sexta-feira, 28 de junho de 2019

OS SETE DHARMAS.


Hinduísmo – Hare Krishna. www.voltaaosupremo.com.br Texto de Giridari Das. OS SETE DHARMAS. Desde nossas necessidades fisiológicas até nossa relação com Deus, muitos detalhes formam nossa e darmos a devida atenção a tudo que nos constitui é uma condição fundamental para podermos nos realizar plenamente. Dharma é um conceito muito rico, e a palavra tem muitos significados, mas meu foco será no dharma como aquilo que precisa ser feito – essência e dever. O dever pode ser algo imposto. A essência não pode ser imposta. Dharma, portanto, é aquele dever que nasce de quem você realmente é, que nasce de sua natureza. Não é uma imposição externa ou social. É o que você precisa fazer, em qualquer dado momento, para ser a melhor pessoa que você pode ser. É fazer a coisa ja incluído no conceito, e pode-se reduzir isso a uma lista do que se deve evitar. O dharma é fluídico, vivo e sensível aos diferentes aspectos de sua vicerta na hora certa. Ser dhármico é mais do que simplesmente fazer o que é natureza bom ou evitar uma conduta danosa ou violenta, embora isso certamente esteda. Grandes mudanças no seu dharma podem ocorrer, literalmente, de um segundo para o outro. Uma maneira de entender o dharma é refrasear os clássicos dizeres: “Não pergunte o que o mundo pode fazer por você, mas pergunte o que você pode fazer pelo mundo”. Dharma é o princípio orientador da vida, a cada momento lhe demonstrando o que você deve fazer, respondendo suas dúvidas em relação a que curso seguir e simplificando as ações da vida. Dharma é sua integridade na ação e a verdadeira expressão do seu ser. Você encontrará seu lugar no mundo uma vez que você se afine com seu dharma. O dharma é uma parte integral da natureza. Não é uma construção psicológica ou um conceito religioso. O nível de fidelidade que você tem ao seu dharma afetará diretamente como você se sente diariamente. Ser fiel a si mesmo significa agir de acordo com seu dharma. Assim, quanto mais você pode se afinar com seu dharma, mais você pode agir com base no seu dharma e mais você se sentirá satisfeito, completo, real e feliz. Quanto mais dhármico for o seu comportamento, mais você se sentirá satisfeito com quem você é agora. Por fim, quanto mais dhármica for a sua vida, mais você poderá recapitulá-la com alegria e com um sentimento de realização. Estar na Zona. MINDFULNEES (ATENÇÃO PLENA) e dharma andam lado a lado. Dharma é algo tão natural que o que você precisa para estar cada vez mais afinada com ele é remover o que não é natural, em especial egoísmo, medo e cobiça. Outra maneira de dizer o mesmo é que, se você for vítima de sua lista de felicidades condicionais, ou simplesmente carecer de consciência suficiente de suas ações, você não conseguirá ver o seu dharma. O foco perfeito no aqui e agora é centrar-se no seu dharma e colocar toda a sua atenção em realizar seu dharma no máximo de sua capacidade. Isso, por si só, trará uma felicidade imediata e sustentável. Você já experimentou isso muitas e muitas vezes. Você talvez se lembre de muitos momentos em que você se focou totalmente em fazer algo que era seu dever, sem qualquer consideração em relação a si mesmo ou a recompensas futuras ou mesmo a perigos. Pais, em especial mães com bebês, experimentam isso com frequência. Essa experiência é chamada de “estar na zona”. A psicologia positiva (o ramo da psicologia que estuda o que torna as pessoas felizes) aponta “estar na zona” como um dos pilares primários de uma vida feliz. Estar focado na ação implica, necessariamente, não estar focado nos sacrifícios ou benefícios materiais que a ação possa suscitar no futuro. Estes dois são diretamente opostos: focar-se no seu dharma aqui e agora, e ansiar por resultados futuros. Este ponto é tão importante que Krishna não o menciona menos do que dez vezes na Bhagavad-gita. Esta mudança de paradigma é a chave para um grande salto de bem-estar. A Mudança de Paradigma: Vida versos Fantasia. A MENTE DESTREINADA frequentemente se esforça por encontrar soluções externas para a vida. Em um processo interminável, a pessoa constantemente busca ajustar a realidade externa para adequá-la a seus desejos. Listas de felicidades condicionais são sempre atualizadas. A mente destreinada, portanto, passa muito tempo no futuro, no que chamo de “mundo de fantasia”, sonhando acordada com o que parece um futuro melhor. Basicamente, esses desejos envolvem mudar o futuro de três maneiras: 1) obtendo coisas (novo carro, telefone, casa, etc.), 2) fazendo pessoas cooperarem com seus planos (como encontrando um esposo ou esposa, ou esperando que o patrão trate você melhor), e 3) tendo a esperança de que situações favoráveis surgirão (como obter um emprego, ficar em forma ou fechar um contrato). É frequente que nada significativo aconteça quando alguém atinge uma dessas metas. Desejos, uma vez realizados, frequentemente satisfazem muito pouco, e logo outros desejos começam a exercer pressão e assumirem o centro do palco da mente. Viver assim é um dos principais componentes para se ter uma vida muito ruim. Quando a mente está no futuro, desejando resultados futuros, ansiedades em relação a consequências futuras são inevitáveis. Nessa situação, igualmente inevitável é a frustração com a vida como ela é hoje, a ira quando surgem obstáculos que aparentemente adiam a realização desses desejos, e o medo de que tudo termine muito mal. Sejamos honestos: todos nós já tentamos viver assim, e simplesmente não funciona. Nunca funcionou. Esse não é um caminho para se obter paz, satisfação e felicidade. Então, a mudança de paradigma é necessária. Em vez de focar no futuro, na crença ilusória de que alguma combinação de realidade externa (estas coisas, com aquelas pessoas, naquela situação) será a chave para a sua felicidade, o foco está em simplesmente viver bem a vida, aqui e agora, centrado no seu dharma. Vida vs. fantasia. A vida está acontecendo a todo momento. É um fluxo, uma constante corrente de eventos. O desafio é estar completamente presente conforme acontece. A felicidade surge de cumprir o seu dharma bem, aqui e agora, indo de um dharma a outro, ao longo do seu dia – sendo a melhor pessoa que você pode ser hoje, neste exato momento, sincero consigo. É simples assim. Não há necessidade (e, francamente, pouquíssima utilidade) em ficar sonhando acordado com um futuro. A realidade é mais bela do que qualquer sonho, se você simplesmente aprender a acessar isso por completo. Eventos futuros se descortinarão sob a força todo-poderosa do tempo. A vida, em sua maior parte, acontece de maneira muito diferente do que qualquer coisa que você imaginou anteriormente. E isso não é algo ruim, nem algo bom. Apenas é. Trata-se da realidade. Quanto mais conseguimos nos sintonizar com a realidade, mais felizes ficamos. Em vez de imaginar que certa combinação de coisas, pessoas e situações trará paz e felicidade para você no futuro, você deve buscar paz e felicidade na vida como ela é, na bênção maravilhosa de estar ativo em seu dharma, de estar vivo, agora mesmo. Os 7 Dharmas. LISTAREI, AGORA, SETE categorias básicas de dharma para ajudar em um melhor entendimento do que é o dharma e como é fácil identificá-lo. É claro que há sutilezas, mas estas sete categorias maiores servem como forte diretriz. 1. DHARMA VOCACIONAL. O primeiro dharma, eu costumo dizer, é o mais difícil de todos, pelo menos para a maior parte das pessoas. O primeiro dharma é o chamado de sua vida, sua vocação. Nasce de sua natureza psicofísica. Algumas pessoas têm a bênção de conhecer sua vocação ainda com pouca idade. Já vi isso pessoalmente no caso de alguns dançarinos, artistas plásticos e atores com que me encontrei. São comuns histórias de atletas que se destacaram tanto que seus parentes e professores naturalmente os orientaram para se tornarem profissionais do esporte. Há outros que têm um QI tão aguçado que naturalmente gravitam em torno de trabalhos acadêmicos e científicos. Para a maioria, isso pode ser uma batalha. A razão para isso ser uma batalha é que a sociedade ensina às pessoas desde tenra idade que o que elas realmente precisam é dinheiro, com metas secundárias de estabilidade e respeito. Em outras palavras, quase todos aprendem, desde o nascimento, a escolher o paradigma fantasia. Em vez de ensinarem as pessoas a fazerem aquilo em que são boas e ajudarem-nas a desenvolverem suas inclinações e talentos únicos, o mais frequente é que os pais, a cultura e o sistema escolar tratem as pessoas como folhas em branco, dando-lhes uma educação que supostamente serve para todos e os encorajando a fazer tanto dinheiro quanto possível. Então, aqui estão algumas dicas para ajudar você a encontrar sua vocação. Lembre-se de que nunca é tarde demais.

·  Quando estiver meditando sobre o que você gostaria de fazer, remova de sua equação qualquer fator externo. A questão é quem você é, e não preocupações práticas.

