Editor do Mosaico. Comento
o filme Irmão Sol Irmã Lua, que estreou no cinema em 1972 na Itália. A
direção é de Franco Zeffirelli (1923- ).
Música composta por Riz Ortolani e roteiro de Franco Zeffirelli e Suso Gecchi
D’amico (1914-2010). Usarei como base dois texto sobre a vida de São Francisco e Santa
Clara de Assis. Um dos textos é do escritor católico brasileiro Leonardo
Boff (1938- ) idealizador da teologia da libertação, que devido a
uma interpretação livre das escrituras sagradas e envolvimento com movimentos
eclesiásticos de base, priorizando ajuda aos pobres e necessitados com
direcionamento à cidadania, conscientização social e política, foi
condenado pela igreja católica (1985) a um ano de silêncio obsequioso (censura,
investigação). Publicou um polêmico livro, aqui no Brasil, chamado Igreja
Carisma e Poder, (1981) que causou inquietação no meio intelectual da Cúria
Romana. Nele é esboçado a necessidade de mudanças na estrutura eclesiástica e
administrativa da igreja católica, bem como a inserção participativa dos leigos
e mulheres nas atividades pastores e ofícios religiosos. O responsável por esse
processo de excomunhão foi o cardeal alemão Joseph Ratzinger (1927-
), a época coordenador da Congregação para a Doutrina da Fé, tornando-se logo
depois o Papa Bento XVI (2005-2013), renunciando ao pontificado. Em 1992, frei
Leonardo Boff, ante novo risco de punição, desligou-se da Ordem Francisca e
pediu dispensa do sacerdócio. Historicamente o século XII e XIII, tempo
em que a trama do filme é relatada, foi palco de um processo de expansão das
religiões monoteístas (crença em um só Deus, sendo as três expressões o
cristianismo, o judaísmo e o islamismo. Como particularidades judeus e
muçulmanos não acreditam na divindade de Jesus, considerando-o como profeta,
nos termos de Abraão e Moisés). Já o cristianismo o inclui na Santíssima
Trindade como sua segunda pessoa, sendo assim Deus. Nessa religião a expansão
deu-se através das beligerâncias; alargando ou mantendo seus domínios e
influências espirituais, culturais e tradicionais entre os povos de outros
continentes. Os cristãos em mais de mil anos de história, através de sua
organizada instituição, igreja católica, sofria com dissensões internas,
facções externas e a cobiça por cargos eclesiásticos em suas fileiras, sendo
que, muitos eram vendidos à revelia (simonia) aos que pagassem o maior preço.
Numa degradante e corrupta situação espiritual a igreja definhava, mantendo-se
apenas pelo nome e a tradição. Mas em meio a tanto descompromisso e indignidade
com seus fiéis, ainda mantinha sua posição decisória e autoritária nos reinos
italianos e demais reinos da Europa Medieval. Os Sarracenos ou “pagãos”, nome
que eram chamados equivocadamente os árabes ou muçulmanos, foram povos
guerreiros, que organizados em exércitos empreendiam campanhas militares contra
os reinos europeus, alcançando expressivas conquistas e expandindo sua
influência pelo velho mundo. Esse engano fez com que os italianos e outros
povos, impingindo neles esse cognome “muçulmano”, generalizando-os,
consideravam os Sarracenos como bárbaros e selvagens, sendo inimigos da fé
cristã e da cruz de Cristo, podendo ser mortos para “glória” do evangelho. A
igreja, nessa época além de corrupta, era impiedosa e implacável com todos os
que desafiavam sua suposta autoridade civil e eclesiástica. Nesse período
aludido na pelica, iniciava-se a “Santa Inquisição Católica” (1184), que levou
a morte milhões de judeus, dissidentes cristão, ciganos, homossexuais e
desafetos da igreja, também milhares de pessoas eram queimadas vivas,
injustamente consideradas bruxas e bruxos. A Cruzada das Crianças (7 a 12
anos), é um misto de fantasia e fatos. A circunstância baseia-se em duas
movimentações separadas com origem na França e na Alemanha, no ano de 1212.
