Mais ou menos no ano 520,
Bodhidharma cruzou o Oceano Índico, indo
para a China. Sua chegada às terras do imperador Amarelo marcou o
início do Chan ou Zen, e ele tornou-se o primeiro patriarca Chinês. Embora
diversas Escolas do Budismo tenham sido criadas na China,
muito antes de Bodhidharma chegar, sua reputação de renomado mestre de
Dhyana antecedeu-o; por isso, o imperador Chinês Wu Ti (502-540), que era um budista devoto, convidou
Bodhidharma para visitar o Palácio Imperial,
a fim de transmitir seus ensinamentos. O Imperador tinha patrocinado a
construção de muitos mosteiros e templos budistas e sustentado diversos
mestres de várias seitas budistas. Segundo
sua maneira de entender os ensinamentos, achava que, em consequência de
tudo o que fazia, deveria merecer um feliz e próspero reino, e ter o
privilegio de reencarnar no lugar que os budistas chamam de Nação Pura,
onde, ao contrário da terra, todas as condições
de vida conduziriam à realização da iluminação. O imperador
estava encantado por ter a oportunidade de encontrar um mestre
profundamente iluminado e ansioso para conhecer suas realizações
espirituais. Conta-se que, ao encontrar
Bodhidharma o imperador perguntou: Tenho
construído muitos templos, copiado inúmeros Sutras e ordenado muitos
monges, desde que me tornei imperador. Portanto, pergunto-lhe: qual é o
meu mérito? Nenhum!, respondeu
Bodhidharma (528- ?). O Imperador insistiu: Por que não tenho mérito?
Bodhidharma replicou: Fazer as coisas para
obter mérito tem um motivo impuro e só revelará o fruto mesquinho do
renascimento. O imperador, um tanto aborrecido, então, perguntou: Qual é
o principio mais importante
do Budismo? Ao que Bodhidharma
respondeu: Um grande vazio. Nada sagrado. O imperador agora confuso e
bastante indignado inquiriu: Quem é este que está diante de mim?
Bodhidharma falou: Eu não sei. Vendo que o Imperador não entendeu,
Bodhidharma cruzou o rio para Shaolin,
onde ficou em meditação durante nove anos voltado à parede de uma
gruta. Wu Ti, mais tarde, conversou com um de seus ministros Budistas
sobre o encontro que tivera
com Bodhidharma. O ministro perguntou:
Vossa Majestade imperial sabe quem é esta pessoa? O Imperador disse que
não sabia. O ministro falou: Ele é o
Bodhisattva da compaixão portador do selo do coração de
Budha. Cheio de arrependimento o Imperador quis chamar
Bodhidharma de volta à corte, mas o ministro
advertiu: Ainda que você o mandasse buscar, ele não viria. Nem mesmo se
todo o mundo, na China, fosse pedir-lhe. Ao mesmo tempo,
Bodhidharma atraia um círculo de seguidores e, com o passar dos anos, confirmou
Eka, o chinês Hui
Ko, como seu próprio sucessor do Dharma. Os mestres de
Dhyana rapidamente descobriram que os chineses tinham um sistema contemplativo próprio nos ensinamentos de
Lao-Tse (604 AC 531) e de Chung-Tsu
(370 AC 287) o qual se chama coletivamente de Taoísmo. A maneira
simples de viver em harmonia com a vida, associada ao Taoísmo, está
resumida no principio Wu-Wei,
que significa, não fazer, ou não esforço (no sentido de seguir as ilusões da mente). O texto clássico do Taoísmo, o Tao Te
Ching, começa assim:
O Tao que pode ser contado não é o Tao Eterno.
O nome que pode ser especificado não é o Nome Eterno.
O nome que pode ser especificado não é o Nome Eterno.
O que não tem nome é o eternamente real.
Dar nomes é a origem de todas as coisas pessoais.
Dar nomes é a origem de todas as coisas pessoais.
Livre do desejo, você compreende o mistério.
Apanhado em desejo, só vê as manifestações.
Apanhado em desejo, só vê as manifestações.
Embora mistério e manifestações surjam da mesma fonte.
Esta fonte chama-se escuridão.
Esta fonte chama-se escuridão.
Escuridão dentro da escuridão.
A porta de todo o entendimento.
A porta de todo o entendimento.
