Espiritismo.
Texto de Alan Kardec (1804-1869). Primeira Parte. AS CAUSAS PRIMEIRAS. Capítulo
um. DEUS. 1. Deus e o Infinito. 2. Provas da Existência de Deus. 3. Atributos
da Divindade. 4. Panteísmo. DEUS É INFINITO. Que é Deus? “Deus é a inteligência
suprema, causa primeira de todas as coisas”. Que se deve entender por infinito?
“O que não tem começo nem fim: o desconhecido; tudo o que é desconhecido é
infinito. Poder-se-ia dizer que Deus é o infinito? Definição incompleta.
Pobreza da linguagem dos homens, que é insuficiente para definir as coisas que
estão acima da inteligência deles. Deus é infinito nas suas perfeições, mas o
infinito é uma abstração; dizer que Deus é o infinito, é tomar o atributo pela
própria coisa e definir uma coisa que não é conhecida por outra menos conhecida
ainda. PROVAS DA EXISTÊNCIA DE DEUS. Onde se pode encontrar a prova da
existência de Deus? “Num axioma que aplicais às vossas ciências: Não há efeito
sem causa. Procurai a causa de tudo o que não é obra do homem e vossa razão vos
responderá”. Para crer em Deus, basta lançar os olhos sobre as obras da
criação. O Universo existe, tem, portanto, uma causa. Duvidar da existência de
Deus seria negar que todo efeito tem uma causa e afirmar que o nada pôde fazer
alguma coisa. Que consequência se pode tirar do sentimento intuitivo, que todos
os homens trazem, em si mesmos, da existência de Deus? O texto colocado entre
aspas, em seguida às perguntas, é a própria resposta dada pelos Espíritos.
Distinguiram-se, através de outros caracteres, as notas e desenvolvimentos
acrescentados pelo autor, diante da possibilidade de serem confundidos com o
texto da resposta. Quando formam capítulos inteiros, não sendo possível a
confusão, conservaram-se os caracteres comuns. “QUE DEUS EXISTE; pois de onde lhes
viria este sentimento, se nada tivesse como base? É ainda uma consequência do
princípio de que não há efeito sem causa.” O sentimento íntimo que temos, em
nós mesmos, da existência de Deus não seria devido à educação e produto de
idéias adquiridas? “Se assim fosse, por que vossos selvagens teriam tal
sentimento?” Se o sentimento da existência de um ser supremo fosse apenas
produto de um ensino, ele não seria universal e não existiria, como as noções
das ciências, senão naqueles que tivessem podido receber esse ensinamento.
Poder-se-ia encontrar a causa primeira da formação das coisas nas propriedades
íntimas da matéria? “Mas, então, qual seria a causa destas propriedades? É
sempre necessária uma causa primeira.” Atribuir a formação primeira das coisas
às propriedades íntimas da matéria, seria tomar o efeito pela causa, pois estas
propriedades são, elas próprias, um efeito que deve ter uma causa. Que se deve
pensar da opinião que atribui a formação primeira a uma combinação fortuita da
matéria, em outras palavras, ao acaso? “Outro absurdo! Que homem de bom senso
pode ver o acaso como um ser inteligente? E, além disso, o que é o acaso?
Nada.” A harmonia que regula os mecanismos do Universo patenteia combinações e
visões determinadas e, por isso mesmo, revela um poder inteligente. Atribuir a
formação primeira ao acaso seria um contrassenso, pois o acaso é cego e não
pode produzir os efeitos da inteligência. Um acaso inteligente não seria mais o
acaso. Onde se vê, na causa primeira, uma inteligência suprema e superior a
todas as inteligências? “Tendes um provérbio que diz o seguinte: Pela obra se
reconhece o artista. Pois bem! Vede a obra e procurai o artista. É o orgulho
que engendra a incredulidade. O homem orgulhoso nada quer ter acima de si, é
por isso que se denomina espírito forte. Pobre ser, que um sopro de Deus pode
abater!” Julga-se o poder de uma inteligência pelas suas obras; nenhum ser
humano podendo criar o que produz a Natureza, a causa primeira é, pois, uma
inteligência superior à Humanidade. Quaisquer que sejam os prodígios executados
pela inteligência humana, esta inteligência tem, ela própria, uma causa, e
quanto maior for o que ela executa, tanto maior deve ser a causa primeira. É
essa inteligência que é a causa primeira de todas as coisas, qualquer que seja
o nome sob o qual o homem a designe. ATRIBUTOS DA DIVINDADE. O homem pode
compreender a natureza íntima de Deus? “Não; é um sentido que lhe falta.” O
homem poderá, um dia, compreender o mistério da Divindade? “Quando seu espírito
não for mais obscurecido pela matéria e, por sua perfeição, tiver se aproximado
dele, então, ele o verá e o compreenderá.” DEUS. A inferioridade das faculdades
do homem não lhe permite compreender a natureza íntima de Deus. Na infância da
Humanidade, o homem, frequentemente, o confunde com a criatura cujas
imperfeições ele lhe atribui; porém, à medida que o senso moral nele se
desenvolve, seu pensamento penetra melhor no fundo das coisas e ele faz uma
idéia mais justa e mais conforme à sã razão, embora ainda incompleta. Apesar de
não podermos compreender a natureza íntima de Deus, podemos ter uma ideia de
algumas de suas perfeições? “Sim, de algumas. O homem as compreende melhor à
medida que se eleva acima da matéria; ele as entrevê pelo pensamento.” Quando
dizemos que Deus é eterno, infinito, imutável, imaterial, único, todo-poderoso,
soberanamente justo e bom, não temos uma ideia completa de seus atributos? “Do
vosso ponto de vista, sim, porque acreditais tudo abarcar; mas sabei bem que há
coisas que estão acima da inteligência do homem mais inteligente e para as
quais a vossa linguagem, limitada às vossas ideias e às vossas sensações, não
tem absolutamente como exprimir. A razão vos diz, com efeito, que Deus deve
possuir essas perfeições em grau supremo, pois se possuísse uma a menos, ou,
então, se ela não estivesse num grau infinito, ele não seria superior a tudo e,
por conseguinte, não seria Deus. Para estar acima de todas as coisas, Deus não
deve sofrer vicissitude alguma, nem possuir nenhuma das imperfeições que a imagina-
ção possa conceber.” Deus é eterno; se tivesse tido um começo, teria saído do
nada, ou, então ele próprio teria sido criado por um ser anterior. É assim que,
pouco a pouco, remontamos ao infi nito e à eternidade. É imutável; se estivesse
