Islamismo. Texto de Samir El
Hayek. Em nome de Deus, O Clemente, O Misericordioso. Disse Deus, O Altíssimo: “Se
tivéssemos feito descer esse Alcorão sobre uma montanha, te-las-ia visto
humilhar-se e fender-se, por temor a Deus. Tais exemplos propomos aos humanos,
para que raciocinem”. Surata Al Haxr 59:21. INTRODUÇÃO AO ALCORÃO SAGRADO.
Louvado seja Deus, Senhor do Universo, e que a paz e a misericórdia estejam com
o Mensageiro e toda a sua estirpe, seus companheiros e seus seguidores! O
Alcorão é a palavra de Deus, revelada a Mohammad, desde a Surata da Abertura
até a Surata dos Humanos, constituindo o derradeiro dos livros revelados à
humanidade. Ele encerra, em sua totalidade, diversificadas nuanças, tais como:
a felicidade, a reforma entre os homens, a concórdia no presente e no futuro;
ele foi revelado, versículo por versículo, surata por surata, de acordo com as
situações e os acontecimentos, no decorrer dos vinte e três últimos anos da
vida do Profeta Mohammad (Maomé). Uma parte foi revelada antes da Hégira, em
Makka (Meca), e outra depois, em Madina (medina). Os versículos e as suratas
revelados em Makka abrangem as normas da crença em Deus, em Seus Anjos, em Seus
Livros, em Seus mensageiros e no Dia do Juízo Final. Os versículos e as suratas
revelados em Madina dizem respeito aos rituais e à jurisprudência. Nele há
narrativas sobre os nossos antecessores e sobre os nossos sucessores, e é um
árbitro entre nós. Há narrativas de povos anteriores, de séculos passados; há
histórias dos profetas, dos Mensageiros, dos povos, dos grupos, das pessoas,
dos acontecimentos e do desenrolar da história da civilização; nele há
explicações e exemplos para aqueles que por ele queiram pautar suas vidas, e
exortação para quem tem coração e está disposto a aceitá-la, e a prestar
testemunho. Ele revela a Lei imutável de Deus, quer seja na perdição dos
extraviados, quer seja na salvação dos encaminhados. Ele ensina que o mundo dos
homens, no decorrer dos séculos, só é benéfico com a religião de Deus; que a
humanidade, o que quer que faça, não alcançará a almejada felicidade se não se
iluminar, guiando-se com a Mensagem Divina. Nele há revelações do futuro sobre
o dia da Ressurreição, sobre a vida futura, no dia em que os homens se
congregarão junto ao Senhor do Universo. "Aquele que fizer um bem, quer
seja do peso de um átomo., vê-lo-á; e aquele que fizer um mal, quer seja do
peso de um átomo, vê-lo-á."(99ª Surata, versículos 7 e 8). Nele há o
julgamento dos problemas e das questões onde é premente uma explicação e uma
diretriz do caminho a seguir, no que diz respeito às questões da crença e do
pensamento, do caráter e do comportamento, das relações econômicas, dos ramos
doutrinários, dos julgamentos pessoais ou não: "Ó humanos, já vos chegou
uma prova convincente de vosso Senhor e vos enviamos uma translúcida
Luz."(4ª Surata, versículo 174) "Recorda-lhes o dia em que faremos
surgir uma testemunha de cada povo para testemunhar contra os seus, e te
apresentaremos por testemunha contra os teus. Temos te revelado, pois, o Livro
que é uma explanação de tudo, é guia, misericórdia e auspício para os
muçulmanos."(16ª Surata, versículo 89) Não há lei religiosa ou um
problema, no que diz respeito ao mundo e à vida dos homens, que não tenha nele
uma solução; ele é um auxílio ao inesgotável, guia, explicação e orientação
para todos, quer seja em partes ou no todo: "Já vos chegou de Deus uma Luz
e um Livro Lúcido."(5ª Surata, versículo 15). Sim, este fabuloso Alcorão é
a luz orientadora para a humanidade. Ele arrancou-a das trevas e transportou-a
para luz, para a verdade e para a verdadeira senda. Foi o ponto de
transformação na sua longa história, tirando-a da vida atroz de corrupção e
levando-a para a vida de liberdade, de religião e de orientação, e instituiu,
no mundo todo, o direito e a compreensão, elevando a humanidade do mais baixo
degrau os píncaros da perfeição, de maneira sobranceira. As evidências e os
significados que o Alcorão abrange, já citados, só podem ser entendidos através
de explicações do texto alcorânico e de seus versículos. Tal explicação é uma
pesquisa sobre a vontade de Deus, sobre o conhecimento dessa vontade através de
Suas palavras no Alcorão, de acordo com a capacidade humana. A ciência da
exegese nasceu débil e cresceu paulatinamente até alcançar a maturidade, e
seguir formidavelmente neste diapasão que conhecemos hoje. Na época da
revelação do Alcorão, enquanto o Profeta vivia, não havia necessidade para a
explicação dos versículos, nem a regulamentação dessa ciência, porque o texto,
na sua totalidade, era claro, compreensível para o Profeta e seus Companheiros.
