Islamismo.
Texto de Zuhra Mohd Hanini. NOÇÃO DE DIREITO ISLÂMICO. I. PROCEDIMENTOS
JUDICIAIS. FUNÇÃO DOS JUÍZES. A FUNÇÃO DESEMPENHADA POR UM JUÍZ é uma nobre
tarefa para quem reúne os requisitos necessários e, além disso, se mantém firme
para não ceder ante a injustiça e a opressão. Essa função é virtuosa uma vez
que implica em reconciliar as partes enfrentadas, fazer valer os direitos dos
oprimidos, julgar a opressão, ordenar o correto, impedir e punir o incorreto,
aplicar as penas e dar a cada um o que lhe corresponde por direito. Esta foi
uma das funções dos Profetas, e por isso trata-se de uma função abençoada e
virtuosa. Deus estabeleceu uma grande recompensa para o juiz que se esforçar
por encontrar a verdade, aplicando seu conhecimento e sua sã crítica racional,
mesmo que sua sentença não tenha sido a mais acertada. Deus recompensa duas
vezes aquele que sentenciar com justiça encontrando a verdade: uma recompensa
pela sua dedicação à causa e a outra por ter encontrado a verdade. E o
recompensa uma vez quando mesmo se dedicando sua sentença não tenha chegado à
verdade. Disse o Profeta Muhamad: “Se um juiz se esforça para ditar uma
sentença justa e acerta a verdade, Deus o premiará com duas recompensas e se
esforçar e não acertar, será premiado com uma só”. E disse: “ Os justos se
encontram, perante Deus, sobre estratos de luz. São os imparciais em suas
sentenças, mesmo que se trate de suas famílias, bem como os fiéis às
responsabilidades de que foram incumbidos. Disse Deus no Alcorão Sagrado em 38,26
“Julga, pois entre os humanos com equidade e não te entregues à concupiscência,
para que não te desvies da Senda de Deus”. Em 16,90 “Deus ordena a justiça, a
caridade, o auxílio aos parentes, e veda a obscenidade, o ilícito e iniquidade.
Ele vos exorta a que mediteis”. A tarefa que desempenham os juízes trata-se, ao
mesmo tempo, uma função virtuosa e de risco e comprometimento, pois consiste
muitas vezes em julgar sobre a vida, bens, e demais direitos das pessoas. O
juiz deve se esforçar para chegar a verdade baseando suas decisões em
fundamentos válidos, compatíveis com o Alcorão e a Sunnah. Disse o Profeta
Muhamad apud Tuwaijri “ Existem três classes de juízes, dos quais duas delas
serão castigados com o inferno e só uma delas será recompensada com o paraíso.
O juiz que tem sabedoria e conhece a verdade e resolva de acordo com ela será
recompensado com o Paraíso. Os que julgam entre as pessoas com ignorância e
aqueles que oprimem intencionalmente em suas sentenças, serão moradores do
inferno”. O juiz deverá ser uma pessoa com um temperamento forte, mas não
agressivo, para que suas posições sejam firmes. Ao mesmo tempo deve ter um
trato correto e cortês com as partes, mas sem mostrar debilidade, para que as
vítimas não sintam temor ao estar perante ele. Além disso deverá ser tolerante,
capaz de suportar a agressão verbal das partes sem ser tomado pela impaciência
e cólera, e deverá proceder com inteligência e astúcia para não ser enganado
pelas partes. Deverá ser leal a sua investidura, sincero em sua função,
honesto, conhecido por sua boa reputação, inatacável conduta e por possuir bens
ganhados dignamente, deve ser conhecedor da legislação e jurisprudência, e
sobretudo temer a Deus e não a crítica das pessoas, e procurar somente a
complacência de Deus em suas decisões. É recomendável ao juiz que este se reúna
com os jurisconsultos e sábios do Islam para consulta-los em casos em que
encontrar alguma dificuldade. A atitude do Juiz com as partes deve prezar por
total equidade com as partes, prescrevendo audiência onde as partes deverão
exercer seus direitos de autodefesa, e colher depoimentos para julgar entre
este conforme o que Deus revelou. O Juiz tem a obrigação de ouvir as partes
envolvidas e não poderá julgar baseado no conhecimento prévio que tenha dos fatos,
e não ser que o caso tenha tomado um estado público onde tanto ele quanto
muitas outras pessoas tenham uma mesma versão dos fatos, neste caso poderá
resolver de acordo com esse conhecimento desde que não exista dúvidas quanto a
isso. Deverá o Juiz mediar entre as partes enfrentadas na busca da
reconciliação das mesmas, disse Deus, Louvado seja, no Alcorão Sagrado em 49,10
“Sabei que os fiéis são irmãos uns dos outros; reconciliai, pois, os vossos
irmãos, e temei a Deus, para vos mostrar misericórdia”. É recomendável ao Juiz
exortar as partes à reflexão antes de julgar. O Profeta Muhamad costumava dizer