As similaridades com o
Dhyana Budista eram marcantes e, mais tarde,
Chan é impregnado pela influência do Taoísmo, que assim, deu a Chan seu
sabor distinto. Veja, por exemplo, o
Hsin Hsin Ming, escrito pelo Terceiro Patriarca,
Sengstan (em japonês, Sosan) que assim começa:
O Grande caminho não é difícil
Para aqueles que não têm preferências.
Quando amor e ódio estão ausentes
Tudo se torna claro e indistinto.
Faça a menor distinção, entretanto,
E o céu e a terra serão infinitamente postos de lado.
Para aqueles que não têm preferências.
Quando amor e ódio estão ausentes
Tudo se torna claro e indistinto.
Faça a menor distinção, entretanto,
E o céu e a terra serão infinitamente postos de lado.
Depois do Quarto Patriarca, Tao-Hsin (596-667), os mestres do Chan começaram a construir e fundar
mosteiros para treinamento, e quando chegou a época do Quinto,
Hung Jen (601-704), já havia mil monges estudando na mesma área.
O SEXTO PATRIARCA. Um dos discípulos do mosteiro de
Hung Jen era um camponês analfabeto que, depois, tomou-se o Sexto Patriarca. Seu nome era
Hui Neng (638-713) e, ao lado de
Bodhidharma e Shakyamuni
(563 AC 483), é talvez o mestre mais renomado na história do Zen. No
relato biográfico de sua vida, o Sutra da Declaração de Princípios do
Sexto Patriarca, conta como chegou até
Hung Jen, depois de ter ficado todo iluminado ao escutar, por acaso, um monge ler o Sutra do Diamante.
Hung Jen,
percebendo a sua Iluminação, colocou-o para trabalhar na cozinha, pois
não queria criar uma situação embaraçosa para os monges mais velhos.
Passaram-se oito meses até que
Hung Jen chamou
todos os monges para uma reunião e anunciou, que se algum deles pudesse
compor uma poesia, explicando a essência do Zen, lhe seria dada a
transmissão, e receberia o manto e a tigela do
Sexto Patriarca. O favorito para o título era o monge chefe,
Shen Hsin. Ele escreveu o verso a seguir, sem assinar, na parede do mosteiro, altas horas da noite.
Nosso corpo é a árvore
Bodhi
Nossa mente, um espelho brilhante.
Cuidadosamente nós os limpamos minuto a minuto
E não deixamos nenhuma poeira ali pousar.
Nossa mente, um espelho brilhante.
Cuidadosamente nós os limpamos minuto a minuto
E não deixamos nenhuma poeira ali pousar.
Os outros monges ficaram maravilhados e decidiram que não poderia haver nada melhor. Entretanto,
Hui Neng, passando pelo corredor, perguntou pelo verso que seria lido para ele (ele não sabia do teste de
Hung Jen), e ditou seu próprio poema:
A árvore
Bodhi não existe
Nem sequer um espelho brilhante.
Já que tudo é vazio
Onde pode a poeira pousar?
Nem sequer um espelho brilhante.
Já que tudo é vazio
Onde pode a poeira pousar?
Todos ficaram surpresos, e o mestre, reconhecendo que este era o trabalho de alguém que verdadeiramente entendeu a essência da
mente, apagou-o, temendo que pudesse expor Hui
Neng à indignação dos monges com ciúmes, por lealdade a
Shen Hsui. Hui
Neng tinha sido convocado para ver o mestre naquela mesma noite.
Ele tinha recebido o manto e a tigela (que se dizia terem pertencido a
Bodhidharma), e tinha sido avisado para seguir para o sul. Durante quinze anos,
Hui Neng ficou
no anonimato até decidir que já era a hora certa de revelar que ele era o
Sexto Patriarca. A Escola do Zen por ele fundada passou a ser conhecida
como Escola do Sudeste, e a de
Shen Hsui, que aos poucos iria desaparecer, como Escola do Nordeste. Tal era a genialidade de
Hui Neng que, com grande capacidade, transmitiu o
Dharma para 43 sucessores. Daí em diante,
apareceram muitas linhas diferentes de transmissão do Zen, sendo que
essa foi a semente para o desenvolvimento das duas principais seitas Zen
no Japão: a Soto e a
Rinzai. A Dinastia Tang (620-906) foi a Idade de Ouro do Zen na China. Ela produziu grandes mestres, como
Joshu (778-897) e Nansen (748-834), e as estórias e casos desses mestres foram reunidas em coleções como a
Mumokan, Hekiganroku,
Shoyoroku e Tetteki Tosui,
e estudadas pelos discípulos do Zen até os dias de hoje. Um dos maiores
professores e que gozou de maior influência, nessa época, foi
Lin-Chi (1974- ).