Apesar disso, o Profeta explicava alguns versículos e algumas pronúncias que
podiam causar ambiguidades; também os Companheiros do Profeta e alguns adeptos
assim o fizeram. Isto porque poderia haver má interpretação, quaisquer que
fossem as razões que teriam de se desenrolar na alvorada de um povo
progressista, em formação, que iria se expandir através de conquistas,
enriquecendo sua existência com acontecimentos históricos, discussões
doutrinárias e pesquisas em jurisprudência e política. O Alcorão era e continua
sendo o centro da cultura islâmica, dos movimentos filosóficos e de todas as
suas atividades intelectuais; seus versículos estimulam a nele pensarmos. Disse
o Altíssimo: "Eis o Livro que te revelamos, para que os sensatos recordem
seus versículos e neles meditem."(38ª Surata, versículo 29). Disse mais:
"Não meditam, acaso, no Alcorão? Se fosse de outra origem que não de Deus,
haveria nele muitas discrepâncias."(4ª Surata, versículo 82). E disse
ainda: "Não meditam, acaso, no Alcorão, ou é que seus corações são
insensíveis?" (47ª Surata, versículo 24). Sua explicação nada mais é do
que o resultado de meditação e de deliberação. O ponto de vista dos doutos na
matéria, bem como seus métodos, são diversificados. Alguns, levados pela
simpatia doutrinária, apegaram-se à explicação dos versículos, nesse sentido. Outros,
levados pela simpatia linguística, eloquência, estilística e literária,
enredaram-se também, nesse particular; o mesmo aconteceu com os simpatizantes
da jurisprudência. Outros, ainda, apegaram-se à explicação das narrativas.
Nesse particular, houve aqueles que se prolongaram na explicação, até a
prolixidade estafante, e outros restringiram-na ao sucinto chocante, e outros,
ainda, quedaram-se no meio-termo. Deles, houve quem tendesse para a explicação
pessoal, e outros ainda no estilo esdrúxulo; outros em estilo claro. De tudo
isso resultou uma grande riqueza científica e um movimento intelectual
considerável, que elevam glorificam um povo que serve ao Livro de seu Senhor,
quer seja em decorá-lo, preservá-lo explicá-lo, quer seja em examiná-lo, elevá-lo
e consagrá-lo ao longo de catorze séculos, que serão seguidos por muitos
outros, até que tudo que há no universo compareça perante o Criador: "Nós
revelamos a Mensagem e somos Seu Preservador" (15ª Surata, versículo 9).