·  Esqueça o dinheiro. Não pense: “Ah! Não posso trabalhar com arte porque isso não pagará minhas contas”, “Não posso cursar Filosofia porque que tipo de emprego eu conseguiria?” Remova tais considerações da mente. Uma maneira de fazer isso é pensar: “Se eu ganhasse na loteria, eu gostaria de trabalhar com (…)”.

·  Esqueça a pressão social e o orgulho. Não se trata do que seus pais querem que você faça. Se você não se atrai pela vida militar, não faz diferença se existem cinco gerações contínuas de militares na sua família. Não se trata de status social também. Talvez a sociedade não aprecie um porteiro ou garçom, mas são profissões perfeitamente nobres. Quem possui a natureza psicofísica para o ofício de porteiro e está fazendo isso está muito melhor situado do que alguém exercendo a profissão de advogado apesar de ter a natureza psicofísica, na verdade, para a ocupação de musicista. O porteiro pode facilmente encontrar paz e felicidade em seu trabalho, enquanto o advogado sempre se sentirá frustrado e não realizado.

·  Não pense apenas no que você gostaria de fazer. Você talvez goste de fazer muitas coisas. Em vez disso, pense no que é aquela atividade específica que você não consegue ficar sem. Tente pensar qual é o tipo dominante de atividade para a qual você é naturalmente atraído.

·  Uma nota para professores: professores têm uma vocação dupla. Primeiramente, têm de aceitar que nasceram para ensinar e, em seguida, têm que encontrar a temática de ensino para a qual têm maior inclinação.

