Agora,
que encontramos o verdadeiro caminho, descobrimos que ele é perfeito e
absoluto; então, por que prática e iluminação seriam diferentes? O veículo do
supremo Dharma é livre; então, por que estudar e praticar com esforço
para alcançá-lo? Não há necessidade de dizer que todo o caminho é isento de
poeira; então, por que limpá-lo? O caminho está bem aqui, neste lugar; então,
para que ir lá ou acolá para praticar? Porém, se houver a menor diferença entre
você e o caminho, o resultado será uma separação maior do que aquela entre o
céu e a terra. Se houver o menor pensamento a favor ou contra, você perderá o
coração mente na confusão. Mesmo que você se orgulhe de seu entendimento e ache
que tenha a Iluminação, mesmo que imagine ter alcançado o caminho, mesmo que
imagine ter iluminado sua mente e ter ganho o poder de tocar o céu, mesmo que
imagine estar no reino da iluminação, você terá, de fato, quase que totalmente
perdido o caminho, que está além da própria iluminação. Até mesmo o Buddha (563 AC 483)
Shakyamuni, que tinha uma sabedoria inata, praticou meditação por seis
anos. Diz-se que até mesmo Bodhidharma, para poder transmitir o coração
mente de Buddha, praticou meditação por nove anos em frente a um muro no
templo de Shao-Lin. Já que os antigos sábios eram tão diligentes, por
que os praticantes de hoje chegariam ao mesmo estado sem a prática da
meditação? Deixe de buscar palavras e letras, aprenda a se recolher e refletir
por si mesmo. Se você praticar isto, o corpo e a mente irão desaparecer e a
natureza original surgirá. Se você quiser realizar a sabedoria de Buddha,
deve começar a meditar imediatamente. Para praticar o Zazen, deve-se ter
uma sala quieta. Coma e beba com moderação, afaste-se das relações ilusórias.
Deixe tudo de lado, não pense no bem e no mal, não se preocupe com o certo e
com o errado. Assim, tendo cessado as várias funções da mente, deixe até mesmo
a ideia de tornar-se um Buddha. Isto não é válido apenas para a
meditação, mas para todas as suas ações do cotidiano. Geralmente, no lugar onde
for meditar, coloca-se uma almofada quadrada e fina zabuto, sobre a qual
se coloca uma almofada redonda e espessa zafu. Você pode sentar na
postura de lótus kekkafuza ou de meio lótus hankafuza. Na postura
do lótus, coloque o pé direito sobre a coxa esquerda e o pé esquerdo sobre a coxa
direita. Em meio lótus, apenas coloque pé esquerdo sobre a coxa direita. A
roupa deve ser larga mas arrumada. Depois, coloque a mão direita sobre o pé
esquerdo e a mão esquerda sobre a palma da mão direita, com as pontas dos
polegares tocando-se levemente. Sente-se ereto, sem se inclinar nem para a
esquerda ou para a direita, nem para frente ou para trás. Suas orelhas devem
estar alinhadas com os ombros e o nariz deve estar alinhado com o umbigo. A
língua deve ficar encostada no céu da boca, os lábios e os dentes dever estar
fechados firmemente. Com os olhos sempre abertos, respire calmamente pelas
narinas. Finalmente, depois de ajustar seu corpo e mente da forma correta,
inspire profundamente e balance o corpo para a esquerda e para a direita, até
que então permaneça firmemente na postura de meditação, como se fosse uma
rocha. Pense no não pensar. Como isto é feito? Pensando além de pensar e do não
pensar. Isto é a própria base da meditação. O Zazen não é uma meditação
passo a passo, é simplesmente a prática fácil e agradável do Buddha, a
realização da sabedoria do Buddha. O kôan aparecerá no cotidiano
e a delusão (engano, logro) não se manifestará mais. Se compreender isto,
estará totalmente livre como um dragão que obteve água ou como um tigre que
repousa na montanha. O Dharma supremo vai se manifestar por si mesmo e a
mente estará livre do desânimo e da distração. Ao concluir a meditação, mova
seu corpo lentamente e se levante calmamente. Não se mova bruscamente. Através
da meditação, é possível transcender o mundano e o sagrado e se obter o poder
de morrer enquanto se estiver meditando sentado ou de pé. Mais do que isso é
impossível para a mente especulativa compreender como os Buddhas e os
ancestrais, através de um dedo, vara, agulha ou tambor, expressaram a essência
do Zen aos discípulos, nem como transmitem a iluminação com o báculo
(cajado, bordão), punho, bastão ou grito. Não se pode obter a compreensão
através de poderes sobrenaturais, ou pela vista dualista de prática e
iluminação. A meditação está além do sujeito e do objeto, além do pensamento
diferenciador. Portanto, não faça distinção entre o sábio e o ignorante.
Praticar o caminho com persistência é, por si mesmo, a iluminação. Prática e
iluminação, meditação e vida diária, não estão separados. Os Buddhas,
neste e no outro mundo, e os ancestrais, na Índia e na China e no Tibete,
preservaram o coração mente de Buddha e difundiram a prática Zen.
Portanto, você deve se devotar, exclusiva e completamente, à absorção na
prática da meditação. Diz-se que há muitos meios de compreender o caminho de Buddha,
mas você deveria apenas praticar a meditação. Não há porque deixar o lugar onde
você se senta e fazer viagens inúteis a outros países. Se o primeiro passo for
errado, imediatamente tropeçará. Você teve a boa fortuna de nascer com um
precioso corpo humano, então não gaste seu tempo em vão. Agora, que você sabe o
que é o mais importante no caminho de Buddha, como poderia se satisfazer
com o mundo impermanente? Nossos corpos são impermanentes como as gotas de
orvalho sobre as folhas, e nossas vidas são como o brilho de um relâmpago, que
desaparecem em um instante. Por favor, honrado seguidor do Zen, não se
surpreenda com um dragão real, nem gaste seu tempo para apalpar apenas uma
parte de um elefante. Siga o caminho que leva diretamente ao coração mente
original do Buddha. Respeite aqueles que realizaram a compreensão
completa e que nada mais têm a fazer. Torne-se um com a sabedoria dos Buddhas
e alcance a iluminação dos ancestrais. Se você praticar a meditação
constantemente, você realizará tudo isto. Então, a sala do tesouro se abrirá
por si mesma e você poderá usá-lo à vontade. Texto de Dogen Zengi (1200-1253).
Abraço. Davi.
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