"Este é o Livro (o Alcorão) veraz por excelência. A falsidade não se
aproxima dele nem pela frente, nem por trás, porque é a revelação do Prudente,
Laudabilíssimo. "(41ª Surata, versículo 41- 42). Todas as importantes
religiões do mundo são baseadas nos seus Livros Sagrados, os quais são frequentemente
atribuídos a revelações divinas. Seria patético se, por algum infortúnio, uma
delas viesse a perder o texto original da revelação; a substituição jamais
poderia estar em inteira conformidade com o que fora perdido. Os brâmanes, os
budistas, os judeus, os masdeístas e os cristãos podem comparar o método
empregado para a preservação dos ensinamentos básicos de suas respectivas
religiões com o método dos muçulmanos. Quem lhes escreveu os livros? Quem lhes
transmitiu de geração a geração? Será a transmissão provinda de textos
originais ou apenas tradução? Não haveriam as guerras fratricidas causado
estrago às cópias dos textos? Não haverá contradições internas ou lacunas cujas
referências são encontradas em outro lugar? Estas são algumas das questões que
poderão ser aventadas, e isso requer respostas satisfatórias. No tempo em que
emergiam o que nós chamamos de as Grandes Religiões, os homens não apenas
confiaram em suas memórias, mas também inventaram a arte de escrever, para
preservarem seus pensamentos, assinalando, de modo mais premente do que fariam
as memórias individuais dos seres humanos que, afinal de contas, têm um
limitado ciclo de vida. Mesmo assim, nenhum destes dois meios é infalível
quando tomados separadamente. É uma questão de experiência cotidiana o ato de
que, quando se escreve algo e então se o revisa, encontram-se mais ou menos
erros inadvertidos, omissão de letras ou mesmo de palavras, repetição de
relatos, uso de palavras contrárias àquelas pretendidas, erros gramaticais
etc., sem falar nas mudanças de opinião do escritor, que também corrige seu
estilo, seus pensamentos, seus argumentos e, às vezes, reescreve todo o
documento. O mesmo acontece quanto à faculdade da memória. Aqueles que têm
obrigação ou habilidade em aprender de memória algum texto, para recitá-lo mais
tarde, especialmente quando isso envolve longuíssimas passagens, sabem que às
vezes suas memórias falham durante a recitação: pulam passagens, misturam umas
com as outras, ou não se lembram de toda a sequência; às vezes o texto correto
permanece na subconsciência e é relembrado no último momento, ou no
rebuscamento da memória por indicação de outrem, ou ao ser consultado o texto
em documento escrito. O Profeta do Islam, Mohammad (Maomé), de memória
privilegiada, empregava ambos os métodos simultaneamente, um ajudando o outro,
reforçando a integridade do texto e diminuindo ao mínimo as possibilidades de
erro. Os ensinamentos islâmicos são baseados no que o Profeta Mohammad disse ou
fez. Ele próprio ditou certos textos a seus escribas, o que chamamos de
Alcorão; outros textos foram compilados por seus companheiros, na maioria das
vezes por iniciativa própria; e a esses escritos chamamos de Tradição. A
palavra Alcorão literalmente significa "leitura por excelência" ou
"recitação". Enquanto o ditava a seus Companheiros, o Profeta lhes
assegurava que era a Revelação Divina que ele havia recebido. Ele não ditou
tudo de uma só vez: as revelações chegavam-lhe em fragmentos, de tempos em
tempos. Tão logo ele recebia uma, costumava comunicá-la a seus companheiros e
pedir-lhes não somente que a prendessem de cor – para que a recitassem durante
a prática das orações – mas também que a
escrevessem e que multiplicassem as cópias. Em tais ocasiões, ele indicava o
lugar preciso da nova revelação no texto; não era dele a compilação
cronológica. Não é de admirar a precaução e o cuidado tomados para a precisão,
levando-se em consideração o padrão da cultura dos árabes daquele tempo. É
razoável acreditarmos que as primeiríssimas revelações recebidas pelo Profeta
não foram imediatamente submetidas à escrita, pela simples razão de que não
havia, ainda, companheiro algum ou aderentes. Estas primeiras partes não eram
nem longas, nem numerosas. Não havia risco de que o Profeta pudesse esquecê-las,
umas vez que ele as recitava frequentemente em suas orações e em conversar
proselíticas (doutrinária). Alguns fatos da história dão-nos a ideia do que
aconteceu. Ômar Ibn al Khattab é considerado a quadragésima pessoa a abraçar o
Islam. Isso se refere ao ano quinto da Missão (oito antes da Hégira). Mesmo em
uma data primordial existiam cópias escritas de certas suratas do Alcorão e,
como Ibn Hicham relata, foi devido ao profundo efeito produzido pela leitura
