstâncias externas, como quando alguém está controlando o alcoolismo e deve evitar frequentar bares. Mas, no fim, não podemos fugir de nós mesmos. Certamente houve e ainda existem eremitas que foram ou são santos genuínos. Contudo, não creio que evitar certos ambientes e buscar a solidão possa ser condenado. Podemos estar em solidão, ainda que intimamente junto a outros, solidários e não sozinhos. É um assunto de temperamento, de nosso dharma pessoal, pelo menos nesta vida, se ficamos no mundo ou escolhemos a solidão. Monges, monjas e ermitãos podem meditar em solidão, podem rogar pelos outros e podem gerar impulsos de cura e de auxílio, formas pensamento, que contribuem para mudar o mundo. Lembro-me de um poema de uma teósofa americana, no qual ela descreve uma jovem que entra no mundo e pratica ativamente o bem. Ela tem uma amiga que é monja e também faz o bem a sua maneira: “Seus pensamentos, atravessando as montanhas, voavam para sua amiga, ela tremia sob o hábito áspero enquanto meditava perto da fonte do convento. Somente eu sabia por que, protegida por Deus, ela fazia isso. Seu amante cuspira nela e sua família e amigos disseram: Tem medo da vida! É insensata como um morcego. Seria melhor se estivesse morta! Ela sabia o que devia fazer nos difíceis dias vindouros. Num mundo dedicado às ações, escravizado pelas máquinas, os supremos dirigentes da coisa, somente uns poucos conhecem a terrível necessidade de suprimento espiritual. Ela fará insistentes petições ao Trono enquanto durar sua vida. Irei acima e abaixo no mundo, e onde eu for lançarei meu amor com os ventos. Não saberemos onde cai a semente nem em quais sulcos vamos semear. Nossa única esperança é acender lanternas semelhantes onde e, quando podermos, e confiar que talvez, uma se torne uma estrela que brilhe na selva para iluminar o homem que luta para voltar ao lugar de onde veio e procura o mapa do Paraíso que perdeu em sua jornada. Uns poucos devem orar e planejar para as enormes multidões de abandonados. Uns poucos, como lâmpadas, devem ser úteis na escura clareira da floresta”. Evitar o mundo não deve ser uma forma de fuga. Pois de qualquer maneira, não podemos fugir de nós mesmos. No outro lado da balança, do ermitão que sai do mundo para não ser do mundo, ou que genuinamente não é do mundo, temos o Avatar o Bodhisattva ou o Messias que não é mais do mundo, que internamente é livre, mas que está no mundo, que limita sua liberdade apenas exteriormente para ajudar e servir os outros e ser um farol para eles. Até mesmo grandes instrutores espirituais, sem necessariamente serem Avatares, Bodhisattvas ou Messias podem muitas vezes dar conselhos em assuntos práticos de todos os dias. Ramakrishna, Ramana Mahasrshi e Krishnamurti muitas vezes o fizeram. Conscientes ou inconscientemente, não ficaram cegos por considerações pessoais como muitos de nós. Vem claramente, e seus corpos são cheios de luz. Não devemos ter medo de permanecer no mundo. A verdadeira sabedoria capacita-nos a agir sabiamente, de praticar karma-yoga como habilidade em ação. E, vice-versa, levar uma boa vida abre caminho para a sabedoria. Já foi dito: “Viva a vida e atinja a sabedoria”. Aldous Huxley (1894-1963) coloca desta maneira: “A natureza da Realidade Uma é tal que não pode ser direta e imediatamente apreendida, exceto por aqueles que escolheram preencher certas condições, tornando-se amorosos, com coração e espírito puros”. Fisicamente não agimos sozinhos. Todas as nossas ações físicas são acompanhadas de pensamentos, sentimentos e motivos, que também são ações. O verdadeiro artista trabalha na matéria física criando grande beleza, edifícios, estátuas, pinturas, movimentos de dança, poemas, sinfonias entre outros. Trabalha no mundo da matéria, vive no mundo, contudo seu maior trabalho é conseguido no esquecimento do eu. E assim esse artista não é “do” mundo. Qualquer trabalho físico pode ser arte, até um arte  que não seja deste mundo. O trabalho considerado penoso pode ser criativo. O Trabalhador que cava buracos na estrada, somente para enchê-los novamente, o trabalhador industrial na linha de montagem, a esposa ou a empregada que limpam, tiram o pó, levam a casa – todos eles, nesse sentido, podem ser artistas. Muito depende de nossa atitude. O poeta George Herbert (1593-1633) escreveu: “A empregada, em sua condição, torna o penoso divino? Quem varre a sala, seguindo tuas leis, faz isto e a ação boas. Esta é a famosa pedra que tudo transforma em outro”. É por isso que os monges zen usufruem do trabalho físico. Diz o ditado de algumas ordens de monges cristãos; “Laborare est orare (trabalhar é orar)”. Em AOS PÉS do MESTRE temos; “Pense como faria um trabalho se soubesse que o Mestre viesse vê-lo”. Podemos fazer coisas por amor a Deus ou por amor a alguém que amamos ou simplesmente por amor. O que importa é esquecermo-nos de nós. Podemos, então, saber realmente o que estamos fazendo. Ai