Islamismo.
Dissertação de Conclusão de Curso de Zuhra Mohd Hanini. Capítulo III. NOÇÃO DE
DIREITO ISLÂMICA - SHARIA. DEFINIÇÃO DE DIREITO ISLÂMICO - SHARIA. SHARIA
significa literalmente “Caminho a seguir”, tecnicamente este termo refere-se ao
código de comportamento ou sistema de vida apresentado pelo Islam, que
estabelece o conhecimento dos direitos e deveres individuais e sociais, bem
como das leis e normas de vida prescritas por Deus para a humanidade. Podemos
afirmar que o Islam possui um sistema tridimensional que estabelece a ligação
direta entre Deus, o homem e a sociedade. Vale aqui ressaltar a colocação de
Abul A’la Maududi (1903-1979) em seu famoso livro “Los Princípios del Islam”
referente à Shari’ah: “A Shariah estipula a lei de Deus e dá uma orientação
para a regulamentação da vida para proveito do homem. O seu objetivo é manter o
homem no melhor caminho e dar-lhe os meios de realizar aquilo que que tem
necessidade para se sentir mais feliz. A Lei de Deus é para o seu benefício.
Não há nada nela que tenda a desperdiçar os vossos poderes ou a suprimir os
vossos desejos e lacunas naturais ou a destruir as vossas solicitações e
emoções. Ela não advoga o ascetismo, ela não diz: Abandonem o mundo, desistam
do sossego e conforto da vida, deixem os vossos lares e divulguem nas planícies
e nas montanhas e na selva sem pão nem roupas, expondo-vos aos incômodos e ao
auto aniquilamento! Não, certamente que não. Este ponto de vista não tem
relevância para a lei do Islam, uma lei que foi formulada pelo Deus que criou
este mundo para benefício da humanidade. A Shariah foi revelada pelo mesmo Deus
que realizou tudo para o homem. A Shariah foi revelada pelo mesmo Deus que
realizou tudo para o homem. Ele não gostaria de arruinar a sua criação. Não deu
aos homens nenhum poder que seja inútil ou desnecessário; nem criou nada no céu
ou na Terra que não esteja no serviço do Homem. É seu desejo explícito que o
Universo, esta grande fábrica com diversas atividades continue funcionando
suave e graciosamente tal qual o homem, o prêmio da criação, faça o melhor e
mais produtivo uso de todos os seus meios e recursos, de tudo o que foi
produzido para ele, tanto na Terra como no alto firmamento. Ele deve usá-los de
tal modo que ele e os companheiros colham primorosos prêmios deles e nunca
devem, intencionalmente ou não, realizar qualquer dano à criação de Deus. A
Shari’ah destaca-se principalmente pela fusão jurídico-espiritual, uma vez que
o espiritual e as relações sociais mundanas se correlacionam de forma a não
causar atritos nem desarmonia entre ambos, pois a lei regula tanto os aspectos
referentes ao culto e a adoração bem como as relações inter-humanas, ou seja, o
direito civil, penal, comercial, etc. O objetivo da Shariah é orientar o ser
humano em todos os campos de sua vida, mantendo-o no melhor caminho e dar-lhe
meios de realizar aquilo que tem necessidade na busca de sua felicidade, dentro
dos limites fundamentais de respeito e moral para consigo e para com a
sociedade que o cerca, trazendo desta forma benefícios em proveito geral da
sociedade. Por outro lado, o conhecimento do homem é limitado, todos os homens,
em todas as épocas, não sabem por si próprios, o que é bom e o que é mau, o que
é benefício e o que lhes é prejudicial. As fontes do conhecimento humano são
também limitadas para lhes fornecerem a completa verdade e o verdadeiro
conceito de justiça, uma vez que não é apto por si só para conceitua-la, por
esta razão Deus revelou a Lei que é o verdadeiro e completo código de vida para
toda a humanidade, poupando o ser humano dos riscos da provação e do erro
mediante a criação de suas leis falhas. O propósito supremo da Shariah é
edificar a vida humana com base nas virtudes e disciplinar o ser humano
afastando-o da depravação e dos vícios que vão contra sua própria natureza e
que o arruínam bem com à sociedade. O conceito de Justiça e Opressão na Shariah
não se modificam conforme o passar do tempo, é eterna e imutável e estão
estabelecidas de modo que estejam claramente identificados e estabelecidos, não
podendo nenhum homem modifica-los a seu bel-prazer, diferentemente dos sistemas
jurídicos ocidentais, principalmente por não ter sido ele e sim seu Criador
quem os conceituou. Portanto, na Shariah não há o que se falar em “leis
desatualizadas” ou “ultrapassadas”, uma vez que, quem ditou tais leis foi Deus.
