Budismo. Texto de Tenzin Gyatso (o 14º Dalai Lama). Valores Universais.
A ÉTICA ALÉM DA RELIGIÃO. Desvantagens em Enfatizar as Diferenças Secundárias. Queridos irmãos e irmãs, estou extremamente feliz
por essa oportunidade de falar com vocês. Primeiramente, eu gosto sempre de
deixar claro que, quando dou palestras às pessoas, por favor, pensem em si como
um ser humano. Isso é dizer, por exemplo, não pense “eu sou suíço”, “eu sou
italiano”, ou “eu sou francês”. Meu tradutor não deveria pensar que é francês!
Eu também não devo pensar que sou tibetano. Além disso, eu não deveria pensar
em mim como budista, porque geralmente nas minhas palestras, a base do caminho
para viver uma vida feliz e menos perturbada está em ser um ser humano. Cada um dos sete bilhões de seres
humanos deseja uma vida feliz, e cada um tem todo o direito de atingir esse
objetivo. Se nós enfatizamos diferenças secundárias como “eu sou tibetano”, então
isso faz parecer que estou mais preocupado com o Tibete. Além disso, “eu sou
budista” gera algum tipo de sentimento de proximidade com outros budistas, mas
automaticamente cria algum tipo de distância de outras fés. Na verdade, esse tipo de visão é fonte
de problemas, incluindo os muitos problemas e a imensa violência que os seres
humanos têm enfrentado no passando e que continuam a enfrentar no século XXI.
Violência nunca acontece se você considerar as outras pessoas como seres
humanos, assim como você. Não há razão para matar um ao outro; mas quando nós
nos esquecemos da humanidade como una, e ao invés disso nos concentramos nas
diferenças secundárias como “minha nação” e “a nação deles”, “minha religião” e
a “religião deles”, nós criamos distinções e nos preocupamos mais com o nosso
próprio povo e seguidores da nossa religião. Assim, nós desconsideramos os
direitos dos outros e temos nenhum respeito pelas vidas dos outros. Muitos dos
problemas que enfrentamos hoje emergem dessa base, de colocar demasiada ênfase
e importância em diferenças secundárias. Agora,
o único remédio para isso é pensarmos logicamente em nós mesmos como sendo
seres humanos, sem demarcações ou barreiras. Quando dou palestras, por exemplo,
se eu me considerar budista tibetano e, talvez, ainda mais, se eu pensar em mim
mesmo como “Sua Santidade o Dalai Lama”, isso cria certo tipo de distância
entre mim e a audiência, o que é tolice. Se eu estou sinceramente preocupado
com o seu bem-estar, tenho que falar com você no nível de sermos irmãos e irmãs
humanos, os mesmos seres humanos assim como eu. Na verdade, nós somos o mesmo:
mentalmente, emocionalmente e fisicamente. E mais o importante, todos querem
uma vida feliz sem nenhum sofrimento, e eu sou o mesmo, então vamos conversar
nesse nível. Ética Laica. A ética laica está muito relacionada
a fatores biológicos, mas fé religiosa é algo que só os seres humanos têm.
Entre a humanidade a fé se desenvolveu, mas certamente não é um fator
biológico. A ética secular abrange toda a população de sete bilhões de seres
humanos. Como eu mencionei ontem, de sete bilhões de pessoas, um bilhão
formalmente afirmou que é cética, e se pensarmos, dos seis bilhões que
supostamente acreditam, existem tantas pessoas corruptas. Há escândalos,
exploração, corrupção, traição, mentira e bullying. Isso, eu acredito, é devido
à falta de genuína convicção nos princípios morais. Então, até a religião é
usada para propósitos errados. Se eu mencionei isso ontem ou não, às vezes eu
realmente sinto que a religião nos ensina como agir hipocritamente. Nós dizemos
coisas boas como “amor” e “compaixão”, mas na realidade não agimos de acordo, e
há muita injustiça. A religião fala sobre essas coisas
boas em uma espécie de maneira tradicional, mas não de um jeito que realmente
se conecta ao seu coração. Isso acontece porque falta às pessoas os princípios
morais, ou a falta de convicção sobre o valor dos princípios morais.
