A palavra sânscrita karma significa ação e se refere à
causalidade, a interdependência entre todos os atos e suas consequências
naturais. De modo geral, para que as coisas aconteçam, é necessária uma ação.
Por exemplo, se você quer tomar um chá, precisa praticar vários atos que
possibilitem isso: comprar a erva, arrumar uma xícara, preparar a água etc.,
até que, enfim, esteja em condições de bebê-lo. Essas ações, como toda e
qualquer ação, têm seus resultados; esta é a lei do karma. Certamente, a
maneira mais utilizada para se explicar o Karma é a analogia de que estamos
colhendo os frutos das ações que cultivamos anteriormente; do mesmo modo, nosso
futuro terá as consequências do que estamos fazendo agora. Existem ações que
frutificam de imediato; outras, porém, frutificam em alguns meses ou anos, ou
depois de várias vidas, ou mesmo depois de várias eras, mas, apesar do tempo
que possa mediar, sempre haverá uma correspondência entre a ação e o seu fruto.
Tudo o que é colocado em movimento produz um movimento correspondente. Se você
joga uma pedra numa lagoa, formam-se ondulações ou anéis que correm para fora,
batem na margem e voltam. O mesmo se passa com o movimento dos pensamentos:
ondulações correm para fora, ondulações retornam. Quando os resultados desses
pensamentos chegam de volta, sentimo-nos vítimas indefesas: estávamos
inocentemente vivendo nossa vida; por que todas essas coisas estão acontecendo
conosco? O que acontece é que os anéis estão voltando para o centro. (...). Isto
é o Karma e, devido a ele, nossa experiência da realidade continua a
girar em ciclos, com todas as suas variações, vida após vida. Assim é o
interminável Samsara a existência cíclica. Não compreendemos que estamos
vivendo resultados que nós mesmos criamos, e que nossas reações produzem ainda
mais causas, mais resultados; incessantemente. (...). O karma pode ser
comparado a uma semente que, em condições adequadas, dará lugar a uma planta.
Se você colocar na terra uma semente de cevada, pode ter certeza de que obterá
um broto de cevada. "Gálatas 6:7 Não vos enganeis: Deus não se permite zombar. Portanto, tudo o que o ser humano semear, isso também colherá!". A semente não vai produzir arroz. A mente é como um campo
fértil; coisas de todos os tipos podem crescer nele. Quando plantamos uma
semente; um ato, uma palavra ou um pensamento, num dado momento, será produzido
um fruto que irá amadurecer e cair por terra, perpetuando e incrementando
sementes de causalidade potentes em nosso corpo, fala e mente. Quando se
juntarem às condições adequadas para o amadurecimento do nosso karma, teremos
que lidar com as consequências das coisas plantamos. Portões da Prática
Budista, Chagdud Tulku Rinpoche. A doutrina budista, ao delinear o que
deve ser abandonado e o que deve ser aceito, classifica o karma em dez
não virtudes e dez virtudes. As dez não virtudes incluem três do corpo; matar,
roubar e conduta sexual indevida; quatro da fala; mentir, difamar, fala rude e
conversa fiada; e três da mente; cobiça, maldade e visão errônea. (...). As dez ações virtuosas são o oposto das dez
não virtuosas: não matar, e sim proteger a vida; não roubar, e sim praticar a
generosidade; não se entregar a uma conduta sexual indevida, e sim praticar a
moralidade em assuntos sexuais (realçada pela manutenção do celibato em certos
dias sagrados e durante certas ocasiões como retiros espirituais); não mentir,
e sim falar a verdade; não difamar, e sim falar harmoniosamente; não usar a
fala rude, e sim usar palavras reconfortantes; não tagarelar, e sim falar com
discrição e significado; não cobiçar, e sim regozijar-se com a riqueza e as
qualidades dos outros; não ter maldade, e sim benevolência; não defender visões
errôneas, e sim cultivar as corretas. A palavra reencarnação, apesar de ser
bastante utilizada, não é muito correta para o contexto budista; a palavra mais
precisa seria renascimento. Algumas pessoas acreditam que uma alma imortal, ou Atma
migra de vida para vida, ou que a consciência individual é reabsorvida na
consciência universal ou mente divina para depois, mais uma vez, renascer. A
visão budista não é nenhuma dessas. (...). Segundo Buddha, o que
sobrevive à morte é o fluxo contínuo, sempre em mutação, da energia de nosso
corpo e mente muito sutis. Todos nós recebemos um nome quando nascemos e, por
toda a nossa vida, respondemos a ele, embora nosso corpo e mente aos dez,
vinte, trinta, quarenta, cinquenta ou setenta anos sejam bastante diferentes.