acurada de alguns versículos da vigésima Surata que Ômar abraçou o Islam. Não
sabemos precisamente o tempo em que a prática de escrever o Alcorão começou;
contudo, há informações precisas de que durante os remanescentes dezoito anos
da vida do Profeta, o números dos muçulmanos, como também das cópias do texto
Sagrado, continuou aumentando dia a dia. Como o Profeta recebia as revelações
em fragmentos, era natural que o texto revelado se referisse aos problemas do
dia. Se acontecesse um de seus companheiros morrer, a revelação consistiria em
promulgar a lei da herança; não seria de lei penal, tratando de roubo, por
exemplo, a ser revelada no momento. As revelações continuaram durante a inteira
vida missionária de Mohammad, treze anos em Makka e dez em Madina. Uma
revelação consistia às vezes de uma inteira Surata, curta ou longa, e às vezes
de apenas uns poucos versículos. A natureza das revelações impunha ao Profeta
repeti-las constantemente em suas recitações, e revisar continuamente a forma
que as coleções dos fragmentos teria que tomar. Todos os doutos afirmam, com
autoridade, que o Profeta recitava todos os anos, no mês de Ramadan, perante o
anjo Gabriel, parte do Alcorão até então revelada, e que no último ano de sua
vida, Gabriel pediu-lhe que o recitasse inteiro duas vezes. O Profeta concluiu,
desde então, que iria, em breve, despedir-se da vida. O Profeta costumava
revisar, nos meses do jejum, os versículos e as suratas, e colocá-las em sua
sequência adequada. Isto era necessário por causa da continuidade das novas
revelações. É também sabido que o Profeta tinha o hábito de celebrar uma
prática adicional de oração durante os meses do jejum, todas as noites, às
vezes mesmo em congregação, na qual ele recitava o Alcorão do princípio ao fim,
tarefa esta que era completada ao cabo de um mês. Esta prática, chamada de
Tarawih, continua a ser observada com grande devoção até estes nossos dias.
Quando o Profeta deu seu último suspiro, uma rebelião estava tomando vulto em
certas partes do país. Tentando debelá-la, várias pessoas que conheciam o
Alcorão de cor tombaram. O Califa Abu Bakr (573-634) sentiu a urgência da
codificação do Alcorão, e a tarefa foi cumprida um mês depois da morte do
Profeta. Durante seus últimos anos de vida, o Profeta costumava usar Zaid Ibn
Sábet (581-629) como principal amanuense, para tomar em ditado as revelações
recentemente recebidas. Abu Bakr encarregou a mesma pessoa da tarefa de
preparação de uma cópia condizente de todo o texto, em forma de livro. Havia
então em Madina vários Huffaz (aqueles que sabiam todo o Alcorão de cor), e Zaid
era um deles. Sob a direção do Califa, Zaid transcreveu o texto escrito em
pergaminhos ou pedaços de couro, nas omoplatas das reses, nos ossos, nas pedras
polidas e mesmo em pedaços de porcelana. A cópia condizente, assim preparada,
foi chamada de Musshaf (encadernação). Esta foi conservada sob a própria
custódia do Califa Abu Bakr e, depois dele, por seu sucessor, Ômar Ibn al
Khattab. Nesse meio tempo o estudo do Alcorão foi encorajado em toda parte do
Império Muçulmano. O Califa Ômar (579-644) sentiu a necessidade de enviar
cópias do texto autêntico aos centros provincianos a fim de evitar as
divergências; mas foi deixado a seu sucessor, Otman, continuar com a tarefa. Um
de seus comandantes, Huzaifa Aliaman, havendo voltado de uma viagem pelas
vastas terras conquistadas pelos muçulmanos, relatou que havia encontrado
divergentes cópias do Alcorão e que havia, às vezes, desentendimento entre os
diferentes mestres do Livro, concernente a isso. Otman fez imediatamente com
que a cópia preparada para Abu Bakr fosse confiada a uma comissão presidida
pelo acima mencionado Zaid Ibn Sábet, para a reprodução de sete cópias; ele
autorizou a revisão da pronúncia, se necessário. Quando a tarefa foi concluída,
o Califa efetuou uma recitação pública da nova edição perante os doutos
presentes na capital, perante os companheiros do Profeta, e então enviou estas
cópias aos diferentes centros do vasto mundo islâmico, ordenando que dali por
diante todas as cópias fossem baseadas na edição autêntica. Ele ordenou a
destruição das cópias que, de algum modo, se desviassem do texto assim
oficialmente estabelecido. É concebível que as grandes conquistas militares dos
primeiros muçulmanos induzissem alguns espíritos hipócritas a proclamarem sua
impulsiva conversão ao Islam por motivos materiais, e para tentar danificá-lo
de maneira clandestina. Eles fabricaram versões do Alcorão com interpolações.