sujeito a mudanças, as leis que regem o Universo nenhuma estabilidade teriam. É
imaterial; isto quer dizer que sua natureza difere de tudo o que chamamos
matéria; de outro modo, não seria imutável, pois estaria sujeito às
transformações da matéria. É único; se houvesse vários Deuses, não haveria
unidade de vistas, nem unidade de poder na ordenação do Universo. É
todo-poderoso, porque é único. Se não possuísse o poder soberano, haveria algo
mais poderoso ou tão poderoso quanto ele; não teria feito todas as coisas e as
que não tivesse feito seriam obra de um outro Deus. É soberanamente justo e
bom. A sabedoria providencial das leis divinas se revela nas menores coisas,
como nas maiores; e essa sabedoria não permite duvidar nem de sua justiça, nem
de sua bondade. PANTEÍSMO. Deus é um ser distinto, ou, conforme a opinião de
alguns, a resultante de todas as forças e de todas as inteligências do Universo
reunidas? “Se assim fosse, Deus não existiria, pois seria o efeito e não a
causa; ele não pode ser, ao mesmo tempo, um e outra.” “Deus existe, disso não
podeis duvidar; é o essencial. Crede-me, não vades além; não vos percais num
labirinto de onde não poderíeis sair; isso não vos tornaria melhores, mas,
talvez um pouco mais orgulhosos, porque acreditaríeis saber e, na realidade,
nada saberíeis. Deixai, portanto, de lado todos estes sistemas; tendes coisas
sufi cientes, que vos tocam mais diretamente, a começar por vós mesmos; estudai
vossas próprias imperfeições, a fim de vos livrardes delas; isto ser-vos-á mais
útil do que querer penetrar no que é impenetrável.” Que se deve pensar da
opinião segundo a qual todos os corpos da Natureza, todos os seres, todos os
globos do Universo seriam partes da Divindade e constituiriam, em conjunto, a
própria Divindade, isto é, da doutrina panteísta? “O homem, não podendo
fazer-se Deus, quer, pelo menos, ser uma parte de Deus.” Aqueles que professam
esta doutrina pretendem nela encontrar a demonstração de alguns dos atributos
de Deus: sendo infinitos os mundos, Deus é, por isso mesmo, infinito; não
havendo o vazio ou o nada em parte alguma, Deus está por toda a parte; estando
Deus por toda a parte, visto que tudo é parte integrante de Deus, ele dá a
todos os fenômenos da Natureza uma razão de ser inteligente. Que se pode opor a
este raciocínio? “A razão; refleti maduramente e não vos será difícil
reconhecer-lhe o absurdo.” Esta doutrina faz de Deus um ser material que,
embora dotado de uma inteligência suprema, seria, em ponto grande, o que somos
em ponto pequeno. Ora, se fosse assim, com a matéria transformando-se
incessantemente, Deus não teria estabilidade alguma; estaria sujeito a todas as
vicissitudes, até mesmo a todas as necessidades da Humanidade; ele careceria de
um dos atributos essenciais da Divindade: a imutabilidade. As propriedades da
matéria não podem se aliar à ideia de Deus, sem rebaixá-lo em nosso
entendimento, e nenhuma sutileza do sofisma conseguirá resolver o problema de
sua natureza íntima. Não sabemos tudo o que ele é, mas sabemos o que ele não
pode deixar de ser e este sistema está em contradição com suas propriedades
mais essenciais; ele confunde o Criador com a criatura, exatamente como se
quisesse que uma máquina engenhosa fosse parte integrante do mecânico que a
criou. A inteligência de Deus se revela nas suas obras, como a de um pintor no
seu quadro; mas as obras de Deus não são o próprio Deus, tanto quanto o quadro
não é o pintor que o concebeu e executou. Capítulo dois. ELEMENTOS GERAIS DO
UNIVERSO. 1. Conhecimento do Princípio das Coisas. 2. Espírito e Matéria. 3. Propriedades
da Matéria. 4. Espaço Universal. CONHECIMENTO DO PRINCÍPIO DAS COISA. É
possível ao homem conhecer o princípio das coisas? “Não, Deus não permite que
tudo seja revelado ao homem neste mundo.” O homem desvendará, um dia, o
mistério das coisas que lhe estão ocultas? “O véu se levanta para ele, à medida
que se depura; mas, para compreender certas coisas, são-lhe necessárias
faculdades que ele ainda não possui.” O homem não pode, através das
investigações da Ciência, desvendar alguns segredos da Natureza? “A Ciência lhe
foi dada para seu adiantamento em todas as coisas, porém, ele não pode
ultrapassar os limites fixados por Deus.” Quanto mais é dado ao homem desvendar
antecipadamente esses mistérios, maior deve ser sua admiração pelo poder e a
sabedoria do Criador; contudo, seja por orgulho, seja por fraqueza, sua própria
inteligência torna-o, frequentemente, joguete da ilusão; ele amontoa sistemas
sobre sistemas e o passar dos dias lhe mostra quantos erros ele considerou como
verdades e quantas verdades ele rejeitou como erros. São outras tantas
decepções para o seu orgulho. Fora das investigações científicas, é dado ao
homem receber comunicações de uma ordem mais elevada, sobre o que escapa ao
testemunho de seus sentidos? “Sim; se Deus o julgar útil, pode revelar o que a
Ciência não pode explicar.” É através destas comunicações que o homem adquire,
dentro de certos limites, o conhecimento de seu passado e de seu destino
futuro. ESPÍRITO E MATÉRIA. A matéria existe de toda a eternidade como Deus, ou
foi criada por ele, num certo tempo? “Só Deus o sabe. Todavia, há uma coisa que
vossa razão vos deve indicar: é que Deus, modelo de amor e de caridade, nunca
esteve inativo. Por mais distante que possais imaginar o início de sua ação,
podeis concebê-lo um segundo na ociosidade?” Geralmente, define-se como
matéria, o que tem extensão, o que pode impressionar nossos sentidos, o que é
impenetrável; estas definições são exatas? “Do vosso ponto de vista isto é
exato, porque não falais senão do que conheceis; mas a matéria existe em
estados que vos são desconhecidos; ela pode ser, por exemplo, tão etérea e
sutil, que nenhuma impressão cause nos vossos sentidos; entretanto, é sempre
matéria; mas para vós, não o seria.” Que definição podeis dar da matéria? “A
matéria é o elo que acorrenta o espírito; é o instrumento que lhe serve e sobre
o qual, ao mesmo tempo, ele exerce sua ação.” Desse ponto de vista, pode-se
dizer que a matéria é o agente, o intermediário com o auxílio do qual e sobre o
qual o espírito age. Que é o espírito? “O princípio inteligente do Universo.”
