quinta-feira, 21 de maio de 2015

Bhagavad Gita. O Karma Yoga.



Neste terceiro capítulo é abordado o Karma Yoga, como o Reto Cumprimento da Ação. Tudo o que o homem faz com motivos pessoais, é sem valor para o Eterno. Para atingirmos a salvação e a união com Deus, havemos de agir sem motivos egoístas, sem tomar em consideração o nosso próprio Eu Pessoal, entregando-nos à Vontade Divina como um instrumento na mão de Deus, e assim, cumprindo o nosso dever por ser dever, sem pedir recompensas. "Falou Arjuna, o príncipe Pândava, a Krishna, o Senhor Bem Aventurado, dizendo: Óh! Conferidor do Saber! Disseste-me que o conhecimento é até mais importante do que a ação; se assim é, por que me incitas à ação? Por que queres que eu entre nesta horrível batalha com meus parentes e amigos? Interessante o texto bíblico de Êxodo 32:26-28, pois lembra figuradamente esse conflito interior que Arjuna enfrentava. Veja o que é dito nele: “Pôs-se em pé Moisés na porta do arraial e disse: Quem é do Senhor, venha a mim. Então se ajuntaram a ele todos os filhos de Levi. E disse-lhes: Assim diz o Senhor Deus de Israel: Cada um ponha a sua espada sobre a sua coxa; e passai e tornai pelo arraial de porta em porta, e mate cada um a seu irmão, e cada um a seu amigo, e cada um a seu vizinho. E os filhos de Levi fizeram conforme à palavra de Moisés; e caíram do povo aquele dia uns três mil homens”. Tuas ambíguas palavras me trazem dúvidas e me confundem o entendimento. Fala-me, peço-te, em frases claras e certas, qual é o caminho que me conduzirá a Paz e à Satisfação? Respondeu Krishna, o Divino: Como já te disse, Oh! nobre príncipe, há dois caminhos que vão à Perfeição. O primeiro é o caminho do Conhecimento (1), e o segundo o da ação (2). Uns preferem o primeiro, e outros, o segundo desses dois caminhos; sabe, porém, que considerados do alto, ambos são um só caminho. Escuta!  (1). Sankhya. (2). Yoga. Engana-se quem pensa que, esquivando-se das ações e persistindo na inatividade, escapa dos resultados da ação. Quem nada começa, não pode entrar no estado da Paz Eterna; a inatividade não conduz à Perfeição. E, na realidade, nem há coisas que se possam designar pela palavra inatividade; pois tudo, no Universo, está em atividade constante, e nada pode subtrair-se à lei geral. Ninguém pode ficar inativo nem um instante; pois as leis de sua natureza o impelem constantemente a fazer alguma coisa, queira ele ou não; o seu corpo ou a sua mente, ou ambos, sempre estão ocupados. Se alguém se assenta para reter e dominar os seus sentidos e os órgãos de atividade, mas, em sua mente, está apegado aos objetos dos sentidos, ilude-se e merece o nome de hipócrita. Porém, é digno de ser chamado sábio e nobre aquele que sujeitou os seus sentidos a Deus, pelo amor ardente ao Altíssimo, e expressa o seu reto pensar em reta ação; ele cumpre o seu dever, sem esperar recompensas e, ocupando-se de objetos dos sentidos, não se deixa dominar por eles. Realiza o bem que te compete fazer no mundo; cumpre bem as tuas tarefas; ocupa-te da obra que encontras, para fazê-la o melhor possível; assim será muito bom para ti. Atividade é melhor do que ociosidade. A atividade fortalece a mente e o corpo, e conduz a uma vida longa e normal; a ociosidade enfraquece tanto o corpo como a mente, e conduz a uma vida impotente e anormal, de duração incerta. Os homens estão aferrados a este mundo, porque agem com o fim de obter recompensa e ganho; estão apegados aos objetos de seus desejos, e, por isso, cansam-se na escravidão dos sentidos. Para se libertarem, hão de agir com resignação, movidos pelo puro amor ao Bem. Realiza, pois, Oh! Arjuna! a tua tarefa, para cumprires o dever que o Eu Real te impõe, e não por qualquer outro motivo. Lembras-te das doutrinas antigas que narram a criação do mundo, e das palavras que o Criador disse aos homens que tinha criado! Ouve, e as repetirei: Pela adoração e pelo sacrifício mútuo, crescereis vos  multiplicarei. (0). (0) As Escritura Cristãs fazem menção a esse texto do Bhagavad Gita em Gênesis 1:28 “E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra”.  