Espiritismo. Texto de Alan Kardec (1804-1869). INTRODUÇÃO AO
ESTUDO DA DOUTRINA ESPÍRITA Parte I. UM.
Para coisas novas, palavras novas são necessárias, assim o requer a clareza da
linguagem, para evitar a confusão inseparável do sentido múltiplo dos mesmos
termos. As palavras espiritual, espiritualista, espiritualismo, possuem uma
acepção bem definida; dar-lhes uma nova para aplicá-las à Doutrina dos
Espíritos, seria multiplicar as causas já tão numerosas de anfibologia. Com
efeito, o espiritualismo é o oposto do materialismo; quem quer que acredite
possuir em si outra coisa além da matéria é espiritualista; mas daí não se
conclui que creia na existência dos Espíritos ou em suas comunicações com o
mundo visível. Em lugar das palavras ESPIRITUAL, ESPIRITUALISMO, empregamos,
para designar essa última crença, as de espírita e de espiritismo cuja forma
lembra a origem e o sentido radical, e que por isso mesmo têm a vantagem de ser
perfeitamente inteligíveis, reservando à palavra espiritualismo sua acepção
própria. Diremos, portanto, que a Doutrina Espírita ou o Espiritismo tem por
princípio as relações do mundo material com os Espíritos ou seres do mundo
invisível. Os adeptos do Espiritismo serão os espíritas, ou, se desejarem, os
espiritistas. Como especialidade, O Livro dos Espíritos contém a Doutrina
Espírita; como generalidade, ele se prende à Doutrina Espiritualista da qual
apresenta uma das fases. Esta é a razão pela qual ele traz no topo de seu
título as palavras: Filosofia Espiritualista. DOIS. Há uma outra palavra sobre a qual convém
igualmente se entenderem, porque é um dos esteios de toda doutrina moral, e
porque é objeto de numerosas controvérsias, por falta de uma acepção bem
determinada; é a palavra alma. A divergência de opiniões sobre a natureza da
alma vem da aplicação particular que cada um faz desta palavra. Uma língua
perfeita, em que cada ideia tivesse sua representação através de um termo
próprio, evitaria muitas discussões; com uma palavra para cada coisa, todo o
mundo se entenderia. Segundo uns, a alma é o princípio da vida material
orgânica; ela não tem, absolutamente, existência própria e termina com a vida:
é o materialismo puro. Neste sentido, e por comparação, falam de um instrumento
rachado que não emite mais som: ele não tem alma. Conforme essa opinião, a alma
seria um efeito e não uma causa. Outros pensam que a alma é o princípio da
inteligência, agente universal do qual cada ser absorve uma porção. Segundo
eles, não haveria para todo o Universo senão uma alma que distribui centelhas
entre os diversos seres inteligentes, durante a vida destes; depois da morte,
cada centelha retorna à fonte comum onde no Livro dos Espíritos ela se confunde
no todo, como os riachos e os rios retornam ao mar de onde saíram. Esta opinião
difere da precedente pelo fato de que, nesta hipótese, há em nós mais do que a
matéria, e de que alguma coisa subsiste após a morte; mas é quase como se nada
restasse, visto que, não possuindo mais individualidade, não teríamos mais
consciência de nós mesmos. Conforme esta opinião, a alma universal seria Deus,
e cada ser uma porção da Divindade; é uma variação do panteísmo. Segundo
outros, finalmente, a alma é um ser moral, distinto, independente da matéria e
que conserva sua individualidade após a morte. Esta acepção é, certamente, a
mais geral, porque, sob um nome ou sob outro, a ideia desse ser que sobrevive
ao corpo encontra-se no estado de crença instintiva e independente de qualquer
ensino, em todos os povos, qualquer que seja o grau de sua civilização. Esta
doutrina, segundo a qual a alma é a causa e não o efeito, é a dos
espiritualistas. Sem discutir o mérito destas opiniões, e apenas considerando o
aspecto linguístico da questão, diremos que estas três aplicações da palavra alma
constituem três ideias distintas que pediriam, cada qual, um termo diferente.