Esta cruzada teria ocorrido entre a Terceira e a Quarta Cruzada e seria um movimento
extraoficial, com apoio do clero superior, baseado na crença que apenas as
almas puras (no caso as crianças) poderiam libertar Jerusalém do jugo dos
muçulmanos. A ideia teria surgido após a notícia de que Constantinopla, uma
cidade cristã, tinha sido saqueada pelos cruzados árabes, fazendo os cristãos
crerem que não se poderia confiar em adultos. 50 mil crianças teriam sido
arregimentadas e colocadas em navios, saindo do porto de Marselha – França,
rumo a Jerusalém. O resultado foi um desastre, pois a grande maioria das
crianças morreu no caminho de fome, frio e inanição. As que sobreviveram foram
vendidas como escravas pelos turcos no Norte da África. Alguns chegaram somente
até a Itália, outros se dispersaram, e houve aquelas que foram sequestrados e
escravizados pelos árabes. O Papa Inocêncio III (1161-1216) um de nossos
personagens nesse filme, juntamente com o alto clero da igreja católica manchou
suas mãos e seu coração com sangue dos inocentes. "Há 800 anos, na
noite de 19 de março de 1212, dia seguinte à festa de Domingos de Ramos, Clara
de Assis, toda adornada, fugiu de casa para unir-se ao grupo de Francisco de
Assis na capelinha da Porciúncula que ainda hoje existe. As clarissas do mundo
inteiro e toda a família franciscana celebram esta data que significa a
fundação da Ordem de Santa Clara, espalhada pelo mundo inteiro. Clara junto com
Francisco, nunca devemos separá-los, pois se haviam prometido, em seu puro
amor, que “nunca mais se separariam” segundo a bela legenda da época,
representa uma das figuras mais luminosas da Cristandade. É bom lembrá-la no
mês de março, dedicado às mulheres. Por causa dela, há milhões de Claras e
Maria Claras no mundo inteiro. Ela, de família nobre de Assis, dos Favarone, e
ele, filho de um rico e influente mercador de tecidos, dos Bernardone. Com 16
anos de idade quis conhecer o então já famoso Francisco com cerca de 30 anos.
Bona, sua amiga íntima, conta, sob juramento nas atas de canonização, que entre
1210 e 1212 Clara “foi muitas vezes conversar com Francisco, secretamente, para
não ser vista pelos parentes e para evitar maledicências”. Destes dois anos de
encontro nasceu grande fascínio um pelo outro. Como comenta um de seus melhores
pesquisadores, o suíço Anton Rotzetter (1939- ) em seu livro “Clara de Assis:
a primeira mulher franciscana” Editora Vozes, Brasil, 1994: “neles irrompeu o
Eros no seu sentido mais próprio e profundo, pois sem o Eros nada existe que
tenha valor, nem ciência, nem arte, nem religião. Eros que é a fascinação que
impele o ser humano para o outro e que o liberta da prisão de si mesmo”, página
63 do referido livro. Esse Eros fez com que ambos se amassem e se cuidassem
mutuamente, mas numa transfiguração espiritual que impediu que se fechassem
sobre si mesmos. Francisco afetuosamente a chamava de a “minha Plantinha”. Três
paixões cultivaram juntos ao longo de toda vida: a paixão pelo Jesus pobre, a
paixão pelos pobres e a paixão um pelo outro. Mas nesta ordem. Combinaram então
a fuga de Clara para unir-se ao seu grupo que queria viver o evangelho puro e
simples sem glosas (censuras) e interpretações que lhe tirariam o vigor. A cena
não tem nada a perder em criatividade, ousadia e beleza, das melhores cenas de
amor dos grandes romances ou filmes. Como poderia uma jovem rica e bela fugir de
casa para se unir a um grupo parecido com os “hippies” dos anos 60? Pois assim
devemos representar o Movimento inicial de Francisco. Era um grupo de jovens
ricos, vivendo anteriormente em festas e serenatas, que resolveram fazer uma
opção de total despojamento e rigorosa pobreza nos passos de Jesus pobre. Não
queriam fazer caridade para pobres, mas viver com eles e como eles. E o fizeram