não somos “do mundo”, mas certamente estamos “no mundo”. Somos o mundo. Quem pratica o bem ativamente no mundo pode ser considerado um guerreiro ou um paladino como foi Annie Besant (1847-1933). O cavaleiro europeu na Idade Média tinha um código de honra ou de cavalaria, provavelmente semelhante ao dos Kshatriyas: praticar o bem, lutar contra os opressores, os injustos e maus, defender os fracos, especialmente as mulheres que eram então, e, muitas vezes, são agora, vítimas de injustiça e crueldade. Um sentido mais profundo pode ser acrescido, como no caso de Arjuna no Bhagavad Gita. Os inimigos, os opressores cruéis, derrotados pelo cavaleiro, podem-se referir não apenas a inimigos extremos, mas aos inimigos internos, isto é, à própria fraqueza, aos traços negativos de caráter como ódio, covardia, injustiça egoísmo. O espiritual não é o mundano. Não podemos prosseguir nos reinos do espírito de acordo com meios mundanos. Como disse Jiddu Krishnamurti (1895-1986): “Se quiser atingir a outra margem, não deve sair desta margem, mas começar da outra margem”. Como pode ser isso, se tudo que conhecemos é esta margem? Talvez esquecendo esta margem, esquecendo o eu, não esperar nada, estar aberto a tudo que chegar. Se vamos atravessar a corrente, não ser mais do mundo, não devemos deixar para trás, bem no fundo do coração, tudo o que sabemos, tudo o que possuímos. Como disse Cristo a um homem rico que buscava o Reino dos Céus e que já havia preenchido as qualificações de uma vida correta, dizendo que sempre havia respeitado os mandamentos. Entretanto isso não foi suficiente, disseram-lhe que vendesse tudo o que tinha e desse aos pobres, mas ele não podia fazer isso “por que era muito rico” Mateus 19,20-22. Talvez rico não apenas em bens materiais, mas talvez em conhecimento, popularidade e autoestima. Mencionados como exemplos de quem verdadeiramente está no mundo, mas não do mundo, citamos o Avatar, o Bodhisattva, o Messias. São seres que evoluíram além do estágio humano, mas que por compaixão por aqueles que ainda estão no estágio humano ou sub-humano ficam em contato com o mundo e até retomam a encarnação no mundo. A tradição hinduísta fala de Avatares, e cito Annie Besant: “(...) a mais sagrada das sagradas, essas manifestações de Deus no mundo nas quais ele é divino, vêm para auxiliar o mundo que criou, brilhando em sua natureza essencial, a forma e um fino filme que apenas esconde a divindade de nossos olhos”. Contam que houve nove Avatares, os primeiros quatro com a aparência de animais. Os mais conhecidos Avatares humanos foram o rei Rama e Sri Krishna, embora o Budha também seja considerado um Avatar, o nono. No Bhagavad Gita, Sri Krishna mostra qual é a função de um Avatar: “Sempre que houve um declínio da retidão (...) e houver exaltação da corrupção, ai eu apareço, de era a era, para proteger o bem, para destruir os malfeitores e para estabelecer firmemente a retidão. Rama foi um rei perfeito, exemplo do governante ideal, sendo puro, justo e forte. O Senhor Krishna foi e é reverenciado como a adorável e travessa criança de uma mãe adotiva, o matador dos demônios que aterrorizavam as pessoas, o amante irresistível das almas das Gopis, o encantador tocador de flauta, o guia, o filósofo e amigo do guerreiro Arjuna a quem ele revela ser a encarnação do Senhor do Universo. Como indicam as palavras do Sri Krishna, os Avatares encarnam quando há necessidade de reforma. Dizem que Sri Krishna deu uma lição para os Kshaltriyas, assim como o Senhor Budha deu uma lição aos Brahmanes, que davam mais importância à forma, à letra da Lei do que a seu espírito, esquecendo a necessidade de compaixão a todos os seres. É dito que tanto Budha como Cristo não vieram para trazer uma nova religião, mas reformar as que existiam, e que novas religiões surgiram em ambas com o correr do tempo. No budismo do norte, o Bodhisattva é reverenciado como um tipo de Avatar, alguém que chegou ao portal do Nirvana, mas recusou ter essa felicidade até que todas as criaturas vivas também estivessem prontas para entrar ai. Os Bodhissatvas permanecem no mundo embora não sejam do mundo. O voto de Kwan yin diz: “Nunca procurarei ou receberei salvação individual, nunca entrarei sozinho na paz final, mas sempre e em toda parte viverei e lutarei pela redenção de todas as criaturas em todo mundo”. Estar no mundo não significa, no caso de um Bodhisattva, que ele seja nosso vizinho de porta ou que possamos encontra-lo na rua. Na verdade, um Bodhisattva pode estar entre nós e pode nos ajudar, mas não será reconhecido a não ser por aqueles que tem “olhos para ver”. Entretanto seu auxílio sempre está presente. Cito Madame Helena P. Blavatsky (1831-1891) em A Voz do Silêncio. “Condenado por ti mesmo a viver por futuros kalpas sem o agradecimento e percepção dos homens; entalado com uma pedra entre outras inúmeras pedras que formam a Muralha guardiã, este é o teu futuro, se