·  Encontrar sua vocação envolve quem você é agora e é algo que está ali para ser descoberto, de modo que há ferramentas e processos que você pode usar para ajudá-lo quanto a isso, incluindo: testes vocacionais, conversar com pessoas que são próximas a você e até mesmo astrologia védica. O melhor a fazer é apenas olhar seriamente para dentro do próprio coração e sentir sua natureza. Passe algum tempo sozinho, em silêncio, e reflita demoradamente. Seja corajoso e esteja disposto a aceitar sua verdadeira natureza. Não se traia. Não deixe o medo do futuro parar você. Encontrar sua natureza é essencial. Passar suas horas de trabalho fazendo algo não adequado à sua natureza psicofísica desgastará suas chances de felicidade. É uma ofensa à sua pessoa. É como manter seu verdadeiro eu trancado em algum lugar distante. 2.DHARMA NATURAL. Krishna explica na Bhagavad-gita que, entre outras coisas, um yogi tem que satisfazer três necessidades naturais: 1) dormir, 2) comer e 3) recrear. Chamo isso de nosso “dharma natural”, porque se tratam de necessidades naturais centrais do corpo e da mente. Krishna enfatiza que não se deve comer ou dormir em excesso nem comer ou dormir menos do que o necessário. Quanto é “em excesso”? Bem, o que seja em excesso para você. Somos todos diferentes. E, em diferentes momentos de sua vida, o que é demais ou insuficiente para você irá variar. Portanto, você tem que encontrar o seu equilíbrio. Viver o seu dharma é, precisamente, ter equilíbrio, sabendo quando mudar de um dharma para outro, em seu limitado dia de 24 horas. O dharma natural significa que você tem que levar a sério, como um dever, como parte de sua essência, os atos simples de comer, dormir e recrear. Você tem que reservar um tempo para comer, para valorizar esse momento. Comer não deve ser empurrar comida para dentro da boca enquanto se faz um milhão de outras coisas. Não deve ser algo corrido. É algo que deve ser tratado como um dever sagrado. Um tempo para pensar sobre suas escolhas alimentares, sobre o que você está colocando em sua boca. É o momento crucial do dia em que você está reabastecendo o seu corpo. “Esta refeição é compatível com quem eu sou? É realmente boa para mim? É boa para o planeta?” São escolhas sérias, com consequências sérias. Em um mundo onde as pessoas estão se matando e destruindo o planeta com más escolhas alimentares, é fácil ver como tomarmos o ato de comer como um dos dharmas fundamentais pode ser muito importante. Dormir não é uma perda de tempo. É um componente essencial para sua saúde mental e física. Falta de sono pode ter um impacto negativo tremendo em sua saúde, e até mesmo matar, no caso de dormir ao volante ou em outra situação similar. É seu dever fazer todos os arranjos necessários para dormir bem e dormir o bastante. Dormir não deve ser algo que você faz quando não é mais capaz de ficar de pé e algo que você interrompe porque é forçado a se levantar para trabalhar. Como dormir o bastante é seu dharma, é seu dever, você tem que organizar sua vida de forma que essa necessidade mental e corpórea crucial seja acomodada. Ver o sono como seu dharma significa também que, quando você vai para a cama, não deve estar pensando em outros dharmas, como o trabalho. Você deve simplesmente dormir. Limpe sua mente e esteja no aqui e agora de simplesmente dormir. Ver a recreação como um dos seus dharmas significa que você pode dispersar todo sentimento de culpa quando você consegue tempo para se divertir ou sair de férias. Isso também significa que você deve reservar um tempo para se divertir e sair de férias. Alguém que trabalha demais e não se diverte nada acaba se tornando alguém muito carrancudo… e pouco dhármico também. Eu, pessoalmente, acho fascinante e confortador que um texto clássico como a Bhagavad-gita, descrevendo o que é preciso para se iluminar, mencione a importância da recreação. 3. Dharma Ocupacional. Independente de se você encontrou sua verdadeira natureza, quando você aceita um emprego, gerencia seu próprio negócio ou se matricula em um programa de estudo de horário integral, você aceitou um grande dharma. Chamo isso de “dharma ocupacional”. É, em geral, o que mais exige horas do seu dia, em virtude do que é muito importante que você veja seu trabalho ou estudo como um dharma, e não como um fardo ou imposição externa. Porque é um dharma, você não deve aceitar um trabalho que cause dor e destruição desumana. A expressão de sua vida, por exemplo, não pode ser ajudar a causar câncer e vícios em milhões de pessoas, roubar ou utilizar indevidamente recursos públicos, destruir a economia, tirar o dinheiro de outras pessoas através de mentiras, matar animais inocentes ou contribuir para a destruição do planeta. Não pode haver felicidade nisso, e nenhum argumento deve conseguir convencer você da necessidade de aceitar uma ocupação tão degradante como essas exemplificadas. Ver seu trabalho como dharma significa aplicar o mesmo princípio de mindfulness para as muitas ações que o circundam. Isso quer dizer que você jamais deve ver seu trabalho ou estudo como um meio para um fim. O trabalho jamais deve se destinar a ganhar dinheiro, e seus estudos jamais devem ter por finalidade conseguir um diploma para conseguir um emprego. Esse tipo de pensamento torturará você e tornará seus dias longos e sofridos. Em vez disso, cada atividade para a qual você é convocado deve ser feita tão bem quanto você seja capaz, com tanto de sua atenção dedicada a isso quanto possível. O foco deve ser a ação em si, não o dia como um todo, nem a carreira, nem o salário ou outra meta no futuro.Se você está se sentindo estressado no seu trabalho, é um sinal bem claro de que sua mente está fora de controle. Estresse é um indicador de que você ou está ansiando por algum futuro positivo ou está temendo algum acontecimento negativo. Em outras palavras, sua mente o está arrastando para o futuro e o enlouquecendo. Então, traga seu foco de volta para uma ação por vez. Se é hora de se sentar em uma reunião ou sala de aula, esteja ali, presente, sendo a melhor pessoa que você pode ser naquele momento. Se é hora de preparar uma apresentação, para vender papel ou qualquer outra coisa, então faça isso somente, faça o melhor que pode fazer e não fique se desgastando com pensamentos do que virá depois, não fique percorrendo as postagens de redes sociais ou respondendo a e-mails. Mantenha sua completa atenção em uma coisa de cada vez. 4. DHARMA PESSOAL. Toda relação pessoal cria uma demanda dhármica. A qualidade e o tipo de relação determina “o peso” das demandas dhármicas ou, em outras palavras, quanto do seu tempo você tem que investir na relação e o quanto de responsabilidade existe no seu papel nesse relacionamento. Mães e pais têm a maior demanda de todas. O dharma de criar os filhos é seríssimo. Donos de animais de estimação também assumem um dharma similar ao de maternidade e paternidade em relação aos seus companheiros animais. O dharma de ser filho ou filha é o segundo mais importante, mas não se compara ao de ser mãe e pai. Amigos muito próximos também criam laços dhármicos. Existem variados níveis de responsabilidade com outros membros familiares, irmãos, vizinhos, colegas de trabalho, etc. Ver toda relação pessoal como dharma, como parte de uma definição de quem somos, como um dever sagrado, significa que você tem que ir além do egoísmo e da preguiça. Você tem que estar ciente dessa relação e sentir o que é preciso para honrá-la, para apreciá-la. Também significa que você quer estar completamente presente quando lida com a pessoa. Se é o momento de dar um telefonema para exercitar seu dharma pessoal com sua esposa, esteja completamente presente, exercendo tanta conexão e tanto amor quanto você seja capaz. Se é hora de passar algum tempo brincando e educando seus filhos, esteja ali por completo. Se entregue a isso. Não deixe sua mente arrastar você para pensamentos referentes ao trabalho. Não dê atenção para sua mente lhe dizendo que, em vez de brincar com um carrinho barulhento, ela preferiria estar malhando na academia ou lendo um livro em um ambiente tranquilo. O dharma pessoal possui uma importância enorme. Se você não der tempo e energia suficientes para seus relacionamentos pessoais, você está fadado a sofrer, independente do que mais você acredite estar obtendo. Você tem que ter a sensibilidade de perceber o que cada relacionamento exige de você e estar pronto para cumprir essa responsabilidade com plena atenção, dando o seu melhor. 