Qual a natureza íntima do espírito? “Não é fácil analisar o espírito com a
vossa linguagem. Para vós, nada é, porque o espírito não é uma coisa palpável;
mas, para nós, é alguma coisa. Sabei-o bem, o nada é coisa alguma; o nada não
existe.” Espírito é sinônimo de inteligência? “A inteligência é um atributo
essencial do espírito; porém, uma e outro se confundem num princípio comum, de
sorte que, para vós, são a mesma coisa.” O espírito é independente da matéria,
ou é apenas uma propriedade dela, como as cores são propriedades da luz, e o
som uma propriedade do ar? “São distintos uma e outro; porém, é necessária a
união do espírito e da matéria para intelectualizar a matéria.” Esta união é
igualmente necessária para a manifestação do espírito? Entendemos, aqui, por
espírito o princípio da inteligência, abstração feita das individualidades
designadas por esse nome. “Ela é necessária a vós, porque não estais
organizados para perceber o espírito sem a matéria; vossos sentidos não foram
feitos para isso.” Pode-se conceber o espírito sem a matéria e a matéria sem o
espírito? “Pode-se, sem dúvida, pelo pensamento.” Haveria, assim, dois
elementos gerais do Universo: a matéria e o espírito? “Sim, e acima de tudo
isso Deus, o criador, o pai de todas as coisas; estas três coisas são o
princípio de tudo o que existe, a trindade universal. Porém, ao elemento
material é preciso acrescentar o fluido universal que desempenha o papel de
intermediário entre o espírito e a matéria, propriamente dita, muito grosseira
para que o espírito possa exercer uma ação sobre ela. Embora, sob um certo
ponto de vista, se Elementos Gerais do Universo possa identifi cá-lo com o
elemento material, ele se distingue deste por propriedades especiais; se ele
fosse positivamente matéria, não haveria razão para que o espírito também não o
fosse. Ele está colocado entre o espírito e a matéria; é fluido, como a matéria
é matéria, suscetível, por suas inúmeras combinações com esta e sob a ação do
espírito, de produzir a infinita variedade das coisas das quais conheceis
apenas uma parte insuficiente. Este fluido universal, ou primitivo, ou
elementar, sendo o agente de que o espírito se serve, é o princípio sem o qual
a matéria estaria em perpétuo estado de divisão e nunca adquiriria as
propriedades que a gravidade lhe dá.” Este fluido seria aquele que designamos
sob o nome de eletricidade? “Dissemos que ele é suscetível de inumeráveis
combinações; o que chamais fluido elétrico, fluido magnético, são modificações
do fluido universal, que não é, propriamente falando, senão uma matéria mais
perfeita, mais sutil e que se pode considerar como independente.” Visto
que o espírito, ele próprio, é alguma coisa, não seria mais exato e menos
sujeito a confusão designar estes dois elementos gerais pelas palavras: matéria
inerte e matéria inteligente? “As palavras pouco nos importam; cabe a vós
formular vossa linguagem de maneira a vos entenderdes. Vossas discussões
provêm, quase sempre, de não vos entenderdes sobre as palavras, porque vossa
linguagem é incompleta para as coisas que não impressionam os vossos sentidos.”
Um fato patente domina todas as hipóteses: vemos matéria que não é inteligente;
vemos um princípio inteligente independente da matéria. A origem e a conexão destas
duas coisas nos são desconhecidas. Se possuem ou não uma fonte comum, se há
pontos de contato necessários; se a inteligência tem sua existência própria, ou
se é uma propriedade, um efeito; se é mesmo, conforme a opinião de alguns, uma
emanação da Divindade, é o que ignoramos; elas se nos apresentam distintas, é
por isso que as admitimos formando dois princípios constitutivos do Universo.
Vemos, acima de tudo isso, uma inteligência que domina todas as outras, que as
governa todas, que delas se distingue por atributos essenciais: é essa
inteligência suprema que chamamos Deus. PROPRIEDADES DA MATÉRIA . A
ponderabilidade é um atributo essencial da matéria? “Da matéria tal como a
entendeis, sim; não, porém, da matéria considerada como fluido universal. A matéria
etérea e sutil que forma esse fluido é imponderável para vós, mas, nem por
isso, deixa de ser o princípio de vossa matéria pesada.” A gravidade é uma
propriedade relativa; fora das esferas de atração dos mundos, não há peso,
assim como não há alto nem baixo. A matéria é formada de um único ou de vários
elementos? “Um único elemento primitivo. Os corpos que considerais como simples
não são verdadeiros elementos, porém, transformações da matéria primitiva.” De
onde se originam as diferentes propriedades da matéria? “São modificações que
as moléculas elementares sofrem, por sua união e em certas circunstâncias.” De
acordo com isto, os sabores, os odores, as cores, o som, as qualidades
venenosas ou salutares dos corpos, não seriam senão modificações de uma única e
mesma substância primitiva? “Sim, sem dúvida, e só existem pela disposição dos
órgãos destinados a percebê-las.” Este princípio é demonstrado pelo fato de que
nem todos percebem as qualidades dos corpos da mesma maneira: um acha uma coisa
agradável ao paladar, um outro acha-a ruim; uns vêm azul o que outros vêm
vermelho; o que é um veneno, para uns, é inofensivo ou salutar, para outros. A
mesma matéria elementar é suscetível de sofrer todas as modificações e de
adquirir todas as propriedades? “Sim, e é isso o que se deve entender, quando
dizemos que tudo está em tudo.” O oxigênio, o hidrogênio, o azoto, o carbono e
todos os corpos que consideramos simples são apenas modificações de uma
substância primitiva. Na impossibilidade em que nos encontramos, até o
presente, de remontar a esta matéria primeira, de outra forma que não seja pelo
pensamento, estes corpos são para nós verdadeiros elementos e podemos
considerá-los como tais, até nova ordem, sem que isso traga inconveniente. Esta
teoria parece dar razão à opinião daqueles que só admitem na matéria duas
propriedades essenciais: a força e o movimento, e que pensam que todas as
outras propriedades são apenas efeitos secundários que variam segundo a
intensidade da força e a direção do movimento? “Esta opinião é exata. É preciso
acrescentar ainda: conforme a disposição das moléculas, como o ves, por
exemplo, num corpo opaco que pode tornar-se transparente e vice-versa.” As
moléculas têm uma forma determinada? “Sem dúvida as moléculas têm uma forma,
mas que não é apreciável por vós.” Esta forma é constante ou variável?