TRANSMISSÕES NA CHINA2
|
|||||
30.
Hui-k'o
|
31.
Seng-ts'an
|
32. Tao-hsin
|
33.
Hung-jen
|
||
35.
Ch'ing-yüan
|
37. Yao-shan
|
38.
Yün-yen
|
39.
Tung-shan
|
40. Tao-ying
|
|
41. Tao-p'i
|
42.
Kuan-chih
|
43.
Yüan-kuan
|
44.
Ta-yang
|
45. T'ou-tzu
|
46. Tao-k'ai
|
47.
Tan-hsia
|
48. Wu-k'ung
|
49.
Tsung-chüeh
|
50.
Hsüe-tou
|
51. Ju-ching
|
1. Extraído de Elementos do Zen de David Scott (1945- ) e Tony
Doubleday
2. Extraído de
Denkôroku de Keizan
Zenji
Antes de serem transmitidas para o Japão, as duas maiores Escolas Dominantes do Chan, na China, eram a que traçou sua linhagem
a partir do Sexto Patriarca até Lin Chi e a que traçou sua linhagem revendo
Tsao Shan Pen Chi em japonês:
Sozan Honjaku, (840-901) e
Tung Shan
Lian Chieh em japonês: Tozan
Ryokai, (807-869), então conhecida como Escola de Tsao
Tung, na China. No Japão, essas duas Escolas ficaram conhecidas como
Rinzai e Soto, respectivamente. A
Rinzaí foi introduzida primeiramente, no Japão, por Eisai (1141-1215), e a Soto, por
Eihei Dogen
Kigen (1200-1253), de quem já falamos. Em 1184, Eisai construiu o primeiro templo do Zen no Japão. Chama-se
Shofuku Ji e até hoje ainda existe. Mais tarde, mudou-se para a capital Imperial, Kyoto, onde a Escola
Rinzai tornou-se firmemente estabelecida. Entre os séculos XII e XIV, o
Rinzai Zen passou a ser muito popular na
classe dos Samurais que dominava o Japão. Os Samurais valorizaram a
imediata praticabilidade do treinamento, que era adaptado para
satisfazer as necessidades urgentes daqueles anos de turbulência.
A coragem e a determinação dos guerreiros fizeram deles discípulos
particularmente fortes. Abriram-se templos do
Rinzai, em Kamakura, a capital militar, e o sistema nativo do Guerreiro Zen, com seu
koan próprio, começou a se expandir. Nesse meio tempo, o Soto Zen desenvolveu-se independentemente da agitação política da capital.
Dogen nasceu em 1200. Seu pai morreu quando
ele tinha dois anos, e sua mãe faleceu cinco anos depois. Com a idade de
treze anos foi viver com um tio, um devoto do Budismo. A perda de seus
pais e o incentivo de seu tio confirmaram
a decisão do Dogen de tornar-se monge. Alguns anos mais tarde, foi para o mosteiro de
Kenninjo, fundado por Eisai, e estudou com o sucessor do
Dharma de Eisai,
Myozen. Durante o tempo que ficou em Kenninjo, o
Dogen completou seu treinamento na tradição
Rinzai e recebeu o Inka, o selo de
mestre. Apesar disso, não tinha resolvido satisfatoriamente seu dilema
básico quanto ao significado da vida. Suas dúvidas levaram-no a
empreender uma via arriscada, para a China, em 1223.
Uma vez lá, estudou com o Mestre Ju-Ching (1163-1228) no mosteiro de
Tien Tung. Tudo leva a crer que o treinamento foi duro e, no início, não teve uma vida fácil por lá. Seu Dai-Kensho ocorreu da seguinte maneira: Seguindo o exemplo do seu mestre,
o Dogen se dedicou à prática do
Zazen noite e dia. De manhã cedo, enquanto dava seu giro costumeiro para fazer uma inspeção, no início do período do
Zazen formal, Ju Ching encontrou um dos monges cochilando. Repreendendo o monge, disse: A prática do
Zazen é o deixar cair o corpo e a mente. O que você espera conseguir cochilando? Ao ouvir estas palavras,
Dogen compreendeu a Iluminação, o olho de sua mente abriu-se completamente. Dirigindo-se para a sala de Ju
Ching, a fim de ter sua Iluminação confirmada como genuína, o
Dogen queimou um incenso e prostrou-se perante seu mestre.