5.DHARMA COMUNITÁRIO. Você é parte de uma comunidade, residente de uma cidade e estado, e cidadão de um país. Isso significa que você tem benefícios e responsabilidades compartilhados. Espera-se que o governo providencie estradas, iluminação pública, eletricidade, água, proteção contra criminosos e invasores estrangeiros, etc., e, em troca, pelo menos, você tem que pagar seus impostos e obedecer às leis. Ainda melhor, você deve ver seu dharma comunitário como um chamado para tornar melhor a vida daqueles que vivem em seu entorno. Você pode ajudar com ideias ou com serviço voluntário? Você pode se engajar na exigência de melhores direitos civis, melhores serviços públicos? Você pode ajudar aprimorando a escola dos seus filhos? Não podemos, todos nós, pensar que isso é problema dos outros. Onde há um crescimento dessa tendência de pensar que outra pessoa deveria se preocupar com o bem público, ali encontraremos políticos corruptos e péssimos serviços governamentais. Assim, de um lado, devemos ser ao menos membros conscientes de nossa comunidade, pagando nossos tributos e seguindo as leis, e, por outro lado, devemos participar ativamente no aprimoramento da sociedade. 6.DHARMA UNIVERSAL. O dharma comunitário possui um foco mais imediato na comunidade e no país em que você vive. Contudo, estamos todos interconectados. Não apenas compartilhamos de uma conexão natural com aqueles da nossa espécie, mas também uma conexão com todos os habitantes do planeta Terra. Essa conexão nos define, é parte de quem somos, diante do que é parte do nosso dharma como um todo. Chamo isso de nosso “dharma universal”. Conforme você evolui, naturalmente você se torna mais e mais afinado com o mundo ao seu redor, sensível ao que está acontecendo. Uma pessoa espiritualmente madura não é indiferente à destruição do planeta e ao sofrimento de outros, e assume a parte que lhe cabe para tornar o mundo um lugar melhor. Isso se chama compaixão. Alguns exemplos de prática desse dharma universal são: 1) fazer o melhor para ser ecológico, 2) ser um consumidor consciente, 3) fazer sua parte em uma emergência, acidente ou desastre natural e 4) buscar saber se você pode ajudar quando há sofrimento em grande escala em nações distantes. 7.DHARMA ESPIRITUAL. Por último, mas certamente não menos importante, está a categoria do dharma espiritual. Seu eu espiritual é a definição última de quem você é, sua essência no sentido último da palavra. Mesmo se, neste ponto, você não “assina embaixo” da ideia de ser mais do que este corpo, você ainda pode compreender o dharma espiritual como seu dever de ser a melhor pessoa possível, de ser completamente justo consigo mesmo. Com o tempo, uma vez que você entenda que você só pode se definir perfeitamente quando entenda sua relação com Deus, então, como parte de sua essência mais íntima, como a definição central de si mesmo, você gozará alegremente dessa conexão, chamada devoção, como a parte mais profunda do seu dharma espiritual. Exercitar seu dharma espiritual é assumir seriamente a responsabilidade de aprimorar-se e de conhecer-se. Mudança de Dharma e Mindfulness.  Foco no dharma é uma ótima maneira de checar se você está praticando o mindfulness; em outras palavras, se você está realmente focado no aqui e agora. Por exemplo, você está se divertindo com um passeio de bicicleta e um pneu estoura, ou você está trabalhando e recebe uma ligação e toma conhecimento de uma emergência familiar com a qual você tem que lidar. A tendência natural é você se perturbar. Quando isso acontece, simplesmente pare. Respire fundo algumas vezes. O que acabou de acontecer foi uma mudança de dharma. Você estava contente no seu dharma de recreação, andando de bicicleta, então, de repente, isso mudou para o dharma de arrumar a bicicleta. Você estava absorto no seu dharma ocupacional, trabalhando no computador, mas, então, você foi forçado a interromper isso para lidar com um dharma pessoal. Não se perturbe. Apenas entenda que aconteceu uma mudança de dharma. Se fixe no novo dharma, fixe sua mente nele, aqui e agora. Viva bem o novo momento. Não resista ao fluxo da vida e às demandas dhármicas sempre em mutação, que podem vir em momentos muito inesperados. Antes de fazer qualquer coisa, certifique-se, primeiramente, que é seu dharma fazer isso. Algumas vezes, surgem em nossa mente ideias sem sentido que é melhor não executarmos. Outras vezes, alguém talvez queira pressioná-lo a fazer algo que é contra o seu dharma. Então, primeiro cheque e, então, seja firme o bastante para dizer não a você mesmo ou a outros caso a ação em questão não seja o seu dharma. Se é, entretanto, se fixe nisso, apesar de algum apego por fazer outra coisa, preguiça ou mesmo medo. Se é o seu dever, seu dharma, simplesmente faça, com sua mente inteiramente centrada nisso. Não permita que sua mente torture você. Não faça uma coisa desejando fazer outra. Se você tem que fazer algo, se é parte do seu dharma, realmente se entregue a isso, mesmo caso não estivesse nos seus planos ou mesmo caso não se sinta apto para isso. O resultado será que você mais uma vez se sentirá harmônico e em paz. Dharma como um Guia e um Caminho para Simplificar a Vida. Conforme você desenvolva sua sensibilidade às demandas dhármicas do momento, saber o que fazer de um momento a outro se torna tão claro e fácil quanto trafegar por uma rodovia. À medida que você desenvolve essa habilidade, você terá a clareza de conhecer qual é a melhor coisa para se fazer agora, e terá, portanto, a determinação natural, nascida de estar livre de dúvidas, para se fixar completamente nisso. Isso permite que você aproveite ao máximo cada dia, aproveite ao máximo cada ato, absorto em mindfulness, sendo o melhor que você pode ser. O dharma também ajudará você a se aliviar do estresse de múltiplas demandas, seja no trabalho, seja em casa ou, ainda pior, por múltiplos desejos. Dharma é sinônimo de uma ação principal por vez. Desejos são ilimitados, e, se você permitir isso, clientes, membros familiares, colegas e seu patrão irão colocar em cima de você uma lista infindável de demandas. Todavia, uma vez que você fique confiante no exercício de identificar seu dharma, de priorizar suas ações de acordo com seu dharma, você terá a paz de fazer uma coisa de cada vez, com sua mente focada nessa única ação. Nunca é seu dharma fazer mais do que você consegue – somente fazer o melhor que você pode. Focar-se no seu dharma conduz ao desenvolvimento de simplicidade, que é uma qualidade maravilhosa. Quanto mais você foca naquilo que você tem que fazer, na expressão de si mesmo, você naturalmente se interessa menos em criar demandas desnecessárias em sua vida ou em comprar coisas que você não precisa. Você desejará comprar apenas coisas que ajudem na realização do seu dharma e nada mais. Viver essa mudança de paradigma de se centrar no seu dharma significa que você dedica cada vez menos atenção aos desejos caprichosos e planos ilusórios e extravagantes para a felicidade. Simplesmente viver seu dharma em mindfulness é algo tão completo e recompensador que você não sente mais a necessidade de buscar felicidade em comprar coisas que você não precisa. Conforme você desenvolva uma crescente sensibilidade em relação ao seu dharma, você não precisará buscar coisas para ocupar seu tempo. Você saberá o que fazer de um momento ao outro, e você valorizará ter tanta liberdade quanto possível para exercer os seus dharmas com toda a sua atenção. Você entenderá que tempo é a posse mais valiosa. Quanto mais demandas você conseguir remover do seu cronograma, mais paz você experimentará em relação a ser capaz de focar em seus dharmas centrais. Casas menores significam menos manutenção e menos tempo gasto com limpeza. Menos roupas significam guarda-roupas menores. Andar de bicicleta ou usar o transporte público, em vez de dirigir, significa menos tempo cuidando do carro. Viver perto do trabalho significa menos tempo no trânsito. Qualquer coisa que você possa fazer para simplificar sua vida resultará em mais paz e, então, mais felicidade. Essa simplicidade é priorizar o seu verdadeiro eu. vwww.voltaaosupremo.com.br