As "lágrimas de crocodilo", que foram derramadas pela destruição das
cópias não autenticadas do Alcorão, por ordem do Califa Otman, somente poderiam
Ter sido de tais hipócritas. É sabido que o Profeta às vezes ab-rogava certos
versículos que haviam sido comunicados previamente ao povo, e isso era feito
para fortificar as novas Revelações Divinas. Houve Companheiros que aprenderam
a primeira versão, sem contudo estarem cientes das últimas modificações, tanto
por causa da morte do Profeta como por suas residências fora de Madina. Estes
devem Ter deixado cópias a seus descendentes, as quais, embora autênticas,
estavam ultrapassadas. Ainda, alguns muçulmanos tinham o hábito de pedir ao
Profeta que explicasse certos termos empregados no texto sagrado e anotar tais
explicações nas margens de suas cópias do Alcorão, a fim de não esquecerem
delas. As cópias feitas mais tarde, com base nesses textos anotados, causariam
às vezes confusões na questão do texto e do glossário. A despeito da ordem do
Califa Otman, para que se destruíssem os textos inexatos, existia, nos séculos
III e IV da Hégira, assunto bastante para a compilação de volumosas obras,
constituindo as "variações do Alcorão". Estas chegaram até nós, mas
um apurado estudo mostra-nos que tais variantes eram arábica, que não possuía
vogais, nem se podia distinguir entre as letras semelhantes, nem davam ideia
das mesmas, sendo meros pontos, como é feito agora. Além disso existiam
diferentes dialetos em diferentes regiões, e o Profeta havia permitido aos
muçulmanos de tais regiões recitarem de acordo com suas algaravias, e mesmo
substituir as palavras que estavam além de sua argúcia, por sinônimos que conhecessem
melhor. Esta foi uma medida imergente de graça e clemência. No tempo do Califa
Otman, contudo, a instrução pública havia-se desenvolvido suficientemente, e
fez-se necessário que aquelas concessões não fossem mais toleradas, pois o
Texto Sagrado seria afetado e as variantes da leitura se radicariam. As cópias
do Alcorão enviadas por Otman aos chefes das províncias gradualmente
desapareceram nos séculos subsequentes; apenas uma delas, que presentemente se
encontra em Tashkent, chegou até nós. O governo czarista da Rússia havia
publicado em uma reprodução fac símile; constata-se haver uma completa
identidade entre essa cópia e o texto em uso noutras ocasiões. A mesma é cópia
fiel do manuscrito existente do Alcorão, tanto completo como fragmentado, datando
do primeiro século da Hégira. O Alcorão é dirigido a toda humanidade, sem
distinção de raça, cor, religião ou tempo. Ainda mais, ele procura guiar a
humanidade em todas as sendas da vida: espirituais, materiais, individuais e
coletivas. Ele contém diretrizes para a conduta do chefe do Estado, bem como do
homem comum; do rico, bem como do pobre; diretrizes para a paz, bem como para a
guerra; tanto para a cultura espiritual como para o comércio e bem-estar
material. O Alcorão busca principalmente desenvolver a personalidade do
indivíduo: Cada pessoa será pessoalmente responsável perante seu Criador. Para tal
propósito, o Alcorão não somente fornece ordens, porém tenta ainda convencer.
