Extraído
do livro: The Service of Humanity, Damodar Mavalankar, Concord Grove Press,
1982. Tradução Izar G. Tauceda. Recebi sua carta de 11 de julho de 1882. Você
pergunta o que penso sobre reencarnação. Bem, essa é uma questão complicada, e
vou lhe dizer simplesmente no que acredito. Para começar, sou um panteísta e
não um teísta ou deísta. Creio que todo o Universo é Deus. Contudo, você deve
entender que a palavra Deus não tem para mim qualquer sentido agregado a esta
palavra pelos ocidentais. Quando digo Deus, penso que é a Natureza ou o
Universo, e nada mais. Portanto, devo ser chamado mais apropriadamente de
naturalista. Para mim, não é possível a existência de uma Divindade extra
cósmica, porque, se houvesse essa possibilidade, não poderia ser preservada a
harmonia ou equilíbrio da natureza em todo o Universo, que, em vez de ser um
todo harmonioso, seria apenas uma torre de Babel. Essa harmonia pode ser
mantida tão somente pela ação das Leis Imutáveis da Natureza. E, se as Leis da
Natureza são imutáveis, elas devem ser cegas e não precisam ser guiadas. Por
isso é impossível a existência de uma divindade extra cósmica. Tanto quanto
posso entender, este é o principal ensinamento e o princípio da filosofia
ariana. As filosofias semita e ariana são diferentes nesta ideia fundamental,
isto é, que a última, ariana, é
panteísta, isto é, não reconhece a existência de um Deus extra cósmico,
enquanto que a primeira, semita, é monoteísta, isto é, admite a existência de
um criador inteligente que existe fora do cosmo. Não posso dizer qual delas é
verdadeira, mas penso que a ariana tem uma posição lógica, enquanto que a
semita é apenas uma fé cega, por isso concordo com a ariana. Agora, alguns
panteístas reconhecem a existência de duas existências distintas, isto é, matéria
e espírito. Entretanto, refletindo um pouco mais sobre o assunto, cheguei à
conclusão de que essa colocação vai além do assunto e conclui que não é lógica.
Tanto quanto posso entender, pode haver apenas uma Existência infinita e não
duas. Quer a denominemos matéria, quer espírito, ou como quiser, ela é uma e a
mesma. E quem pode dizer que isto é Espírito e isto é Matéria? Você pode em
algum lugar traçar uma linha entre os dois? Por exemplo, o gelo é uma forma
bruta de matéria. Suponha que tenha forma rarefeita, você ainda terá água, que
ainda chama de matéria. Mas refinada ainda, você terá vapor, que ainda é
matéria. Mais alto ainda torna-se atmosfera, mas ainda é matéria. Além disso,
torna-se éter, e ainda é matéria, e assim você pode ir ad infinitum. Desse
modo, tornando-se mais e mais sublimada atinge seu clímax no processo de
espiritualização. Contudo ainda não se torna nada, porque tem um fim, deve ter
um começo. Se teve um começo, deve ter sido criada e assim devemos assumir a
existência de uma Divindade extra cósmica, que como disse acima, não é uma
colocação lógica. Então de forma lógica, entendemos que essa forma mais elevada
de matéria sublimada não pode ser nada. Nesse caso a matéria atingiu esse
clímax de sublimação ou espiritualização, quando qualquer ação ulterior a
tornaria mas grosseira e não mais refinada. O que se entende normalmente pela
palavra “espírito” não é mais do que uma forma altamente etérea da matéria, que
nós não podemos compreender com nossos sentidos finitos. Mas isso ainda é
matéria tanto quanto ainda é algo e sujeita a se tornar densa. Alguns dizem que
esses termos são usados para significar as duas condições extremas da matéria.
Contudo, com meus sentidos finitos, não posso compreender onde se pode traçar
uma linha entre matéria e espírito. E a gradação sendo infinita, desisto dessa
tarefa que é sem saída para mim, um ser finito imperfeito. Ora, há apenas uma
Existência Infinita Eterna, quer a chamemos de Espírito ou de Matéria. Contudo,
vou designá-la por este último nome, porque este termo é mais adequado para a
compreensão comum do que vou afirmar. A matéria, você sabe, chamamos de Maya.
Agora alguns dizem que a Matéria, quando assume uma forma e um molde temporário
é uma ilusão e, portanto, realmente não existe. Mas não concordo com isso. Em
minha opinião, e esta é a de todo metafísico racional, é a única Existência,
que é chamada de Maya simplesmente por causa das transformações. Nunca está
quieta. O processo sempre está operando. A Aglomeração Infinita de matéria, em algumas
de suas formas, fica mais e mais densa, enquanto que em outras torna-se mais e
mais sublimada. O círculo sempre está fazendo sua volta. Nada sai fora deste
círculo. Tudo é mantido dentro de seus limites pela ação das forças centrípetas
e centrífugas. As formas, mas a substância interna permanece a mesma.