Independente da pessoa ser crente ou cética, nós precisamos pensar mais
seriamente em como educar as pessoas sobre esses princípios morais. Então, em
cima disso, você pode adicionar a religião, e isso se torna uma verdadeira e
genuína religião. Todas as religiões, como eu mencionei ontem, falam sobre
esses valores. Desenvolvendo Desapego no Próprio Campo. No século passado, enquanto às pessoas matavam uma
à outra, ambos os lados estavam rezando para Deus. Difícil! Ainda hoje, às
vezes, você vê conflitos em nome da religião, e eu acho que ambos os lados
rezam para Deus. Às vezes eu brinco, dizendo que parece que Deus está confuso!
Como Ele poderia decidir, com os dois lados rezando para Ele, procurando alguma
forma de benção? É difícil. Uma vez na Argentina, durante uma discussão com
cientistas e alguns líderes religiosos, embora não tenha sido um encontro
inter-religioso, conheci um físico com o nome de Maturana. Ele era professor do
já falecido Varela e eu já havia o conhecido anteriormente na Suíça, e então na
Argentina, mas nunca mais desde então. Durante sua palestra, ele mencionou que,
como físico, não deveria desenvolver apego em relação à sua própria área
científica. Então, essa foi uma afirmação maravilhosa e sábia que eu aprendi. Eu sou budista, mas não devo
desenvolver apego com relação ao budismo porque apego é uma emoção negativa.
Quando você desenvolve apego, sua visão se torna tendenciosa. Uma vez que sua
mente se torna tendenciosa, você não consegue ver as coisas objetivamente. É por isto que acho que, na maioria
das vezes, para aqueles envolvidos em conflitos em nome da religião a
verdadeira razão não é a fé religiosa, mas sim interesses econômicos ou
políticos. Mas em alguns casos, como os de
fundamentalistas, eles se tornam tão apegados à sua própria religião e então,
por causa disso, não podem ver o valor de outras tradições. A afirmação de Maturana foi um grande
conselho para mim. Como resultado de me encontrar com muitas pessoas, eu admiro
muitas outras tradições e, claro, espero não ser fundamentalista ou fanático.
Às vezes eu menciono que uma vez estive em Lurdes, no sul da França. Fui como
um peregrino, e, na frente de uma estátua de Jesus Cristo eu bebi um pouco de
água. Eu estava na frente da estátua e refleti na minha mente, sobre o que
tinha ouvido, que milhões de pessoas ao longo dos séculos que visitaram esse
lugar, procurando conforto, com algumas pessoas doentes, que através de sua fé
e algum tipo de benção foram curadas. Então eu refleti sobre essas coisas e
tive alguma forma de sentimento profundo de apreço pelo cristianismo, as
lágrimas quase vieram. E então, em outra vez, aconteceu uma coisa estranha em
Fátima, Portugal. Cercado por católicos e cristãos, nós fizemos um pequeno
período de meditação silenciosa na frente de uma pequena estátua de Maria.
Quando eu e todos os outros estávamos para ir embora, me virei para trás e a
estátua de Maria estava realmente sorrindo para mim. Eu olhei de novo e de
novo, e sim, ela estava sorrindo. Eu senti que Maria parecia ter algum tipo de
reconhecimento pelo meu caminho não sectário! Se eu tivesse passado mais tempo
com Maria discutindo filosofia, no entanto, talvez algo mais complicado pudesse
ter surgido! De qualquer forma, até o apego pela
sua própria fé não é bom. Às vezes a religião causa conflitos e divisões, e
isso é um assunto um tanto sério. A religião é, supostamente, um método de
aumentar a compaixão e o perdão, que são os remédios para a raiva e o ódio.
Então, se a própria religião criar maior ódio contra as outras fés religiosas,
é como um suposto remédio para curar a doença, mas que, ao invés disso, causa
mais doença. O que fazer? Todas essas coisas tristes existem, essencialmente,
devido à falta de convicção nos princípios morais, por isso eu acredito que nós
precisamos de várias práticas e fatores, de modo a fazer um verdadeiro esforço
para promover a ética secular. Secularismo e Respeito pelos Outros.
