1. O Budismo é uma
doutrina com uma visão negativa da vida? O Budismo é niilista? Não, o
Budismo não tem uma visão negativa da vida e nem é niilista. Mas é uma
realidade que no Ocidente o Budismo tem sido rotulado como uma religião
negativa que enfatiza o sofrimento e a negação da vida, que defende o niilismo.
2. Porque o Budismo recebeu esse rótulo negativo no Ocidente? Essa ideia
surgiu entre filósofos europeus durante o século 19. Na época, vários
escritores influentes, baseados em leituras falhas dos textos Budistas,
rotularam o Budismo como uma forma perigosa de niilismo. Mais recentemente,
esse tipo de ideia prevalece mesmo dentro da Igreja Católica, como pode ser
constatado no livro "Crossing the Threshold of Hope", escrito pelo
Papa João Paulo II, Karol Wojtyla (1920-2005). Nesse livro, o Papa afirma que a
iluminação do Budha teve como base a convicção de que o mundo representa o mal
e é a fonte de sofrimento do homem. Dessa forma, para se livrar do sofrimento é
necessário se livrar do mundo. Seria necessário romper os vínculos que nos atam
à realidade externa. Quanto mais nos libertarmos desses vínculos mais nos
libertaremos do sofrimento, isto é, do mal que provém do mundo. O Budha nunca
afirmou que o mundo é a fonte do mal e do sofrimento. A ênfase do ensinamento
Budista está na mente e não no mundo. O mundo é neutro, é a mente do homem que
cria dificuldades no mundo. A fonte do sofrimento, de acordo com o ensinamento
do Budha, é a cobiça e a raiva numa mente confusa. Essas características não
são do mundo, mas do próprio homem. 3. Mas o que é o niilismo? Niilismo
é uma designação atribuída a várias filosofias radicais que rejeitam todo e
qualquer valor positivo e não acreditam em nada. Os niilistas adotam um visão
materialista da vida e afirmam que depois da morte não há nada. Ou seja, com a
morte, esse tipo de doutrina considera que não só o corpo é aniquilado, mas a
mente também é completamente aniquilada. O Budismo rejeita esse tipo de
doutrina e afirma que após a morte há a continuidade da consciência. Não no
sentido de uma entidade permanente, como por exemplo uma alma ou espírito, mas
uma consciência que está sujeita a um contínuo processo de vir a ser ou devir.
Além disso, a doutrina do karma, ou lei da natureza relativa às ações e suas
consequências, que faz parte dos ensinamentos centrais no Budismo, também é
evidência de que o Budismo não ensina a aniquilação completa com a morte. 4.
Mas o vazio ou vacuidade no Budismo não é uma afirmação niilista? O termo
técnico Budista Shunyata, em sânscrito ou suññata em Pali, tem dado origem a mal
entendidos no Ocidente, onde esse termo é interpretado como o nada, a ausência
ou extinção da existência. Shunyata, ou Vacuidade, é um sinônimo para a origem
dependente. A origem dependente é provavelmente o ensinamento Budista mais
importante, e em essência afirma que
todas as coisas, quer sejam materiais ou mentais, surgem, subsistem e
desaparecem de acordo com causas e condições. Nenhum tipo de coisa existe de
forma autônoma, independente de causas e condições. Essas causas e condições
são internas e externas. Por exemplo, uma árvore depende para sua sobrevivência
do seu tronco, raízes, galhos e folhas, que são as suas condições internas, mas
também a árvore depende da terra, do sol, do abastecimento de água e das
condições climáticas de uma forma geral para a sua sobrevivência, essas são as
condições externas. Sem estar suportada por essas condições a árvore não
existe, o que leva à conclusão de que a árvore em si é vazia. Uma outra forma
de análise é observar que as condições internas na verdade são partes nas quais
a árvore pode ser dividida e ao dividir a árvore em partes, não há nada nessas
partes que contenha em si a característica de árvore. A ideia da árvore é um
conceito criado pela mente a partir da união daquelas partes, e assim sendo a
árvore em si é vazia. Então, não é que o Budismo negue a existência das coisas,
mas o que é negado é que as coisas possuam algum tipo de existência
independente, autônoma. Se as coisas tivessem uma existência autônoma então o
mundo seria estático, permanente. É evidente que esse não é o caso. Como as coisas
são desprovidas de uma existência independente, autônoma, e dependem de causas
e condições para se manifestar, é dito que as coisas são vazias, vazias de uma
existência inerente. E justamente pelo fato das coisas serem vazias que a
mudança é possível. As coisas mudam quando as condições das quais elas dependem
mudam. Esse entendimento é o que viabiliza toda a prática Budista, pois o
caminho Budista trata da mudança, da transformação dos estados mentais inábeis,
ou prejudiciais, em estados mentais hábeis, ou benéficos. 5. O Budismo então
também rejeita a eternidade? A ideia de uma vida eterna ou de coisas que
durem para sempre é rejeitada no Budismo. Se analisarmos as coisas neste mundo
com atenção é possível verificar que não há absolutamente nada que seja
permanente. Todas as coisas, quer sejam na nossa mente e corpo ou no exterior,
exibem a mesma característica de impermanência e instabilidade. As coisas
surgem e desaparecem de acordo com causas e condições. 6. Mas e com relação
ao sofrimento. Porque o Budismo coloca tanta ênfase no sofrimento? A visão
Budista do mundo pode ser descrita como realista. Ninguém pode negar que há
sofrimento na vida. O envelhecimento, a enfermidade e a morte são causas de
sofrimento para a maioria das pessoas. Também no dia a dia as pessoas estão
sujeitas a todo tipo de desconfortos físicos e mentais que causam sofrimento e
estresse em graus variados. Na verdade, para a maioria das pessoas a vida
contém momentos de alegria e felicidade mais ou menos na mesma proporção de momentos
de tristeza e infelicidade. Poderíamos chamar isso de padrão de uma vida normal
e o Budismo simplesmente reconhece isso e afirma que não há nada de errado
nisso. Se as pessoas sofrem elas não precisam se culpar por isso, visto que
sofrer faz parte da vida. Para curar um enfermo, a primeira coisa que um médico
precisa fazer é um diagnóstico preciso para então saber qual o tratamento a ser
prescrito. O Budha ao transmitir os seus ensinamentos agiu como um médico. O
diagnóstico da condição humana é que o sofrimento é a experiência comum a todos
os seres vivos, em forma de descontentamento, insatisfação ou tristeza. Em
vista desse diagnóstico, o Budha prescreveu a maneira de dar um fim ao
sofrimento; e o tratamento para dar um fim ao sofrimento é o núcleo da prática
Budista. O sofrimento é a experiência que nos leva ao despertar, pois quando
sofremos, tendemos a investigar, a ter curiosidade, a buscar uma saída. O
Budismo, na realidade, nos apresenta a oportunidade de despertar para a nossa
verdadeira natureza, para a verdadeira liberdade, para o amor e a compaixão.
Ele proporciona uma visão positiva do potencial humano para encontrar a
verdadeira felicidade. http://www.nossacasa.net/shunya/.
Abraço. Davi.
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