Esta palavra tem, portanto, uma tripla acepção, e cada qual tem razão, sob seu
ponto de vista, na definição que lhe dá; a dificuldade ocorre porque a língua
possui uma só palavra para três ideias. Para evitar qualquer equívoco, seria
necessário restringir a acepção da palavra alma a uma destas três ideias; a
escolha é indiferente, o importante é que todos se entendam, é uma questão de
convenção. Acreditamos mais lógico tomá-la na sua acepção mais vulgar; é por
isso que chamamos ALMA o ser imaterial e individual que reside em nós e que
sobrevive ao corpo. Se este ser não existisse, sendo apenas um produto da
imaginação, ainda assim, seria preciso um termo para designá-lo. Por falta de
uma palavra especial para cada uma das duas outras acepções nós chamamos:
Princípio vital o princípio da vida material e orgânica, qualquer que seja sua
fonte e que é comum a todos os seres vivos, desde as plantas até o homem.
Podendo a vida existir, abstração feita da faculdade de pensar, o princípio
vital é uma coisa distinta e independente. A palavra vitalidade não daria a
mesma ideia. Para uns, o princípio vital é uma propriedade da matéria, um
efeito que se produz quando a matéria se encontra em dadas circunstâncias;
segundo outros, é a ideia mais comum, ele reside num fluido especial,
universalmente espalhado e do qual cada ser absorve e assimila uma parte
durante a vida, como vemos os corpos inertes absorver a luz; este seria, então,
o fluido vital que, segundo algumas opiniões, não seria outro senão o fluido
elétrico animalizado, também designado sob os nomes de fluido magnético, fluido
nervoso, etc. Seja como for, há um fato que não se poderia contestar, pois é um
resultado de observação, é que os seres orgânicos têm em si uma força íntima
que produz o fenômeno da vida, enquanto essa força existe; que a vida material
é comum a todos os seres orgânicos e que é independente da inteligência e do
pensamento; que a inteligência e o pensamento são faculdades próprias de
algumas espécies orgânicas; finalmente, que, entre as espécies orgânicas
dotadas de inteligência e de pensamento, há uma dotada de um senso moral
especial que lhe dá uma incontestável superioridade sobre os outros, é a
espécie humana. Concebe-se que, com um sentido múltiplo, a alma não exclui o
materialismo, nem o panteísmo. O próprio espiritualista pode muito bem entender
a alma de acordo com uma ou outra das duas primeiras definições, sem prejuízo
do ser imaterial distinto ao qual ele dará, então, um nome qualquer. Assim,
esta palavra não representa uma opinião: é um Proteu2 que cada um acomoda à sua
maneira; daí a fonte de intermináveis disputas. Evitar-se-ia igualmente a
confusão, ao empregar a palavra alma nos três casos, se a ela se acrescentasse
um qualificativo que especificaria o ponto de vista sob o qual ela é encarada,
ou a aplicação que dela se faz. Seria, então, uma palavra genérica,
representando, ao mesmo tempo, o princípio da vida material, da inteligência e
do senso moral e que se distinguiria, através de um atributo, como os gases,
por exemplo, que se distinguem acrescentando as palavras hidrogênio, oxigênio
ou azoto. Portanto, poder-se-ia dizer, e talvez fosse o melhor, a alma vital
para o princípio da vida material, a alma intelectual para o princípio
inteligente, e a alma espírita para o princípio de nossa individualidade após a
morte. Como se vê, tudo isso é uma questão de palavras, porém uma questão muito
importante para que nos entendamos. Desta forma, a alma vital seria comum a
todos os seres orgâ nicos: plantas, animais e homens; a alma intelectual seria
própria dos animais e dos homens; e a alma espírita pertenceria apenas ao
homem. Julgamos necessário insistir um tanto mais nessas explicações porque a
Doutrina Espírita repousa, naturalmente, sobre a existência em nós de um ser
independente da matéria e que sobrevive ao corpo. Devendo a palavra alma se
reproduzir frequentemente no decorrer desta obra, era importante ser fixada no
sentido que lhe atribuimos, afim de evitar qualquer engano. Passemos, agora, ao
objeto principal desta instrução preliminar. TRÊS. A Doutrina Espírita, como
qualquer coisa nova, tem seus adeptos e seus contraditores. Vamos tentar
responder a algumas das objeções destes últimos, examinando o valor dos motivos
sobre os quais eles se apoiam, sem ter, entretanto, a pretensão de convencer a
todos, pois há pessoas que acreditam que a luz foi feita apenas para elas. Nós
nos dirigimos às pessoas de boa-fé, sem idéias preconcebidas ou mesmo inflexíveis,
porém, sinceramente desejosas de se instruir, e nós lhes demonstraremos que a
maioria das objeções que se opõe à doutrina provém de uma observação incompleta
dos fatos e de um julgamento emitido com muita leviandade e precipitação.
