quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

VI. RAJA YOGA. SAMADHI PADA.



RAJA YOGA. Texto de I. K. Taimni (1898-1978). SAMADHI PADA. Drstanusravika visaya vitrsnasya vasikara samjna vairagyam. I-15. A CONSCIÊNCIA DE PERFEITO DOMÍNIO DOS DESEJOS NO CASO DE ALGUÉM QUE TENHA DEIXADO DE ANSIAR POR OBJETOS VISTOS OU NÃO VISTOS É VAIRAGYA. Este sutra define vairagya, o segundo meio usual de produzir a supressão de citta vrttis. O completo significado de vairagya e seu papel de propiciar à mente uma condição de repouso será plenamente compreendido somente após estudo da filosifa dos Klesas, descrita nas seção II. Discutiremos aqui apenas certos princípios gerais. A palavra vairagya é derivada da palavra raga, definida em II-7 como a atração proveniente do prazer originário de qualquer objeto. Vairagya, por conseguinte, significa a ausência de qualquer atração por objetos que dão prazer. Pode-se perguntar: por que somente ausência de atração, por que não ausência de repulsão também, uma vez que atração e repulsão são dois opostos e a repulsão prende a alma aos objetos tanto quanto a atração? Não é por negligência que dvesa foi deixada de lado, na expressão etimológica da ideia como vairagya, mas pelo fato de que dvesa está realmente incluído em raga e com raga forma um par de opostos. A alternância da atração e da repulsão entre dois indivíduos ligados entre si mostra a relação subjacente de atração e repulsão, e sua origem comum derivada do apego. Assim, o desapego, que significa liberdade tanto em relação à atração quanto à repulsão, expressa corretamente o significado fundamental de vairagya. A razão por que vairagya desempenha tão importante papel na restrição e, depois, na eliminação de citta vrttis está no fato de que o desejo, em suas duas expressões – raga e dvesa – é uma força extraordinariamente impulsionadora e perturbadora, que, de forma ininterrupta, produz vrttis na mente. De fato, nos estágios iniciais do progresso evolutivo, o desejo é a única força motriz, e o desenvolvimento da mente ocorre, quase que exclusivamente, como resultado do constante impulso a que a mente é submetida pelo desejo. Nos estágios posteriores, outros fatores também aparecem e, como o desejo gradualmente se transforma em vontade, esta vontade, cada vez mais, se transforma na força motriz do desenvolvimento evolutivo. Todos os aspirantes que estão trilhando a Senda do Yoga precisam, portanto, tentar compreender claramente o papel que o desejo representa em nossa vida, bem com a maneira como ele conserva nossa mente em constante estado de agitação. Muitos sadhakas, não compreendendo suficientemente a influência perturbadora do desejo, tentam praticar a meditação sem prestar suficiente atenção à questão do controle dos desejos, daí não obtendo qualquer sucesso significativo em fazer com que a mente liberte-se das perturbações, no momento da meditação. Tentar tornar a mente calma sem eliminar o desejo é como procurar parar o movimento de um bote em águas violentamente agitadas por um forte vento. Por mais que tentemos fazê-lo parar em uma posição, usando força externa, ele continuará a movimentar-se como resultado dos impulsos imprimidos pelas ondas. Mas, se o vento cessar e as ondas amainarem por completo, o barco sossegará – no devido tempo – mesmo sem a aplicação de qualquer força externa. O mesmo acontece com a mente. Se a força motriz do desejo é completamente eliminada, a mente descansa (estado de nirudha) de modo natural e automático. A prática de vairagya é a eliminação das forças motrizes do desejo – a palavra desejo é aqui utilizada em seu mais amplo sentido de vasana, conforme explicado na seção IV. Mas a eliminação de citta vrtti pela prática exclusiva de vairagya, embora teoricamente possível não é nem exequível (executável) nem recomendável. É como tentar parar um carro apenas cortando a gasolina. Por que não usar também o freio e fazer com que ele pare mais rápida e eficazmente? Nisto entra o papel desempenhado pelo abhyasa. Abhyasa e vairagya são, assim, utilizados conjuntamente para citta vrtti nirodha. Após estas considerações gerais sobre a função de vairagya, verifiquemos, agora, algumas das expressões usadas em I-15, com vistas à compreensão do que realmente significam as definições antes citadas. Visaya são os objetos que produzem a atração e o consequente apego. Foram classificados sob dois títulos, aqueles que são vistos e aqueles sobre os quais ouvimos falar, isto é, aqueles que são mencionados em escrituras. Anusravika, é claro, refere-se aos deleites que os seguidores das religiões ortodoxas esperam obter na vida após a morte. A prática de vairagya procura destruir a sede pelas duas espécies de deleites. Ver-se-á, do que foi dito acima, que o ideal do Yoga é inteiramente diferente do idela religioso ortodoxo. Neste último, são prescritos modos especiais de vida e de conduta, e se o devoto de determinada religião age de acordo com tal código de conduta, ele espera viver, após a dissolução do corpo físico, num mundo super físico, com todos os tipos de deleite e meios de alcançar a felicidade. Os céus das diversas religiões podem diferir em relação aos encantos