Pela resignação, obtereis a satisfação dos vossos desejos. Lembrai-vos da Fonte de todas as coisas, do Distribuidor dos objetos desejados. Pensai no que é Divino, para que o Divino pense em vós (6). (6) Outra citação que lembra o Novo Testamento em Colossenses 3:1-3 “Portanto, se já ressuscitastes com Christo (Krishna), buscai as coisas que são de cima, onde Christo (Khrishna) está assentado à destra de Deus. Pensai nas coisas que são de cima, e não nas que são da terra. Porque já estais mortos, e a vossa vida está escondida com Christo (Krishna) em Deus”. Se nutrirdes, com o sacrifício de vós mesmos, os deuses, eles vos darão o desejado alimento espiritual. Quem recebe os dons dos deuses e não lhes mostra a gratidão, é como um ladrão. Os bons homens que retém para si só aquilo que resta depois de terem oferecido à Divindade tudo o que é divino, são livres de todos os pecados; porém, os maus que querem agir só para si mesmos, vivem em pecado (...). Todas as criaturas (tanto espirituais como as materiais) vivem, enquanto se alimentam. O alimento cresce com a chuva. A chuva é mandada pelos deuses em resposta aos desejos, às preces e as súplicas dos homens. Os desejos, as preces e as súplicas dos homens são formas de ações; e as ações procedem da Vida Una que tudo penetra. Sabe que toda ação tem sua origem em Brahma. Brahma (O Eterno, O Ser Supremo, O Uno, A Consciência Cósmico, O Inominado e Indizível) é a revelação da Indivisível Unidade. Por isso, Brahma, que tudo penetra, é sempre presente nas tuas ações. É vã e vergonhosa a vida do homem que, vivendo neste mundo de ação, tenta abster-se da ação; quem, gozando o fruto da ação do mundo ativo, não coopera, mas vive em ociosidade. Aquele que, aproveitando a volta da roda (do Dharma), em cada instante de sua vida, não quer pôr a mão à roda para ajudar a movê-la, é um parasita e um ladrão que toma, sem dar coisa alguma em troca (7). (7) Outra referência importante paralela está em Jeremias 18:2-4 “Levanta-te, e desce à casa do oleiro, e lá te farei ouvir as minhas palavras. E desci à casa do oleiro, e eis que ele estava fazendo a sua obra sobre as rodas. Como o vaso, que ele fazia de barro, quebrou-se na mão do oleiro, tornou a fazer dele outro vaso, conforme o que pareceu bem aos olhos do oleiro fazer”. Sábio é, porém, aquele que cumpre bem os seus deveres e executa as obras que são para fazer-se no mundo, renunciando a seus frutos e concentrado na ciência do Eu Real. Tal homem, elevado acima dos mundos, não se inquieta por saber se alguma coisa no mundo acontece ou não acontece; achando em si mesmo tudo de que precisa, não tem necessidade de refugiar-se em nenhum ser criado, para nele achar apoio. Participando de tudo e agindo, em tudo, de acordo com os ditames do dever, de nada depende, porque a sua fé, esperança e ciência se fixam no Imperecível, que é o único apoio seguro. Faz, pois, o que deve ser feito; porém, sem egoísmo e sem considerações pessoais. Quem age assim e cumpre o seu dever, livre de motivos egoístas, e sem depender de alguém, caminha, com passos firmes, diretamente à Consciência Superior, ao plano espiritual. Janaka e muitos outros atingiram o estado de perfeição por  meio de boas obras e reta ação. Trabalha, pois, também tu por amor à humanidade. Quando um nobre homem faz alguma coisa, os outros o imitam; o exemplo que ele dá, é seguido pelo povo. Segue, portanto, os melhores de tua raça. Toma-me por exemplo, Oh! príncipe. Nada há, no Universo dos Universos, que eu deseje ou que seja necessário que para mim não se faça; nem há coisa alguma atingível que eu não tenha já atingido. E, contudo, estou em constante ação e movimento, agindo sempre e incessantemente. Os homens, Oh! Arjuna, seguem sempre o meu exemplo; por isso, se eu deixasse de ser ativo, estes Universos cairiam em ruína. Se eu não agisse, começaria a reinar uma confusão Universal, e a minha inatividade seria a causa da destruição do gênero humano. Como os que carecem ainda da Luz Espiritual fazem esforços para alcançar o que desejam, sendo a esperança de recompensa o estímulo