quinta-feira, 27 de junho de 2019

A CAMINHO


Marabharata. Livro Marabharata - Versão Comentada da Maior Epopeia do Mundo. Por Khrisna Dharma. Capítulo Cinco. A CAMINHO - FAZENDO, REPENTINAMENTE, CARIDADES em grandes quantidades, os Kauravas ganharam os favores do povo. Também prepararam várias cerimônias de concessão de reconhecimento e títulos de honra a vários líderes cidadãos. Gradualmente, popularidade deles cresceu. Quando se aproximava a data do festival de Varanavata, Dritarastra fez com que alguns de seus ministros elogiassem a cidade na presença dos pândavas. Obedecendo ao rei, eles mencionaram a beleza do lugar, o clima ameno e o maravilhoso festival que logo seria celebrado. Os jovens pândavas se sentiram atraídos. Vendo que assim reagiam, Dritarastra lhes disse: Tenho ouvido muitos comentários fabulosos sobre Varanavata e suas inúmeras atrações. Normalmente, nós enviamos uma delegação para nos representar no festival, e pensei que, este ano, vocês cinco gostariam de ir. Serão umas férias muito agradáveis. Iudistira imediatamente entendeu o que estava acontecendo. Já notara como os kauravas estavam tentando obter a simpatia do povo com favores e caridades, e agora compreendia por quê. Para ele, era óbvio que algum plano malicioso estava a caminho, mas o príncipe sabia que não poderia fazer grande coisa, pois ele e seus irmãos não estavam numa posição favorável. O rei era simplesmente uma peça nos esquemas de Duriodhana, mas tinha controle sobre o tesouro, o exército e os ministros. Assim, seria inútil e talvez até perigoso confrontá-lo. Escondendo os sentimentos, Iudistira respondeu: Então que assim seja. Acho que vamos nos divertir em Varanavata. Duriodhana extasiou-se quando soube que os pandavas tinham concordado em partir e falou secretamente com um confidente próximo, chamado Purochana, instruindo-o a que fosse para Varanavata logo. Construa uma casa de materiais altamente inflamáveis, mas que pareça perfeitamente norma. Instale os pandavas lá e, quando estiverem bem estabelecidos e abrirem a guarda (...). Duriodhana fez um sinal que indicava fogo. Purochana sorriu e entendeu, ao que Duriodhana complementou: Este mundo e toda a sua riqueza estão sob o meu comando. Você não vai sentir falta de nada. Agora vá e cumpra minhas ordens. Dependo totalmente de você. Purochana juntou alguns artesãos de confiança e logo seguiu para Vara navata. Poucos dias mais tarde, os pandavas se preparavam para partir também. Despediram-se dos anciãos e dos cidadãos tristes, que não queriam que eles viajassem. Apesar dos recentes feitos de caridade dos Kauravas, os gentis pandavas ainda eram os que o povo amava mais profundamente. Muitas pessoas suspeitavam de algum atentado da parte dos kauravas. Enquanto os pandavas subiam em seus carros para partir. Duriodhana ficou ao lado dos irmãos, acenando adeus. Ó filhos de Pandu, que os deuses possam abençoá-los no seu caminho. Que nenhum perigo se aproxime de vocês. E os pandavas, junto com a mãe, saíram da cidade, acompanhados por uma grande multidão. Os cidadãos imploravam aos irmãos que ficassem em Hastinapura, censurando Dritarastra por enviá-los naquela viagem. Mas Iudistira parou o carro, logo depois dos portões da cidade, e se dirigiu ao povo com estas palavras: Caros amigos, Dritarastra é o rei. É nosso pai, preceptor e superior. Temos que obedecer às suas ordens sem questionar. Essa é a lei eterna dada por Deus. Voltem agora para suas casas. Quando chegar a hora, vocês poderão nos oferecer seu apoio. O povo regressou à cidade, hesitante, mas Vidura se aproximou para falar com Iudistira. E lhe falou numa linguagem que só mesmo os dois poderiam compreender. Por meio de seus espiões, o ministro chegara a saber do plano de Duriodhana. Entretanto, da mesma forma que Iudistira, não achava sábio se opor abertamente ao rei. Pegando o braço de Iudistira, sussurrando, disse: O fogo não pode atingir aquele que se esconde num buraco ou no meio da floresta. Mesmo oprimido por inimigos, aquele que domina seus próprios sentidos nunca será vencido. Na verdade, chegará a governar o mundo. Iudistira assentiu, demonstrando que entendera. O ministro kuru, então, abençoou os irmãos e se despediu deles e de Kunti. Quando já estavam a alguma distância da cidade, Iudistira contou à mãe e aos irmãos o que Vidrua lhe tinha dito: Ele confirmou minhas suspeitas. É claro que Duriodhana maquinou um plano para nos matar de alguma forma, aparentemente pelo fogo. Nossos tio nos deu uma pista, por meio da qual poderemos escapar. Apreensivos, eles seguiram para Varanavata e lá chegaram no começo da noite. Um grande número de cidadãos saiu às ruas para saudá-los, felizes por conhecerem os famosos filhos de Pandu. A chegada foi uma festa, com milhares de pessoas dirigindo carros de todos os  tipos, sacudindo bandeiras e tocando música. Os anciãos da cidade  saudaram os irmãos e os levaram ao centro da cidade, onde conheceram Purochana. Este lhes disse que, sob as ordens do rei, estava construindo uma mansão especialmente para a estadia do rei, estava construindo uma mansão especialmente para a estadia deles na cidade. Os irmãos trocaram olhares significativos, mas não disseram. Em duas semanas a mansão ficou pronta, e Purochana lhes apresentou o grande prédio com um sorriso. Tudo foi feito para o conforto de vocês, ó príncipe. Não sentirão falta de nada, e eu mesmo morarei aqui para servi-los melhor. Quando Purochana saiu, Iudistira chegou perto de uma parede e bateu levemente. Esta casa foi totalmente construída com materiais altamente inflamáveis, disse ele aos irmãos. Vocês não sentem o cheiro de òleo e laca? Sem dúvida, o pecador Purochana pretende nos matar pelo fogo. Ele é apenas um instrumento de Duridhana. O grande sábio Vidura nos advertiu adequadamente desse perigo. Bima roncou de raiva. Então vamos logo sair daqui. Já estou farto de Duriodhana! Temos que dar um jeito nele. Iudistira balançou a cabeça. Não, ainda não está na hora. O que podemos cinco fazer contra o estado de Hastinapura, agora efetivamente sob o controle de Duriodhana por intermédio do pai de vontade frágil? iudistira também  rejeitou a sugestão de que deveriam fugir de Varanavata. Se fugirmos, Duriodhana saberá que descobrimos seu plano e enviará um monte de espiões para nos procurar e matar de qualquer forma. O melhor que podemos fazer é ficar aqui, por enquanto. Não devemos mostrar tampouco que sabemos de algo e ser especialmente cautelosos com Purochana. Se ele suspeitar que o descobrimos, fará qualquer coisa para nos destruir. Os pandavas, sempre obedientes ao irmão mais velho, concordaram. Recordando-se das palavras de Vidura, Iudistira disse: Precisamos cavar um túnel sob esta casa. Se ela pegar fogo, poderemos nos abrigar e fugir por ele. Então, Iudistira sugeriu que passassem os dias explorando as áreas circunvizinhas e, quando a oportunidade surgisse para fugirem, já conheceriam os arredores. Dois dias depois de se mudarem para a mansão, que Purochana chamou de "Casa Abençoada", um estranho chegou e quis falar com eles. Sou um mineiro experiente. Foi Vidura quem me mandou aqui, dizendo que vocês me dariam um bom trabalho. Falando na mesma linguagem discreta usada por Vidura quando ele avisara Iudistira, o mineiro lembrou-os daquele incidente. Iudistira, de início desconfiado que aquele fosse outro ttuque de Duriodhana, logo afastou a desconfiança e abraçou calorosamente o mineiro. Que bom vê-lo, senhor! Qualquer amigo de Vidrua é nosso amigo também. Iudistira contou-lhe acerca da casa e do plano de Purochana de queimá-los vivos. O mineiro disse que construiria um túnel da mansão até os bosques mais próximos. Acho que posso terminá-lo em um mês. Também acredito que Purochana vai esperar bem mais que um mês antes de atacar. Naturalmente, quer se assegurar de que vocês  fiquem completamente à vontade. Iudistira concordou, e o mineiro logo começou seu trabalho, cavando num local escondido dentro da casa. Os dias e as semanas iam e vinham, e os pandavas passavam a maior parte do tempo passeando e familiarizando-se com os bosques que cercavam a mansão. Marcaram uma estrada que saia da cidade com pedaços de pano branco, que seriam visíveis à noite. Mais de um mês se passou. Os irmãos e sua mãe pareciam estar claros e à vontade, mas estavam sempre em alerta, esperando a próxima jogada de Purochana. Um deles sempre ficava acordado à noite, atento a quaisquer sons incomuns, e as armas estava sempre  à mão. Percebendo que Purochana não suspeitava de nada e confiava que eles estavam à vontade, Iudistira disse aos irmãos, uma noite: Acho que deveríamos agir agora, antes que Purochana tenha oportunidade. Vamos nós mesmos atear fogo a esta casa, queimando aquele homem falso com ela. O túnel está pronto e já podemos escapar por ele, para que as pessoas pensem que morremos queimados. Iudistira sabia que a notícia de suas supostas mortes logo chegaria a Hastinapura. Assim, eles poderiam viajar por todo o país sem medo de ser perseguidos. Se permanecessem incógnitos, podeiam sair de Varanavata e pensar no próximo passo a ser dado. No dia seguinte, o festival foi celebrado. Kunti preparou grande quantidade de comida para distribuir aos pobres e carentes da cidade. E a Providência Divina fez com que uma mulher e seus cinco filhos chegassem à mansão. Eles comeram quanto quiseram e beram uma grande quantidade de vinho. Logo ficaram bêbados e caíram, adormecidos. Incapaz de despertá-los, os criados os deixaram onde estavam. Quando todos já tinham saído da mansão naquela noite, os pandavas se recolheram. Purochana também fora dormir no lugar de sempre, num quarto perto da porta da saída. Lá fora, caía uma tempestade, e em seus aposentos os pandavas esperavam silenciosamente que Purochana adormecesse profundamente. Então, um