passares o sétimo portal (...) essa muralha guardiã construída pelas mãos de muitos Mestres de Compaixão, erguida por seus tormentos, cimentada com o seu sangue, ela defende a humanidade desde que o homem é homem, protegendo-a de ulteriores e muito maiores misérias e aflições”. No judaísmo e no cristianismo temos o conceito do Messias. Muitos judeus ortodoxos aguardam a vinda do Messias. Muitos cristãos acreditam que Jesus Cristo foi o Messias em sua encarnação na Palestina, no começo da era cristã, e algumas seitas cristãs aguardam todos os dias seu retorno. Conheci uma moça que pertencia a essa seita, e, aparentemente do apartamento de sua família, a qualquer hora, ouvia-se uma voz entoando “Jesus está chegando”. Em anos recentes, foram expostas descobertas interessantes a respeito do cristianismo, revelando que a visão tradicional é certo tipo de “cobertura”. Na tradição judia, às vezes são mencionados dois Messias: um Messias nobre, descendente do rei Davi, e um Messias sacerdotal, descendente de Arão, o Primeiro Sacerdote. Algumas vezes sugerem que os dois papeis sejam exercidos pela mesma pessoa. Eles são vistos como dois pilares unidos por um arco, significando Shalom, paz, talvez, a paz de Deus além do entendimento. Esses dois pilares refletiram-se e foram deformados na última situação na Europa, onde o imperador reinava sobre o chamado “Sagrado Império Romano”, representando o poder secular, e o Papa representava o poder espiritual. E idealmente esse conceito corresponde ao ideal hinduísta e budista do Chakravartin e do Budha. Cito de Filosofia da Índia, de Heirich Zimmer (1890-1943): Existe um antigo ideal mítico – um sonho idílico compensatório, nascido do desejo de estabilidade e paz que representava um império totalmente universal de duradoura tranquilidade com um monarca justo e virtuoso, o Chakraavartin (...) que conseguiu pôr fim à perpetua luta de estados contendores”. De acordo com a concepção budista, o monarca universal é a contraparte secular do Budha, o Iluminado, que dizem, “colocou em movimento a roda da doutrina sagrada (...) sua roda, o dharma budista, não é apenas para as castas privilegiadas, (...) mas para todo o Universo, a doutrina da libertação, com o propósito de trazer paz a todos os seres vivos sem exceção”. O monarca do mundo hinduísta, pacificando a humanidade sob sua única autoridade todos os reinos próximos sob – “o grande rei (...) rei dos reis, que foi proclamado em gradação igual aos Budhas redentores do mundo, que, através de suas doutrinas, colocaram em movimento a roda”. O Sol, a luz e a vida do mundo brilham sobre todos da mesma maneira sem distinção, e assim também brilha o verdadeiro Chakravartin. Por quanto tempo teremos que esperar por este monarca, por este Budha? Talvez até a próxima Idade do Ouro, que, certamente, não está logo ali na esquina. E, enquanto isso, estaremos “no mundo”, mas não seremos “do mundo”. Assim o mundo estará pronto no devido tempo. “Libertar-se do sentimento de posse, quer a respeito das coisas, de pessoas, de pais, de raça, de religião e até de nossas virtudes imaginárias, exige uma compreensão madura. Essa libertação torna a vida simples, sem superficialidades e é eficiente na maneira de manifestar a real beleza e natureza do Espírito em nós”. N. Sri Ram (1889-1973). Loja Teosófica Jehoshua – Porto Alegre – RS – Brasil. Abraço. Davi

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

STARS WARS - E A LITERATURA VÉDICA.

Hinduísmo. Texto de Madhava Smullen. Poderia Guerra nas Estrelas ser baseado na literatura Védica. A Obra “O Jedi no Lótus” tem uma opinião. Satyaraja Dasa (Steven J. Rosen (1955-  ), um estudioso erudito da Sociedade Internacional para a Consciência de Krishna e escritor popular no meio do Yoga e da autor realização, investiga a conexão entre dois mundos – Star Wars e a tradição hindu. Ou, talvez mais precisamente, Star Wars e a família de tradições religiosas frequentemente designada “hindu”, como o vaishnavismo, shaivismo e shaktismo. Neste momento, você talvez esteja estranhando essa proposta. “Espere. Você se refere a Star Wars, a série imensamente popular de filmes de ficção científica, criada puramente como entretenimento, e o hinduísmo, uma antiga tradição espiritual que objetiva o desenvolvimento do amor a Deus e a obtenção da liberdade deste mundo material? Não esfregue os olhos ou se belisque. Se a fusão dessas duas coisas lhe causa estranhamento, não há nada de errado com você, pois mesmo Satyaraja, antes de escrever seu livro The Jedi in the Lotus “O Jedi no Lótus”, ainda sem tradução para o português, não era muito familiarizado com a série de filmes e não estava ciente da ligação entre ela e a tradição religiosa da Índia. Assim permaneceu até que Rajiv Malhotra (1950-  ), presidente da organização hindu Infinity Foundation, contatou-o. Malhotra era familiarizado com os muitos livros anteriores de Satyaraja