Lembremos, primeiramente, em poucas palavras, a série progressiva dos fenômenos
que deram origem a esta doutrina. O primeiro fato observado foi o de objetos
diversos postos em movimento; designaram-no, vulgarmente, sob o nome de mesas
girantes ou dança das mesas. Este fenômeno, que parece ter sido observado
primeiramente na América, ou Proteu: da mitologia grega, filho de Poseidon, que
mudava de forma à vontade. (Nota do tradutor segundo o Dicionário Larousse
Illustré. As suas notas sequentes conterão apenas as iniciais N.T.). O Livro
dos Espíritos foi o melhor, que se repetiu nesse país, pois a História prova
que ele remonta à mais remota Antiguidade, produziu-se acompanhado de
circunstâncias estranhas, tais como ruídos insólitos, pancadas sem causa
ostensiva conhecida. Daí, propagou-se rapidamente pela Europa e por outras
partes do mundo; a princípio, despertou muita incredulidade, porém a
multiplicidade das experiências, em pouco tempo, não mais permitiu duvidar da
realidade. Se esse fenômeno se tivesse limitado ao movimento dos objetos
materiais, poderia explicar-se por uma causa puramente física. Estamos longe de
conhecer todos os agentes ocultos na Natureza e todas as propriedades daqueles
que conhecemos; a eletricidade, aliás, multiplica, diariamente, ao infinito, os
recursos que proporciona ao homem e parece ir clarear a Ciência com uma nova
luz. Portanto, nada haveria de impossível em que a eletricidade, modificada por
certas circunstâncias, ou qualquer outro agente desconhecido, fosse a causa
desse movimento. A reunião de várias pessoas, aumentando o poder de ação,
parecia apoiar essa teoria, pois podia-se considerar esse conjunto como uma
pilha múltipla cuja potência estivesse na razão do número dos elementos. O
movimento circular nada apresentava de extraordinário: ele está na Natureza;
todos os astros se movem circularmente; poderíamos, portanto, ter em ponto
menor, um reflexo do movimento geral do Universo, ou, melhor dizendo, uma causa
até então desconhecida, podia produzir, acidentalmente, com pequenos objetos, e
em dadas circunstâncias, uma corrente análoga àquela que arrasta os mundos. Mas
o movimento não era sempre circular; muitas vezes ele era brusco, desordenado;
o objeto era violentamente sacudido, revirado, levado numa direção qualquer e,
contrariamente a todas as leis da estática, suspenso do solo e mantido no
espaço. Nada nestes fatos que não possa ser explicado pelo poder de um agente
físico invisível. Não vemos a eletricidade derrubar os edifícios, desenraizar
as árvores, lançar a distância os corpos mais pesados, atraí-los ou repeli-los?
Supondo que os ruídos insólitos, as pancadas não fossem um dos efeitos comuns
da dilatação da madeira, ou de qualquer outra causa acidental, ainda poderiam
muito bem ser produzidos pela acumulação do fluido oculto: a eletricidade não
produz os ruídos mais violentos? Até aqui, como se vê, tudo pode caber no
domínio dos fatos puramente físicos e fisiológicos. Sem sair deste círculo de
ideias, havia ali matéria de estudos sérios e dignos de prender a atenção dos sábios.