“Constante, para as moléculas elementares primitivas, porém, variável, para as
moléculas secundárias que são, elas próprias, somente aglomerações das
primeiras; pois o que chamais molécula está longe ainda da molécula elementar.”
Este princípio explica o fenômeno conhecido de todos os magnetizadores e que
consiste em dar, pela ação da vontade, a uma substância qualquer, à água, por
exemplo, propriedades muito diversas: um gosto determinado e até as qualidades
ativas de outras substâncias. Visto que só há um elemento primitivo e que as
propriedades dos diferentes corpos são apenas modificações deste elemento, daí
resulta que a substância mais inofensiva tem o mesmo princípio que a mais
deletéria. Assim, a água, que é formada de uma parte de oxigênio e de duas de
hidrogênio, torna-se corrosiva, se duplicamos a proporção de oxigênio. Uma
transformação análoga pode produzir-se pela ação magnética dirigida pela
vontade. Água: H2 O (formada de dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio). Se
duplicamos a proporção de oxigênio, teremos H2 O2 = água oxigenada. (N.T.)
Elementos Gerais do Universo. ESPAÇO UNIVERSAL. O espaço universal é infi
nito ou limitado? “Infinito. Imagina-o limitado; o que haveria além? Isto
confunde tua razão, bem o sei, todavia, tua razão te diz que não pode ser de
outra maneira. O mesmo se dá com o infi nito em todas as coisas; não é na vossa
pequenina esfera que podeis compreendê-lo.” Se imaginarmos um limite para o
Espaço, por mais distante que o pensamento possa concebê-lo, a razão diz que,
além deste limite, há alguma coisa e assim, gradativamente, até o infinito; e
mesmo que esta alguma coisa fosse o vazio absoluto, ainda assim seria Espaço.
36. O vazio absoluto existe, em alguma parte, no Espaço universal? “Não, nada
está vazio; o que está vazio para ti está ocupado por uma matéria que escapa
aos teus sentidos e aos teus instrumentos.”. Capítulo três. CRIAÇÃO. Formação
dos Mundos. 2. Formação dos Seres Vivos. 3. Povoamento da Terra. Adão. 4.
Diversidade das Raças Humanas. 5. Pluralidade dos Mundos. 6. Considerações e
Concordâncias Bíblicas no Tocante à Criação. FORMAÇÃO DO MUNDO. O Universo
compreende a infinidade dos mundos que vemos e dos que não vemos, todos os
seres animados e inanimados, todos os astros que se movem no Espaço, assim como
os fluidos que o preenchem. O Universo foi criado, ou existe de toda a
eternidade, como Deus? “Certamente, ele não se pôde fazer sozinho e, se
existisse de toda a eternidade, como Deus, não poderia ser obra de Deus.” A
razão nos diz que o Universo não pôde fazer-se a si mesmo e que, não podendo
ser a obra do acaso, deve ser a obra de Deus. Como Deus criou o Universo? “Para
me servir de uma expressão corrente: por sua Vontade. Nada caracteriza melhor
esta vontade onipotente do que estas belas palavras da Gênese: “Deus disse:
Faça-se a luz e a luz foi feita.” Podemos conhecer o modo da formação dos
mundos? “Tudo o que se pode dizer e o que podeis compreender é que os mundos se
formam pela condensação da matéria disseminada no Espaço.” Os cometas seriam,
como agora se pensa, um início de condensação da matéria e mundos em via de
formação? “Isto está correto; porém, o que é absurdo é acreditar na infl uência
deles. Refiro-me a essa influência que vulgarmente lhes atribuem, pois todos os
corpos celestes têm sua parte de influência em certos fenômenos físicos.” Um
mundo completamente formado pode desaparecer e a matéria que o compõe
disseminar-se de novo no Espaço? “Sim, Deus renova os mundos, como renova os
seres vivos.” Podemos conhecer a duração da formação dos mundos: da Terra, por
exemplo? “Não posso te dizer isto, pois só o Criador o sabe e bem louco seria
quem pretendesse sabê-lo, ou conhecer o número de séculos desta formação.”