num espírito de grande jovialidade, sem sequer criticar a opulenta Igreja dos
Papas. Na noite do dia de 19 de março de 1212, Clara, escondida, fugiu de casa
e chegou à Porciúncula. Entre luzes bruxoleantes (brilhar tremulamente),
Francisco e os companheiros a receberam festivamente. E em sinal de sua
incorporação ao grupo, Francisco lhe cortou os belos cabelos louros. Em seguida,
Clara foi vestida com as roupas dos pobres, não tingidas, mais um saco que um
vestido. Depois da alegria, das canções dos trovadores franceses que Francisco
tanto gostava e das muitas orações, foi levada para dormir no convento das
beneditinas a 4 km de Assis. 16 dias após, sua irmã mais nova, Inês, também
fugiu, unindo-se à irmã. A família Favarone tentou, até com violência, retirar
as filhas. Mas Clara se agarrou às toalhas do altar, mostrou a cabeça raspada e
impediu que a levassem. O mesmo destemor mostrou quando o Papa Inocêncio III
(1161-1216) não quis aprovar o seu voto de pobreza absoluta. Lutou tanto até
que o Papa enfim consentisse. Assim nasceu a Ordem das Clarissas. Seu corpo
intacto depois de 800 anos comprova, uma vez mais, que o amor é mais forte que
a morte". http://laurocampos.org.br.
Essa narrativa, supostamente, tem um cunho humanista passional, pois entende
Francisco e Clara envolvido numa emotividade que oblitera a espiritualidade de
ambos. Parece que o autor implicitamente quis dar esse enfoque, para acentuar o
lado humano e sentimental dos personagens. Uma abordagem corajosa, já que,
quando falamos de pessoas que deixaram pegadas por esse mundo como Jesus, por
serem espirituais e religiosas, tendo expressado uma profunda comunhão mística
com o divino, os "rotulamos" como pessoas perfeitas e incapazes de
contagiarem-se com qualquer sentimento "íntimo" de afetividade, que
não seja relacionado ao amor santo e absoluto proveniente de Deus. As palavras
paixão e Eros, pensadas pelo senso comum, são pejorativamente carregadas de
preconceito. Alguns até poderiam criticar o autor, quando aplica esses termos
em relação aos dois personagens citados. Mas convenhamos, sinceramente, que
essas ideias passam-se pela mente de qualquer mortal quando em proximidade de
convivência com o sexo oposto. A história demonstrou, porém, que o amor de
Francisco por Clara, era sublime e transcendente, pois o amor aos pobres e a
fraternidade universal os uniu no propósito maior da propagação do evangelho ao
mundo europeu da Idade Média. Nada além desse amor supremo, os ligava tão
fortemente, ao ponto de fundirem suas almas em busca dos pobres perdidos e
necessitados da compaixão e misericórdia do Jesus pobre, o Salvador da
humanidade. "Irmão Sol. Giovanne de Pietro de Bernardone, mais conhecido
como São Francisco de Assis (1182-1226), foi um frade católico da Itália.
Depois de uma juventude irrequieta e boêmia, voltou-se para uma vida religiosa
de completa pobreza, fundando a Ordem Mendicante dos Frades Menores, mais
conhecidos como Franciscanos, que renovaram o Catolicismo de seu tempo. Com a
habilidade da pregação itinerante, quando os religiosos de sua época estavam
mais ligados aos mosteiros rurais, e com sua crença de que o evangelho devia
ser seguido à risca, imitando-se a vida de Cristo. Francisco desenvolveu uma
profunda identificação com os problemas do seu semelhante e com a humanidade do
próprio Cristo. Sua atitude foi original quando afirmou também a bondade e a
maravilha da criação, quando se dedicou aos mais pobres dos pobres, e quando
amou todas as criaturas (minerais, vegetais, animais e humanos) chamando-as de
irmãos. Alguns estudiosos afirmam que sua visão positiva da natureza e do
homem, impregnou a imaginação de toda a sociedade de sua época, sendo uma das
forças primeiras que levaram a formação da Filosofia da Renascença. Irmã Lua.