Aquele que conhece o presente e o futuro. Ocorre, muitas vezes, que o ser
humano decai em sua conduta, com relação aos princípios morais básicos e
considere isso como “avanço” ou “modernização” ao invés de considera-lo como
decadência e depravação, e para “legalizar” tal feito quer modificar o conceito
de moral e de justiça para favorecer seus interesses, na maioria das vezes, em
detrimento do direito alheio, e é isso geralmente o que ocorre no sistema
jurídico ocidental. Já com relação à Shariah, independentemente da modificação
da conduta do ser humano com o passar do tempo, os conceitos de moral e justiça
continuam intactos, tendo o ser humano que se adaptar a eles e não eles ao ser
humano. Tal característica é fundamental para se compreender a Shariah e seus
objetivos. Além disso, a Shariah modela a sociedade de tal modo que o bem, a
virtude e a verdade possam se desenvolver livremente, em todas as esferas da
atividade humana, e dá livre ação às forças do bem em todas as direções,
enquanto afasta todos os obstáculos do caminho da virtude, ao mesmo tempo que
tenta eliminar os males do seu esquema social, proibindo o vício, removendo as
causas de seu aparecimento e desenvolvimento, bloqueando os canais que lhe dão
entrada na sociedade e adotando medidas preventivas para controla-los. Dentre
os objetivos principais da Shariah com relação à vida da sociedade em geral que
estão em ordem de prioridade temos: I. Garantia de suas necessidades vitais.
II. Satisfação de suas exigências. III. Melhoria, na qualidade de vida. As
necessidades vitais que a Shariah se preocupa em proteger são aquelas das quais
o homem depende, qualquer uma que seja ameaçada acarretará a corrupção, a
desordem e a injustiça na vida coletiva. Estas necessidades vitais, em ordem de
importância, são cinco: 1 – a religião ou sistema natural de crenças e modo de
vida islâmico. 2 – a vida do ser humano individual e das espécies humanas. 3 –
a mente. 4 – a honra e a castidade do indivíduo. 5 – a fortuna ou propriedade.
A proteção de cada um destes itens é necessária para a prosperidade dos
indivíduos e da sociedade. A religião é a totalidade de crenças, práticas e
leis pelas quais o Islam regulamenta a relação entre o homem e seu Criador e
entre o homem e o homem. Para preservar a religião é preciosos que ele esteja livre
do desvio e do erro e que as pessoas sejam convidadas a aceita-lo e a viverem
de acordo, defendendo-o das forças hostis. A preservação da vida significa a
adoção de medidas para preservar as espécies humanas da melhor forma possível,
e isto inclui leis relativas ao casamento e a reprodução. E também inclui a
satisfação das necessidades vitais de comida, bebida, vestimenta e segurança.
Isso também inclui leis relativas à proibição do suicídio e do aborto (a não
ser que a vida da mãe esteja em perigo) e a necessidade de retaliação justa
contra aquele que comete assassinato. A proibição da Shariah protegem a honra e
a castidade e pune as relações sexuais fora do casamento e o falso testemunho
contra as pessoas que são castas (relativo a virgindade). Com relação às
exigências, está no âmbito das leis da Shariah elaborar leis que eliminam ou
reduzem a dificuldade na vida das pessoas. Por exemplo, se uma pessoa estiver
doente ou viajando no mês de Ramadan, não se exige dela que faça o jejum. Nas
transações comerciais, a Shariah permite uma série de contratos e transações
comerciais. Ela permite os costumes regionais no atendimento das necessidades
locais, desde que não sejam proibidos. Permite o divórcio em caso de
necessidade. Tais permissões foram sancionadas em versículos do Alcorão Sagrado
capítulo 22 versículo 78 “E não vos impôs dificuldade alguma na religião”; e no
capítulo 2 e versículo 185 “Deus vos deseja a comodidade e não a dificuldade”.