FORMAÇÃO DOS SERES VIVOS. Quando a Terra começou a ser povoada? “No começo tudo
era caos; os elementos estavam confundidos. Pouco a pouco, cada coisa tomou seu
lugar; então, apareceram os seres vivos apropriados ao estado do globo.” De
onde vieram os seres vivos para a Terra? “A Terra continha-lhes os germens que
aguardavam o momento favorável para se desenvolver. Os princípios orgânicos se
reuniram, desde que cessou a força que os mantinha afastados, e eles formaram
os germens de todos os seres vivos. Os germens permaneceram em estado latente e
inerte, como a crisálida e as sementes das plantas, até o momento propício à
eclosão de cada espécie; então, os seres de cada espécie reuniram-se e se
multiplicaram.” Onde estavam os elementos orgânicos antes da formação da
Terra? “Eles se achavam, por assim dizer, em estado fluídico, no Espaço, no
ambiente dos Espíritos, ou em outros planetas, aguardando a criação da Terra
para iniciar uma nova existência em um globo novo.” A Química nos mostra as
moléculas dos corpos inorgânicos unindo-se para formar cristais de uma
regularidade constante, conforme cada espécie, desde que estejam nas condições
desejadas. A menor perturbação nestas condições é sufi ciente para impedir a
reunião dos elementos, ou, pelo menos, a disposição regular que constitui o
cristal. Por que o mesmo não se daria com elementos orgânicos? Conservamos,
durante anos, germens de plantas e de animais que só se desenvolvem a uma dada
temperatura e num meio propício; têm-se visto grãos de trigo germinar após
vários séculos. Há, portanto, nessas sementes um princípio latente de
vitalidade que apenas aguarda uma circunstância favorável para se desenvolver.
O que acontece, diariamente, sob os nossos olhos, não pode ter ocorrido desde a
origem do globo? Esta formação dos seres vivos saindo do caos pela própria
força da Natureza, tira alguma coisa da grandeza de Deus? Longe disso, ela
responde melhor à ideia que fazemos de seu poder, exercendo-se sobre mundos
infinitos através de leis eternas. Esta teoria não resolve, é verdade, a
questão da origem dos elementos vitais; Deus, porém, tem seus mistérios, e pôs
limites às nossas investigações. Ainda há seres que nasçam espontaneamente?
“Sim, porém o gérmen primitivo já existia em estado latente. Sois testemunhas,
todos os dias, deste fenômeno. Os tecidos do corpo humano e dos animais não
encerram os germens de uma multidão de vermes que aguardam, para eclodir, a
fermentação pútrida necessária à sua existência? É um mundo minúsculo que
dormita e que se cria.” A espécie humana encontrava-se entre os elementos
orgânicos contidos no globo terrestre? “Sim, e ela veio a seu tempo; foi o que
fez com que se dissesse que o homem tinha sido formado do limo da terra.” 48.
Podemos conhecer a época da aparição do homem e dos outros seres vivos na Terra?
“Não, todos os vossos cálculos são quiméricos.” Se o gérmen da espécie humana
encontrava-se entre os elementos orgânicos do globo, por que não se formam,
espontaneamente, homens, como na origem destes? “O princípio das coisas está
nos segredos de Deus; todavia, pode-se dizer que os homens, uma vez espalhados
pela Terra, absorveram em si mesmos os elementos necessários à sua formação
para transmiti-los, segundo as leis da reprodução. O mesmo se dá com as
diferentes espécies de seres vivos.” POVOAMENTO DA TERRA. ADÃO. A espécie
humana começou por um único homem? “Não; aquele a quem chamais Adão não foi o
primeiro, nem o único que povoou a Terra.” Podemos saber em que época vivia
Adão? “Aproximadamente, naquela que lhe assinalais; mais ou menos 4.000 anos
antes do Cristo.” O homem, cujo nome a tradição conservou como Adão, foi um
daqueles que sobreviveram, numa região, após alguns dos grandes cataclismos que
agitaram, em diversas épocas, a superfície do globo, e se tornou o tronco de
uma das raças que, hoje, o povoam. As leis da Natureza se opõem a que os
progressos da Humanidade, constatados muito tempo antes do Cristo, tenham
podido se efetuar em alguns séculos, como se o homem estivesse na Terra, apenas
a partir da época assinalada pela existência de Adão. Alguns consideram, e com
mais razão, Adão como um mito ou uma alegoria que personifica as primeiras
idades do mundo. DIVERSIDADE DAS RAÇÃS HUMANAS. De onde vêm as diferenças
físicas e morais que distinguem as variedades de raças humanas na Terra? “Do clima,
da vida e dos hábitos. O mesmo se dá com dois filhos de uma mesma mãe, que,
educados longe e diferentemente um do outro, em nada se assemelharão quanto ao
moral.” O homem surgiu em vários pontos do globo? “Sim e em diversas épocas, e
aí está uma das causas da diversidade das raças; depois, os homens,
dispersando-se sob diferentes climas e aliando-se a outras raças, formaram
novos tipos.” Estas diferenças constituem espécies distintas? Criação
“Certamente que não, todos são da mesma família: as diferentes variedades do
mesmo fruto o impedem de pertencer à mesma espécie?” Se a espécie humana não
procede de um único indivíduo, os homens devem deixar de considerar-se irmãos
por isso? “Todos os homens são irmãos em Deus, porque são animados pelo
espírito e ten dem para o mesmo objetivo. Quereis sempre tomar as palavras ao
pé da letra.” PLURALIDADE DOS MUNDOS. Todos os globos que giram no Espaço são
habitados? “Sim, e o homem da Terra está longe de ser, como o supõe, o primeiro
em inteligência, em bondade e em perfeição. Há, no entanto, homens que se
acreditam muito fortes, que imaginam que este pequeno globo é o único a possuir
o privilégio de conter seres racionais. Orgulho e vaidade! Acreditam que Deus
criou o Universo unicamente para eles.” Deus povoou os mundos de seres vivos
que contribuem, todos, para o objetivo final da Providência. Acreditar que os
seres vivos estejam limitados unicamente ao ponto que habitamos no Universo,
seria colocar em dúvida a sabedoria de Deus, que nada fez de inútil; ele deve ter
traçado para esses mundos um objetivo mais sério do que o de recrear nossa
vista. Nada há, aliás, nem na posição, nem no volume, nem na constituição
física da Terra, que possa, racionalmente, fazer supor que apenas ela tenha o
privilégio de ser habitada, com exclusão de tantos milhares de mundos
semelhantes. A constituição física dos diferentes globos é a mesma? “Não; eles
de modo algum se assemelham.” Não sendo a mesma para todos a constituição
física dos mundos, segue-se que haja para os seres que os habitam uma
organização diferente? “Sem dúvida, assim como no vosso os peixes são feitos
para viver na água e os pássaros no ar.” Os mundos que se encontram mais
afastados do Sol acham-se privados de luz e de calor, visto que o Sol não se
mostra a eles senão sob a aparência de uma estrela? “Credes, pois, que não haja
outras fontes de luz e de calor além do Sol; e não levais em conta a
eletricidade que, em certos mundos, desempenha um papel que vos é desconhecido
e bem mais importante do que na Terra? Além disso, não foi dito que todos os
seres vêem da mesma maneira que vós e com órgãos constituí- dos como os
vossos.” As condições de existência dos seres que habitam os diferentes mundos
devem ser apropriadas ao meio no qual eles são convocados a viver. Se nunca
tivéssemos visto peixes, não compreenderíamos que seres pudessem viver na água.