Ele apela para a razão do homem e relata histórias, parábolas e metáforas.
Descreve os atributos de Deus, que é Um, Criador de tudo, Onisciente,
Onipotente, Ressuscitador dos mortos e Observador de nosso comportamento
terreno; é Justo, Clemente.( vide nota da 7ª Surata, versículo 180) O Alcorão
indica ainda o modo de aprazermos a Deus, apontando quais as melhores orações,
quais os deveres do homem com respeito a Ele, a seus semelhantes e a seu
próprio ser; ele dá destaque ao fato de que não nos pertencemos, outrossim,
pertencemos a Deus. O Alcorão fala das melhores normas relacionadas com a vida
social, comercial, matrimonial, com a herança, com o direito penal, com o
direito internacional, e assim por diante. Todavia, o Alcorão não é um livro,
no senso comum; é a coleção das palavras de Deus, reveladas de tempos em
tempos, durante vinte e três anos, a Seu Mensageiro, escolhido entre os seres
humanos. O Soberano dá Suas instruções a Seu vassalo; portanto, há certas
nuançes (diferenças imperceptíveis entre as coisas) compreendidas e implícitas; há repetições, e mesmo mudanças nas formas
de expressão. Deste modo, Deus fala às vezes na primeira pessoa e às vezes na
terceira. Ele diz "Eu", bem como "Nós" e "Ele",
porém, jamais "Eles". É uma coleção de revelações enviadas de
ocasiões em ocasiões; e devemos, por isso, lê-lo mais e mais, a fim de melhor
aquilatarmos os seus significados. Ele possui diretrizes para todos, em todos
os lugares e para todos os tempos. O estilo e a dicção do Alcorão são
magníficos e apropriados para a sua qualidade Divina. Sua recitação comove o
espírito até daqueles que apenas o ouvem sem entende-lo. Com o passar do
tempo, o Alcorão tem, em virtude de sua reivindicação de origem divina,
desafiado a todos a criarem, conjuntamente, mesmo uns poucos versículos iguais
aos que ele contém. Tal desafio porém tem permanecido sem resposta até os
nossos dias. Há algumas diferenças intrínsecas entre o Alcorão e os livros
precedentes. Tais diferenças podem ser sucintamente estipuladas, como segue: 1.
Os textos originais da maior parte dos primitivos Livros Divinos foram em sua
quase totalidade perdidos, sendo que somente as suas traduções existem hoje. O
Alcorão, por outro lado, existe hoje exatamente como foi revelado ao Profeta;
nem uma palavra – mais ainda, nem uma letra sequer – foi trocada. Encontra-se à
disposição, em seu texto original, fazendo com que a Palavra de Deus seja
preservada agora, bem como por todo o porvir. 2. Nos primitivos Livros Divinos
os homens mesclaram suas palavras com as palavras de Deus; porém, no Alcorão
encontra-se tão somente as palavras de Deus – em suas prístinas (original ou inalterado) purezas. Isto é
admitido, mesmo pelos oponentes ao Islam. 3. Não se pode dizer, com base na
autêntica evidência histórica, em relação a nenhum outro Livro Sagrado possuído
por diferentes povos, que ele realmente pertence ao mesmo profeta a quem é
atribuído. No caso de alguns deles, mesmo isto não é sabido. Em que época e a
que profeta eles foram revelados? Quanto ao Alcorão, as evidências que existem
de que foi revelado a Mohammad são tão vultosas, tão convincentes, tão sólidas
e completivas, que mesmo o mais ferrenho crítico do Islam não pode lançar
dúvidas sobre isso. Tais evidências são tão vastas e detalhadas, que sobre
muitos versículos do Alcorão, mesmo a ocasião e o local de suas revelações,
podem ser conhecidos com exatidão. 4. Os primitivos Livros Divinos foram revelados