Somos a mesma pessoa, mas não somos a mesma pessoa. A natureza essencial de
nossa mente é vazia de uma existência por si mesma independente. Nossa natureza
mais essencial é como um cristal puro, Vajra, e nela são gravadas
muitas marcas. Assim, momento após momento, vida após vida, estamos sempre nos
manifestando de formas diferentes. As existências sucessivas numa série de
renascimentos não são como as pérolas de um colar, presas por um cordão, a
"alma", que passa através de todas as pérolas; são mais como dados
empilhados uns sobre os outros. Cada um dos dados é separado, mas suporta o que
está sobre ele e está funcionalmente conectado com ele. Entre os dados não há
identidade, mas condicionalidade. Há nas escrituras budistas um relato muito
claro desse processo de condicionalidade. O sábio budista Nagasena, que viveu aproximadamente em 150 AC, fez
uma explanação disso ao rei Milinda num famoso conjunto de respostas à
perguntas que o rei lhe fez. O rei perguntou a Nagasena: quando alguém
renasce, ele é o mesmo que acabou de morrer ou é diferente. Nagasena
respondeu: Ele não é o mesmo, nem é diferente... Diga-me uma coisa, se um homem
acendesse uma lamparina, ela poderia fornecer luz durante toda a noite? Sim. É
a chama que brilha na primeira vigília da noite a mesma da segunda... ou da
última? Não. Isso quer dizer que há uma lamparina na primeira vigília, outra
lamparina na segunda, e outra na terceira? Não. É de uma única lamparina a luz
que brilha a noite toda? Sim. No renascimento é a mesma coisa: um fenômeno
surge e outro cessa, simultaneamente. Assim, o primeiro ato de consciência na
nova existência não é o mesmo do último ato de consciência da existência
prévia, nem tampouco é diferente. O rei pediu outro exemplo que explicasse a
natureza precisa dessa dependência, e Nagasena fez a comparação do leite: a
coalhada, a manteiga ou o ghee (manteiga semi líquida), feitos de leite,
nunca são o mesmo que o leite, mas dependem totalmente dele para serem
produzidos. A palavra também é geralmente traduzida com o sentido reencarnação,
mas o significado correto é corpo de emanação (sânsc. Nirmanakaya). Do
mesmo modo que o sol emana muitos raios; que não são totalmente iguais, nem
totalmente diferentes; um lama teria a capacidade de emanar uma sucessão
de renascimentos para trazer benefício aos outros seres. "No budismo
tibetano, é muito comum a identificação de tulkus (tibetano sprul, skul),
lamas renascidos como crianças e identificados através de visões, profecias
e testes. O mais famoso tulku tibetano é Tenzin Gyatso (1935- ), Sua Santidade, o Dalai Lama, a 14ª reencarnação do boddhissatva. Segundo
ele, a tarefa de identificar os tulkus é mais lógica do que pode parecer
à primeira vista. Dada a crença budista no renascimento, e considerando
que todo o propósito da reencarnação é possibilitar ao ser continuar seus
esforços em benefício de todos os seres vivos, é uma conclusão clara que
deveria ser possível identificar casos individuais. Isso habilita-os a serem
educados e colocados no mundo de tal forma que continuem seu trabalho o mais
rápido possível. Certamente, podem ocorrer erros nesses processo de identificação,
mas as vidas da grande maioria dos tulku (atualmente existem algumas centenas
deles reconhecidos, sendo que antes da invasão chinesa eram provavelmente
milhares os reconhecidos) são um bom exemplo do testemunho de sua eficácia. O filme o Pequeno Buddha (1993) do diretor Bernardo Bertolucci (1941- ), aborda esse tema da reencarnação búdica nos renascidos. O
que continua num tulku? É ele exatamente a mesma pessoa que reencarnou?
Ele é e não é, ao mesmo tempo. Sua motivação e dedicação para ajudar todos os
seres é a mesma, mas ele não é na verdade a mesma pessoa. O que continua de uma
vida para outra é uma bênção, é isso que o cristão chama de graça. Texto bíblico acrescentado pelo redator do Mosaico. "Efésios 4:7. E a cada um de nós foi concedida a graça, conforme a medida repartida por Cristo". Essa
transmissão de uma bênção e da graça é sintonizada e adequada a cada época
sucessiva, e a encarnação aparece da maneira que potencialmente melhor se
adequa ao karma das pessoas desse tempo, para poder ajudá-las de modo
mais completo. Shunya. Grupo de Estudo e Prática Budista. Abraço. Davi.
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