Assim é, em outros mundos, que encerram, sem dúvida, elementos que nos são
desconhecidos. Não vemos, na Terra, as longas noites polares iluminadas pela
eletricidade das auroras boreais? Nada há de impossível em que, em certos
mundos, a eletricidade seja mais abundante do que na Terra e neles desempenhar
um papel geral, cujos efeitos não podemos compreender? Esses mundos podem,
portanto, encerrar, em si mesmos, as fontes de calor e de luz necessárias aos
seus habitantes. CONSIDERAÇÕES E CONCORDÂNCIA BÍBLICAS NO TOCANTE A CRIAÇÃO. Os
povos formaram ideias muito divergentes sobre a Criação, conforme o grau de
suas luzes. A razão, apoiada na Ciência, reconheceu a inverossimilhança de
algumas teorias. A que é dada pelos espíritos confirma a opinião há muito tempo
admitida pelos homens mais esclarecidos. A objeção que se pode fazer a esta
teoria é a de que ela contraria o texto dos livros sagrados; mas um exame sério
leva a reconhecer que essa contradição é mais aparente do que real e que
resulta da interpretação dada a algo, com frequência explicado alegoricamente.
A questão do primeiro homem na pessoa de Adão, como origem exclusiva da
Humanidade, não é, absolutamente, a única sobre a qual as crenças religiosas
tiveram que se retificar. O movimento da Terra pareceu, em determinada época,
tão oposto ao texto sagrado, que a toda espécie de perseguições essa teoria
serviu de pretexto; e, entretanto, a Terra gira, apesar dos anátemas e ninguém,
hoje, poderia contestá-lo sem depor contra sua própria razão. A Bíblia diz,
igualmente, que o mundo foi criado em seis dias e fixa-lhe a época em,
aproximadamente, 4000 anos, antes da era cristã. Antes disso, a Terra não
existia, tendo sido retirada do nada: o texto é formal; e eis que a Ciência
positiva, a Ciência inexorável, vem provar o contrário. A formação do globo
está escrita em caracteres imprescritíveis no mundo fóssil e está provado que
os seis dias da criação correspondem a tantos períodos, cada um, talvez, de
várias centenas de milhares de anos. Isto não é um sistema, uma doutrina, uma
opinião isolada, é um fato tão consistente quanto o do movimento da Terra e que
a Teologia não pode recusar-se a admitir, prova evidente do erro que se pode cometer,
tomando ao pé da letra as expressões de uma linguagem, frequentemente,
figurada. Poder-se-ia daí concluir que a Bíblia é um erro? Não; porém, que os
homens se enganaram ao interpretá-la. A Ciência, escavando os arquivos da
Terra, reconheceu a ordem na qual os diferentes seres vivos apareceram em sua
superfície e esta ordem está de acordo com o que indica a Gênese, com a
diferença de que esta obra, em vez de ter, milagrosamente, saído das mãos de
Deus, em algumas horas, efetuou-se, sempre pela sua vontade, porém, segundo a
lei das forças da Natureza, em alguns milhões de anos. Deus é, por isso, menor
e menos poderoso? Sua obra é, menos sublime, por não ter o prestígio da
instantaneidade? Evidentemente, não; seria preciso fazer-se uma ideia muito mesquinha
da Divindade para não reconhecer sua onipotência nas leis eternas que ele
estabeleceu para regerem os mundos. A Ciência, longe de depreciar a obra
divina, no-la mostra sob um aspecto mais grandioso e mais condizente com as
noções que temos do poder e da majestade de Deus, pelo próprio fato de que ela
efetuou-se sem derrogar as leis da Natureza. A Ciência, nesse ponto, de acordo
com Moisés, coloca o homem em último lugar, na ordem da criação dos seres
vivos; Moisés, porém, coloca o dilúvio universal, no ano de 1654 enquanto que a
Geologia nos mostra o grande cataclismo como refere-se ao calendário
judeu; anterior à aparição do homem, visto que, até hoje, nenhum traço de sua
presença foi encontrado nas camadas primitivas, nem o de animais da mesma
categoria, do ponto de vista físico; mas, nada prova que isso seja impossível.