Por que não foi assim? É penoso dizê-lo, mas isto deriva de causas que provam,
entre mil fatos semelhantes, a leviandade do espírito humano. Primeiramente, a
vulgaridade do objeto principal que serviu de base às primeiras experimentações
talvez não fosse estranha para eles. Que influência uma palavra, muitas vezes,
não tem tido sobre as coisas mais graves! Sem considerar que o movimento podia
ser impresso a um objeto qualquer, a ideia das mesas prevaleceu, com certeza,
porque era o objeto mais cômodo, e porque é mais natural sentar-se em torno de
uma mesa do que de qualquer outro móvel. Ora, os homens superiores são algumas
vezes tão pueris que nada haveria de impossível em que alguns espíritos de
elite tenham acreditado estar abaixo deles se ocupar com o que se convencionara
chamar de a dança das mesas. É até provável que, se o fenômeno observado por
Galvani o tivesse sido por homens comuns e tivesse permanecido caracterizado
por um nome grotesco, ele estaria ainda relegado, junto com a varinha mágica.
Com efeito, qual o cientista que, não acreditaria rebaixar-se, ocupando-se da
dança das rãs? Alguns, no entanto, bastante modestos para convir que a Natureza
bem poderia não lhes ter dito sua última palavra, quiseram ver, para o bem de
sua consciência; mas aconteceu que o fenômeno nem sempre respondeu à sua
expectativa, e do fato de não se ter produzido à sua vontade, e conforme seu
modo de experimentação, eles concluíram pela negativa; apesar de sua sentença,
as mesas, visto que há mesas, continuam a girar, e podemos dizer com Galileu: e
todavia elas se movem! Diremos mais, é que os fatos se multiplicaram de tal
forma que, hoje, eles têm o direito de cidade, importando apenas encontrar para
eles uma explicação racional. Pode-se concluir alguma coisa contra a realidade
do fenômeno, pelo fato de que ele não se produz de uma maneira sempre idêntica,
segundo a vontade e as exigências do observador? Os fenômenos de eletricidade e
de química não estão subordinados a certas condições, e devemos negá-los porque
eles não se produzem fora dessas condições? O que há, portanto, de
surpreendente em que o fenômeno do movimento dos objetos pelo fl uido humano
tenha, também, suas condições de ocorrer e deixe de se produzir, quando o
observador, colocando-se no seu próprio ponto de vista, pretende fazê-lo ao
sabor de seu capricho, ou sujeitá-lo às leis dos fenômenos conhecidos, sem
considerar que para fatos novos, pode e deve haver leis novas? Ora, para
conhecer essas leis, é preciso estudar as circunstâncias nas quais os fatos se
produzem, e este estudo não pode ser senão o fruto de uma observação embasada,
atenta e, frequentemente, muito longa. Porém, alegam algumas pessoas, há, com
freqüência, fraude evidente. Nós lhes perguntaremos, primeiramente, se elas
estão bem certas de que haja fraude, e se elas não tomaram como tal, efeitos
que elas não podiam explicar, mais ou menos como aquele camponês que
considerava um sábio professor de Física, que fazia experiências, um hábil
escamoteador. Supondo até que isso tenha podido acontecer algumas vezes, seria
isto uma razão para negar o fato? Será preciso negar a Física, porque há
ilusionistas que se decoram com o título de físicos? Aliás, é preciso levar em
conta o caráter das pessoas e o interesse que elas poderiam ter em enganar. Seria,
então, uma brincadeira? Pode-se bem se divertir por um instante, mas uma
brincadeira indefinidamente prolongada seria tão enfadonha para o mistificador
quanto para o mistificado. De resto, haveria numa mistificação que se propaga
de uma extremidade do mundo à outra, e entre as pessoas mais austeras, mais
honradas e mais esclarecidas, algo pelo menos tão extraordinário quanto o
próprio fenômeno. QUARTO. Se os fenômenos com os quais nos ocupamos se tivessem
limitado ao movimento dos objetos, eles teriam permanecido, como o dissemos, no
domínio das ciências físicas; mas isto não ocorreu: estava-lhes destinado colocar-nos
no caminho de fatos de uma ordem estranha. Acreditou-se descobrir, não sabemos
através de que iniciativa, que a impulsão dada aos objetos não era somente o
produto de uma força mecânica cega, mas que havia nesse movimento a intervenção
de uma causa inteligente. Uma vez aberto esse caminho, era um campo totalmente
novo de observações; era o véu levantado de sobre muitos mistérios. Haverá, com
efeito, um poder inteligente? Essa é a questão. Se esse poder existe, qual é
ele, qual a sua natureza, sua origem? Está acima da Humanidade? Tais são as
outras questões que decorrem da primeira. As primeiras manifestações
inteligentes aconteceram por meio de mesas que se levantavam e batiam com um pé
um número determinado de pancadas, e respondendo, assim, através de sim ou de
não, conforme a convenção, a uma pergunta feita. Até aí nada de convincente,
certamente, para os cépticos, pois podiam crer num efeito do acaso.