sobre a temática do “hinduísmo” e sua reputação como um estudioso da tradição. Ele, então, convidou-o a documentar as muitas similaridades entre Star Wars e hinduísmo que hindus em toda parte do mundo apontavam-lhe. Satyaraja aceitou o convite. “Contudo, eu lhe expliquei que eu teria que explicar ao começo do livro que a palavra ‘hinduísmo’ é um nome inapropriado”, ele diz. “Eu disse que ficaria feliz em usar o subtítulo “Star Wars and the Hindu Tradition” (Star Wars e a Tradição Hindu) para atrair o interesse da comunidade hindu, mas meu interesse seria em demonstrar como Star Wars reflete o Sanatana Dharma, a função eterna da alma descrita no vaishnavismo, em vez da tradição hindu que surgiu mais tarde e tem um caráter sectário. Como é de sua personalidade, Satyaraja imergiu-se no trabalho, assistindo todos os seis filmes de Star Wars um após o outro e lendo todo livro com que se deparava sobre as séries. Sem demora, ele notou muitos paralelos entre Star Wars e a Tradição Védica, e inspirou-se. “Foi empolgante a escrita porque, embora houvesse livros sobre Star Wars a partir da perspectiva cristã, budista e taoista, ninguém escrevera um livro sobre os óbvios paralelos da série com a tradição hindu”, ele diz. Satyaraja explica que George Lucas (1944-  ), o bilionário cineasta americano, com fortuna avaliada em mais de US$ 5 bilhões de dólares, o criador de Star Wars, foi influenciado por Joseph Campbell (1904-1987), o famoso mitólogo, de quem era amigo. George Lucas até mesmo disse: “Não existiria Star Wars sem ele”. O “estoque favorito de mitos” de Campbell, como ele dizia, incluía o Ramayana e o Mahabharata, antigas histórias védicas sobre os Avataras de Deus escritas milhares de anos atrás. Embora nunca tenha mencionado especificamente esses livros, George Lucas disse: “Peguei da ‘mitologia hindu”. E depois do lançamento do primeiro Star Wars, em 1977, ele afirmou que sua história fora moldada, em parte, pelas ideias descritas no livro de Campbell O Herói de Mil Faces, no qual os principais exemplos do “mono mito” -  espécie de história arquetípica de herói – são tirados das histórias da Índia antiga. No The Jedi in the Lotus, Satyaraja demonstra que essa influência rendeu em Star Wars muitos paralelos surpreendentes com os épicos Védicos. Por exemplo, ele compara o enredo da trilogia original de Star Wars com o enredo do Ramayana. Em Star Wars, a princesa Léia é raptada e mantida presa por um tirano maligno, Darth Vader. Seu pedido desesperado de socorro é levado por uma misteriosa entidade não humana – o android R2-D2 – ao jovem herói Luke Skywalker. O herói, então, vai ao resgate da princesa, auxiliado por uma criatura devotada e nobre que é meio homem, meio animal, Chewbacca, natural de outro planeta. Ao final da trilogia original de Star Wars, Luke, ajudado pelo místico cavaleiro Jedi de nome Obi-Wan Kenobi e legiões de soldados ursos antropomórficos, trava uma grande guerra. Darth Vader e seu império nefasto são derrotados, a princesa retorna em segurança, e a paz e a retidão são restabelecidas. Em paralelo, no Ramayana, a princesa Sita também é raptada e mantida prisioneira do demônio Ravana. Seu pedido de socorro é levado por uma misteriosa entidade não humana – o abutre falante de nome Jatayu – ao jovem herói Rama. Rama, então, vai ao resgate da princesa, auxiliado por uma criatura devotada e nobre que é meio homem, meio animal, o homem macaco Hanuman, natural de outro planeta. Rama também trava uma guerra para resgatar Sita, liderando um exército de vanaras (ursos e macacos que têm características antropomórficas), e, finalmente, livra-a do domínio de Ravana. Com as forças do submundo derrotadas, o reinado de Rama, de verdade e retidão, se faz soberano. Satyaraja diz que George Lucas não exatamente nega todas essas similaridades, mas é muito cauto em relação a revelar suas influências. Enigmaticamente, ele disse: “Estou contando um velho mito de uma maneira nova”. Existem muitos outros paralelos entre Star Wars e a cultura védica. A relação entre Yoda e Luke é muito similar ao tradicional relacionamento guru/discípulo, e Satyaraja diz que as instruções que Yoda apresenta são “quase literalmente tiradas do Bhagavad-gita”, o antigo guia espiritual falado pelo Senhor Krishna a Arjuna. “Yoda ensina autocontrole a Luke, e a importância de restringir os sentidos”, ele explica. “Todo Jedi, Yoda diz, tem que superar o desejo e a ira. Similarmente, no Bhagavad-gita, está escrito: ‘Quando a morte chega, o sujeito tem de ser capaz de tolerar os ímpetos dos sentidos materiais e superar a força do desejo e da ira. Se alguém o faz, estará bem situado”. Yoda também descreve “a Força” como a fonte da força dos Jedis, e, de fato, a fonte de todas as habilidades. Krishna Se descreve da mesma forma no Bhagavad-gita: “Eu sou a habilidade no homem. Eu sou a força dos fortes, desprovida de paixão e desejo. De tudo o que material e