Várias descobertas já lançaram dúvidas a esse respeito; pode, pois, acontecer
que de um momento para o outro, adquira-se a certeza material desta
anterioridade da raça humana e, então, reconhecer-se-á que, sobre este ponto,
como sobre outros, o texto bíblico é uma figura. A questão está em saber se o
cataclismo geológico é o mesmo de Noé; ora, o tempo necessário à formação das
camadas fósseis não permite confundi-los e, desde o momento em que se encontrem
os traços da existência do homem, antes da grande catástrofe, ficará provado,
ou que Adão não é o primeiro homem, ou que a sua criação se perde na noite dos
tempos. Contra a evidência, não há raciocínios possíveis e será preciso aceitar
esse fato, como se aceitaram o do movimento da Terra e os seis períodos da
Criação. É verdade que a existência do homem, antes do dilúvio geológico, ainda
é hipotética, porém, eis aqui algo que não é tanto: admitindo-se que o homem
tenha aparecido pela primeira vez na Terra 4000 anos antes de Cristo, se 1650
anos mais tarde toda a raça humana foi destruída, com exceção de uma única
família, daí resulta que o povoamento da Terra data apenas de Noé, isto é, de
2350 anos antes da nossa era. Ora, quando os hebreus emigraram para o Egito, no
século XVIII antes de Cristo, encontraram esse país muito povoado e já bastante
adiantado em civilização. A História prova que, nessa época, as Índias e outros
países estavam igualmente florescentes, sem mesmo se levar em conta a
cronologia de alguns povos, que remonta a uma época bem mais recuada. Teria
sido necessário, portanto, que do vigésimo quarto ao décimo oitavo século, isto
é, no espaço de 600 anos, não somente a posteridade de um único homem tivesse
podido povoar todas as imensas regiões, então conhecidas, supondo que as outras
não o fossem, mas também que, nesse curto intervalo de tempo, a espécie humana
tivesse podido elevar-se da ignorância absoluta do estado primitivo ao mais
alto grau do desenvolvimento intelectual, o que contraria todas as leis
antropológicas. A diversidade das raças vem, ainda, ratificar esta opinião. O
clima e os costumes produzem, certamente, modificações de caráter físico;
sabe-se, contudo, até onde pode ir a influência destas causas e o exame
fisiológico prova que há, entre certas raças, diferenças constitucionais mais
profundas do que as que o clima pode produzir. O cruzamento das raças origina
os tipos intermediários; ele tende a apagar os caracteres extremos, mas não os
produz; cria apenas variedades. Ora, para que tenha havido cruzamento de raças,
seria preciso que houvesse raças distintas. E como explicar a existência delas,
dando-lhes uma origem comum e, sobretudo, tão próxima? Como admitir que, em
poucos séculos, alguns descendentes de Noé tenham-se transformado ao ponto de
produzirem a raça etíope, por exemplo; uma tal metamorfose não é mais
admissível, que a hipótese de uma origem comum para o lobo e a ovelha, o
elefante e o pulgão, o pássaro e o peixe. Ainda uma vez, nada poderia prevalecer
contra a evidência dos fatos. Ao contrário, tudo se explica, admitindo-se a
existência do homem, antes da época que, vulgarmente, lhe é atribuída; a
diversidade das origens; Adão vivendo há 6000 anos, povoando uma região ainda
desabitada; o dilúvio de Noé, como uma catástrofe parcial, confundida com o
cataclismo geológico; finalmente, levando-se em conta a forma alegórica própria
ao estilo oriental e que se encontra nos livros sagrados de todos os povos. Eis
por que que é prudente não agir com leviandade, julgando falsas doutrinas que
podem, mais cedo ou mais tarde, como tantas outras, desmentir aqueles que as
combatem. As ideias religiosas, longe de perderem, se engrandecem, caminhando
com a Ciência; este o único meio de não mostrarem um lado vulnerável ao
ceticismo. Capítulo
IV Princípio Vital. 1. Seres Orgânicos e Inorgânicos. 2. A Vida e a Morte. 3.
Inteligência e Instinto. SERES ORGÂNICOS E INORGÂNICOS. Os seres orgânicos são
os que têm em si uma fonte de atividade íntima que lhes dá a vida; nascem,
crescem, reproduzem-se por si mesmos e morrem; são providos de órgãos especiais
para a execução dos diferentes atos da vida e que são apropriados às suas
necessidades, para sua conservação. Destes fazem parte os homens, os animais e
as plantas. Os seres inorgânicos são todos aqueles que não possuem vitalidade,
nem movimentos próprios e que são formados apenas pela agregação da matéria;
assim, são os minerais, a água, o ar, etc. A força que une os elementos da
matéria nos corpos orgânicos e nos corpos inorgânicos é a mesma? “Sim, a lei de
atração é a mesma para todos.” Há diferença entre a matéria dos corpos
orgânicos e a dos corpos inorgânicos? “A matéria é sempre a mesma, porém nos
corpos orgânicos ela está animalizada.” Qual a causa da animalização da
matéria? “Sua união com o princípio vital.” O princípio vital reside num agente
particular, ou é apenas uma propriedade da matéria organizada; numa palavra, é
um efeito ou uma causa? “Um e outra. A vida é um efeito produzido pela ação de
um agente sobre a matéria; este agente, sem a matéria, não é a vida, assim como
a matéria não pode viver sem esse agente. Ele dá a vida a todos os seres que o
absorvem e o assimilam.” Vimos que o espírito e a matéria são dois
elementos constitutivos do Universo; o princípio vital forma um terceiro? “É,
certamente, um dos elementos necessários à constituição do Universo, mas ele
próprio tem sua origem na matéria universal modificada; é um elemento, para
vós, como o oxigênio e o hidrogênio que, entretanto, não são elementos
primitivos, pois tudo isso parte de um mesmo princípio.” Parece resultar, daí, que a vitalidade não tem
seu princípio num agente primitivo distinto, mas numa propriedade especial da
matéria Universal, devida a certas modificações. “É a consequência do que
dissemos.” O princípio vital reside num dos corpos que conhecemos? “Ele tem sua
origem no fluido universal; é o que chamais fluido magnético ou fluido elétrico
animalizado. Ele é o intermediário, o elo entre o espírito e a matéria.” O
princípio vital é o mesmo para todos os seres orgânicos? “Sim, modificado
segundo as espécies. É o que lhes dá o movimento e a atividade e os distingue
da matéria inerte; pois o movimento da matéria não é a vida; ela recebe este
movimento, não o dá.” A vitalidade é um atributo permanente do agente vital,
ou, então, esta vitalidade só se desenvolve pelo funcionamento dos órgãos? “Ela
só se desenvolve com o corpo. Não temos dito que esse agente sem a matéria não
é a vida? É necessária a união das duas coisas para produzir a vida.” Pode-se
dizer que a vitalidade se acha em estado latente, quando o agente vital não
está unido ao corpo? “Sim, é isto.” O conjunto dos órgãos constitui uma espécie
de mecanismo que recebe sua impulsão da atividade íntima ou princípio vital que
neles existe. O princípio vital é a força motriz dos corpos orgânicos. Ao mesmo
tempo que o agente vital dá a impulsão aos órgãos, a ação dos órgãos entretém e
desenvolve a atividade do agente vital, quase como o atrito desenvolve o calor.