No domingo de Ramos de 1212, uma nobre senhora, chamada Clara de Favarone (hoje
conhecida por Santa Clara (1194-1253) ou Clara de Assis), foi procurar
Francisco pra abraçar a vida de pobreza. Alguns dias depois, Inês de Favarone
(1198-1253), sua irmã, segue o caminho. Surge a Fraternidade das Pobres Damas,
uma das três ordens ligadas a São Francisco". http://textoparareflexao.com.br.
Esse segundo texto, parece, mais centrado numa proposta condizente com a
experiência de São Francisco e Santa Clara. Aja vista, está baseado no filme
Irmão Sol Irmã Lua do cineasta italiano Franco Zeffirelli (1923- ), ele
constando hoje 94 anos, sendo a pelica uma de suas obras prima. O filme é
tocante, transparecendo em suas tomadas de cena a espiritualidade estampada em
cada fase do enredo. Nessa situação específica, o personagem principal, Francisco,
é enaltecido, pela amizade sincera e franca com Clara. As várias biografias
escritas de ambos, comprovam sua fé cristã e dedicação exclusiva à causa do
evangelho, principalmente, entre os mais pobres, fracos, doentes e
necessitados. Também dizem, esses biógrafos, que eles trocavam cartas, sendo
estas, enviadas secretamente para não suscitar má interpretações entre os
irmãos. Quando necessitavam de conversar assuntos importantes relacionados a
ordem religiosa, marcavam encontros, ora no convento onde Clara (mosteiro de
São Damião) estava servindo, enclausurada, ora onde Francisco se encontrava.
Clara era amiga "íntima" e confessora de Francisco, conservando essa
posição até a morte de seu irmão. O filme começa com Francisco em uma cama
tendo alucinações de guerra, e sua mãe o assistindo nessa situação, pois sendo
de família nobre os Bernardones, fora convocado para defender igreja católica
nas cruzadas contra os curdos muçulmanos, que liderados por Saladino
(1138-1193) conquistara a cidade de Jerusalém. Após sua recuperação deste
incidente traumático, Francisco, tem uma experiência de encontrar alguns
indigentes nas vielas da cidade de Assis, causando-lhe uma forte impressão. Mas
antes, percebe um pássaro na janela de seu quarto e seguindo-o pelo telhado de sua
casa, praticamente hipnotizado, quase cai daquela altura. Quando Francisco se
converte à Cristo, estando em uma missa por imposição de seu pai, olhando pro
altar vê os olhos do Cristo se abrindo, sendo que, em consequência dá um grito,
assustando os presentes que ouviam um cântico em latim. Por esse motivo a
homilia foi interrompida dispersando os fiéis. Esse evento da conversão,
juntamente com a experiência do contato com os pobres de Assis, desencadeou uma
estranha maneira de demonstrar sua alegria e contentamento, pois quando foi
levado por seu pai diante do bispo da cidade para ser disciplinado por sua
atitude irreverente e insubmissão desfazendo-se dos tecidos do genitor;
despe-se de suas roupas, e, estando nu, insolitamente percorre o centro da cidade
da Assis, saindo pelo portão principal, à vista de alguns transeuntes que
presenciava a controvérsia levantada por seu pai. Assim, posterga a tutela de
seu pai, iniciando sua vida cristã devota junto aos leprosos e pobres, que
usavam o casebre em ruínas (antiga igreja de São Damião) como moradia. Em nosso
senso comum, julgaríamos o fato de sua nudez como um pecado grosseiro, algo
imoral e escandaloso ante o convencionado padrão de comportamento vigente, que
fere os bons costumes sociais. Mas esse evento, significava, que Francisco a
partir daquele instante, assumiria por toda sua vida um compromisso, voto, de
despojamento material e extrema pobreza, vivendo com os pobres, como pobre e
pelos pobres. Ele costumava dizer que sua esposa era a pobreza. Outra cena
interessante é quando Francisco as margens de um lago, em contemplação, avista
Clara vindo ao seu encontro por entre as margaridas, jasmins e begônias. Ela
lhe diz que deseja entrar para a vida cristã, monástica, entregando-se
completamente a Cristo. Em outra cena Francisco adentra num belo campo florido
na periferia da cidade de Assis, contatando borboleta, lagarta, besouro; vê-se
também cavalos, éguas e potro. Um coelho surge dos arbustos, e Francisco toma
uma pedra na mão e aprecia suas particularidades. "Francisco fez muitas
viagens pelo oriente, e segundo estudiosos conheceu o lado esotérico do
Islamismo chamado de Sufismo, mais precisamente a Ordem dos Dervixe. Os pontos
de coincidência entre a Ordem Franciscana e os Dervixe são muito. 1. Ambas as
ordens pregam a ajuda ao próximo como fator de salvação. Um dos pilares do Islã
é justamente a "esmola", erroneamente traduzida na sociedade
capitalista como dar dinheiro. Entretanto, o sentido original desse pilar
religioso diz respeito a ajudar ao próximo, não necessariamente financeira.