espiritual, saiba por certo que Eu sou a origem e a dissolução”. A Força também é descrita como um tipo de divindade que é energia pura – ela penetra e permeia tudo que existe, e mantém a galáxia unida. Isso é similar ao Brahman, a manifestação impessoal de Deus. O aspecto pessoal da Força é destacado em O Retorno do Jedi, no qual Yoda nos diz que a Força é seu “aliado” e faz alusão ao “amor da Força”. Isso aponta para Bhagavan, Deus, haja vista que uma energia estritamente impessoal não pode comportar atributos como “amor” e “aliança”. E Yoda também fala sobre a importância de nos harmonizarmos com nosso próprio eu superior, descrevendo em essência o terceiro aspecto de Deus descrito nos Vedas: Paramatma. Além disso, a forma nobre da arte da guerra imbuída de ética e espiritualidade ensinada por Yoda aos cavaleiros Jedis é tal qual aquela dos nobres guerreiros kshatriyas dos antigos tempos védicos. Assim como Yoda ensina os Jedis a serem não agressivos porém valentes, Dronacharya, no Mahabharata, treina os heróis Pandavas para serem protetores honrados dos inocentes. É claro, alguns podem dizer que os paralelos apontados em The Jedi in the Lotus são meras coincidências. Talvez isso seja produto do exercício a que os praticantes da tradição vaishnava estão acostumados: tentar conectar tudo a Krishna. E algumas das similaridades descritas por Satyaraja parecem, sim, “forçosas” – por exemplo, seu comentário de que “o nome Yoda é próximo do termo sânscrito yuddha, que significa ‘guerra’. Ou sua empolgação quanto ao fato de que, como estudante em um filme, Luke Skywalker exibe uma cabeça raspada e um shikha, um tufo de cabelo similar ao utilizado por devotos de Krishna e que os indica como “servos do guru”. O próprio Satyaraja admite que monges em tradições chinesas e japonesas também têm esse corte de cabelo. E ele não teme dizer que muitos dos paralelos que ele aponta provavelmente são coincidências. Todavia, ele está convencido de que muitos deles são mais do que isso. “No posfácio do livro, digo que agora que o leitor considerou todos os paralelos que eu trouxe, ele pode decidir por si mesmo se são coincidência ou se realmente há cruzamentos o bastante para termos como evidente que Lucas foi influenciado pelos textos védicos”, ele explica. “Eu, como alguém que pesquisou isso meticulosamente, estou convencido, sem sombras de dúvida, que ele foi”. Apoiando a declaração de Satyaraja no prefácio de The Jedi in the Lotus está Jonathan Young Ph.D., psicólogo e curador fundador do Joseph Campbell Archives. Próximo tanto de Campbell quanto de Lucas, Young diz que o livro “revela como a sabedoria da Índia permeia os filmes de Star Wars” e “nos leva para dentro das histórias dos Jedis para documentar os profundos ensinamentos orientais que George Lucas transmite nas séries”. Independe de você compartilhar ou não da convicção de Satyaraja de que Star Wars foi influenciado pelos textos védicos, não há dúvidas de que The Jedi in the Lotus é um texto bem composto e fascinante. Em entrevista à revista Times, George Lucas disse: “Coloquei a Força no filme para tentar despertar certo tipo de espiritualidade nos jovens”. É exatamente essa abertura que Satyaraja tenta explorar: “A série Star Wars é capaz de fazer as pessoas se abrirem à ideia de que existe algo além da superfície. E eu aponto meus leitores para os textos antigos e para as religiões que se originaram a partir deles para obterem o ponto crucial da espiritualidade”. É bastante possível que The Jedi in the Lotus possa prover a base para milhares de pessoas se aprofundarem na espiritualidade oriental. Em 2001, mais de 70.000 pessoas na Austrália, 53.000 na Nova Zelândia e quase 40.000 no Reino Unido declararam em seus respectivos census que são seguidores da fé Jedi, a “religião” criada pelos filmes Star Wars. Embora se acredite que alguns disseram isso apenas para fazer uma brincadeira com o census ou como um ato de protesto contra o mesmo, existem muitos adeptos genuínos da fé Jedi. “Star Wars pode ser uma história ficcional criada para entretenimento, mas os princípios de um Jedi são princípios que qualquer um pode apreciar”, diz Satyaraja, “e eles são muito similares àqueles descritos por Krishna no Bhagavad-gita como pertencentes a um transcendentalista: ‘Aquele que não tem a mente perturbada mesmo em meio às três classes de misérias ou que não tem a mente tomada de regozijo quando há felicidade, e que é livre de apego, medo e ira, chama-se um sábio de mente estável’. Satyaraja conclui: “Espero que, pela leitura de The Jedi in the Lotus ou pela leitura desta matéria, os fãs de Star Wars sintam-se encorajados a investigar a literatura védica para conhecer ainda mais e encontrem uma descrição de um Jedi ainda mais detalhada do que encontrada nos próprios filmes”. www.voltaaosupremo.com.br. Abraço. Davi

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

FANTASMAS EXISTEM?