O que você quer dizer com isto? perguntou Ju
Ching.
Eu experimentei o deixar cair o corpo e a mente, respondeu Dogen.
Ju Ching, vendo que a Iluminação do Dogen era genuína, disse por fim: Você realmente deixou cair o corpo e a mente!
Dogen, entretanto, insistiu em dizer: Eu apenas acabei de compreender a Iluminação, não me aprove com tanta facilidade.
Eu não estou o aprovando facilmente.
Dogen, ainda insatisfeito, persistiu: Em que você se baseia para dizer que não me aprovou facilmente?
Ju Ching respondeu: Corpo e mente caíram!
Ouvindo isto, Dogen prostrou-se perante o mestre em profundo respeito e gratidão, mostrando que realmente havia transcendido sua mente discriminatória.
Eu experimentei o deixar cair o corpo e a mente, respondeu Dogen.
Ju Ching, vendo que a Iluminação do Dogen era genuína, disse por fim: Você realmente deixou cair o corpo e a mente!
Dogen, entretanto, insistiu em dizer: Eu apenas acabei de compreender a Iluminação, não me aprove com tanta facilidade.
Eu não estou o aprovando facilmente.
Dogen, ainda insatisfeito, persistiu: Em que você se baseia para dizer que não me aprovou facilmente?
Ju Ching respondeu: Corpo e mente caíram!
Ouvindo isto, Dogen prostrou-se perante o mestre em profundo respeito e gratidão, mostrando que realmente havia transcendido sua mente discriminatória.
Extraído de
Dogen Zen, por Yuho
Yokoi.
Dogen
voltou
para o Japão em 1227, levando cópias de certos textos importantes do
Soto Zen, muito embora tenha dito que regressou de mãos vazias. A
essência fundamental do Zen, que ele agora ensinava, era que a prática
ou atividade do dia a dia é a expressão da própria
Iluminação. Por este motivo, começou a dar grande ênfase aos detalhes
da atividade cotidiana, e encarou cada momento como uma oportunidade de
expressar a gratidão pela natureza de
Budha. Ganhou a reputação de se submeter a uma disciplina severa e de fazer críticas abertas às outras seitas budistas, inclusive ao
Rinzai. Em 1236, Dogen
fundou seu próprio templo, e sua fama de mestre começou a se espalhar.
Hoje ele é reverenciado como um dos maiores gênios religiosos do Japão.
Dogen não tinha nada cm comum com as lutas
do poder aristocrático e militar do seu tempo e isto, combinado com sua
insistência em afirmar que mulheres e homens eram igualmente capazes de
realizar o Caminho de
Budha, fez do Soto uma tradição realmente sem classes. Os ensinamentos do
Dogen teve um incomensurável impacto sobre o
Zen japonês e nenhum discípulo bem intencionado poderá desprezar sua
obra. Não estaremos exagerando se dissermos que, após a introdução do
Soto e do
Rinzai no Japão, como Escolas Separadas,
elas se desenvolveram e floresceram independentes uma da outra por quase
700 anos. Se o vigor dessas escolas foi firmemente mantido, através dos
séculos, é um assunto que envolve certa controvérsia.
O Zenji Hakuin (1686-1789), por exemplo, é considerado por toda a parte, no Japão, como o reformador do
Rinzai Zen, no século XVII, que estava naquela época se tornando bastante insípido. Similarmente, os métodos de ensino de mestre
Bankei separou os sistemas tradicionais
completamente. Durante todos estes anos, uma Escola tem criticado a
outra, e cada uma pode estar certa dentro de sua própria perspectiva. Os
praticantes do
Rinzai criticam seus congêneres do Soto por subestimarem a realização do
Satori, e os últimos criticam os primeiros
por não considerarem que a prática diária do Caminho não é nada mais do
que realizar a Iluminação. É preciso que alguém tenha a capacidade do
próprio
Dogen para obter a aprovação de mestre em
uma tradição, e ainda reconhecer que existe algo a ser aprendido com a
outra. Entretanto, foi precisamente isto que o
Roshi Daiun
Sogaku Harada (1872-1963) fez. O
Roshi Yasutani (1885-1973), seu sucessor do
Dharma, disse a respeito dele: Embora ele próprio fosse da seita
Soto, não conseguira encontrar um mestre verdadeiramente realizado
naquela seita, e portanto, submeteu-se ao treinamento no
Shogen Ji, e, depois, no Nansen Ji, dois mosteiros
Rinzai. Em Nansen Ji. finalmente, apoderou-se do segredo mais profundo do Zen, sob a orientação do
Roshi Dokutan (1871-1961), um eminente mestre. Em consequência, os sucessores do
Dharma do Roshi
Harada (1940- ) usaram ambos os métodos de ensino, Soto e
Rinzai, e argumentaram que assim procediam de uma maneira
inovadora, tradicional e flexível. Menciona-se tal fato devido à
profunda influência que o
Roshi Yasutani (1932- ) e outros dessa linhagem tiveram sobre o desenvolvimento do Zen no Ocidente.