A VIDA E A MORTE. Qual é a causa da morte nos seres orgânicos? “Esgotamento dos
órgãos.” Poder-se-ia comparar a morte à cessação do movimento numa máquina
desorganizada? “Sim, se a máquina está desajustada, cessa a atividade; se o
corpo está enfermo, a vida se extingue.” Por que uma lesão do coração causa
mais a morte do que a de outros órgãos? “O coração é uma máquina de vida; mas o
coração não é o único órgão cuja lesão ocasiona a morte; ele é apenas uma das
peças essenciais.” O que se tornam a matéria e o princípio vital dos seres
orgânicos, quando da morte destes? “A matéria inerte se decompõe e forma
outros; o princípio vital retorna à massa.” Estando morto o ser orgânico, os
elementos dos quais é formado sofrem novas combinações, que constituem novos
seres; estes haurem na fonte universal o princípio da vida e da atividade,
absorvem-no e o assimilam, para devolvê-lo a essa fonte, quando deixarem de
existir. Os órgãos são impregnados, por assim dizer, de fluido vital. Esse fluido
dá a todas as partes do organismo uma atividade que possibilita seu inter relacionamento
e, em certas lesões, restabelece funções, momentaneamente suspensas. Porém,
quando os elementos essenciais ao funcionamento dos órgãos estão destruídos, ou
muito profundamente alterados, o fluido vital é impotente para lhes transmitir
o movimento da vida e o ser morre. Os órgãos reagem, mais ou menos
necessariamente, uns sobre os outros; é da harmonia de seu conjunto que resulta
sua ação recíproca. Quando uma causa qualquer destrói esta harmonia, suas
funções cessam, como o movimento de um mecanismo cujas peças essenciais estão
escangalhadas. Assim como um relógio que com o tempo se gasta ou se quebra por
acidente e cuja força motriz é impotente para colocar em movimento. Num
aparelho elétrico, temos uma imagem mais exata da vida e da morte. Este
aparelho, como todos os corpos da Natureza, contém a eletricidade em estado
latente. Os fenômenos elétricos apenas se manifestam, quando o fluido é colocado
em atividade por uma causa especial: então, poder-se-ia dizer que o aparelho
está vivo. Vindo a cessar a causa da atividade, o fenômeno cessa: o aparelho
retorna ao estado de inércia. Os corpos orgânicos seriam, assim, espécies de
pilhas ou aparelhos elétricos nos quais a atividade do fluido produz o fenômeno
da vida: a cessação dessa atividade produz a morte. A quantidade de fluido
vital não é absoluta em todos os seres orgânicos; ela varia segundo as espécies
e não é constante, nem no mesmo indivíduo, nem nos indivíduos da mesma espécie.
Há aqueles que estão, por assim dizer, saturados dele, enquanto que outros
possuem no apenas numa quantidade sufi ciente; daí, para alguns a vida mais
ativa, mais tenaz, e de certa forma, superabundante. A quantidade de fluido
vital se esgota; ela pode se tornar insuficiente para a manutenção da vida, se
não for renovada pela absorção e a assimilação das substâncias que o contêm. O
fluido vital se transmite de um indivíduo a um outro indivíduo. Aquele que o
possui em maior quantidade, pode dá-lo àquele que possui menos, e em certos
casos, reacender a vida prestes a extinguir-se. INTELIGÊNCIA E INSTINTO. A
inteligência é um atributo do princípio vital? “Não, visto que as plantas vivem
e não pensam: elas só possuem a vida orgânica. A inteligência e a matéria são
independentes, já que um corpo pode viver sem a inteligência; mas, a
inteligência só pode manifestar-se por meio dos órgãos materiais; é necessária
a união do espírito para intelectualizar a matéria animalizada.” A inteligência
é uma faculdade especial, própria a algumas classes de seres orgânicos e que
lhes dá, com o pensamento, a vontade de agir, a consciência de sua existência e
de sua individualidade, assim como os meios de estabelecer relações com o mundo
exterior e de proverem às suas necessidades. Podem distinguir-se assim: 1o ) os
seres inanimados, constituídos unicamente de matéria, sem vitalidade nem
inteligência: são os corpos brutos; 2o ) os seres animados que não pensam,
formados de matéria e dotados de vitalidade, porém, desprovidos de
inteligência; 3o ) os seres animados que pensam, formados de matéria, dotados
de vitalidade e que possuem a mais um princípio inteligente que lhes dá a
faculdade de pensar. Qual é a fonte da inteligência? “Nós o dissemos: a
inteligência universal.” Poder-se-ia dizer que cada ser haure uma porção de
inteligência da fonte universal e a assimila, como haure e assimila o princípio
da vida material? “Isto é apenas uma comparação, mas que não é exata, porque a
inteligência é uma faculdade peculiar a cada ser e constitui sua
individualidade moral. Além disso, vós o sabeis, há coisas que não é dado ao
homem penetrar e esta, no momento, é uma delas.” O instinto é independente da
inteligência? “Não, precisamente, pois é uma espécie de inteligência. O
instinto é uma inteligência não raciocinada. É através dele que todos os seres
provêm às suas necessidades.” Pode-se demarcar um limite entre o instinto e a
inteligência, isto é, precisar onde termina um e onde começa a outra? “Não,
pois, frequentemente, eles se confundem; porém, podem-se distinguir, muito bem,
os atos que advêm do instinto daqueles que derivam da inteligência.” É certo
dizer que as faculdades instintivas diminuem à medida que crescem as faculdades
intelectuais? “Não; o instinto existe sempre, mas o homem o despreza. O
instinto pode também conduzir ao bem; ele quase sempre nos guia e, algumas
vezes, com mais segurança do que a razão; ele nunca se extravia.” Por que a
razão nem sempre é guia infalível? “Ela seria infalível, se não fosse falseada
pela má educação, pelo orgulho e pelo egoísmo. O instinto não raciocina; a
razão permite a escolha e dá ao homem o livre-arbítrio.” O instinto é uma
inteligência rudimentar que difere da inteligência propriamente dita, pelo fato
de que suas manifestações são quase sempre espontâneas, enquanto que as da
inteligência são o resultado de uma combinação e de um ato deliberado. O
instinto varia em suas manifestações, segundo as espécies e suas necessidades.
Nos seres que têm a consciência e a percepção das coisas exteriores, ele se
alia a inteligência, isto é, a vontade e a liberdade. Livro dos Espíritos. www.espiritismo.net.com.br Abraço. Davi.
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