Obtiveram-se, em seguida, respostas mais desenvolvidas através das letras do
alfabeto: com o objeto móvel batendo um número de pancadas correspondente ao
número de ordem de cada letra, chegava-se, assim, a formular palavras e frases,
que respondiam às questões propostas. A justeza das respostas, sua correlação
com a pergunta, causaram espanto. O ser misterioso que assim respondia,
interrogado sobre sua natureza, declarou que ele era Espírito ou gênio,
atribuiu-se um nome, e forneceu diversas informações a seu respeito. Isto é uma
circunstância muito importante que deve ser assinalada. Porquanto ninguém
imaginou os Espíritos como um meio de explicar o fenômeno, foi o próprio fenômeno
que revelou a palavra. Frequentemente, nas ciências exatas, fazem-se hipóteses
para se ter uma base de raciocínio; ora, aqui não foi, absolutamente, o caso.
Esse meio de correspondência era demorado e incômodo. O Espírito, e isso é
ainda uma circunstância digna de nota, indicou um outro. Foi um desses seres
invisíveis que deu o conselho de adaptar um lápis a uma cesta ou a um outro
objeto. Essa cesta, colocada sobre uma folha de papel, é posta em movimento
pela mesma potência oculta que faz mover as mesas; mas, em vez de um simples
movimento regular, o lápis traça, por si mesmo, caracteres que formam palavras,
frases, e discursos inteiros de várias páginas, tratando das mais elevadas
questões de Filosofi a, de Moral, de Metafísica, de Psicologia, etc., e isso
com tanta rapidez, como se escrevesse com a mão. Esse conselho foi dado,
simultaneamente, na América, na França e em diversos países. Eis os termos nos
quais ele foi dado em Paris, em 10 de junho de 1853, a um dos mais fervorosos
adeptos da doutrina, que já há vários anos, e desde 1849, ocupava-se com a
evocação dos Espíritos: “Vai pegar, no quarto ao lado, a cestinha; prende-lhe
um lápis; coloca-o sobre o papel; põe os dedos sobre a borda”. Alguns instantes
depois, a cesta pôs-se em movimento e o lápis escreveu, muito legível, esta
frase: “Proíbo-vos, expressamente, de dizer o que vos digo aqui; da primeira
vez que eu escrever, escreverei melhor.” O objeto ao qual se adapta o lápis,
sendo apenas um instrumento, sua natureza e sua forma são completamente
indiferentes; procurou-se a disposição mais cômoda; é assim que muitas pessoas
se utilizam de uma pequena prancheta. A cesta, ou a prancheta, só podem ser
postas em movimento sob a influência de certas pessoas dotadas, para isso, de
um poder especial e que designamos sob o nome de médiuns, isto é, meios, ou
intermediários entre os Espíritos e os homens. As condições que dão esse poder
remontam a causas, ao mesmo tempo, físicas e morais ainda imperfeitamente
conhecidas, pois encontramos médiuns de todas as idades, de ambos os sexos e em
todos os graus de desenvolvimento intelectual. Essa faculdade, aliás,
desenvolve-se pelo exercício. CINCO. Reconheceu-se, mais tarde, que a cesta e a
prancheta, na realidade, formavam apenas um apêndice da mão, e o médium,
pegando diretamente o lápis, posse a escrever através de um impulso
involuntário e quase febril. Dessa maneira, as comunicações se tornaram mais
rápidas, mais fáceis e mais completas; hoje, é o meio mais utilizado, tanto
mais que o número das pessoas dotadas desta aptidão é bem considerável e se
multiplica todos os dias. Finalmente, a experiência revelou muitas outras
variedades na faculdade mediadora, e soube-se que as comunicações podiam,
igualmente, acontecer através da palavra, da audição, da visão, do tato, etc.,