1. Extraído de "Elementos do Zen" de David Scott e Tony
Doubleday
Embora muitas vezes o associem às artes marciais, medicina alternativa, cozinha macrobiótica, manutenção de motocicleta
etc, muitos ocidentais, pelo menos, já
ouviram falar no Zen hoje em dia. Ele tem sido popularizado em filmes,
música, artes e ficção, e não existem boas livrarias ou bibliotecas que
não tenham, pelo menos, uma publicação sobre o
assunto. O trabalho pioneiro de D.T. Suzuki (1870-1966), Alan Watts
(1915-1973) e
Christmas Humphries
(1901-1983), juntamente com o intercâmbio cultural deste século, também
tornou muito fácil, para diversas gerações de mestres Zen orientais,
trazer o
Dharma para o Ocidente. Talvez por causa do
relacionamento desenvolvido entre as forças americanas de ocupação e os
nacionalistas japoneses, os primeiros mestres Zen do Japão que viajaram
para o exterior foram inicialmente para a
América do Norte. No início, reuniões informais conduzidas por
Nyogen Senzaki (1876-1958) e outros, despertaram um interesse nos retiros (Sesshin) formais do Zen, sob a orientação, por exemplo, dos
Roshis
Shunryu Suzuki (1905-1971), Hakuin
Yasutani (1885-1973) e Soen
Nakagawa (1907-1984). No início da década de setenta, centros de treinamento formal foram fundados na América para o Soto e o
Rinzai Zen, bem como para o Chan chinês e o
Son coreano. Como os monges japoneses Eisai e
Dogen, que foram para a China e retornaram para o Japão com o
Dharma, alguns ocidentais, interessados no Zen, foram para o
Oriente, de lá regressando para fundar seus próprios centros de
treinamento como satélites de mosteiros do Japão ou independentes. Entre
estes estão o
Roshi Jiyu
Kennet (1924-1996), o Venerável Myoko-Ni e o
Roshi Philip Kapleau (1912-2004).
Juntos, os discípulos americanos e europeus e os mestres japoneses no
Ocidente, que concluíram seu próprio treinamento formal, representam uma
geração de mestres Zen nativos, alguns dos quais
agora têm seus próprios sucessores do Dharma.
Apesar de ainda estarmos nos primeiros anos de seu desenvolvimento,
ficou claro que o Zen, no Ocidente, vai ser diferente de seus congêneres
orientais. Isto se reflete nas expectativas
dos próprios discípulos, seus mestres e no Dharma
em si. Deste modo, assim como tem tido um notável crescimento, o Zen no
Ocidente tem também experimentado muitos mal-entendidos e dificuldades:
duras lições estão sendo aprendidas
tanto pelos discípulos como pelos mestres. Tem havido considerável
experimentação com os métodos de ensino tradicionais, e um dos
resultados é que os mestres ficaram mais dispostos a falar e explicar o
Zen do que no passado. Mas há também diferenças de estilo
marcantes com relação às várias linhagens que estão surgindo no
Ocidente. Vejamos o Soto Zen, por exemplo; a Escola Franco Europeia,
fundada pelo
Roshi Taisen
Dshimaru (1914-1982), é muito diferente, na sua abordagem para treinamento, da britânica do
Roshi Jiyu
Kennet e da Ordem norte-americana dos budistas contemplativos.