Hinduísmo. Por Chaitanya Charana Dasa. Fantasmas existem? Sim, seria a resposta de muitas pessoas em diferentes tempos e lugares. Algo quase universal na experiência humana são relatos de pessoas vendo, ouvindo ou percebendo de alguma maneira seres descorporificados que parecem agir de maneiras misteriosas e assustadoras. Em nossos tempos científicos, muitos de nós tendem a rejeitar a ideia da existência de fantasmas, tendo-a como fantasia folclórica, carente de evidências científicas. Entretanto, muitos cientistas eminentes consideram a questão dos fantasmas com grande seriedade. Proeminente entre os cientistas que acreditam em fantasmas está o cientistas naturalista inglês Alfred Russel Wallace (1823-1913) que foi um dos fundadores da teoria da evolução. Em sua autobiografia, ele narra como evidências o forçaram a abandonar seu preconceito quanto à existência de fantasmas: “A maioria das pessoas de hoje cresceu com a crença de que milagres, fantasmas e toda a série de fenômenos estranhos aqui descritos não podem existir, que são contrários às leis da natureza, que são superstições de tempos passados e que são, portanto, ou imposições ou ilusões, necessariamente. Não existe espaço na tessitura (contextura) de seu pensamento em que se possa encaixar esses fatos. Quando comecei a questionar isso, o mesmo acontecia comigo. Os fatos não encontravam espaço na estrutura de pensamento que eu tinha erigido até então. Todos os meus preconceitos, todo o meu conhecimento, toda a minha crença na supremacia da ciência e da lei natural se forçavam sobre mim sem possibilidade de eu escapar delas, ainda. Espíritos era a última coisa em que eu poderia acreditar. Toda outra possível solução foi experimentada, e rejeitada. Não pedimos aos nossos leitores que acreditem, mas que duvidem de sua infalibilidade em analisar a questão; pedimos que indaguem e façam experimentos com paciência, em vez de tirar alguma conclusão precipitada”. Outro cientista eminente que se convenceu diante de evidências foi o bem reputado psicólogo norte-americano William James (1842-1910): “Então, quando me volto ao restante das evidências, no tocante a fantasmas e coisas similares, não consigo mais carregar comigo algum tendência irreversivelmente negativo da mente de ‘rigor científico’, com seus pressupostos quanto a como deve ser a verdadeira ordem da natureza.” (William James on Psychical Research, de Gardner e Ballou Murphy). As evidências hoje têm mais peso do que nunca antes, visto que muitos livros bem documentados relatam evidências acumuladas por meio de rigorosos procedimentos científicos, conduzidos por muitos pesquisadores de para normalidade. Paralela a essas evidências significativas, e possivelmente abastecida por isso, temos uma crença pública substancial na existência de fantasmas. Uma pesquisa Gallup conduzida em 1990 demonstrou que: 29 por cento dos estadunidenses acreditam em fantasmas assombrando casas, e 1 em cada 10 estadunidenses alegam terem visto ou terem estado na presença de um fantasma. Apesar de cada vez mais evidências documentais e cada vez maior aceitação popular, o conceito de fantasmas permanece inaceitável para a maioria dos cientistas. Uma razão primária para isso é que a ciência materialista moderna não possui uma estrutura conceitual dentro da qual possa considerar a existência de fantasmas. Mas essa limitação não é intrínseca à ciência per se, embora possa ser essencial para a ciência materialista. Não há razão, todavia, para se presumir que toda ciência tenha que ser materialista, pois não há evidência científica de que toda a realidade exista apenas no nível material. Para quem possui uma mente aberta e aventureira o bastante para explorar visões de um mundo não-materialista, a sabedoria védica oferece uma estrutura explicativa sistemática para a compreensão da existência de fantasmas. Três Níveis de Ser. Para auxiliar no nosso entendimento dos fantasmas, precisamos, primeiramente, nos familiarizar com os três níveis de existência, explicados na sabedoria védica. Esses três níveis são os seguintes:1. O nível material grosseiro: Este nível abrange a realidade física que podemos perceber com os nossos sentidos e com instrumentos que expandem a capacidade dos nossos sentidos, como microscópios. Cientistas materialistas se focam neste nível material grosseiro principalmente, se não exclusivamente. 2. O nível material sutil: Este nível, embora material, está além da percepção dos nossos sentidos e abrange os sentidos sutis, a mente, a inteligência e o falso ego. De maneira simplificada, iremos nos referir a todo esse nível, algumas vezes, como o nível da mente, ou o nível mental. 