em línguas que estão mortas desde há muito tempo. Na era presente, nação ou
comunidade alguma fala tais línguas e há apenas umas poucas pessoas que se
jactam de compreendê-las. Destarte, mesmo que tais Livros existissem hoje em
suas formas originais e autênticas, seria virtualmente impossível, em nossa
era, compreender e interpretar corretamente suas injunções, bem como pô-las em
prática em sua forma requerida. A língua do Alcorão, por outro lado, é uma
língua viva; milhões de pessoas falam-na e outro tanto a compreende. Ela está
sendo ensinada e aprendida em quase todas as universidades do mundo; todas as
pessoas podem aprendê-la, e aquele que não tem tempo para isso pode, em
qualquer parte, deparar com quem conheça a língua, que lhe explique o significado
do Alcorão. 5. Cada um dos Livros Sagrados existentes, encontrados entre as
diferentes nações do mundo, foi dirigido a um povo em particular. Cada um deles
contém um número de ditames que parece Ter sido dirigido a um período da
história em particular e que supria tão-somente as necessidades daquela era.
Tais necessidades não são válidas hoje, nem tampouco podem ser aplainadas e
propíciamente vertidas para a prática. Depreende-se disto que tais livros eram
dirigidos àqueles povos em particular e nenhum deles para o mundo. Ademais,
eles não foram revelados para serem seguidos permanentemente, mesmo pelo povo
para o qual foram revelados; restringiam-se a influenciar somente sobre um
certo período. Em contraste a isso, o Alcorão é dirigido a toda humanidade; não
se pode suspeitar que injunção alguma tenha sido dirigida a um povo em
especial. Do mesmo modo, todos os ditames e injunções no Alcorão são os mesmos
que podem ser aplicados em todos os lugares e em todas as épocas. Este fato vem
provar que o Alcorão é dirigido ao mundo inteiro, constituindo-se em eterno
código para a vida humana. 6. Não há negar o fato de que os precedentes Livros
Divinos cultuavam o bem e a virtude, ensinavam também os princípios da
moralidade e da veracidade, e apresentavam uma maneira de viver consentânea com
a vontade de Deus. Contudo, nenhum deles era suficientemente compreensivo para
englobar tudo quanto fosse necessário para uma vida humana virtuosa, sem nada
supérfluo, sem nada carente. Alguns deles excediam em um aspecto, alguns em
outros. É o Alcorão, e tão-somente o Alcorão, que cultua não apenas tudo o que
havia de magnífico nos livros precedentes, porém, ainda, aperfeiçoa os
desígnios de Deus e os apresenta em sua totalidade, delineando uma norma de
vida que compreende tudo o que é necessário para o homem nesta terra. Os
pensamentos se renovam e as culturas se proliferam; a vida evolui e a colheita
intelectual da humanidade aumenta a cada dia, e quanto mais a humanidade
evolui, mais unida e mais mesclada fica. Os veículos de comunicação em muito
ajudam nisso, como se quisessem corroborar as palavras do Alcorão: "Ó
humanos, em verdade, Nós vos criamos de macho e fêmea e vos dividimos em povos
e tribos para reconhecerdes uns aos outros. "(49ª Surata, versículo 13).
No que diz respeito à tradução do Alcorão para outros idiomas, dando
oportunidade a que outros povos, na pluralidade de suas línguas e cores, possam
conhecer a Mensagem de Mohammad, os doutos na matéria dizem: "a Mensagem
de Mohammad é para a humanidade em geral, e, sendo ele árabe, essa mensagem
pode alcançar os não- árabes, através de traduções que substituirão o original.