a um, eles entraram no túnel, colocando Kunti no meio. Bima esperou até que todos estivessem no túnel; então, pegando uma tocha, ateou fogo à casa, começando pela porta. Depois, correu para o túnel, e dentro de poucos instantes a mansão estava em chamas. Purochana não teve oportunidade de escapar, pois a casa rapidamente se tornou um inferno. Uma multidão de cidadãos, despertos no meio da noite pelos ruídos da conflagração, saiu às ruas. Quando viram a casa dos pandavas cercada de labareda, choraram e gritaram de tristeza. Depois que as chamas diminuíram, eles jogaram água no chão fumegante e entraram nas ruínas. E encontraram os corpos queimados da mulher da tribo e de seus cinco filhos. Acreditando que fossem os restos mortais de Kunti e dos pandavas, lamentaram-se por longo tempo, gritando: Ah, esta é com certeza mais uma maldade do perverso Duriodhana! Sempre invejoso dos primos generosos, ele não hesitou em destruí-los! Com certeza seu pai cego também é cúmplice desse crime; senão, como é que isso poderia ter acontecido? Os cidadãos reconheceram os materiais inflamáveis com que a casa tinha sido construída. Ajudando-os na busca no meio das cinzas, o mineiro se assegurou cuidadosamente de que o túnel não fosse encontrado. E mensageiros foram, então, enviados a Hastinapura para informar os kurus da tragédia. Capítulo Seis. A PRINCESA QUE NASCEU DO FOGO - EM HASTINAPURA, OS MENSAGEIROS DE VARANAVATA trouxeram a notícia da suposta morte dos pandavas. Dritarastra soluçava, triste. Genuinamente triste, pois sua aflição originava-se do sentimento de culpa. Ele segurava a cabeça e chorava: Hoje é que o meu querido irmão Pandu, que vivia por meio dos filhos, morrreu. Este é um dia negro para os kurus. O rei instruiu para que se fizesse uma cerimônia fúnebre. Milhares de cidadãos, chorando, entraram nas águas do rio Ganges para ofertar flores às almas que haviam partido. Lamentavam-se terrivelmente, chamando alto os nomes de Kunti e de seus filhos. Bishma se mostrou particularmente aflito, isolando-se em seus aposentos para chorar sozinho. Duriodhana e os irmãos deram ostensivas demonstrações de tristeza, lamuriando-se sem cessar, mas internamente se rejubilavam. Vidura não se mostrou muito triste, mas sabia que não podia revelar a verdade a ninguém, Até mesmo Bisma, que era favorável aos pandavas, certamente contraria ao rei que eles estavam salvos, e haveria muita perturbação e tensão em Hastinapura. Seria melhor aguardar até que o Senhor revelasse um momento mais oportuno. Os pandavas viveram um tempo em Ekachacra. Apresentando-se como brâmanes, ganhavam a vida pedindo esmolas. De dia, percorriam a aldeia coletando esmolas. Voltavam ao anoitecer e Kunti preparava a refeição, dividindo a comida em duas partes - metade para Bima e metade para todos os outros. Enquanto os pandavas viviam em Ekachacra, um brâmane viajante pernoitou na casa deles e lhes contou histórias que ouvira em suas viagens. Souberam, então, que em breve haveria uma cerimônia de swayamvara na capital do rei Drupada, na qual sua filha escolheria um marido. O brâmane descreveu a filha de Drupada, Draupadi: Essa nobre moça é de uma beleza incomparável. E não nasceu como qualquer mulher mortal. Todos os reis do mundo comparecerão ao swayamvara de Draupadi. Fascinados, os pandavas pediram ao brâmane que lhes falasse mais sobre Draupadi. Esta história começa, na verdade, com o nascimento de Drena, o brâmane respondeu, e tem suas raízes ou relacionamentos entre o grande achária e o poderoso rei Drupada. O brâmane narrou a história do desentendimento entre Drona e Drupada, que os pandavas conheciam tão bem. Eles se mantiveram em silêncio enquanto o brâmane relatava como eles tinham derrotado Drupada. Depois disso, o rei se foi, espumando de indignação. Ele queria se vingar de Drona. Compreendendo que somente outro brâmane poderoso poderia se igualar a Drona e vencê-lo, entrou na floresta para procurar um. Encontrou dois irmãos brâmanes, chamados Yaja e Upayaja. Quando lhes perguntou se poderiam fazer com que tivesse um filho que vencesse Drona, eles aceitaram fazer um sacrifício para esse fim. Drupada e sua esposa se sentaram no momento do sacrifício, observando enquanto os dois irmãos faziam as oferendas ao grande fogo. Então, ante seus olhos atônitos, um jovem surgiu no fogo. Vestido com armadura de ouro, o guerreiro resplandecente imediatamente subiu no carro e circulou por ali, gritando e brandindo o arco. Uma voz celestial anunciou que ele tinha nascido para destruir Drona, e foi-lhe dado o nome de Dristadiúmna. Logo após, uma moça também surgiu do fogo. Com a pele clara como um lótus azul, era linda como a deusa da fortuna. Seus olhos eram escuros e seus cabelos caiam em cachos negros. Emanava uma fragrância doce, tinha a cintura bem fina, seus lábios eram sensuais e seus membros delicados. Ouviu-se novamente a voz celestial: Esta  beleza divina será a melhor das mulheres. Cumprindo o propósito dos deuses, ela provocará a morte de incontáveis guerreiros. O brâmane também lhes contou que Drona, mesmo sabendo que o rapaz tinha nascido para matá-lo, o aceitara o na sua academia e lhe ensinara a ciência das armas. Quando o brâmane terminou de falar, os pandavas ficaram em silêncio. A mente deles viajava até o passado. Sabendo que seu amado guru Drona seria morto, e também escutando a descrição de Draupadi, celestialmente adorável, ficaram pasmos e sentiram que falar, naquele momento, seria supérfluo. Naquela noite, depois que se retiraram para descansar, Kunti falou aos filhos. Vendo que estavam ansiosos, disse-lhes: Nós já vivemos aqui por um longo tempo. Acho que deveríamos agora partir para o reino de Drupada, Panchala. Iudistira concordou. Tanto ele quanto seus irmãos queriam muito ir ao swayamvara de Draupadi. Mas ele se lembrou do aviso de Viasadeva: O rishi nos pediu que o esperássemos aqui até que ele voltasse. No momento em que pronunciou o nome de Viasadeva, o sábio repentinamente apareceu perto deles. Todos logo o reverenciaram, ajoelhando-se a seus pés, e ele disse: Entendi o desejo de suas mentes e vim aqui vê-los. Vocês certamente devem ir a Panchala para o swayamvara de Draupadi. O sábio também disse que Arjuna deveria participar do concurso para ganhar a mão de Draupadi. A princesa é uma noiva e tanto. Na verdade, ela está destinada a se casar com vocês. Iudistira falou: Ó rishi onisciente, iremos logo para Panchala. Viasadeva então se despediu de Kunti e dos irmãos e, no dia seguinte, eles partiram para a cidade de Drupada, Kampilia, a capital de Panchala. Caminhando pelas estradas dia e noite, iam na direção norte. Depois de três dias de viagem, chegaram ao rio Ganges. Já era noite, e andavam iluminados pela tocha que Arjuna carregava. Quando se aproximaram do rio, foram repentinamente interpelados por alguém que lhes gritou de dentro da escuridão. Alto lá! vocês não podem seguir adiante. Sou Angaraparna, um chefe gandarva que está se banhando neste rio. É durante a noite que os seres celestiais como nós usam o rio; os homens devem se banhar somente de dia. Se vocês se aproximarem mais, correrão sério perigo. Sou poderoso e não tolerarei qualquer abuso. Arjuna colocou a tocha em várias direções e finalmente viu o gandarva à sua frente, sentado num carro de ouro. Dando um passo à frente, ele riu e falou: Ó tolo, desde quando o rio Ganges pode ser fechado a qualquer pessoa e a qualquer hora? Isso é totalmente contrário aos princípios religiosos. Só mesmo uma pessoa ignorante ou sem nenhum poder acataria seu aviso. Quanto a nós, não damos a mínima para as suas palavras. Angaraparna ficou furiosos. Imediatamente pegou seu arco e atirou inúmeras flechas, que sibilavam como serpentes venenosas. Arjuna não se perturbou: aparou algumas das flechas com o escudo que tinha numa das mãos e outras com a própria tocha. Sempre rindo, falou: Ó gandarva, não tente intimidar aqueles que são os melhores nas armas. Você está desperdiçando seu tempo. Mas, por ser um ente celestial, lutarei contra você com armas celestiais. Prepare-se para receber a Agneyastra, o míssil do deus do fogo! Elevando a tocha, Arjuna recitou alguns mantras para invocar o poder da arma celestial. Então, atirou a tocha contra Angaraparna. Carregada de poder místico, a tocha explodiu contra o carro do gandarva e o reduziu a cinzas. Atônito, este caiu de cabeça no chão. Arjuna o levantou pelos cabelos, que estavam adornados com guirlandas de flores, e o levou aos pés de Iudistira. A esposa de Angaraparna, chocada, correu até Arjuna e lhe pediu,  de mãos postas, que liberasse o marido. Iudistira sorriu para Arjuna e falou: Ó herói, quem mataria um inimigo que é vencido na batalha, indefeso, de quem lhe tiram a honra e ainda por cima protegido por uma mulher? Deixe-o ir. Arjuna libertou Angaraparna: e sua esposa correu até ele e respingou água em seu rosto. O gandarva se levantou e disse a Arjuna, em voz baixa: Daqui por diante renuncio a meu orgulho, uma vez que fui humilhado por um homem. Ainda assim, considero uma sorte ter conhecido heróis como vocês, que comandam armas divinas. Vocês me devolveram a vida, e desejo lhes dar alguma coisa em troca. Angaraparna, então, concedeu a Arjuna o poder de ver qualquer coisa, assim como sua natureza essencial, que existisse no mundo. Também lhe ofereceu o poder de criar ilusões durante uma batalha. Além disso, ainda lhe darei cavalos que podem  galopar na velocidade do pensamento. Por favor, aceite estes presentes, ó homem sem pecados. Arjuna juntou as mãos e respondeu: Não posso aceitar nada em troca de sua vida. Os Vedas ordenam que não se mate uma pessoa perturbada e, além disso, meu irmão me ordenou que o libertasse. Portanto, este era o meu dever. Livro Mahabharata - Versão Comentada da Maior Epopeia do Mundo. Abraço. Davi.