Naturalmente você vai perguntar por que ser bom ou mau se a Natureza tem seu
próprio rumo? Nossas almas tornar-se-ão etéreas na hora certa? Mas afinal o que
é uma alma? É material ou imaterial? Bem, para mim é material porque como disse
acima, não há nada imaterial. Mas, então, o queé? Tanto quanto posso pensar, é
uma aglomeração que reúne todos os atributos com algo que nos dá a consciência
do que somos. E assim como pensamento é matéria, assim é todo atributo da
matéria. Por sua vez devemos perguntar, tornar-se-ão nossas almas etéreas? Ora,
tomemos novamente o exemplo do gelo. É sua forma mais grosseira de matéria.
Dizemos que se torna água. No entanto, seria assim se não entrasse em contato
como o calor? Com certeza, não. A ação da força centrípeta é forte e mantém
juntas as partículas de gelo. É necessária a ação da força centrífuga efetuada
pelo suprimento do calor. Se esse pedaço de gelo for colocado num lugar frio,
permanecerá assim até que, por acidente, os raios do Sol penetrem nele ou que
de alguma maneira o calor seja suprido. É também assim com o homem. A ação da
força centrípeta mantém-nos em nossas formas grosseiras. E, se quisermos
tornarmo-nos etéreos, devemos suprir a força centrífuga que é nossa vontade. E
esse é o primeiro princípio do ocultismo. Você deve perguntar: não podemos nos
elevar mais e mais alto sem sermos ocultistas? Respondo: decididamente não ao
ponto em que um ocultista atingirá. Você deseja simplesmente chegar mais acima?
Bem, como disse antes, este é apenas o primeiro princípio do ocultismo. E assim
como um passo leva a certo progresso, mais conhecimento levará a um progresso
maior, uma vez que cada resultado deve ser proporcional à causa que o produziu.
Anteriormente disse que a ação da matéria é sempre contínua. E a cada instante
estamos emitindo e atraindo vários átomos de matéria. Ora, a pessoa que não é
ocultista, terá vários desejos e, inconscientemente, produzirá a causa que
atrairá para ela estes átomos de matéria que não são adequados a seu progresso
superior. Da mesma maneira, quando ela setá emitindo outros átomos de matéria,
ela poderá dar-lhes uma certa tendência que irá misturá-los a outros inclinados a má índole e, assim outras
individualidades que serão tomadas terão que sofrer por faltas que não são
suas. Enquanto que um ocultista direciona ambas. Ele é o mestre da situação.
Ele não é guiado pelas forças cegas da natureza, mas as guia. E conhecendo sua
ação, produz as condições favoráveis para atingir o Nirvana. Mas o que é
Nirvana? Por Nirvana não me refiro a um local, mas a um estado. É essa condição
em que estamos tão etéreos que, em vez de sermos simplesmente uma forma de uma
existência infinita como agora, mergulhamos na Totalidade e tornamo-nos O TODO.
Também há outro motivo pelo qual um ocultista avançado está além de quem
meramente está contente com o primeiro passo mencionado acima. Quanto mais ele
estuda e compreende a ação das forças da natureza, mais condição tem para
beneficiar a humanidade. Enquanto um está simplesmente contente com seu
progresso, o outro, o ocultista avançado, coloca sua felicidade ao bem da
humanidade, que ele praticamente assiste e beneficia. Talvez você pense, como o
Universo está evoluindo, poderá chegar a hora em que este processo de evolução
deve cessar e começar a involução, e quando este último processo tenha
completado seu curso, tudo será Nirvana. E portanto, porque nos atribulamos com
o estudo do ocultismo e assim por diante se pudermos estar nesse estado? Mas há
dois motivos para fazê-lo. O primeiro é que não sabemos quando começará o
processo de involução e talvez passem milhões e bilhões de anos antes que tudo
seja Nirvana. E quem sabe por quantas transformações teremos que passar,
porque, como disse antes, a matéria nunca está quieta, está sempre mudando de
forma. Um ocultista prático atinge esse estado num período de tempo
comparativamente curto. Outro motivo é que quando tudo for Nirvana, nã haverá
Eu que atinja o Nirvana. E aqui quero afirmar que acredito que um homem pode
atingir o Nirvana apenas nesta vida e em nenhuma outra. Você naturalmente vai
perguntar: se algum tempo depois da morte Eu não for para o Nirvana, afinal,
para onde Eu vou? Respondo que se você não mantiver sua individualidade, você a
perde. O Ego permanece, mas a individualidade é perdida. Perco algo que no
presente não dá a consciência de que sou Damodar, que eu existo como tal. Minha
alma espiritual ou Ego, se for pura e boa, deve se tornar etérea e atingir o