3. O nível espiritual: A alma, que é a fonte da consciência, existe neste nível imaterial. Pertinente para nossa discussão dos fantasmas é a diferença entre a mente e a alma. A mente, embora invisível, não é espiritual; é material, apesar de feita de uma substância material sutil, o que a torna invisível aos nossos sentidos grosseiros. A mente, sendo material, não é consciente; apenas a alma é consciente. A mente pertence ao nível sutil, que fica entre o nível espiritual e o nível material. A partir dessa posição intermediária, a mente age como o conduto da consciência da alma, permitindo-a interagir com o corpo grosseiro. A mente tem a função de operar como um depósito de impressões adquiridas pela interação com o nível material grosseiro. Essas impressões abarcam, entre outras coisas, memórias do passado e desejos para o futuro. Com esse fundamento de ontologia védica básica, entendamos, agora, como e por que alguns indivíduos se tornam fantasmas. DESCORPORIFICADOS E DESAFORTUNADOS. No momento da morte, a alma, acompanhada pelo corpo sutil, deixa o corpo grosseiro. Normalmente, a alma obtém um novo corpo sutil, de acordo com seu karma. Em casos excepcionais, entretanto, quando a alma não obtém um próximo corpo grosseiro, ela permanece em um estado descorporificado. As almas vivendo essa existência descorporificada são chamadas de “fantasmas”. É claro que fantasmas não são completamente descorporificados; ainda têm um corpo sutil. Contudo, porque no linguajar não técnico, a palavra “corpo” denota um corpo grosseiro, o estado de existência sem esse corpo é chamado de “descorporificado”. Por que os fantasmas não obtêm um corpo físico? SUICÍDIO: Aqueles que destroem seu corpo físico por meio de suicídio, isto é, aqueles que destroem o corpo prematuramente, antes do tempo estabelecido pelo seu destino cármico para receber um novo corpo, sentenciam-se a uma existência descorporificada como fantasmas até serem alocados em um novo corpo físico. Srila Swami Prabhupada (1896-1977) declara: “Fantasmas são destituídos de um corpo físico por causa de seus atos pecaminosos de grande gravidade, como o suicídio.” Assim, pessoas frustradas que imaginam que a morte é o fim da existência e, portanto, cometem suicídio para se livrarem de sofrimentos dão consigo mesmas em uma existência ainda mais miserável como um fantasma. APEGO EXTREMO: Aqueles que morrem com extremo apego ao corpo, ao ambiente ou às posses físicas também podem se tornar fantasmas. Durante a morte de alguém nessa condição de apego, a obsessão excessiva e intensa da mente com o passado pode impedir que a alma vá adiante e, em consequência disso, fique descorporificada. Srila Prabhupada (1896-1977) explica: “Quem é muito pecaminoso e apegado à sua família, casa, vila ou país não recebe um corpo grosseiro feito de elementos materiais, senão que permanece num corpo sutil, composto de mente, ego e inteligência. Aqueles que vivem em tais corpos sutis se chamam fantasmas”. UM ESTADO FRUSTRANTE E ATERRADOR. A condição anormal de estar sem corpo é agonizante para os próprios fantasmas e aterradora para os demais. Vejamos o porquê: AGONIZANTE PARA ELES: Os fantasmas possuem uma mente, tal qual a nossa. A mente deles, como a nossa, está cheia de memórias e desejos, os quais eles desenvolveram em sua existência corporificada anterior. Contudo, diferente de nós, eles não têm um corpo grosseiro para a realização desses desejos. Assim, a memória deles pode estimulá-los, por exemplo, a desejar um doce favorito. E, como o corpo sutil contém sentidos sutis, talvez até mesmo percebam outros – pessoas corporificadas – saboreando esse doce, o que agrava o seu desejo. Todavia, como os fantasmas não possuem uma língua física para desfrutar pessoalmente desse doce, seu desejo permanece eternamente sem ser satisfeito. A situação deles é como aquela de alguém que tem que seguir uma dieta estrita enquanto vê outros se banquetearem. Para o doente, essa aflição talvez dure por alguns dias apenas, mas, para os fantasmas, isso se alonga por toda a duração de sua existência fantasmagórica. Como se isso não bastasse, essa frustração se estende a quase todo tipo de desejo que têm. Não é de surpreender que eles considerem agonizante sua existência. Srila Prabhupada resume a causa da agonia deles quando declara: “Os fantasmas, por não possuírem um corpo, sofrem terrivelmente, não sendo capazes de satisfazer seus sentidos”. ATERRADOR PARA OS DEMAIS. Muitas pessoas têm muito medo de fantasmas porque lhes é algo incompreensível – assustadora e misteriosamente incompreensível. Ficam arrepiadas apenas por imaginar portas se abrindo de repente sem ninguém nas proximidades ou barulhos estranhos vindo de uma área sem uma fonte evidente para o som. Poucas coisas afastam mais possíveis compradores de uma casa do que rumores – verdadeiros ou falsos – de que a casa é assombrada. Para muitos, a mera possibilidade de se encontrarem com um fantasma é assustadora o bastante, mas a ideia de ser possuído é muito apavorante. Possessão se refere ao fenômeno desconcertante em que um fantasma entra no corpo grosseiro de alguém, assume o controle desse corpo e o utiliza como um instrumento para realizar seus desejos pessoais. O indivíduo assim possuído frequentemente fala e age de maneiras que diferem marcadamente de sua maneira habitual de falar e se comportar. Durante a possessão, o possuído exibe uma personalidade diferente de sua personalidade habitual porque essa personalidade habitual foi suprimida pela personalidade dominante do fantasma. A alteração de personalidade frequentemente deixa perplexos e perturbados os parentes da pessoa possuída. Anedotas envolvendo essas possessões fazem crescer o medo de fantasmas na mente do público em geral. EVAPORANDO A NÉVOA DE MISTÉRIO. A sabedoria védica consegue evaporar essa névoa de mistério em torno dos fantasmas. Ela