quarta-feira, 26 de junho de 2019

ACREDITA NO RENASCIMENTO?


Budismo. www.studybuddhism.com. Texto de Alexander Berzin. ACREDITA NO RENASCIMENTO? Sim, eu acredito. Mas demorei muito tempo a chegar a esse ponto. A crença no renascimento não surge imediatamente. Algumas pessoas vêm de um ambiente em que a crença no renascimento faz parte dessa cultura. Esse é o caso de muitos países asiáticos e, deste modo, como as pessoas ouvem falar sobre o renascimento desde crianças, esta crença surge automaticamente. Contudo, para aqueles como nós de culturas ocidentais, de início isso parece estranho. Geralmente, nós não adquirimos a convicção no renascimento de repente, com arco-íris, música de fundo e "Aleluia! Agora eu acredito!" Geralmente não funciona assim. A maior parte das pessoas leva muito tempo a se habituar à ideia do renascimento. Eu atravessei vários estágios no processo de obter convicção nele. Primeiro, tive de me abrir à ideia, no sentido de começar a pensar: "Na verdade, eu não compreendo o renascimento". É importante admitirmos que não o compreendemos, porque poderíamos às vezes rejeitar o renascimento, e o que estariamos realmente rejeitando seria uma ideia do renascimento que o budismo também rejeitaria. Alguém poderia pensar: "eu não acredito no renascimento porque acho que não há uma alma com asas que voe para fora do corpo e entre num outro corpo". Os budistas concordariam: "nós também não acreditamos numa alma com asas". Para decidir se acreditava no renascimento, tive de compreender o conceito budista do renascimento, e esse conceito não é simples. É muito sofisticado, como podem ver do que já expliquei à cerca da consciência e das energias mais sutis, e dos instintos que a acompanham. Então pensei dar ao renascimento o benefício da dúvida. Provisoriamente, digamos que há renascimento. Agora, o que se segue ao vermos a nossa existência dessa maneira? Podemos estabelecer todos os treinamentos do bodhisattva, podemos reconhecer todos os seres como tendo sido nossas mães e, assim, podemos sentir alguma ligação com todos os outros. Também poderia explicar por que é que as coisas que aconteceram na minha vida, aconteceram. Por que é que alguém com o meu background foi fortemente atraído para o estudo da língua chinesa? Por que é que eu fui atraído à Índia e a estudar com os tibetanos? Considerando os interesses e o ambiente da minha família onde cresci, o meu interesse por estas coisas não faria nenhum sentido. No entanto, quando pensei em termos de renascimento, havia uma explicação. Eu devo ter tido alguma ligação com a Índia, a China e o Tibete em diferentes vidas, e isso fez com que eu estivesse interessado nesses lugares, nas suas línguas e culturas. O renascimento começou a dar respostas a muitas perguntas sobre as quais eu não poderia encontrar respostas de outra forma; se não houvesse vidas passadas nem carma, então o que aconteceu na minha vida não faria nenhum sentido. O renascimento poderia também explicar os sonhos recorrentes que eu costumava ter. Assim, comecei lentamente a me acostumar à ideia. Nestes últimos dezenove anos, eu venho estudando na Índia e tive o grande privilégio e oportunidade de estudar com alguns dos antigos mestres, quando eles ainda eram vivos. Muitos faleceram e regressaram, e agora encontro-os outra vez, como pequenas crianças. Eu conheço-os em duas das suas vidas. Há uma certa altura no caminho budista em que podemos controlar os nossos renascimentos. Não temos de ser Budas, nem seres liberados, ou arhats, para fazer isso. No entanto, temos de ser bodhisattvas. Temos também de ter avançado até um certo estágio na via tântrica, e de ter uma determinação muito forte em renascer numa forma em que possamos ajudar a todos. Há certos métodos e visualizações que nos permitem transformar a morte, o estado intermediário e o renascimento. Se tivermos mestria a esse nível, poderemos controlar os nossos renascimentos. Há cerca de mil pessoas entre os tibetanos que atingiram esse nível e, quando morrem, são encontrados outra vez. No sistema tibetano, são chamados tulkus. Um tulku é um lama reencarnado, alguém a quem é dado o título Rinpoche. O título Rinpoche, contudo, não é usado exclusivamente para tulkus ou lamas reencarnados. É usado também para o abade ou o abade aposentado de um mosteiro. Nem todos os que são chamados Rinpoche são lamas reencarnados. E devo também clarificar que o modo como a palavra lama é usada varia entre as tradições tibetanas. Em algumas delas, lama se refere a um professor espiritual muito elevado, tal como um geshe – que tem o equivalente a um doutoramento em estudos budistas – ou um lama reencarnado. Em algumas tradições, lama é usado para alguém que age um pouco como um padre numa comunidade. Essa pessoa fez um retiro de três anos e aprendeu os diversos rituais. Ele ou ela irá então às vilas e fará rituais nas casas das pessoas. O título lama pode ter diferentes significados. Como já disse, há cerca de mil reconhecidos lamas encarnados, ou tulkus, e são identificados através de várias indicações que eles próprios dão, assim como por outras indicações, tais como oráculos ou sinais significativos no ambiente. Os assistentes do lama anterior procurarão a nova encarnação. Levarão objetos rituais e pertenças pessoais do lama anterior, juntamente com outros semelhantes artigos. A criança será capaz de reconhecer o que pertenceu à sua vida anterior. Por exemplo, Sua Suprema Presença, Sua Santidade o Dalai Lama, reconheceu as pessoas que o foram procurar. Chamou-os pelo nome e começou a falar com eles no dialeto de Lhasa, que não é a língua da região onde nasceu. Por tais sinais, conseguiram identificar a criança. Foi muito impressionante para mim encontrar novamente os meus professores nas suas vidas seguintes. O exemplo mais impressionante foi Ling Rinpoche, que era o tutor sênior de Sua Santidade o Dalai Lama. Era também líder da tradição Gelug. Quando faleceu, permaneceu em meditação durante quase duas semanas, embora a sua respiração tivesse parado e, para todos os fins médicos, ele teria sido considerado morto. Contudo, a sua consciência sutil estava ainda dentro do corpo: ele estava absorto numa meditação muito profunda com a mente muito sutil. A zona em redor do coração estava ainda ligeiramente morna, e sentou-se na posição de meditação sem o seu corpo se decompor. Quando acabou a meditação, a sua cabeça se quedou e um pouco de sangue pingou das suas narinas. Nessa altura a sua consciência havia deixado seu corpo. Em Dharamsala, onde vivo, este tipo de coisas ocorre duas, três, quatro vezes por ano. Não é incomum, embora seja necessário estar-se num nível avançado de prática espiritual para se fazer isto. Esta faculdade pode ser alcançada. A reencarnação de Ling Rinpoche foi reconhecida quando tinha um ano e nove meses. Geralmente, as crianças não são identificadas assim tão novas, porque quando ficam com mais idade – com cerca de três ou quatro anos – elas próprias podem falar e dar algumas indicações. A criança foi levada de novo à sua velha casa. Houve uma ceremónia muito grande para lhe dar as boas-vindas. Alguns milhares de pessoas alinharam nas ruas, e eu tive a sorte de estar entre eles. Estavam vestidos com roupas especiais e estavam cantando. Foi uma ocasião muito alegre. Como é que a criança foi identificada? Através de oráculos e médiuns, e por ela ter identificado vários objetos da sua vida anterior. Também manifestou certas características físicas. Por exemplo, o seu predecessor segurava sempre seu mala (rosário budista de “missangas”) com as duas mãos, e a criança também fazia isso. Também reconheceu as pessoas da sua família. No entanto, o que mais me convenceu foi o comportamento da criança durante a cerimónia. A criança foi levada à casa onde estava instalado um trono perto do patamar, confrontando uma grande varanda, com duas a três mil pessoas reunidas no pátio. A maioria das crianças com menos de dois de idade ficaria muito assustada nessa situação. Esta não. Puseram a criança sobre o trono. Normalmente, qualquer criança quereria descer e gritaria se não conseguisse o que queria. Esta sentou-se de pernas cruzadas, sem se mexer durante uma hora e meia, enquanto as pessoas faziam um puja (ritual) para a sua longa vida. Estava totalmente interessada no que se estava a passar, e estar entre essa enorme multidão não a incomodou nada. Parte da cerimônia envolvia a doação de oferendas ao lama e o pedido da sua longa vida. Havia uma procissão de pessoas, cada uma delas trazendo uma oferenda – uma estátua do Buda, um texto escritural, um monumento do relicário stupa, um conjunto de vestes de monge, e muitas outras coisas. Quando alguém lhe dava uma oferenda, era suposto que ele a recebesse com as duas mãos e a desse a uma pessoa à sua esquerda. Ele assim o fez, perfeitamente, com cada objeto. Foi realmente notável! Como se poderia ensinar a uma criança com um ano e nove meses a fazer algo como isso? Não se pode. Quando a cerimónia terminou, todas as pessoas se alinharam para receber a benção da sua mão. Alguém segurou a criança, e ela deu a bênção com a mão, mantendo a sua mão na posição correta. Com total concentração, e sem perder o interesse nem ficar cansado, a criança deu então uma benção com a mão a duas ou três mil pessoas. Depois disso, Sua Suprema Presença, Sua Santidade o Dalai Lama, almoçou com ele e passaram algum tempo juntos. A única vez que a criança chorou ou ficou agitada foi quando o Dalai Lama começou a sair. Ele não queria que ele se fosse. De fato, a criança já dava benção de mão até antes de ter sido reconhecida como Ling Rinpoche (1903-1983). Ele e seu irmão mais velho estavam num orfanato, porque a mãe havia morrido pouco depois dele ter nascido. O pai era muito pobre e por isso teve de pôr as crianças num orfanato. Ali, ele costumava dar a benção de mão às pessoas. Seu irmão, que era três ou quatro anos mais velho, dizia às pessoas: "O meu irmão é muito especial. É um lama. É um Rinpoche. Não lhe façam nada de mal. Tratem-no como especial". Os anteriores Ling Rinpoche tinham sido professores de três Dalai Lamas consecutivos. Um Ling Rinpoche foi o professor do XII Dalai Lama; o Ling Rinpoche seguinte foi o professor do XIII; o seguinte foi o professor do XIV. Certamente, as pessoas olham para este como o professor do próximo Dalai Lama. Ver exemplos como este impressionou-me muito sobre a possibilidade de vidas futuras. Assim, pensando, ouvindo histórias e vendo coisas como estas, fiquei gradualmente mais e mais convencido sobre a existência de vidas passadas e futuras. Se agora me perguntarem: "Acredita em vidas futuras?" Sim, eu acredito. Os lamas encarnados são encontrados apenas entre os tibetanos? Não, cerca de sete também foram identificados em países ocidentais. Um destes, Lama Osel, a reencarnação de Lama Thubten Yeshe (1935-1984), é uma criança espanhola. As pessoas que conheceram Lama Yeshe, ao se encontrarem com Lama Osel ganharam muita convicção no renascimento.