Agora, sobre ética laica. Eu conhecia
o ex vice primeiro-ministro indiano, Advani, muito bem. Em uma ocasião ele
mencionou que uma equipe de televisão canadense o entrevistou e perguntou qual
era a base para a prática bem-sucedida da democracia na Índia. Ele respondeu
que, por milhares de anos na Índia, a tradição foi de sempre respeitar os
outros, apesar de argumentos e visões diferentes. Ele me contou que por volta
de 3.000 anos atrás, o Charvaka, ou visão filosófica “niilista” se desenvolveu
na Índia. Os representantes de outras visões filosóficas indianas os criticaram
e condenaram seu ponto de vista, mas ainda se referiam aos representantes do
Charvaka como “rishi”, que significa sábio. Esse é um indício de que, apesar
dos desentendimentos ou discussões acaloradas, ainda havia respeito. Significa
que nós também devemos respeitar os céticos. Ontem eu disse que alguns dos meus amigos, alguns
cristãos e alguns muçulmanos, têm um pouco de reserva com a palavra
“secularismo”. Eu acho que é porque, durante a Revolução Francesa ou Revolução
Bolchevique, houve uma tendência a ser contra a religião. Mas eu quero fazer
uma clara distinção entre religião e instituições religiosas, que são duas
coisas diferentes. Como qualquer pessoa sensata pode ser contra a religião?
Religião significa amor e compaixão, e ninguém pode criticar essas coisas. As
instituições religiosas são, porém, algo diferente. Durante as Revoluções
Francesa e Bolchevique, em ambos os casos as classes dominantes realmente
abusavam das massas. Além do mais, a classe dominante também recebia total
apoio das instituições religiosas, e então, logicamente, de modo a desenvolver
uma determinação contra essa classe dominante, foi incluído ser contra as
instituições religiosas também. Portanto, houve alguma forma de tendência a ser
contra a religião ou Deus. Ainda
hoje, se houver algum tipo de exploração ocorrendo dentro de instituições
religiosas, incluindo a comunidade budista tibetana, nós temos que ser contra
isso. Minha experiência própria é de que há dois anos eu terminei com a
tradição de 400 anos de que o Dalai Lama automaticamente se torna líder
espiritual e temporal dos tibetanos. Eu acabei com ela, voluntariamente, feliz
e orgulhoso. Coisas como essas na realidade danificam o verdadeiro valor da
religião, ou do Dharma. Assim, nós devemos fazer a distinção entre as
instituições religiosas, e as reais práticas e mensagens religiosas. De acordo com o entendimento indiano
de secularismo, nunca há um sentimento de negatividade com relação à religião,
mas bastante respeito por todas as religiões, e também respeito por todos os
céticos. Eu acho isso muito sábio. Como podemos promover isso? Através da
pregação? Não. Então, certamente através da prece? Não. Mas através da
educação, sim. Nós recebemos educação sobre higiene física, então por que não
receber educação sobre higiene mental ou emocional, simples conhecimentos de
como cuidar de uma mente saudável? Não há necessidade de falar sobre Deus ou a
próxima vida, ou sobre Buda ou nirvana, mas simplesmente sobre como se tornar
uma pessoa feliz com a mente. Uma pessoa feliz gera uma família feliz, que gera
uma comunidade feliz. Logo, eu acho que nós precisamos de algumas lições sobre
higiene emocional. Higiene Emocional. O que é higiene
emocional? Significa tomar conta de fatores que destroem sua calma mental, ou
sua paz de espírito. Esses fatores são como doenças mentais, porque essas
emoções negativas não só destroem sua pacífica e saudável mente, como também
destroem sua habilidade mental para julgar a realidade. Isso causa muito dano
porque quando você está com muita raiva, você não consegue ver a realidade, e
sua mente se torna estreita. Também com o apego, você não consegue ver a
realidade corretamente. Isso é uma doença da mente. A própria natureza da mente
é consciência e então qualquer forma de fator mental que reduza essa capacidade
de consciência é uma coisa negativa. Higiene
emocional é, portanto, a diminuição desses tipos de emoções e a manutenção de
sua habilidade mental para a clareza e calma, que constitui uma mente saudável.