E também a Shariah se preocupa com relação às leis que se referem à melhoria da
qualidade da vida humana, da moral e conduta, e do embelezamento das condições
sob as quais a vida é vivida. Isto inclui leis referentes à higiene do corpo,
roupas e meio ambiente, a cobertura das partes privadas, o método de livrar-se
de impurezas, a prática de atos voluntários de adoração, tais como o jejum e
caridade, etc. Por fim, vale salientar a afirmação de Abul A’la Maududi
(1903-1979), em seu livro Leis e Constituição Islâmica: “Seguir este código de
comportamento é a mais verdadeira e coerente atitude da humanidade. Ele
estabelece os padrões para um comportamento humano disciplinado, tanto
individual como coletivo, assim como para as maiores ou menores tarefas que nos
incumbirem. Uma vez aceita a filosofia de vida anunciada pelo “Livro” e pelo
“Mensageiro Muhammad” como encarnação da realidade, não há nenhuma justificação
para não se obedecer a Direção revelada por Deus, na esfera de opção pessoal
também. Esta é, por toda uma série de razões, a abordagem mais racional que o
homem possa seguir. Primeiro, as faculdades e os órgãos através dos quais
funciona o nosso livre arbítrio são
dádivas de Deus e não o resultado dos nossos próprios esforços. Segundo, até a
liberdade de opção nos tem sido concedida por Deus, e não fomos nós que a ganhamos
mediante o esforço pessoal. Terceiro, todas as coisas em que funciona o nosso
livre arbítrio não são apenas propriedade, mas também criação de Deus. Quarto,
o território em que exercemos a nossa independência e liberdade é também
território de Deus. Quinto, a harmonização da vida humana com o Universo impõe
a necessidade da existência de um Soberano e uma Fonte de Direito comum às duas
esferas da atividade humana – a voluntária e a involuntária, ou noutras
palavras, a moral e a física. A separação destas duas esferas em compartimentos
impermeáveis, leva ao aparecimento dum conflito irreconciliável que acaba por
provocar desordem e desastres sem fim não apenas ao indivíduo, mas também à
noção e à humanidade no seu conjunto. CARACTERÍSTICAS E PRINCÍPIOS GERAIS DA
SHARIAH. A SHARIAH possui características e princípios gerais que são
intrínsecos à sua natureza e que são indispensáveis em todo o direito islâmico.
Tais princípios precisam ser compreendidos de forma correta para que se possa
entender todos os demais princípios e Leis da Shariah. Dentre estas
características podemos enumerar as seguintes principais: I. Universalismo – O
Direito Islâmico está caracterizado por sua universalidade, uma vez que se
destina à toda a humanidade. Isso se explica pelo fato que o Legislador nesse
caso é o Senhor e Criador da humanidade, independentemente da nacionalidade,
cor, sexo, posição social, etc. Assim, o Direito Islâmico sustenta um ponto de
vista internacional na sua perspectiva dos problemas humanos e não admite as
barreiras, as distinções e as disputas nacionais, trazendo uma legislação
Universal e equânime. Aqui prevalece o princípio da igualdade da humanidade,
que estabelece que todos os seres humanos são iguais em sua essência e criação,
não havendo distinções entre as classes, entre as nacionalidade, entre as raças
ou cores, destacando-se apenas, nesse contexto, o mais virtuoso e o mais
obediente às Leis de Deus. II. Imutabilidade – A Sharia é eterna e permanente
quanto suas leis e princípios, pois é um sistema de legislação para toda era e
tempo, uma vez que suas injunções foram cunhadas de tal maneira que não são
afetadas pelo lapso de tempo, não se tornam absoltas nem seus princípios gerais
e teorias básicas necessitam de mudança, reformas ou substituições. Isso se
deve pelo fato de que seus princípios têm uma elasticidade e generalidade que
permite trazer para sua jurisdição até mesmos os novos casos da atualidade.