Tanto os Franciscanos como os Sufis, inicialmente saíam as ruas, teorizando e
praticando seus ensinamentos, isto é, pregando o evangelho e o Alcorão;
ajudando os necessitados, curando, consolando, dando abrigo e comida, afinal,
não há melhor maneira de praticar os ensinamentos de Deus do que com o próximo.
Outro ponto interessante é a saudação franciscana: "Que a paz de Deus
estava convosco". Segundo Francisco esta é a bênção que Deus lhe enviou,
entretanto, a mesma bênção está presente no Islã com a famosa frase:
"Sallam Aleikun", que também significa: Que a paz de Deus estava
convosco. Do ponto de vista histórico esta é mais uma prova do contato de
Francisco com os povos árabes, que o influenciaram não só na doutrina, mas
também na ética e moral franciscana. Do ponto de vista filosófico isto mostra,
que Deus se revelou tanto no cristianismo como no islamismo e em todas as
religiões existentes". http://www.oiluminador.blogspot.com.br. Junto com
seus companheiros, Francisco, restaura a igrejinha que está em ruínas. Quando
ele se converte a Cristo, por ser da elite social da cidade de Assis, seus
antigos amigos lentamente se juntam a ele, desse modo, criando um impasse
político religioso. O orgulhoso e soberbo bispo de Assis (dom Guido II), ao
receber a autoridade civil vinda de Roma diz que Francisco estava persuadindo
os jovens à um movimento separatista, mas o representante do governo insiste
que esse fato está sob a responsabilidade da igreja, cabendo a ela tratá-lo. Assim
numa atitude covarde, o bispo manda que a igrejinha (Porciúncula) seja
incendiada. Interessante que esse momento da assinatura do edito clerical,
impressão em tinta do seu anel no documento oficial, para frear as pretensões
“dissidentes” de Francisco, este, junto com seu grupo e grande multidão,
comemoravam com uma festa, tendo os sacramentos como destaque, a reabertura da
igreja de São Damião, restaurada por eles. O que impressiona nessa cena, é a
simplicidade com que se celebra esse ato místico, pois no altar dividindo a
mesma posição do pão e vinho, haviam um cordeiro mansamente agachado e vários
patos grasnando, acompanhado a música cantada pelos presentes na missa
inaugural, em sua língua paterna; diferentemente do oficioso ritualismo
litúrgico em latim celebrado à comunidade em Assis nas missas paroquianas. Em
outro momento, enquanto Francisco e seus irmãos juntamente com Clara atendiam
os leprosos, doentes e necessitados de Assis; as margens de uma cachoeira, o
atentado se consumava. São avisados do ocorrido e chegando encontram a igreja
em chamas, e Francisco não entende tanto ódio e maldade; a igreja que ele
e a comunidade dos pobres restauraram com tanto amor e carinho agora
parcialmente destruída. Francisco entra em crise psicológica, e depois de
orações e conversas com Clara, resolve ir a Roma - Itália visitar o Papa
Inocêncio III (1161-1216) pra saber dele que posição tomar quanto a essa
questão. Nas ruas de Roma, ele e seu grupo parecem mais mendigos e indigentes
que pessoas comuns. Um de seus amigos que era aliado do bispo arquiteta um
plano, para que Francisco não encontre aquiescência do Papa em suas pretensões
quanto a Nova Ordem Religiosa que deseja iniciar. Assim, após convencê-lo, lhe
arranja audiência com o santo padre, mas com a condição, que ele leia um texto
em latim, declarando sua total e absoluta obediência a igreja. Quando Francisco
e seus companheiros entram na igreja de São Pedro, no Vaticano, é notório o
contraste da extrema pobreza dos mendicantes, com suas vestes esfarrapadas e o
clero romano em sua opulência, riqueza e soberba. De joelhos Francisco começa a
ler o texto, mas repentinamente, muda sua orientação recitando partes das
sagradas escrituras em Mateus 6:19-26 “Não ajunteis tesouros na terra, onde a
traça e a ferrugem tudo consomem, e onde os ladrões minam e roubam. Mas ajuntai
tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões
não minam nem roubam. Porque onde estiver o vosso tesouro, ai estará também o
vosso coração. (...). Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de
odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis
servir a Deus e a Mamom. Pois isso vos digo: Não andeis cuidadosos quanto à
vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao
vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento,
e o corpo mais do que o vestuário? Olhai para as aves do céu, que nem semeiam,
nem colhem, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não
tendes vós muito mais valor do que elas?”, que dizem respeito ao desapego ao
materialismo, vivendo em modéstia e singeleza, confiando apenas no suprimento
dado por Deus. De início Sua Santidade (o Papa Inocêncio III) ouve, juntamente
com seus cardeais e bispos auxiliares surdamente; alguns até falando que isso
era um insulto contra o papa e a santa igreja. Quem é esse, para nos ensinar o
evangelho? Mas quando é ordenado que Francisco e seus irmãos sejam presos; em
êxtase, o Papa reconhece que cometeu um erro “pecado” contra alguém, que de
forma simples e extraordinariamente condizente com o evangelho, procurava viver
a vida cristã; e ele e seu séquito esbanjando conforto e ostentação. Desse
modo, arrepende-se e imediatamente manda chamar Francisco. Quando este chega e
novamente ajoelha-se diante do trono do Sumo Pontífice, Inocêncio III desce e
percorrendo as escadarias aproximou-se de Francisco. Os dois em pé conversam
sobre o porquê da vinda deles, e num gesto imprevisível, o Papa ajoelhasse e
humildemente beija os pés de Francisco. Ao final despede-se do grupo,
abençoando-os à prosseguirem em sua missão de propagar o evangelho conforme a
orientação que receberam de Jesus, e aprova as pretensões de Francisco quanto
ao estabelecimento da Nova Ordem Religiosa. Também, depois de convertido ao
cristianismo, Francisco, discutia com seu pai, pois como de família abastada
(muitas posses), eram mercadores de tecidos e comerciantes, e agora Francisco
queria dividir sua fortuna com os pobres de Assis; coisa que seu pai não admitia
de forma nenhuma. Mas ele, aproveitando a ausência temporária do pai, que
estava em viagem a negócios, joga pela janela de sua casa grande quantidade de
tecidos aos pobres. Quando seu pai chega, sabendo do ocorrido, o castiga e o
expulsa de sua casa. Francisco em nenhum momento de sua vida segundo seus
biógrafos, criticou a autoridade da igreja, sendo sua submissão incondicional
aos superiores eclesiásticos até o fim. Algumas das regras dos Franciscanos,
como voto, incluíam a pobreza extrema, a castidade, os jejuns regulares e a
obediência ao evangelho particularizado na vida de Jesus. Francisco foi um
místico cristão, pois sua experiência de meditação e contemplação levaram-no à
numinosidade (estado de vivência que o indivíduo possui acerca de questões sobrenaturais,
transcendentes ou de divindades, comportando-se e sendo influenciado por elas)
espiritual e contemplativa. Também frequentemente conversava com animais,
pássaros, plantas, árvores e ouvia sons vindo dos ventos trazendo presságios
bons ou ruins. Em algumas ocasiões, interpretava ruídos das rochas ou
montanhas. Costumava fazer leitura "criptográfica" nos espelhos
d'água, e espantosamente, dialogando com seus irmãos, de repente desaparecia,
sendo visto noutro lugar diferente. Muitos desses "poderes"
taumaturgos Francisco aprenderá com a tradição Islã do Sufismo. As chagas
(feridas) de Francisco encontradas em seu corpo após sua morte; bem parecidas
com aquelas feita em Jesus em seu calvário, desde o julgamento religioso pelos
judeus (sumo sacerdotes), e o político pelo governo romano (Pôncio Pilatos),
onde fora chicoteado e espancado. Essas marcas foram imprimidas com sangue,
conforme a tradição da igreja, quando Jesus, ao ser sepultado por Nicodemos e
José de Arimatéia, envolveram seu corpo em um lençol, provavelmente branco, que