Singapura, agosto de 1988. Excerto revisado Berzin, Alexander e Chodron, Thubten. Glimpse of Reality. Singapore: Amitabha Buddhist Centre, 1999. www.studybuddhism.com. Abraço. Davi


terça-feira, 25 de junho de 2019

O QUE É REENCARNAÇÃO?


Budismo. www.studybudhism.com. Texto de Alexander Berzin (1944 -). O QUE É REENCARNAÇÃO? Assim como outras religiões indianas, o budismo também afirma a existência do renascimento ou reencarnação. O continuum mental de um indivíduo, com seus instintos, talentos e assim por diante, vem de vidas passadas e segue para vidas futuras. Dependendo de suas ações e das propensões por elas geradas, um indivíduo pode renascer em uma variedade de formas, algumas melhores e outras piores: humana, animal, de insetos e até mesmo de fantasmas e outros estados invisíveis. Todos os seres experimentam renascimentos incontroláveis devido à força de suas atitudes perturbadoras, como apego, raiva e ingenuidade e o comportamento compulsivo desencadeado por elas. Se uma pessoa segue os impulsos negativos que surgem em sua mente devido a padrões passados de comportamento e age de forma destrutiva, ela experimentará como resultado o sofrimento e a infelicidade. Se, por outro lado, uma pessoa envolve-se em atos construtivos o resultado será a felicidade. A felicidade ou infelicidade de um indivíduo em seus sucessivos renascimentos não é, portanto, uma recompensa ou punição, mas é criada por suas ações pregressas, de acordo com as leis de causas e efeitos comportamentais. Como Podemos Vir a Entender o Renascimento? Como podemos saber de forma legítima se algo é verdadeiro? De acordo com os ensinamentos budistas, existem duas maneiras: através da percepção direta ou por inferência. Se fizermos uma experiência em um laboratório, podemos validar a existência de algo através da percepção direta. Por exemplo, se olharmos através de um microscópio podemos ver, através apenas de nossos sentidos, que existem minúsculos micróbios em uma gota de água do lago. Entretanto, existem algumas coisas que não podem ser validadas pela percepção direta. Precisamos nos basear em lógica, razão e inferência, como no caso do magnetismo, cuja existência é inferida através do comportamento de um imã e uma agulha de ferro. É muito difícil provarmos o renascimento através da percepção direta. Entretanto, existem muitos exemplos de pessoas que lembram de suas vidas passadas e conseguem identificar objetos pessoais ou pessoas que conheciam na vida anterior. Podemos inferir daí a existência do renascimento, mas algumas pessoas podem ainda assim duvidar e achar que é um truque. Mas podemos deixar de lado os casos de memórias de vidas passadas e usar a lógica para compreender o renascimento. Sua Santidade o Dalai Lama declarou que, se determinados aspectos do budismo não corresponderem à realidade, ele estaria disposto a eliminá-los, e isso se aplica também ao renascimento. Inclusive, foi esse o contexto original da declaração. Se os cientistas conseguirem provar a inexistência do renascimento, teremos que deixar de tomar isso como verdadeiro. Entretanto, se eles não conseguem provar que renascimento não existe, eles têm que investigar se existe: afinal os cientistas seguem a lógica e a metodologia científica, que é a aberta a coisas novas. Para provar que a inexistência do renascimento eles teriam que encontrar sua não existência. Declarar que “renascimento não existe porque não consigo testemunhá-lo com meus olhos” não é provar a inexistência do fato; afinal existem muitas coisas que não conseguimos ver, e no entanto existem, como o magnetismo e a gravidade. Linhas de Raciocínio para Investigarmos Se Renascimento Existe ou Não. Se os cientistas não conseguem provar a inexistência do renascimento, convêm investigarmos sua existência. O método científico é postular uma teoria baseada em alguns dados e depois verificar se ela pode ser validada. Portanto, olhamos os dados. Por exemplo, percebemos que crianças não nascem como caixas vazias. Elas têm certos hábitos e características pessoais (personalidade) observáveis até mesmo quando são muito novas. De onde vêm essas características? Não faz sentido dizermos que vêm apenas da continuidade física do material doado por seus pais, o óvulo e o espermatozoide. Se nem todos os óvulos fecundados conseguem alojar-se no útero e virar um feto, o que faz com que alguns virem bebês e outros não? O que será que está realmente causando os vários hábitos e instintos da criança? Não podemos dizer que é o DNA e os genes, o lado físico. Ninguém está negando que esse é o aspecto físico que define como o bebê será, mas e quanto ao aspecto vivencial? Como explicar a mente? A palavra inglesa para mente (e também a portuguesa) não tem o mesmo significado que o termo supostamente traduzido do Sânscrito e Tibetano. Nesses idiomas, “mente” refere-se à atividade mental ou eventos mentais e não àquilo que está fazendo essa atividade. A atividade ou evento em questão é o surgimento cognitivo de determinados fenômenos — pensamentos, visões, sons, emoções, sentimentos e assim por diante — e um envolvimento cognitivo com eles — vendo-os, ouvindo-os, compreendendo-os e até mesmo não os compreendendo. De onde vem essa atividade e esse envolvimento de um indivíduo com objetos cognitivos? Não estamos questionando de onde vem o corpo, pois é óbvio que vem dos pais. Não estamos questionando a inteligência e coisas do gênero, porque nesse caso também podemos argumentar que existe uma base genética. No entanto, dizer que a preferência de uma pessoa por sorvete de chocolate vem de seus gens é “forçar um pouco a barra”. Podemos dizer que alguns de nossos interesses podem ser influenciados por nossas famílias e por nossa situação social e econômica. Esses fatores, sem dúvida, têm influência, mas é difícil utilizarmos para explicar tudo o que fazemos. Por exemplo, porque eu me interessei por yoga quando era criança? Ninguém na minha família ou círculo social se interessava. Havia alguns livros disponíveis na área onde eu morava, portanto você pode dizer que houve alguma influência da sociedade, mas por que eu me interessei especificamente por aquele livro de hatha yoga? Por que o escolhi? Essa é uma outra questão. Será que as coisas acontecem apenas por acaso e a sorte tem um papel nisso, ou será que tudo pode ser explicado? De Onde Vem a Atividade Mental de Cada Indivíduo? Deixando tudo isso de lado, voltemos à questão principal: de onde vem a atividade que faz surgir objetos cognitivos e que causa nosso envolvimento cognitivo com eles? De onde vem essa capacidade de percebê-los? De onde vem a chama da vida? O que faz com que surja vida da combinação de espermatozoide e óvulo? O que faz com que essa vida seja humana? O que faz com que pensamentos e visões surjam e o que causa nosso envolvimento cognitivo — que é o aspecto vivencial da química e da eletricidade do cérebro — com elas? É complicado dizermos que a atividade mental de um bebê veio de seus pais, porque se veio, como foi que veio? Tem que haver algum mecanismo envolvido. Será que a chama da vida — caracterizada pela consciência das coisas — veio de nossos pais, da mesma forma que o espermatozoide e o óvulo? Será que veio do orgasmo? Será que veio da ovulação? Será que está no espermatozoide? No óvulo? Se não conseguimos chegar a um indicador lógico e científico de quando ela é transferida dos pais para os filhos, temos que buscar outra solução. De um ponto de vista puramente lógico, percebemos que fenômenos funcionais vêm de uma continuidade de momentos prévios de algum fenômeno da mesma categoria. Por exemplo, um fenômeno físico, seja matéria ou energia, vem de um momento prévio daquela matéria ou energia. É um continuum. Tomemos a raiva como exemplo. Podemos falar da energia física que sentimos quando estamos com raiva, isso é uma coisa. Entretanto, considere a atividade mental de vivenciar a raiva — vivenciar o surgimento da emoção e a consciência ou inconsciência dela. A raiva de um indivíduo tem seus próprios momentos anteriores de continuidade nesta vida, mas de onde ela veio antes disso? Ou veio de nossos pais, e parece não haver mecanismo para descrever como isso acontece, ou tem que vir de um Deus criador. Para algumas pessoas, no entanto, a inconsistência lógica da explicação de como um ser onipotente cria, é um problema. Para evitarmos esses problemas, a alternativa é que o primeiro momento de raiva na vida de alguém vem da continuidade de seus próprios momentos anteriores de raiva. A teoria do renascimento explica exatamente isso. A Analogia com um Filme. Podemos tentar entender o renascimento através da analogia com um filme. Assim como um filme é uma continuidade de quadros, nosso continuum mental é uma continuidade de momentos de consciência de fenômenos em uma vida, e também de uma vida para a outra. Não existe uma entidade sólida, encontrável, como um “eu” ou “minha mente”, que renasce. No caso do renascimento, não podemos usar uma analogia com uma estátua em uma esteira rolante, indo de uma vida para a outra, mas sim de um filme, algo em constante mudança. Cada quadro é diferente, mas existe uma continuidade. Um quadro está relacionado com o próximo. Da mesma forma, existe uma continuidade, em constante mudança de momento de consciência de fenômenos, mesmo que alguns desses momentos sejam inconscientes. E ainda, assim como os filmes não são todos o mesmo filme, apesar de todos serem filmes, da mesma forma, todos os continuums mentais ou “mentes” não são uma mente apenas. Existem inúmeros continuums individuais de consciência de fenômenos e cada um pode ser rotulado como “eu” a partir de sua própria perspectiva. Essas são as linhas de raciocínio que começamos a investigar quando consideramos a questão do renascimento. Se uma teoria faz sentido lógico, podemos olhar com seriedade o fato de que existem pessoas que se lembram de vidas anteriores. Dessa maneira, investigamos a existência do renascimento através de uma abordagem coerente. O Que Renasce? Segundo o budismo, a analogia do renascimento não é a de uma alma, uma pequena estátua concreta ou pessoa, viajando em uma esteira rolante de uma vida para a outra. A esteira representa o tempo e a imagem representa algo sólido, uma personalidade fixa ou alma, que chamamos de “eu”, passando pelo tempo: “Agora eu sou jovem, agora eu sou velho; agora eu estou nesta vida, agora eu estou naquela vida.” Esse não é o conceito budista de renascimento. A analogia é a de um filme. Existe uma continuidade em um filme; os quadros formam um continuum. O budismo também não diz que eu me transformo em você ou que somos todos um. Se fossemos um, e eu fosse você, se estivéssemos com fome, você poderia esperar no carro enquanto eu ia comer. Não é assim. Cada um de nós tem seu continuum individual. A sequência do meu filme não se tornará o seu filme, mas nossas vidas prosseguem como filmes no sentido de que não são concretas e fixas. A vida segue de um quadro para outro. Ela segue uma sequência, de acordo com nosso karma, e assim forma uma continuidade. Cada continuum é alguém e pode ser chamado de “eu”; não é que cada continuum não seja é ninguém. Assim como o título de um filme - que se refere a todo o filme e também a cada quadro dele, mas não pode ser encontrado como algo concreto em cada quadro - da mesma forma “eu” refere-se a um continuum mental individual e a cada momento dele, mas também não pode ser encontrado como algo concreto em nenhum desses momentos. Todavia, existe um “eu”, convencionalmente falando, um “self”. O budismo não é um sistema niilista. Humanos Sempre Renascem como Humanos? Estamos falando de atividade mental e dos fatores gerais que caracterizam nossa atividade mental. O que caracteriza a atividade mental humana é a inteligência, e essa inteligência, da forma como a conhecemos, pode estar em qualquer ponto de uma escala de “não muito inteligente” até “muito inteligente”. Mas existem outros fatores que também fazem parte da atividade mental, como a raiva, a ganância, o apego, a distração e os comportamentos compulsivos que derivam desses fatores mentais. Em algumas pessoas, esses fatores dominam a atividade mental e portanto elas não estão utilizando sua inteligência humana; ao invés disso estão operando principalmente com base em ganância, raiva (...). Por exemplo, existem pessoas que tem um tremendo desejo sexual e ficam de bar em bar conhecendo pessoas e tendo relações sexuais com quase todos que encontram — essas pessoas estão agindo como cachorros, não acha? Um cachorro tem relações sexuais com qualquer cachorra que encontrar, seja quando for; ele não exerce qualquer tipo de auto controle. Se um humano se comporta dessa forma, ele está criando um habito que pertence a uma mentalidade animal. Assim, não é de se surpreender, pensando em termos de renascimento, que a mentalidade de desejo dessa pessoa será o modo de atividade mental dominante em uma vida futura; e ela reencarnará em uma base própria para essa atividade mental, ou seja, o corpo de um animal. Portanto é muito útil examinarmos nosso comportamento: “Será que estou agindo como esse ou aquele animal?” Pense em uma mosca. A mentalidade de uma mosca é de total distração. Uma mosca não consegue ficar em um lugar por mais de alguns instantes, ela está constantemente se movendo e constantemente distraída. Assim é a nossa mente, como a de uma mosca? Se sim, o que esperar na próxima vida? Podemos esperar ter inteligência e boa concentração? Esses são alguns pensamentos que nos ajudam a compreender que humanos não renascem necessariamente como humanos. Podemos renascer em muitas formas diferentes de vida, para cima ou para baixo. Se criarmos muitos hábitos humanos positivos, mesmo que renasçamos como um animal, quando a força kármica do nosso comportamento animalesco se exaurir, nossa força positiva anterior pode se tornar dominante e podemos renascer como humano novamente. Não estamos condenados a renascimentos inferiores para sempre. O ponto aqui é entender que não há nada intrínseco à atividade mental que faça dela uma atividade mental humana ou que a faça masculina ou feminina ou qualquer outra coisa. É simplesmente atividade mental, e o tipo de nascimento que teremos depende do nosso karma, dos vários hábitos que criamos com nosso comportamento compulsivo. Em vidas futuras teremos um corpo que funcionará como uma base apropriada para manifestarmos esses hábitos. Conclusão. Quando utilizamos a razão para examinar a apresentação budista do renascimento, precisamos examinar os processos causais que perpetuam continuums mentais individuais: continuidades mentais individuais que nunca se degeneram. A conclusão que chegamos é de renascimentos sem início, com cada vida moldada por hábitos comportamentais previamente criados. www.studybuddhism.com. Abraço. Davi.