III. Unidade do Espírito e da Matéria – Uma característica peculiar do Direito
Islâmico é o fato de não admitir a divisão da vida entre o espiritual e o
material, considerando a vida do indivíduo como um todo, com o devido
equilíbrio. O Islam não exige que o homem abandone as coisas materiais regendo
sua vida somente através do lado espiritual, nem tampouco é materialista
esquecendo-se do lado espiritual. Assim o Direito Islâmico visa estabelecer
esses dois aspectos da vida, respondendo tanto às necessidades seculares quanto
as espirituais do ser humano, ordenando-lhe purificar a alma e reformar a vida
material tanto individual como coletiva, estabelecendo assim o direito e a
justiça no lugar da injustiça e a virtude no lugar do vício. Assim, a Shariah
causa um impacto maior na consciência do
ser humano quanto ao acato de suas normas, pois une o fato de que o crime além
de ser um fato típico sujeito a punições é um pecado e uma desobediência a
Deus. IV. INDIVISIBILIDADE – A lei islâmica é indivisível no sentido de que não
se pode adotar alguns princípios e deixar de lado outros. As leis islâmicas devem
ser aplicadas como um todo, sendo proibido o fato de se adotar determinadas
leis e anular outras ou modifica-las. Não pode ser aplicada só em partes
isoladas sem a devida relação com o conjunto. Uma vez aplicada a Shariah, ela
deve ser considerada no todo, ou seja, ela só pode funcionar de maneira
permanente e eficaz se todo o sistema de vida se guiar por ela , e só por ela.
V. Equilíbrio entre o Individualismo e o Coletivismo – A Shariah não enfatiza o
direito individual em detrimento do social, mas estabelece um equilíbrio entre
os dois e destina a cada um o que lhe é de direito. Reconhece a personalidade
individual do indivíduo garantindo-lhe direitos e deveres. Assegurando o fato
de que cada indivíduo é responsável pelos seus atos diante da lei, isso deriva
de um princípio básico do Islam que estabelece que ninguém será
responsabilizado por culpa alheia, exceto se induziu o indivíduo a infringir a
lei. Por outro lado, a Shariah estabelece e incentiva o sentimento da
responsabilidade social. O indivíduo é responsável pelo bem-estar comum e a
prosperidade da sociedade, sendo a responsabilidade não só perante a sociedade,
mas também perante Deus, pois se trata de um princípio religioso ao mesmo
tempo. Dentre os princípios básicos da estrutura social da Shariah podemos
destacar: o amor sincero pelos semelhantes, a ajuda e conforto aos
necessitados, ajuda às vítimas da injustiça, os sentimentos autênticos de
fraternidade e solidariedade social, o respeito ao direito alheio quanto à sua
vida, propriedade e honra, respeito devido aos idosos, visitas aos doentes, a
ajuda mútua na justiça e na virtude e a erradicação da imoralidade e injustiça,
etc. VI. MORALIDADE – A Shariah prescreve um modelo de comportamento moral que
é permanente e universal e válido em todos os tempos e circunstâncias. Este
código moral abrange os menores detalhes da vida doméstica, bem como os
aspectos tão vastos do comportamento nacional e internacional., guiando o ser
humano em todas as fases da vida. Algo a ser ressaltado é o fato de que o
sistema islâmico encara o fato de que a lei moral não depende somente de
pressões externas de punição do Estado no caso de violação das leis morais, mas
baseia-se principalmente no instinto do bem que é inerente a cada pessoa e que
deriva diretamente da fé em Deus e no Dia do Juízo Final. Antes de elaborar
quaisquer mandamentos morais, a Shariah tenta implantar firmemente no coração
do homem a convicção de que está a tratar com Deus, que o vê em qualquer
momento e local, e que mesmo que engane a todos e se oculte de todos, jamais
poderá enganar a Deus ou ocultar-se Dele, e principalmente no princípio de que
poderá o homem fazer o que bem entender nessa breve estadia nessa vida, mas ao
fim de contas este morrerá e terá de se apresentar perante o Tribunal Divino,
onde nenhuma defesa, intercessão, recomendação, informação falsa, engano ou
fraude lhe poderão valer, e onde seu futuro será decidido com total
imparcialidade e perfeita justiça. Neste mundo pode haver ou não haver polícia,
tribunal ou prisão para impor o respeito desses mandamentos e regulamentações
morais, mas esta crença fortemente enraizada no coração, é a verdadeira força
que está por detrás da lei moral do Islam e contribui para ela ser respeitada.
Universidade da Região da Campanha – Campus Universitário do Curso de Direito –
Bagé – RS – Brasil . Abraço. Davi.
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