segunda-feira, 28 de maio de 2018

I. SOBRE TORNAR-SE TOTALMENTE HUMANO


Teosofia. Artigo da Revista Theosophy in Australian. Texto de Linda Oliveira. I. SOBRE TORNAR-SE TOTALMENTE HUMANO. O ser humano é uma das inumeráveis expressões da Natureza – é único, dotado de mente, um ser ainda enigmático com potencial de elevação ainda por ser descoberto. O que implica ser TOTALMENTE HUMANO? Para o mundo, SER HUMANO pode ser diferente da visão de HUMANIDADE retratada pela tradição da Sabedoria Perene. Para muitos, SER HUMANO pode implicar certo domínio sobre a Terra, levando à competição, agressão e exploração, misturada com uma pequena porção de bondade. Alguns podem pensar que, neste momento, a HUMANIDADE encontra-se em seu pináculo. Mas Emily Sellon (1830-1888), escritora teosófica, chegou a descrever a HUMANIDADE como incipiente, sugerindo que a maior parte de nossa evolução, ou talvez a fase mais significativa de nossa evolução, está ainda por vir. Seja lá como for, parece que temos uma longa jornada à nossa frente. Nesse contexto, é importante lembrar um dos mais conhecidos comentários de um dos Mestres espirituais das Cartas dos Mahatmas para Alfred Percy Sinnett (1840-1921). “(...) É a HUMANIDADE que é a grande Órfã, a única deserdada sobre a Terra, meu amigo” – Carta dos Mahatmas nº 15”. Quais são as características de um órfão? Se a HUMANIDADE é órfã, então ela está separada de seus país, de sua linhagem. Num sentido mais amplo, podemos entender que a HUMANIDADE está separada de suas raízes, de sua linhagem ou herança espiritual. Nesse sentido, podemos dizer que muitos humanos parecem estar distantes de suas raízes. Se isso for verdade, então, em essência, somos desprovidos daquele princípio capaz de nos impulsionar na direção do ar refinado de Atma, do Self, da consciência pura, de nossa essência. Pois é a partir dela, da essência de nosso ser, que todos os princípios humanos emergem e finalmente retornam. Como Shirley Nicholson (1928-  ): “Partimos de nossa casa no Atma numa viagem para adquirir experiência no mundo, retornando a ela enriquecidos pela jornada”. Portanto tornar-se totalmente humano envolve uma jornada – uma peregrinação de proporção monumental. Qual é a essência desta jornada? Podemos descrevê-la como o desdobramento da sabedoria interior em resultado da experiência mundana, o que certamente não é algo que pode ser realizado durante o curso de uma única vida. Será que estamos vivos para a viagem? Como podemos criar um ponto de acesso à essência de nosso ser, que ao mesmo tempo é o início e o fim de nossa jornada – e podemos até dizer, nosso direito de nascimento espiritual? Vamos abordar aqui: 1. O ser HUMANO como um sistema vivo. 2. Como criar uma abertura para que a renovação aconteça. 3. Alguns pensamentos especulativos sobre o que o processo de se TORNAR TOTALMENTE HUMANO pode significar. O SER HUMANO COMO UM SISTEMA VIVO. Nosso Presidente Internacional (da Sociedade Teosófica) usou o termo “regeneração HUMANA” como a essência de todo trabalho teosófico. Regenerar significa “insuflar vida nova” em algo. Talvez seja isso que aconteça durante os últimos estágios da EVOLUÇÃO HUMANA. O que é velho precisa no final das contas tornar-se novo. Portanto, ser vivo, verdadeiramente vivo, é uma parte bem próxima do processo de regeneração. Rohit Mehta (1908-  ) mencionou que os sistemas vivos são fontes de regeneração. Ele observou que, de acordo com o princípio da entropia na ciência física, tudo no Universo está firmemente se deteriorando na direção do equilíbrio termodinâmico, ou da morte e extinção. Esse desgaste envolve uma irreversível perda de energia. No entanto, ele cita o recentemente falecido Llya Prigogine (1917-2013) que, segundo ele, nos deu esperança. Prigogine disse a ordem e a organização podem surgir “espontaneamente” a partir da desordem e do caos, por meio do processo de “auto-organização”. Por exemplo, ele comenta que o corpo HUMANO é capaz de curar uma ferida (pelo menos uma ferida que não seja grande demais). Em outras palavras, existe um livre intercâmbio entre o sistema e o meio ambiente, assim como uma determinada flexibilidade. Um sistema vivo pode se desviar quando necessário, mas logo recupera seu estado original. Além disso, ele é vulnerável, extremamente frágil na verdade, parecendo fácil de quebrar, mas prevenindo rupturas pela sua força inerente. Um sistema vivo recupera sua energia perdida e, na verdade, incorpora o segredo da regeneração. O CORPO HUMANO possui uma habilidade de regeneração física excepcional, de várias maneiras – desde que esteja devidamente mantido e alimentado por seu meio ambiente. Quanto à regeneração ESPIRITUAL HUMANA, talvez seja possível fazer um paralelo como essa descrição de um sistema vivo, que requer um tipo diferente de manutenção. Quais seriam os requisitos de um sistema VIVO HUMANO que contém o potencial de renovação espiritual? INTERCÂMBIO ABERTO/LIVRE: Fomos informados que um sistema vivo envolve um livre intercâmbio com o meio ambiente. Considerem por um momento que a regeneração espiritual requer uma mente (que é o ponto essencial de um sistema de VIDA HUMANO) que não seja fechada ao seu ambiente e que permita um livre fluxo de ideias e percepções – temperança, esperança, por meio de viveka ou discernimento espiritual. Diz-se que a capacidade despertada de manas e sua concomitante autoconsciência nos tornam singularmente humanos. Uma mente viva pode desenvolver grande capacidade. De