de suas ações; assim deve o homem desenvolvido e iluminado agir abnegadamente, pela causa do bem comum e conforme a Lei Universal. Mas não deves confundir, com estas ideias, as cabeças dos homens inexperientes, cujo coração ainda está apegado às obras. Deixa-os fazer o melhor que podem; mas tu e os outros sábios, devem agir em harmonia comigo, animando os outros à atividade, e dando-lhes o exemplo. Toda a atividade e todas as ações provêm dos movimentos das forças da Natureza. O insensato, que é iludido pela presunção e vaidade, pensa que ele é o ator e diz: Eu faço isto, eu fiz aquilo. Mas quem conhece a verdade, sorri, porque detrás da personalidade, enxerga a fonte real da ação, a causa e o efeito. Entretanto, os que conhecem a verdade inteira, devem acautelar-se para não ofuscarem com ela o fraco entendimento daqueles que ainda não estão preparados para conhecê-la, por que  as doutrinas prematuras poderiam confundir e desviar estes da sua atividade. Tu, porém, Oh! Arjuna, liberta-te de todos os cuidados, de todo medo e, igualmente, do egoísmo e das esperanças pessoais; em Meu nome (3), faz tudo o que hás de fazer, concentrando todos os teus pensamentos no Altíssimo! Os homens que, cheios de fé e confiança, seguirem estes meus ensinos e não tiverem dúvidas, alcançarão a liberdade também pelas obras e ações.  (3). Isso é, em nome de Deus, Krishna (Christo) é a Encarnação Divina. Porém, aqueles que rejeitam os ensinos da Verdade e agem contra eles, são insensatos e iludidos, caem em confusão e inquietações. Cada ser age em conformidade com a sua natureza; também o sábio procura o que se harmoniza com a sua própria natureza, de acordo com aquilo que é o mais alto no seu caráter. Ninguém pode escapar às leis naturais. Os objetos sensuais são os senhores dos sentidos, e atraem ou repelem o coração dos homens, enchendo-o de afeição ou de aversão. Não te deixes dominar por nenhuma destas duas forças, porque ambas são obstáculos no caminho e o sábio as subjuga ambas. Finalmente, lembra-te que é melhor cumprir a própria tarefa, ainda que seja humilde e insignificante, do que querer fazer a tarefa de um outro, por mais nobre e excelente que seja. É melhor morrer no cumprimento do seu dever, do que viver negligenciando-o e querendo fazer o que a outros compete fazer. Pergunta Arjuna: Mas fala-me, Oh! Senhor, que força misteriosa é essa que, muitas vezes, parece obrigar o homem a praticar um mal, até contra a própria vontade! Explica Krishna: Esta tentação, Oh! príncipe, é a essência dos desejos que o homem em si acumulou (4). Ela é o seu maior inimigo, e chama-se Paixão; nasce da natureza carnal, cheia de pecado e de erro, e ataca o homem para o consumir.  (4).  Em sanscrito dá-se o nome de Kama. Não confundir com Karma. Como a fumaça envolve a chama, a ferrugem o metal, o útero a criança para nascer; assim o mundo é envolvido por este inimigo, chamado Desejo. O Desejo impede o verdadeiro saber; ele é como um fogo devorador, difícil de extinguir-se. Os sentidos e a mente são a sede; e, por meio deles, confunde o discernimento e obscurece o conhecimento da verdade. Antes de tudo, devas, portanto vencer esse inimigo de tua alma. Domina os teus sentidos e os seus órgãos, e afugenta de ti esse gerador do mal. Os sentidos são grandes e poderosos; porém, maior e mais poderosa é a mente; maior do que esta é a Razão, e o mais forte é o Eu Real, A Luz da Divindade (5).  (5). Os sentidos, que são a sede do desejo, designam-se, em sânscrito pelo termo Kama; a mente chama-se Manas; a Razão Iluminada é Budhi; o Eu Real, a Consciência da Divindade é Atma. Reconhecendo, pois, o Eu Real como o Senhor mais poderoso, domina pelos seu poder o Eu Pessoal, e assim subjuga o monstro de desejo; esta tarefa é difícil, mas não impossível. Combate o desejo, domina-o pela força da Luz Divina do Eu Real; não o deixes ser teu Senhor, mas reduzi-o a ser teu escravo!". Bhagavad Gita. A Mensagem do Mestre. Tradução Francisco Valdomiro Lorenzo. Editora Pensamento. São Paulo - Brasil. Abraço. Davi.

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