estado de Nirvana, mas não será mais a individualidade Damodar que vai atingir
esse estado. Assim devo manter essa individualidade até atingir o estado de
Nirvana. E como fazer isto é ensinado pelo ocultismo. Não surge do nada. As
partículas que me formam sempre existiram, e não sei em qual forma elas
existiram antes. Provavelmente passaram por milhões e bilhões de
transformações. E por que não lembro agora? Porque não mantive minha
individualidade. Não supri a ação da força que não teria permitido a
desintegração de minha individualidade. O ocultismo dá a chave. E, se Eu agir
de acordo, devo atingir o Nirvana. Mas então Eu não estaria eternamente neste
estado. Porque não é justo que as ações de alguns anos fossem eternamente
recompensadas ou punidas. E quanto pode durar uma vida? Mais ou menos oitenta
anos. Seria então justo que minhas ações em tão curto período pudessem ser
eternamente punidas ou recompensadas? E o que são bilhões de anos comparados à
eternidade? Mas você vai perguntar: para que atingir o Nirvana, se vamos voltar
outra vez? Por dois motivos, o primeiro é que, devo estar em Nirvana por algum
tempo, tanto quanto as ações da força me mantenham ai, ou, em outras palavras,
devo ficar ai até que se complete o resultado de meus esforços para atingí-lo,
e o efeito sempre é proporcional à causa. Aqui novamente você deve perguntar:
não temos que manter ad infinitum este processo? Claro que não porque a Lei da
Exaustão deve se confirmar. Tudo que você fizer deve ser em detrimento de outra
(coisa), ou em outras palavras, você exaure certa quantidade de energia para
produzir certo resultado. O outro motivo é que enquanto você está passando pelo
processo de tornar-se etéreo, fluído, relacionado com partículas ou o próprio
éter; que tende a volaticidade, você também confere uma certa tendência às
partículas das quais você é formado. Essa tendência sempre vai se manter e
assim, em cada ciclo, isto é, em cada círculo de sua transformação ou
reencarnação, você terá as mesmas vantagens que sempre poderá utilizar, para
logo se libertar e ficar mais tempo no estado de Nirvana do que a maioria da
humanidade, e você fica comparativamente livre. Assim, toda consciência que já
foi completamente desenvolvida deve se desintegrar, se não for preservada pela
pureza de seus Egos sucessivos até que o estado de Nirvana seja atingido. Ora,
creio que o pleno desenvolvimento de minha consciência como Domodar é possível
apenas nesta Terra. Assim, uma pessoa deve morrer antes que sua consciência
esteja desenvolvida e renascer nesta terra. E isso é possível apenas em dois
estados, isto é, se morremos na infância ou no caso de uma pessoa que sofre de
incapacidade congênita. Ou há um terceiro estado possível que é este: suponha
que estudo ocultismo e chego a certo estágio em que posso reter minha
individualidade, suponha que meu corpo esteja incapacitado para meus propósitos
práticos. Ai, com meu conhecimento, posso escolher qualquer corpo que Eu
quiser, porque, como disse antes, só se pode
atingir o estado de Nirvana nesta vida terrena. Posso estar em qualquer
outro corpo, mas minha individualidade será a mesma de agora e vou me reconhecer como Domodar. É
muito difícil, colocar essas ideias no papel, porque o processo é tedioso. Tais
coisas devem ser entendidas intuitivamente e, portanto, nossos conceitos delas
serão mais etéreos. A primeira coisa que tenho que fazer é materializar meu
pensamento, dar-lhe uma forma e então descrevê-lo. Tenho também que pensar nas
objeções que devem surgir naturalmente. E assim, nestes assuntos, acredito ser
mais fácil debater oralmente do fque escrever ou falar. Devo ter esquecido
muitos pontos, mas dei-lhe as ideias princpais para que você possa fazer suas
perguntas e ficarei muito feliz em responder a elas. Devo, contudo, dizer-lhe
que apenas Eu sou responsável por qualquer engano. Eu simplesmente li Isis Sem
Véu, livro publicado primeiramente em 1877 de Helena Petrovna Blavatsky
(1831-1891), e escutei muitas vezes HPB conversar com outras pessoas, como
também em algumas ocasiões sobre Os Poderes Superiores. Eles me deram algumas
sugestões. Mas o trabalho subsequente é inteiramente meu. Se você achar que ele
é bom e correto, todo crédito é devido a eles, nossos irmãos, e a HPB por terem
me dado estas indicações. Se houver alguns enganos, toda falta é inteiramente
minha, por não ter entendido adequadamente seus ensinamentos. E isso deve
mostrar que tenho muitas falhas em minha intuição. Abraço. Davi.
Nenhum comentário:
Postar um comentário