alguma forma temos que ser capazes de apreender o mundo dentro de nós. Por fim, para usar a terminologia de Helena P. Blavatsky, a mente humana pode “abranger o Universo”. FLEXIBILIDADE: Rohit Mehta disse que um sistema vivo pode ser desviado quando necessário, mas rapidamente recupera seu estado original. Será que é possível tornar-se inerentemente flexível? Esta é uma reminiscência daquela bela afirmação em A Voz do Silêncio que diz que as hastes dos germes sagrados que florescem e se desenvolvem invisíveis na alma do discípulo se fortalecem a cada nova tentativa, vergam como junco, mas jamais se quebram. Quando nos tornamos rígidos, a vida não flui, criamos barreiras para a vida, podendo nos tornar quebradiços e sujeitos à ruptura, incapazes de lidar com as inúmeras mudanças da vida que parecem prosseguir quase exponencialmente nas últimas décadas. VULNERABILIDADE E FORÇA: De acordo com Rohit Mehta, um sistema vivo é vulnerável, até mesmo frágil, embora inerentemente forte. Certamente temos aqui um paradoxo, que também é a linguagem do espírito. Portanto, por analogia, os seres humanos necessitam de duas coisas: precisamos de força para sustentar a inevitável transmutação da personalidade de forma a permitir que o ser interior possa emergir. Sugere-se que esta força seja adquirida por experiência e desafios da vida. Mas também precisamos de uma abertura do coração, para nos tornarmos vulneráveis e sermos capazes de temperar esta força com compaixão e sensibilidade. Assim, atributos como uma mente aberta, flexibilidade, força e vulnerabilidade fornecem um ambiente propício à renovação. Não se trata apenas de fantasia poética. Um sinônimo de “regenerar” é “encorajar”. Portanto, o ser humano regenerado é uma pessoa encorajada, em quem a natureza espiritual  está desperta, um sistema de vida dinâmico de condição elevada. Nesse sentido, talvez se possa afirmar que a maioria dos seres humanos ainda não seja um sistema vivo completo. DICAS PARA CRIAR OPORTUNIDADES DE RENOVAÇÃO. DESSCONTENTAMENTO. O termo “descontentamento Divino” será familiar a muitas pessoas. De alguma maneira, o descontentamento parece ser um elemento importante na Jornada Espiritual Humana. Mas existem diferentes tipos de descontentamento. Frequentemente, o descontentamento pode resultar em atitude destrutiva. No entanto, como Rohit Mehta indicou, a regeneração pode acontecer somente em indivíduos incendiados pelo descontentamento construtivo – e não naqueles bem adaptados ao ambiente reinante. Portanto, a complacência ou satisfação com a própria vida provavelmente não irá levar a mudanças fundamentais. Fica claro também que a natureza deste descontentamento deve ser muito mais construtiva do que destrutiva. A Jornada Espiritual exige uma orientação distante das coisas mundanas enquanto se permanece e se atua no mundo. Alguns podem dar o passo extremo e optar pela vida monástica, mas para as pessoas mais espiritualmente perceptivas o truque é ser capaz de vier uma vida cheia de simplicidade e discernimento inserido no ruído da cultura mundana. Talvez N. Sri Ram (1889-1973) tenha feito eco desta necessidade pelo descontentamento quando escreveu: “aquilo que é estático não pode criar”. Mais: “se estivermos repletos de contentamento, a renovação não é possível”. Escreveu: “A Teosofia deveria ser uma força criativa para nós, uma sabedoria que nos cria novamente. A transformação é iniciada naqueles que são capazes de receber sua chama em seus corações. Presentemente, somos veículos de argila, opacos, ausentes de força e brilho, um meio não condutor”. O que é opaco não transmite luz, não é capaz de transferir luz. Portanto, se formos um tipo de argila ou algo opaco, a luz dos reinos mais sutis não vai ser capaz de penetrar em nossa consciência, muito menos ser transmitida por nós. ESFORÇO: Parece que criar espaço para uma abertura ocorre gradualmente, num primeiro momento, talvez alimentada por este nível de descontentamento construtivo com o mundo ou nossas circunstâncias. Mas esta abertura ou ponte se tornará mais ampla quando o processo de descontentamento se tornar cada vez mais consciente, temperado pelo altruísmo. Parece também que a vida não fica nem um pouco mais fácil neste ponto! Como madame Blavatsky (1831-1899) escreveu sobre o assunto do progresso espiritual. Desde os Vedas e os Upanishads até a recente publicação de Luz no Caminho de Mabel Collins (1851-1927), pesquisado nas bíblias de todas as raças e cultos, foi encontrado somente um único caminho – difícil, doloroso, perturbador, pelo qual o homem pode chegar ao verdadeiro insight espiritual. Sempre disseram que o verdadeiro adepto, o homem desenvolvido, não pode ser construído, deve vir a ser. O processo demanda, portanto, um crescimento por meio da evolução, e deve necessariamente envolver certa quantidade de dor. Por isso, o processo possui seus desafios dolorosos, especialmente durante as últimas etapas da jornada humana. Além disso, claro está que não fomos feitos completamente humanos por algum agente exterior. Trata-se de um processo consciente de cada indivíduo. A ajuda é disponibilizada até um determinado ponto, proveniente dos ensinamentos e mestres espirituais. Entretanto, a própria vida acaba por fornecer as condições para a manifestação da abertura ou ponte, de forma a dar continuidade à evolução espiritual humana. Revista Teosófica – As Coisas Transitórias. Abraço. Davi

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