desmistifica a natureza da existência fantasmagórica e nos ajuda a ver os fantasmas como indivíduos mais em sofrimento do que indivíduos malévolos. É claro que alguns fantasmas podem ser maus, especialmente com quem fez mal a eles em sua existência corporificada passada. Entretanto, os fantasmas, em geral, são, antes de tudo, indivíduos que estão sofrendo por causa dos desejos não realizados, um problema endêmico de sua existência descorporificada. A pressão dessas frustrações frequentemente os volta à violência e, algumas vezes, à maldade sistemática. A visão védica da realidade tríplice – matéria grosseira, matéria sutil e espírito – nos ajuda a entender o comportamento aparentemente misterioso dos fantasmas, que desafiam as leis da ciência materialista. Essas leis da ciência materialista foram postuladas principalmente com base em observar e analisar o comportamento da matéria grosseira. Como a mente é um elemento material sutil, pode atuar sobre o nível material grosseiro de maneiras que não são limitadas a essas leis da ciência materialista. Não é de espantar, portanto, que os fantasmas, existindo como existem no plano mental, possam atuar de formas que confundem e perturbam as pessoas que foram ensinadas a acreditar que tudo na natureza segue as leis da ciência materialista. O poder fantástico dos fantasmas é indicado no Srimad-Bhagavatam (5.5.21-22), que aponta os fantasmas como superiores aos humanos na hierarquia universal de seres vivos: “Superiores aos seres humanos são os fantasmas, pois não possuem corpo material”. Os textos védicos explicam que os fantasmas acomodam-se em condições de ignorância e ilusão. Assim, quem se mantém habitualmente em condições dessa natureza, como a alteração da consciência por meio de álcool e outras drogas, tem mais chances de ter uma mente fraca que facilite ataques e possessões por parte de fantasmas. Srila Prabhupada declara: “Ser assombrado é algo que acontece em um estado de existência impuro”. Podemos nos tornar praticamente invulneráveis a esses ataques incorpóreos ao adotarmos um modo de vida iluminado. A sabedoria védica recomenda esse modo de vida primeiramente para o fim do avanço espiritual, que é a meta mais elevada da vida. Apesar disso, esse modo de vida que se afasta de atividades autodestrutivas, como o uso de drogas, oferece o benefício adicional de nos proteger de ataques de criaturas fantasmagóricas. Para lidar com ataques de fantasmas, a sabedoria védica nos equipa não apenas com insights preventivos, mas também remediadores. Atividades devocionais, como sequências de mantras sagrados, podem exorcizar tanto lugares que estejam assombrados quanto pessoas que estejam possuídas. Srila Prabhupada endossa isso em uma carta enviada em resposta aos questionamentos de um discípulo: “A melhor maneira de removê-los [fantasmas] é cantar Hare Krishna muito alto e fazer um kirtana jubiloso até que vão embora. Na Inglaterra, na casa do Sr. John Lennon, onde fiquei em 1969, havia um fantasma. Contudo, tão logo os devotos começaram a cantar muito alto, ele se foi sem demora.” (Carta a Damodara, Delhi, 3 de dezembro de 1971). INDO ALÉM DE TODAS AS MISÉRIAS. É importante salientar que, embora a sabedoria védica reconheça a existência de fantasmas, ela não é caprichosa em colocar neles toda culpa de acontecimentos estranhos. Srila Prabhupada escreveu em uma carta a um discípulo que perguntou se seus problemas mentais eram causados por fantasmas: “Com relação às ofensas que você está ouvindo, não se trata de fantasmas, como você diz, mas são criações da sua mente. A mente é realmente repulsiva, como você disse. Portanto, Krishna diz que o transcendentalista esforçado tem que primeiro controlar a mente, após o que, pelo controle da mente, terá paz.” (Carta a Dhristaketu, Bombaim, 1 de novembro de 1974). Disciplinar a mente por meio da prática da consciência de Krishna é a maneira mais efetiva de lidar com todos os problemas da existência material – tornar-se um fantasma, ser assombrado por um fantasma ou ser atormentado por perturbações da mente que alguns poderiam atribuir a fantasmas, ou todos os outros problemas que são, em última instância, as reações cármicas para os erros impelidos pela mente descontrolada. É por isso que, embora explique a existência de fantasmas e confirme a potência exorcista do santo nome, a sabedoria védica não dá muita importância para nenhuma das duas. Ela declara que a vida humana se destina a um propósito muito mais importante do que se preocupar com fantasmas, seja na forma de fascínio mórbido, medo paranoico ou negação dogmática. A vida humana carrega a potência gloriosa de nos outorgar a imortalidade caso utilizemos esta vida para redirecionar nosso amor do efêmero para o eterno, da matéria para Krishna. Devolver-nos nosso direito perdido à imortalidade como seres espirituais é o tesouro supremo da sabedoria védica. A explicação precisa e coerente da sabedoria védica de fenômenos como assombrações – um fenômeno que confunde a ciência materialista e a impele a viver em eterna negação – pode servir como um combustível para nossa fé conforme exploramos os insights mais espirituais e desfrutamos das dádivas devocionais dessa fonte de conhecimento perene. www.voltaaosupremo.com.br. Abraço. Davi.