De modo a fazer isso, nós devemos primeiramente cultivar e desenvolver o
interesse em fazê-lo. Sem nenhum interesse, você não pode forçar as pessoas a
fazê-lo. Nenhuma lei ou constituição pode forçar as pessoas a fazê-lo. Tem de
vir através do entusiasmo individual, que só vem quando você vê o valor em
fazê-lo. E são sobre esses valores que nós podemos ensinar. Descobertas Científicas sobre a Mente e Emoções. Agora nós podemos olhar para a ciência. Antes a
ciência moderna focava na matéria, da qual você pode tirar medidas. Eu acho que
na parte final do século XX e agora, no começo do século XXI, mais e mais
cientistas estão realmente mostrando interesse na mente e suas emoções, porque
existe uma conexão muito próxima entre a mente e as emoções quando se trata da
saúde. Alguns cientistas estão dizendo “mente sã, corpo sã”. Cientistas médicos
também dizem que o medo, raiva e ódio constantes, na verdade, comem fora nosso
sistema imunológico, enquanto uma mente mais compassiva basicamente sustenta e
pode até melhorar um corpo saudável. Obviamente, sabemos que, para aquelas
pessoas que são mentalmente felizes, os efeitos positivos para seus corpos são
imensos. Reconhecendo o
Positivo em Situações Negativas. Na
minha própria vida, aos 16 anos, eu assumi muitas responsabilidades, e a
situação tornou-se muito difícil. Então, na idade de 24, perdi meu próprio país
e agora tenho vivido a maior parte de minha vida como um refugiado. Nesse meio
tempo, tem havido muito sofrimento e problemas dentro do Tibete, e as pessoas
colocam muita esperança e confiança em mim. Mas eu não posso fazer muito.
Entretanto, minha paz de espírito me permitiu ver tudo isso de modo mais
realista. Como disse Shantideva, se as dificuldades podem ser superadas, então
não há necessidade de ser preocupar. E, se há uma situação difícil sem nenhuma
possibilidade de ser superada, então não faz sentido em se preocupar demais.
Isso é bem realista, então eu pratico essas coisas. É importante olhar as coisas de
maneira mais realista, e também enxergar que todas as coisas são relativas. O
que quer que aconteça, pode haver algum efeito positivo. No meu próprio caso,
me tornei um refugiado, mas por causa disso, eu tenho tido a oportunidade de me
encontrar com muitas pessoas e aprender sobre diferentes pontos de vista.
Conheci mendigos, líderes, acadêmicos de diferentes campos, e pessoas que são
contra a religião. Isso é muito útil, já que se eu tivesse permanecido dentro
do Tibete, penso que meu conhecimento seria metade do que é hoje. Então, de
certa forma, é uma grande tragédia, mas por outro lado, trouxe muitas boas
oportunidades. Se olharmos por vários ângulos, então nos sentiremos bem. Coisas
ruins podem acontecer, mas pode haver algumas coisas boas nelas. O povo tibetano, no passado, esteve
um pouco isolado, mas agora seu pensamento é muito mais amplo. Através dos
séculos, os tibetanos estavam vivendo em um estado como o do sono, mas agora
eles acordaram. Isso é bom! Então veja, se você olhar de ângulos diferentes,
pode encontrar coisas positivas. Isso é de uma ajuda imensa na manutenção da
paz de espírito. Hoje em dia, muitos dos meus velhos amigos falam em como meu
rosto ainda parece jovem, quando encontro-os, e algumas dessas pessoas
perguntaram meu segredo. Eu geralmente os digo que oito ou nove horas de sono
ajuda para a paz de espírito. Na verdade, esse é um fator, mas o que é de
benefício real é se nossa mente e estados mentais são comparativamente quietos
e calmos. Uma mente calma inclusive te ajuda a
se recuperar de coisas como uma cirurgia médica. Quando fiz uma cirurgia na
minha vesícula biliar, foi realmente muito sério. Mais tarde, o cirurgião me
disse que a operação leva de 15 a 20 minutos, mas meu caso foi tão sério que
foi preciso quase 3 horas, porque minha vesícula biliar estava quase duas vezes
o tamanho normal, com muito pus. Mas, então, eu me recuperei no prazo de cinco
dias, simplesmente assim. Por isso, uma mente calma e atitude otimista
realmente ajudam na manutenção de um corpo saudável, e assim, mesmo se alguma