Todavia, deve ser uma tradução impecável, correta, concordante, para que se
possa coibir a trajetória de muitas traduções incorretas e preambuladas de
fábulas irreais". Como o Livro de Deus é um mar sem porto, com profundeza
ignorada, esforçamos em Ter como base para a nossa versão uma explicação em
estilo contemporâneo, fácil, simples, clara, solerte, sucinta, livre das
divergências doutrinárias, dos aparatos artísticos, dos preâmbulos e dos
problemas linguísticos, para que isso nos facilitasse e auxiliasse de uma
maneira satisfatória, a tradução. E foi a paixão pelo Islam, o grande desejo de
lhe útil – nós que somos um de seus adeptos - que nos levou a enfrentar a
empresa de traduzir o Alcorão Sagrado. Depois de muito trabalho, de muita
perseverança, e de termos vencido o desânimo que chegou a nos invadir por
dificuldades várias, sai este, g raças ao Altíssimo. Imbuído de força de força
de vontade, seguimos avante, derrubando obstáculos, vencendo etapas, auxiliado
pela graça Divina. Para tanto, tivemos de recorrer várias fontes, consultar
várias interpretações, antigas e modernas. Estivemos trabalhando frente a obras
como: "Ahcam al Cor’an" (As Máximas do Alcorão), de Abu Bakr ar Razi;
"Ahcam al Cor’an (As Máximas do Alcorão), de Abu Bakr al Arabi;
"Muntakhab Ahcam al Cor’an" (Coletânea de Máximas do Alcorão), de Abu
Abdullah al Kurtubi; "Ahcam al Cor’an (As Máximas do Alcorão), de Abul
Hassan at Tabari; "At Ta fsir al Wádhih" (A Exegese Inteligível), de
Mohammad Mahmud Hijazi; "Al Cor’an al Mufassar" (O Alcorão
Explicado), de Mohammad Farid Wajdi; "Tafsir al Manar" (A Exegese da
Luz), de Mohammad Rachid Rida; "Al Muntakhab fi Tafsir al Cor’an al Carim"
(O Seleto na Exegese do Sagrado Alcorão), publicado pelo Conselho Superior dos
Assuntos Islâmicos do Cairo; "The Holy Kuran" (O Alcorão Sagrado),
tradução de Maulana Abdur-Rahim Tariq; "Safwat al Bayan li Ma’ani al
Cor’an (Gema do Discernimento das Exegeses do Alcorão), de Hassanain Mohammad
Makhluf ; "The Meaning of the Glorius Koran" (O Alcorão Glorioso),
uma tradução explanatória de Mohammad Marmuduke Pickthall; "Al M’ujan al
Mufahrass li Alfaz al Cor’an al Carim" (Índice dos termos do Sagrado Alcorão),
de Mohammad Fuad Abdel Baqui, "The Holy Koran, Translation and
Commentary" (O Alcorão Sagrado, Tradução e Comentários), de A. Youssef
Ali. Na maioria dos casos seguimos as exegeses do Conselho Superior dos
Assuntos Islâmicos e do Professor Mohammad Mahmud Hijazi, por se situarem entre
as que mais se coadunavam com os requisitos necessários. Por fim, quando ainda
na permanência de dúvida a respeito do significado de algum termo, recorremos à
ajuda inestimável de S. E. Dr. Abdalla Abdel Chakur Kamel, Diretor do Centro
Islâmico do Brasil e Coordenador dos Assuntos Islâmicos da América Latina, que
muito nos auxiliou neste sentido; a ele vão aqui nossos agradecimentos.
Queremos render os nossos mais sinceros agradecimentos ao Sr. Jorge Boucher,
que lutou conosco, pesquisando, consultando, comparando e encontrando termos
que ia ao encontro do sentido preciso, participando também conosco das cinco
revisões que efetuamos dos originais. Finalmente, agradecemos a todos aqueles
que, de uma maneira ou de outra, participaram na compilação deste livro, desde
datilógrafos, digitadores, até impressores. O nosso muito obrigado a todos.
Centro Cultural Beneficente Árabe Islâmico de Foz do Iguaçu – PR. Brasil.
Abraço. Davi.
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