Qualitativamente,
cada uma das seis aflições mentais engendra um certo tipo de nascimento: o ódio
conduz a um reino infernal, a ganância a um reino de fantasmas famintos, a
estupidez a um reino animal, o apego desejoso a uma condição humana, a inveja
ao reino dos deuses invejosos, e o orgulho aos estados divinos.
Quantitativamente, estes diferentes estados resultam da acumulação de karma.
Então, muito karma negativo gera um reino infernal; um karma um
pouco menos negativo, o reino dos fantasmas famintos; um pouco menos que isso,
um reino animal. Geralmente, quando o karma positivo está misturado com
alguns aspectos negativos, nascemos em um dos três reinos superiores da
existência, de acordo com as respectivas forças destes karmas. O
Reino do Inferno. A mente dominada pela raiva e pelo ódio produz o karma
para a vida em um inferno (não está relacionado a danação eterna, ensinada no
cristianismo, onde é dito em Marcos 9:48 “Onde seu bicho não morre, e o fogo
nunca se apaga. Inferno aqui é um estado de consciência entorpecida, e
singularizada pelo extremo apego aos prazeres mundanos e ao materialismo
egoísta e descartável). O que sofre nesse estado infernal é a mente, nossa
mente. As aparências infernais, os seres que nos atacam ou nos matam, o
ambiente e todo o sofrimento que nos aflige nesse reino, são produções de nossa
própria mente condicionada pelo nosso karma. Nestes estados infernais,
somos atormentados inflexivelmente por um sofrimento inconcebível: somos mortos
e, em alguns reinos infernais, experienciamos ser mortos de novo e de novo;
somos torturados pelo calor e frio extremos. E não há liberdade, nem qualquer
possibilidade de nos dedicarmos à prática espiritual. O Reino dos
Fantasmas Famintos. Se nossas mentes caírem como pressas da ganância ou
cobiça, o karma que resulta é o nascimento como um fantasma faminto.
Neste estado, nunca podemos obter o que queremos, nem podemos desfrutar da
comida ou bebida que desejamos desesperadamente como fantasmas famintos. Sempre
estamos precisando e procurando algo, mas somos completamente incapazes de
satisfazer nossos desejos e sofremos de fome, de sede e de constantes
frustrações intensas. É também um estado produzido pela nossa própria mente e,
apesar de ser um pouco menos desfavorável que o reino infernal, ainda é um
estado miserável. O Reino Animal. A mente também pode cair sob a
influência da cegueira, da estagnação mental e da estupidez, o que causa o
nascimento como um animal. Há muitas espécies animais: animais selvagens,
animais domésticos e assim por diante. Todos eles experienciam diferentes
formas de sofrimento, tais como ser comido vivo, brigar uns com os outros, ou
ser subserviente e abusado. Todo sofrimento encontrado no reino animal também é
a produção da mente e a manifestação de karma resultante de ações
negativas anteriores. Estes três tipos de existência compõem os estados dos
reinos inferiores. Entre eles, o mais favorável é o reino animal. Mas mesmo
nesse estado, é muito difícil despertar o amor e a compaixão, e é impossível
praticar o Dharma. Em todos estes reinos inferiores, não há a
possibilidade de praticar o Dharma e de atingir a realização; a mente
está constantemente perturbada pela raiva, ódio, desejo e assim por diante.
Além disso, os seres dos reinos inferiores tendem a realizar mais ações
negativas que criam ainda mais karma doloroso. Deste modo, eles
perpetuam o condicionamento das vidas nos reinos inferiores que, além disso,
duram por um tempo extremamente longo. O Reino Humano. A condição
humana é a primeira das existências nos reinos superiores. Os humanos são
praticamente os únicos seres dotados com as condições necessárias para o
progresso espiritual, assim com as faculdades que permitem a prática e a
compreensão do Dharma. Porém, ser humano não garante o progresso
espiritual. O valor da vida humana é variável e apenas aqueles que obtiveram a
chamada "preciosa existência humana" podem praticar o Dharma;
eles são tão raros quanto estrelas durante o dia! Apesar desta ser uma condição
menos dolorosa que as existências nos reinos inferiores, a condição humana
ainda tem muitos tipos de sofrimento, sendo que os quatro tipos principais são
o nascimento, a doença, a velhice e a morte. Além destas quatro grandes fontes
de sofrimento, os humanos sofrem quando são separados daqueles que amam muito,
durante suas vidas ou na morte, ou quanto têm de lidar com pessoas com as quais
não querem lidar ou que são hostis diante deles. Os humanos sofrem ao perder
suas posses, ao não serem capazes de manter o que planejaram adquirir e ao não
serem capazes de obter o que querem. O Reino dos Deuses Invejosos.