às partes antes de julgar: “Eu sou somente um homem para o qual vocês
apresentam vossas disputas. Talvez alguns de vós sejais mais eloquentes que
outros nas declarações, e por certo que julgo segundo o que concluo após
escutar as partes. Se eu julgar em favor de quem em verdade é o culpado, que
não aceite o meu juízo, pois estarei desta forma entregando-lhe uma parte do
fogo do inferno. Um juiz será incompetente para julgar causas, quando uma das
partes esteja relacionada a ele através do parentesco ou outro vínculo que, de
acordo com a lei, impeça a declaração testemunhal de um a favor do outro como,
por exemplo, seus filhos e esposa. Quanto ao julgamento o juiz tem a obrigação
de julgar conforme o que Deus revelou, ou seja, através do Alcorão Sagrado e a
Sunnah do Profeta Muhamad. Qualquer que seja a situação, este não poderá
recorrer à outra legislação para fundamentar sua sentença. A Shariah é a fonte
para a solução de todos os conflitos e por este motivo o juiz deverá sempre
recorrer a ela ao emitir um juízo. O Islam compreende uma legislação completa,
autossuficiente e reparadora. Disse Deus no Alcorão Sagrado em 5,44 “Não
temais, pois, os homens, e temei a Mim, e não negocieis as minhas leis a vil
preço. Aqueles que não julgarem, conforme o que Deus tem revelado, serão
incrédulos”. Também em 5,49 “Incitamos-te a que julgues entre eles, conforme o
que Deus revelou, e não sigas os seus caprichos e guarda-te de quem te desvie
de algo concernente ao que Deus te revelou. Se te refutarem fica sabendo que
Deus os castigará por seus pecados, porque muitos homens são depravados.
Anseiam, acaso, o juízo do tempo da insipiência? Quem melhor juiz do que Deus,
para os persuadidos? DEMANDAS E PROVAS. A DEMANDA É QUANDO UMA PESSOA expressa
sua pretensão invocando um direito vulnerado por outro e que ele crê lhe
corresponder. O demandante é quem reclama um direito, assumindo a iniciativa de
um juízo com a exposição da demanda. O demandado é aquele a quem demandante
reclama um direito. As partes constitutivas de uma demanda são: demandante,
demandado e o objeto reclamado. Para que uma demanda seja válida deverá ser
escrita e conter um relato detalhado dos fatos, já que logo se seguirá um
juízo, portanto deverá haver uma petição clara do que se reclama. A
interposição da demanda deverá ser na jurisdição que corresponda ao domicílio
do demandado, respeitando o princípio de inocência. AS PROVAS TRATAM-SE de um
conjunto de atuações que se encaminham a demonstrar a verdade ou a falsidade
dos fatos, como a prova testemunhal, o juramento e os indícios, entre outros.
AS PROVAS QUE CONFIRMAM contundentemente uma demanda são: A CONFISSÃO DO FATO:
A confissão consiste no reconhecimento voluntário que uma pessoa capaz ante a
lei faz contra ela mesma da veracidade de um fato. Esta será válida sempre que
quem a realizar seja capaz perante a lei, goze de suas faculdades mentais
plenas e não haja sob pressão. A confissão é a prova mais importante
considerada pela Shariah. É lícito confessar um delito de instância privada que
seja penalizado como a fornicação e o adultério, por exemplo. Mas o recomendado
pela Shariah é que não se faça público este fato e se arrepender perante Deus
do pecado. Deus disse no Alcorão Sagrado em 39,53 “Ó servos meus, que se
excederam contra si próprios, não desespereis da misericórdia de Deus,
certamente, Ele perdoa todos os pecados, porque Ele é o Indulgente, o
Misericordiosíssimo”. Em 24,31 “Ó fiéis, voltai-vos todos, arrependidos, a
Deus, a fim de que vos salveis”. Se uma pessoa confessa um fato relacionado com
a violação dos direitos de outras pessoas, não poderá se retratar de sua
confissão. Em troca, se tratar-se de delitos de instância privada penalizados por
Deus, como por exemplo, a fornicação, o consumo de embriagantes, poderá se
retratar-se da confissão, pois as penas previstas para estes delitos não
poderão ser aplicadas ante a mínima existência de suspeita, como a que geraria
a retratação. A PROVA TESTEMUNHAL: O TESTEMUNHO CONSITE NA DECLARAÇÃO que uma
pessoa faz do que conhece conforme seu leal saber e entender. Quando uma pessoa
é citada para atuar como testemunha pela autoridade competente, se encontrar-se
apta física e psicologicamente para testemunhar e isso não implicar em perigo à
sua vida ou à sua família, esta deverá acatar a ordem. Deus, Louvado seja,
disse no Alcorão Sagrado em 2, 293 “Não vos negueis a prestar testemunho;
saiba, pois, quem o negar, que seu coração é nocivo. Deus sabe o que fazeis”.