depois de sua ressurreição ficou no sepulcro. Marcos 15:46 "E, tendo-se
certificado pelo centurião, deu o corpo a José de Arimatéia. O qual comprará um
lençol fino, e, tirando-o da cruz, o envolveu nele, e o depositou num sepulcro
lavrado numa rocha; e revolveu uma pedra para a porta do sepulcro". Esse
tecido acabou sendo conhecido como o manto sagrado ou sudário de Turim,
guardado na Catedral de Turim - Itália, desde o século XIV. Assim, também, o
corpo de Francisco tinha marcas semelhantes com as estampadas no "manto
sagrado". Evidentemente o assunto é discutível até hoje, não havendo um
posicionamento científico da veracidade quando ao fato do "manto
sagrado" de Jesus, e de igual modo, as chagas encontradas no corpo de Francisco.
Mas a igreja em ambos os casos, assevera por crença e fé a verossimilhança
desses eventos. Santa Clara, também, em sua vida religiosa foi uma mística
dedicando-se a oração, e a obras de caridade. Participou ativamente do
emergente Movimento Franciscano em sua versão feminina, cooperando, para que o
evangelho livre e compromissado com a vida de Jesus, alcançasse todas as
regiões da Europa e outros continentes. "O seu primeiro milagre em vida
demonstra sua grande fé. Conta-se que uma das irmãs da sua congregação saíra
para pedir esmolas para os pobres que iam ao mosteiro. Como não conseguiu quase
nada voltou desanimada e foi consolada por Santa Clara que lhe disse: confia em
Deus. Quando a santa se afastou, a outra freira foi pegar no embrulho que trouxera,
e não conseguiu levantá-lo, pois tudo havia se multiplicado. Em outra ocasião
quando da invasão da cidade de Assis pelos Sarracenos, no ano de 1240, Santa
Clara apanhou o ostensório com a hóstia consagrada e enfrentou o chefe deles,
dizendo que Jesus Cristo era mais forte que eles. Os agressores, tomados de
repente por inexplicável pânico, fugiram. Por este milagre Santa Clara é
representada segurando o ostensório na mão". Fonte Wikipédia. A
Basílica de Santa Clara, na cidade de Assis - Itália, é um belíssimo santuário
católico, que os amigos do Mosaico, principalmente europeus, que tiverem
oportunidade de conhecer, ficarão vislumbrados. Há uma forte energia positiva
no recinto, e um sentimento profundo de amor à Deus e ao próximo nos perpassa
ao olhar cada imagem, pintura e expressão religiosas e artística do
Renascimento. O túmulo de São Francisco dentro da cripta, causa-nos uma forte
impressão; motivando-nos a uma vocação e devoção íntima ao nosso Deus e Pai. O
corpo de Santa Clara continua intacto, conforme Frei Vitório Mazzuco Filho, OFM
(1953- ). "Em 11 de agosto de 1253, Santa Clara entra na
glória eterna; já no dia seguinte seu corpo é levado para a igreja de São Jorge
onde também repousa Francisco. No dia 3 de outubro de 1260, o corpo é exumado e
colocado na Basílica de Santa Clara; ali permanece perto do altar com uma
simples inscrição: "Aqui jaz o corpo da Virgem Santa Clara",
protegido pelo brilho de uma lâmpada e as preces silenciosas de suas filhas que
guardaram este fato no segredo de seus corações. Um relicário de vidro protege
os ossos de Santa Clara. A lateral esquerda deste "corpo" encontra-se
aberta. Assim, apenas as Irmãs Clarissas vêm, de dentro da clausura, os ossos
da santa. Ao chegarmos a Assis e orarmos, rezarmos, diante de Clara devemos
lembrar que uma vida como a dela é sempre fecunda, nunca se decompõe. Num
coração aberto para o Absoluto, Deus sempre deposita a sua Beleza. Diante de
seu corpo temos que ter o desejo de rezar, orar. É preciso sempre desejar o
espírito! Orar é abrir os olhos, abrir nossas faculdades humanas e todo o nosso
ser e deixar que Deus se estabeleça ai. Rezar é ver e auscultar, perceber que o
espírito sempre trabalha na imagem. Diante do corpo de Clara, é preciso
redescobrir a espiritualidade da ternura, da pequenez, da pobreza. Clara,
mulher e santa, não é um aprendizado intelectual, mas um conhecimento afetivo.