O karma que é acima de tudo positivo, porém misturado com a inveja,
causa o nascimento no reino dos deuses invejosos. Este é um estado feliz,
dotado com muitos poderes e prazeres, mas por causa da força da inveja, há
constantes brigas e conflitos. Os deuses invejosos opõem-se aos deuses que são
seus superiores e brigam entre si mesmos. O Reino Divino. O karma
positivo combinado com pouquíssimo karma negativo resulta em um
renascimento nos estados divinos. Há diferentes níveis de existência divina. Os
primeiros são os estados divinos do reino do desejo, assim chamados porque a
mente nesses reinos ainda está sujeita aos desejos e ao apego. Estes deuses têm
uma vida extremamente longa: em um dos primeiros reinos dos deuses, um dia dura
o equivalente a cem anos humanos, e eles vivem quinhentos dos anos deles. No
nível seguinte dos reinos divinos, cem de nossos anos equivalem a um dos dias
deles, e eles vivem mil anos! Nestes reinos geralmente felizes, ainda há algum
sofrimento, causado por ocasionais brigas com os seres do reino dos deuses
invejosos. As existências no reino do desejo vão desde os reinos mais
miseráveis, os reinos infernais, até os primeiros reinos dos deuses; todos
estes estados estão sob o controle do desejo. Além do reino do desejo, há o
reino da forma sutil, que inclui uma hierarquia de dezessete níveis divinos
sucessivos. Os seres nestes estados têm uma forma sutil e corpos extremamente
grandes, luminosos; suas mentes conhecem poucas paixões, poucos pensamentos; e
eles desfrutam de uma felicidade incrível. A paixão predominante é o orgulho
sutil, os seres destes reinos acham que atingiram algo superior e vivem um tipo
de auto satisfação. Estes estados do reino da forma correspondem aos quatro
níveis de concentração meditativa, caracterizados pela transcendência
progressiva da investigação, da análise, da alegria e do êxtase. Finalmente,
além até mesmo deste quatro níveis de concentração do reino da forma, pode
haver o nascimento no reino sem forma. Os seres do reino sem forma não
experienciam qualquer sofrimento severo e virtualmente não têm quaisquer
paixões; eles permanecem apenas em uma forma extremamente sutil. A impureza que
permanece em suas mentes é um tipo de estagnação mental que impede a realização
da natureza última da mente. No reino sem forma, a mente tem acesso a quatro
estados sucessivos de consciência; absorção do espaço infinito, absorção da
consciência infinita, absorção do nada, e absorção nem da diferenciação nem da
não diferenciação. Os deuses do reino sem forma têm o sentimento de possuir um
corpo, mas este corpo é imperceptível. Eles têm apenas o quinto agregado da
individualidade, a consciência, ainda presente como uma ignorância sutil que
lhes dá um sentimento de existir neste corpo sem forma. Esta consciência
finalmente age como uma mãe que novamente dá a luz aos outros agregados. Deste
modo, os deuses do reino sem forma retornam aos reinos inferiores. Para ser
livre do Samsara, a consciência em si deve ser definitivamente
transformada na sabedoria primordial, a sabedoria da iluminação. Estes oito
estados dos reinos da forma e sem forma pertencem a uma mente positiva,
não distraída; seus estágios sucessivos são progressivamente livres do apego.
Todos estes estados dos seis reinos do Samsara são transitórios e
condicionados: todos eles são parte da roda do Samsara. Apesar de os
deuses dos reinos da forma e sem forma terem poucas formas severas de
sofrimento, eles ainda estão sujeitos à morte e à transmigração. Eles não têm o
poder de permanecer em sua condição divina e sofrem, tendo de renascer em um
reino inferior. Se acharmos difícil aceitar a noção destes diferentes reinos,
vamos simplesmente lembrar que a experiência de cada um é a sua realidade.
Quando estamos sonhando, nossos sonhos tornam-se a nossa realidade, e acontece
o mesmo com os seis reinos. Por exemplo, água pode ser experienciada de
maneiras muito diferentes: para os seres do inferno, ela causa tortura; para os
fantasmas famintos, é o que desejam desesperadamente; para alguns animais, é o
meio necessário para a vida; para as pessoas, é uma bebida; para os deuses
invejosos, é uma arma; e para os deuses, é um néctar sublime. As profundezas do
oceano são o habitat natural dos peixes, mas os humanos não podem viver lá. Os
pássaros voam no céu, mas isto é impossível para o corpo humano. As pessoas que
são cegas não podem ir aonde querem, enquanto aqueles que têm a visão normal
podem se mover livremente por aí. Cada um vive em seu próprio mundo ou reino,
sem perceber o dos outros. Então, o Samsara é composto por três reinos:
o reino do desejo, o reino da forma e o reino sem forma. Todas as
possibilidades da existência condicionada estão incluídas neles. Tornando-nos
conscientes de que todos os seres sofrem neste ciclo de existência, nos
inspiraremos a nos liberarmos da ignorância e da delusão (engano) onde estamos imersos,
a nos libertarmos do Samsara, que é um oceano de sofrimento, e a nos
esforçarmos para atingir a felicidade suprema do estado búddhico perfeito.
No passado, tivemos incontáveis nascimentos na existência cíclica. Hoje, somos
seres humanos; se usarmos esta oportunidade sabiamente, poderá ser o ponto de
partida para a nossa liberação. Shunya. Grupo de Estudos e Práticas Budistas.
Abraço. Davi.
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