coisa der errado, você se recuperará mais rapidamente. Paz de espírito
realmente é um fator muito importante para a boa saúde. Beleza Interior versos Beleza Exterior. Também irei mencionar aqui, meio brincando e meio
implicando, que algumas jovens gostam de gastar um tanto de dinheiro em
cosméticos. Algumas mulheres usam diferentes cores em seus rostos – azul,
verde, e outras. Não fica muito bom, mas elas acham que é muito bonito! As
pessoas parecem prestar mais atenção à beleza exterior. Numa palestra pública
outro dia, uma mulher tinha cabelo azul, o que era muito incomum. Então, é
claro, eu impliquei com ela e disse que o cabelo azul não é necessariamente
bonito! Obviamente, a beleza exterior é importante, mas a coisa mais importante
é a beleza interior. Àquelas senhoras que gastam muito dinheiro na beleza
exterior, por favor, prestem mais atenção à sua beleza interior, que é muito
melhor! A Mente e as Emoções como um Assunto Acadêmico. Nós estamos falando sobre descobertas científicas.
A verdadeira paz de espírito é crucial. A base para a paz de espírito é a
autoconfiança e a força interior, que vêm da prática do amor e da compaixão,
com um sentimento de respeito pelos outros e preocupação pelo seu bem-estar.
Isso é ética secular. Do jardim de infância até à
universidade, nós podemos educar sobre a mente e em como cuidar de nossas
emoções. O assunto é vasto, e existem muitas explicações sobre nossa mente e
emoções, e a conexão entre elas. Nós podemos ver um tipo de relação de causa e
efeito, em que se alguma coisa acontece em uma parte da mente, outra coisa
acontece em outro lugar. Então, para lidar com isso, nós precisamos seriamente
considerar o modo pelo qual a mente e o todo o cérebro estão conectados. Esse vasto assunto realmente vale a
pena, academicamente. Nos últimos dois anos, nos Estados Unidos, cientistas vêm
realizando experimentos com base nessa informação, e alguns resultados um tanto
quanto concretos têm surgido. Como resultado, existem agora programas educativos
ensinando sobre ética secular. Agora nós também estamos comprometidos para a
criação de um projeto curricular sobre a ética moral, baseado no secularismo, o
que pode se encaixar no campo da educação secular. O público, em particular os
educadores e pensadores aqui, deve pensar mais sobre isso e se surgir uma
oportunidade, deve realizar algumas discussões sobre o assunto. Atualmente,
parecem faltar lições sobre a ética moral no sistema educacional, assim, a
maioria das pessoas depende dos ensinamentos religiosos para isso. É claro que
isso é bom, mas também existem aqueles que não têm interesse em religião, e
acham difícil aceitar conceitos religiosos. Isso dificulta. Portanto, nós
precisamos encontrar um caminho laico, que é universalmente aceitável. Terminei. Agora algumas perguntas.
Perguntas
Pergunta: Sua Santidade, no seu último comentário você
tocou na questão sobre a qual eu iria perguntar, mas de modo a conseguir uma
resposta completa, eu vou perguntar de novo, se você não se importa. Com
relação ao ensino da ética secular nas escolas e universidades, você está
trabalhando para desenvolver um programa de ensino adequado para qualquer um?
Se sim, você tem alguma instituição educacional ou financeira para te apoiar?
Sua Santidade: Na Índia, com a ajuda de algumas universidades em
Délhi, nós já começamos a trabalhar para criar um projeto curricular, como eu
mencionei antes. Assim, também temos o Mind and Life Institute. E nos Estados
Unidos, membros autônomos em seus próprios campos, em lugares como Universidade
de Wisconsin, Universidade Emory, Universidade Stanford nos USA e assim por diante, já
estão realizando educação com ética secular. E essa instituição que já se
expandiu na Europa. Em breve queremos criar uma instituição em Delhi - Índia. Até
agora, estivemos simplesmente trabalhando nisso. Uma vez que o currículo
estiver pronto, então talvez possamos treinar alguns professores, e alguma
coisa acontecerá. Talvez valerá a pena, veremos.