Por que Clara é bela? Porque o Espírito imprime sempre no corpo a sua forma. O
Amor pelo Esposo tomou forma em seu corpo! Após 750 anos, cuidou-se muito dos
restos mortais de Clara para não se deixar lembrar a sua forma de vida, modo
como ela "eternizou-se" no tempo". No fim de 1224, com quarenta
e dois anos, Francisco estava muito doente. Sofria de malária, não conseguindo
comer, e o pior, além de não enxergar quase nada, nem aguentava a luz do sol ou
do fogo em seus olhos. O cardeal Hugolino, que se tornou o Papa Gregório IX
(1170-1241) sendo era seu amigo, estava sempre procurando algum médico melhor
para ele. Nessa ocasião, mandou dizer que tinha encontrado um bom doutor em
Sena, onde estavam o papa e seus cardeais. Francisco aceitou o convite e quis
ir pra lá. Mas foi primeiro a São Damião, despedir-se de Clara. Chegou lá tão
mal que Clara e os frades que o acompanhavam decidiram que ele não podia
viajar. Ainda mais com aquele inverno pesado, com todas as estradas cobertas de
neve. Clara mandou fazer uma cabaninha para ele, junto da casa dos frades que
ajudavam em São Damião. Foi um dos tempos piores de sua vida, apesar do carinho
de Clara, das irmãs e dos frades. Ele estava doente no corpo e na alma. Um
desânimo enorme o abatia profundamente. Lembrava que muitas coisas não estavam
indo bem no meio da multidão dos seus irmãos e pensava que tinha feito muitas
coisas erradas na vida. Uma certeza cruel esmagava-o dia e noite; ele tinha
perdido a vida e ainda iria para o inferno. Para completar, o lugar estava
cheio de ratos, que ficavam a noite inteira andando por cima dele. Francisco
sempre foi humano como nós, passando por tristeza, desilusão, inconformismo,
rejeição, mas desfrutou grandes momentos de paz, alegria, gozo, contentamento.
De acordo com o seu desejo, morreu deitado na terra. Foi então que as multidões
começaram a chegar e se deram conta de que aquele homem só podia ser
extraordinário: tinha até as chagas de Jesus crucificado. A vida de
Francisco e Clara é emocionante e comovente, como vimos sucintamente, desde o
primeiro momento em que se encontraram, pois cultivaram entre si uma amizade
pura, sincera, franca e espiritual. Francisco sofreu muito nos anos que
antecederam sua morte, mas a amiga e irmã Clara nunca o abandonou, assistindo-o
em suas dores físicas e distúrbios psicológicas. Também ouvia pacientemente
suas confissões, ajudando-o em suas crises, intercedendo por ele em oração ao
Eterno Pai. Finalmente, depois de muita agonia e dor, Clara foi chamada à
reconhecer, na Porciúncula, que seu grande amigo Francisco havia partido para
estar com Cristo na eternidade. Abraço. Davi.
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