Tudo isto é de esperar enquanto os mestres adaptam o treinamento para
atender às necessidades dos discípulos. Uma impressão que se tem do Chan
desenvolvido é de que se tornou reconhecidamente
diferente dos sistemas do Budismo Mahayana de
Dhyana, no qual teve origem. De maneira semelhante, o Soto e o
Rinzai japoneses, conforme existem hoje, são muito diferentes das
suas origens do século XII. Já que o Zen trata da valorização da vida,
em vez da devoção a dogmas e credos específicos, suas formas europeias e
norte americanas, com certeza, evoluirão
com as conhecidas características da cultura ocidental. É muito cedo
para dizer que forma essas características finalmente vão tomar; porém,
neste estágio, certas preocupações e temas parecem bastante comuns em
várias Escolas Ocidentais do Zen. Resumidamente
são: 1. Apesar de o Dogen insistir que
homens e mulheres são igualmente capazes de realizar o Caminho, há uma
diferença marcante entre o moderno Ocidente e o antigo Oriente quanto ao
lugar e o status da mulher no treinamento Zen.
A tendência no Ocidente tem sido não fazer distinção de sexo. Centros
de treinamento, mosteiros,
sesshin, acesso aos mestres, todos estão
abertos para qualquer pessoa. Talvez, em consequência disso, haja muito
mais mulheres procurando o treinamento Zen no Ocidente do que no
Oriente. 2. A necessidade da distinção entre treinamento
leigo e monástico tem sido matéria para muita meditação e
experimentação no Ocidente. Alguns mestres são muito severos nas suas
exigências para com os discípulos que querem se tornar monges, ao passo
que outros encaram como natural, para qualquer um que pratique
a meditação regularmente, tomar-se monge, se assim o desejar. A
distinção é também obscura porque não existe uma tradição muito
difundida, no Ocidente, para os leigos manterem as comunidades
monásticas. Isto significa que quase todos os monges Zen ocidentais
têm de trabalhar, pelo menos por algum tempo, em tarefas comuns, para
se manterem. Em consequência disso, nos centros Zen que ficam na cidade,
mais do que nos mosteiros da zona rural, está tem sido a regra. Onde
centros de retiros monásticos foram fundados,
a tendência é abrigar apenas pequenas comunidades residenciais, e a
maior parte das pessoas ficar somente algumas semanas ou meses de cada
vez. 3. Até que ponto o Zen ocidental deverá adotar as formas orientais
nas quais o Zen está condensado é um assunto
que tem sido tratado amplamente, de diferentes maneiras. Algumas
linhagens ocidentais têm feito um grande esforço para remover da prática
todos os vestígios das origens orientais. Assim, todos os termos de
referência, os Sutras e os cânticos têm sido traduzidos
nos equivalentes próximos europeus, e têm sido adotadas formas de
apresentação das tradições religiosas europeias. Outras têm sido mais
conservadoras, entretanto, limitando-se, por exemplo, a traduzir para o
vernáculo somente certos cantos. Os motivos para
fazer ou deixar de fazer quaisquer modificações no tratamento oriental
do Zen serão testados com o passar do tempo; alguns surgirão como bem
sucedidos, outros serão desprezados como inadequados. Por enquanto, a
escolha dos estilos de ensino e tradições disponíveis
para o iniciante é muito grande, senão um pouco confusa. Talvez o
melhor e mais imparcial conselho que possa ser dado é aquele certa vez
oferecido pelo
Zenji Dogen (1200-1253):
Mesmo as pessoas que estão no mundo profano devem se concentrar em uma
coisa e aprendê-la o máximo possível, para poder realizá-la perante os
outros, em vez de aprender muitas
coisas, ao mesmo tempo, sem realizar verdadeiramente nenhuma delas.
Isto é tanto mais válido para o
Dharma de Budha,
que transcende o mundo profano e nunca foi aprendido ou praticado a
partir do começo sem começo. Nós ainda não estamos familiarizados com
ele. Além disso, nossa capacidade é pobre. Se
tentarmos aprender muitas coisas a respeito deste majestoso e ilimitado
Dharma de Budha, não realizaremos
nada. Mesmo que nos dediquemos a apenas uma coisa, devido a nossa
natureza e capacidade inferiores, teremos dificuldade de esclarecer o
Dharma de Budha completamente em uma vida. Discípulos, concentrem-se em uma coisa só (...). Extraído de Elementos do Zen, de David Scott e Tony
Doubleday.
http://www.nossacasa.net/shunya/. Abraço. Davi.
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