Quem presenciar um delito de instância privada penalizado por Deus, como a
fornicação, pode ou não testemunhar, sendo que o melhor é evitar testemunhar,
devido à obrigação moral de não divulgar pecados alheios. Mas, é recomendável
dar o testemunho quando o delito é cometido abertamente e em público, neste
caso o testemunho se realiza com o fim de terminar com a corrupção e a
obscenidade na sociedade. Só é lícito dar testemunho de fatos sobre os quais se
tem um conhecimento real. Para isso a testemunha deve haver visto ou ouvido o
sucedido, ou ser de público conhecimento, como por exemplo, o casamento ou a
morte de uma pessoa. Dar o falso testemunho trata-se de um gravíssimo pecado,
pois dá lugar à violação de direitos e a confusão dos juízes, e dificultam o
caminho até a verdade real e aplicação da lei de Deus. Os requisitos que devem
reunir uma testemunha para que sua declaração seja válida: QUE SEJA CAPAZ ANTE
A LEI e goze de suas faculdades mentais plenas. Não é aceito o testemunho de
crianças, exceto nos fatos em que estão envolvidos só menores. QUE POSSA FALAR.
Não se aceita o testemunho do mudo, exceto se este puder dar seu testemunho por
escrito. QUE SEJA MUÇULMANO, isso se aplica em casos onde um muçulmano estiver
sendo julgado. Nas lides entre não muçulmanos será aceito o testemunho de um
não muçulmano. QUE SE LEMBRE PERFEITAMENTE DO FATO que estiver testemunhando.
Não se aceita o testemunho de quem não lembrar com certeza. QUE SEJA HONESTO, e
para isso deve-se ter em conta as seguintes condições: A RELIGIOSA, que
consiste em cumprir com os preceitos obrigatórios do Islam e se afastar dos
atos reprováveis e proibitivos. A BOA REPUTAÇÃO, que consiste em realizar toda
ação que o prestigie como a generosidade, o bom comportamento, e se afastar de
tudo que comprometa sua honra como os jogos de azar, a magia e os vícios. QUE
SE ENCONTRE livre de toda acusação ou suspeita. As causas que anulam um
testemunho são: QUE EXISTA UM PARENTESCO em linha reta entre as partes e a
testemunha. Com relação aos demais parentes é aceito o testemunho. QUE EXISTA
UM INTERESSE MATRIMONIAL. Não se aceita o testemunho entre cônjuges. QUE EXISTE
UM INTERESSE evidente por parte da testemunha em obter algum benefício com seu
testemunho, e neste caso não é aceito, assim como aquele que testemunha a favor
de seu sócio. QUE A TESTEMUNHA esteja atuando sob pressão ou medo. QUE EXISTA
INIMIZADE minifesta entre uma das partes
e a testemunha. QUE HAJA REGISTRADO precedentes de haver sido julgado por
emitir um falso testemunho. QUE EXISTA UM NACIONALISMO manifesto ou outro
sentimento de fanatismo ou discriminação por parte da testemunha contra uma das
partes. QUE A TESTEMUNHA seja empregado da parte a beneficiar com seu
testemunho. O JURAMENTO POR DEUS: Consiste em jurar mencionando o nome de Deus.
Na Shariah é permitido recorrer ao juramento por Deus em toda a demanda por
violação ou conflito dos direitos das pessoas, e neste caso, o mesmo deve ser
solicitado formalmente como um instrumento probatório. Com relação aos delitos
de instância privada e não cumprimento das obrigações religiosas não se pode
exigir que a parte a realizar o juramento, já que o recomendado nesses casos é
mantê-los em reserva e só corresponderá fazer um chamado à reflexão e ao
arrependimento. Se o demandante não conta com provas para apresentar em juízo e
o demandado nega o acusado, então o juiz poderá pedir a este último que jure
por Deus que diz a verdade. Vale ressaltar que isso é próprio dos juízos por
interesses patrimoniais. O juramento faz concluir um juízo, mas isso não
significa que a posteriori não se possa provar a verdade real. O demandante é
quem tem a obrigação de apresentar as provas, enquanto que o demandado, ante a
falta de evidência é quem deve jurar por Deus quando nega a acusação que lhe é
feita. A evidência para isso está no Hadith onde o Profeta Muhamad disse: “As
provas devem ser apresentadas pelo demandante, enquanto que o juramento deve
ser realizado pelo demandado”. O juiz poderá considerar conveniente em alguns
casos solicitar o juramento do demandante e em outros do demandado, e sempre é
válido, pois toda a pessoa é inocente, salvo que se demonstre o contrário. E
quando não existem provas, o juramento por Deus é suficiente para presumir sua
inocência. Universidade da Região da Campanha. Campus Universitário do curso de
direito. Bagé – RS – Brasil. Abraço. Davi.
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