e até pela escrita direta dos Espíritos, isto é, sem o concurso da mão do
médium, nem do lápis. Obtido o fato, restava constatar um ponto essencial: o
papel do médium nas respostas, e a parte que nelas pode tomar, mecânica e
moralmente. Duas circunstâncias capitais que não poderiam escapar a um observador
atento, podem resolver a questão. A primeira é a maneira pela qual a cesta se
move sob sua infl uência, unicamente pela imposição dos dedos sobre as bordas;
o exame demonstra a impossibilidade de qualquer direcionamento. Esta
impossibilidade se torna patente, sobretudo, quando duas ou três pessoas se
colocam, ao mesmo tempo, junto à mesma cesta; seria preciso, haver entre elas
uma concordância de movimento verdadeiramente fenomenal; seria preciso, ainda,
concordância de pensamentos para que elas pudessem se entender sobre a resposta
a dar à questão proposta. Um outro fato, não menos singular, vem ainda aumentar
a dificuldade: é a mudança radical da escrita, conforme o espírito que se
manifesta, e toda vez que o mesmo Espírito retorna, sua escrita se reproduz.
Seria preciso, portanto, que o médium tivesse treinado a mudança de sua própria
caligrafia de vinte maneiras diferentes e, principalmente, que pudesse
lembrar-se daquela que pertence a esse ou àquele Espírito. A segunda
circunstância resulta da própria natureza das respostas que estão, na maioria
das vezes, sobretudo quando se trata de questões abstratas ou científicas,
notoriamente fora dos conhecimentos e, algumas vezes, do alcance intelectual do
médium, que, de resto, mais comumente, não tem consciência do que se escreve
sob sua influência; que com muita frequência não entende ou não compreende a
pergunta feita, visto que ela o pode ser numa língua que lhe é estranha, ou
mesmo mentalmente, e que a resposta pode ser dada nessa língua. Enfim, acontece
com frequência que a cesta escreva espontaneamente, sem pergunta preliminar,
sobre um assunto qualquer e inteiramente inesperado. Em alguns casos, essas
respostas têm um cunho de sabedoria, de profundidade e de propósito; elas
revelam pensamentos tão elevados, tão sublimes, que não podem emanar senão de
uma inteligência superior, impregnada da moralidade mais pura; de outras vezes,
elas são tão levianas, tão frívolas, tão triviais mesmo, que a razão se recusa
a acreditar que possam proceder da mesma fonte. Esta diversidade de linguagem
só pode se explicar pela diversidade das inteligências que se manifestam. Essas
inteligências estão na Humanidade ou fora da Humanidade? Este é o ponto a
esclarecer, e cuja explicação completa encontrar-se-á nesta obra, tal como foi
dada pelos próprios Espíritos. Eis, portanto, efeitos patentes que se produzem
fora do círculo habitual de nossas observações, que não ocorrem
misteriosamente, mas à luz do dia, que todo o mundo pode ver e constatar, que
não são privilégio de um único indivíduo, mas que milhares de pessoas repetem,
todos os dias, à vontade. Esses efeitos têm, necessariamente, uma causa, e
desde o momento em que revelam a ação de uma inteligência e de uma vontade,
eles saem do domínio puramente físico. Várias teorias foram emitidas a esse
respeito; nós as examinaremos em breve, e veremos se elas podem explicar todos
os fatos que se produzem. Admitamos, por enquanto, a existência de seres
distintos da Humanidade, uma vez que esta é a explicação fornecida pelas inteligências
que se revelam e vejamos o que eles nos dizem. O Livro dos espíritos. www.espiritismo.net. Abraço. Davi.
Nenhum comentário:
Postar um comentário