Pergunta: Sua
Santidade, eu amo o planeta e tudo que o compõe, a terra e as plantas e
animais, e a nós, humanos fascinantes. Mas esses humanos estão sempre
destruindo o planeta, com talvez coisas muito pequenas e simples como comprando
garrafas plásticas, e então coisas maiores e mais importantes, como
desflorestamento. Eu sei que devo ser paciente, mas quando vejo isso, quando
vejo que a vida está morrendo e sofrendo, há muita raiva vinda do meu estômago
e eu quero lutar. Então minha pergunta é: existe raiva saudável? Posso eu lutar
com amor?
Sua
Santidade: Como eu mencionei anteriormente, a
raiva está relacionada com a motivação. Então a raiva gerada por preocupação
por uma coisa ou alguém é uma coisa, e a raiva motivada com ódio é algo muito
diferente.
Pergunta: Sua
Santidade, obrigado por estar aqui. É maravilhoso te ver e te ouvir. Eu tinha
uma pergunta muito simples. Se você tivesse tempo livre amanhã para fazer
qualquer coisa, o que gostaria de fazer? Obrigado.
Sua
Santidade: Geralmente, sempre que tenho
tempo, eu leio as escrituras budistas, principalmente em tibetano. No budismo
tibetano, temos cerca de 300 volumes. 100 volumes são as palavras do próprio
Buda, quase como uma Bíblia. Então temos outros 200 volumes de comentários.
Assim, estou sempre dizendo aos tibetanos que esses não são apenas objetos de
adoração, mas são textos a serem estudados. Enquanto eu digo isso às outras
pessoas, eu mesmo também tento ler esses livros. Eu acho que, dos 300 volumes,
eu talvez tenha lido até hoje 30-40 volumes. Então, muitos livros ainda para
estudar. E, talvez, se eu tiver dois dias de lazer, então eu gostaria de ir a
uma área de montanhas cobertas de neve. Eu iria gostar de ver mais neve!
Pergunta: Sua
Santidade, você tem falado sobre os seis bilhões de fiéis e o provável um
bilhão de ateus no planeta. Tenho a impressão de que existe um terceiro grupo
de pessoas que não se sentem mais realmente em casa dentro da religião
tradicional e institucionalizada, mas que tampouco são ateus, e estão
procurando espiritualidade além da religião institucionalizada. Qual é o seu
conselho para eles?
Sua
Santidade: Anos atrás em Estocolmo, eu
conheci um pequeno grupo de pessoas. Eles não favoreciam tradições ou religiões
existentes, mas ainda estavam procurando alguma forma de espiritualidade. Sim,
existe esse tipo de pessoa. Entretanto, eu descobri que o que vocês chamam de
“nova era”, ou pegar partes daqui e dali e criar uma grande mistura, não é
muito útil!
Eu penso que é bom
não apenas satisfazer suas necessidades materiais, mas tentar achar valores
mais profundos é muito bom. Vale a pena analisar nossas vidas, e ver que nossa
felicidade não vem de alguma forma de satisfação sensorial. É como, quando uma
música está tocando, você está satisfeito, mas quando a música para, não há
mais satisfação. No nível mental, ter um tremendo sentimento ou fé ou compaixão
– a satisfação que vem disso é muito mais duradoura.
Questão: O que é, para você, a coisa mais importante
na vida humana?
Sua
Santidade: Eu estou sempre dizendo às pessoas
que o propósito da nossa vida é ter uma vida feliz. Agora, de modo a alcançar
felicidade ou a alegria, isso não deveria depender de faculdades mentais ou
experiências, mas deveria sim depender do nosso estado mental. Então, como eu
geralmente digo, devemos prestar mais atenção aos nossos valores interiores. Muito
obrigado.
Sua
Santidade o XIV Dalai Lama. Friburgo - Suíça, Abril de 2013. Levemente editado
por Alexander Berzin. www.studybuddhism.com.br.
Abraço. Davi.
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