que oferecem, mas a ideia fundamental é a mesma, isto é, uma espécie particular de vida que consiste em observar certas normas e determinado código moral, como garantia de uma vida feliz após a morte. A filosofia do Yoga não nega a existência do céu e do inferno (1), mas apresenta ao yogi um ideal de realização, no qual não há lugar para os gozos e prazeres da vida celestial, por serem estes também temporários e sujeitos à ilusão. Os prazeres do mundo celestial nada são, se comparados à bem aventurança e aos poderes que o yogi adquire quando sua consciência passa para planos de existência ainda mais elevados. Até mesmo a esses estados transcendentes, ele tem que renunciar, em seu progresso na direção de seu objetivo supremo. Todo poder e prazer “nascidos” do contato com prakrti e que não são inerentes ao Eu e, por conseguinte, não tornam o yogi auto suficiente, deve ser incluído em anusravika visaya. Pode-se mencionar, aqui, não ser a sensação de prazer, ao entrar em contato com visaya, o que constitui trsna. Em nosso contato com objetos sensoriais, alguns têm que, necessariamente, produzir uma sensação de prazer. Quando a consciência atua nos planos superiores, através dos veículos mais sutis, a bem aventurança é o acompanhamento natural inevitável, mas não é este sentimento de prazer ou bem aventurança que constitui raga. A atração e o consequente apego é que causam a escravidão e precisam ser destruídos pela prática de vairagya. É também necessário lembrar que a simples ausência de atração, em virtude da inatividade do corpo, ou da sociedade, ou da preocupação com outras coisas, não constitui vairagya. Um homem que envelhece pode perder seu desejo sexual, durante algum tempo. Um político empenhado em levar avante suas ambições pode, ocasionalmente, tornar-se indiferente a prazeres sensuais. Mas essa indiferença temporária em relação aos objetos nada tem a ver com vairagya. A atração encontra-se apenas latente e pronta para vir à tona, tão logo as condições necessárias estejam presentes. O que é necessário para a verdadeira vairagya é a deliberada destruição de todas as atrações e consequente apego e o domínio consciente dos desejos. Este é o significado da expressão vasikara samjna. O controle sobre os veículos, através dos quais os desejos se fazem sentir, bem como o consciente domínio decorrente de tal controle, são os elementos essenciais de vairagya. Para se conseguir esta espécie de domínio, é preciso que se tenha tido contato com tentações de toda espécie, ter passado por provações de toda ordem, sair não apenas triunfante, mas sem sentir a mais leve atração. Pois, se a atração é sentida, mesmo que a ela não se sucumba, não se terá dominado completamente o desejo. Constata-se, portanto, que o isolamento do mundo ou a fuga das tentações não nos ajudam a adquirir o verdadeiro vairagya, embora isso possa tornar-se necessário nos primeiros estágios da aquisição do autocontrole. Temos que aprender a lição e testarmo-nos em meio aos prazeres e às tentações – é claro que sem sucumbir  às tentações nem permitir os prazeres, mas procurando passar pelas atraentes ilusões que envolvem tais prazeres, enquanto estivermos sob seu domínio. A verdadeira vairagya não é caracterizada por uma violenta luta com nossos desejos. Isso vem naturalmente e em sua forma mais eficaz pelo exercício de nossa faculdade de discernimento chamada viveka. A fascinação desempenha papel muito importante na produção de raga ou apego, é até mesmo uma análise comum de caráter intelectual, combinada com a razão e o bom senso, pode livrar-nos de muitos hábitos e apegos irracionais. Mas a verdadeira arma a ser utilizada na aquisição do autêntico vairagya é a mais penetrante luz de Buddhi, que se expressa como viveka. A medida que nossos corpos vão se purificando nossa mente se tornando livre dos desejos mais grosseiros, es)) do sa luz aumenta seu brilho e destrói nossos apegos, expondo as ilusões neles subjacentes. De fato, viveka e vairagya podem ser considerados dois aspectos do mesmo processo de dissipação da ilusão pelo exercício do discernimento, de um lado, e a renúncia, de outro. A medida que o processo vai atingindo seu nível mais profundo, ele vai-se fundindo cada vez mais com jnana, tornando-se indistinguível dele. (1). É oportuno considerar que o autor está visivelmente se referindo as religiões ortodoxas da Índia, nas quais o céu e o inferno são estados transitórios da alma, após a morte, entre uma vida e outra, no ciclo das reencarnações. Nessas religiões não se encontra o sentido de céu e inferno eternos, como ocorre em muitas religiões ocidentais. Tat param purusa khyater gunavaitrsnyam. I-16. ESTE É O MAIS ELEVADO VAIRAGYA, NO QUAL, DEVIDO AO PERCEBIMENTO DO PURUSA, CESSA O MAIS LEVE DESEJO PELO GUNAS. Em relação ao sutra anterior, foi mencionado que o discernimento e a renúncia fortificam-se mutuamente e produzem a destruição progressiva de ilusões e apegos, raiz e causa da escravidão. Isso resulta na liberação da consciência dos grilhões que a ligam aos mundos inferiores e todo o processo culmina, como veremos mais adiante em Kaivalya, objetivo final do Yoga. Nesse estado, purusa, tendo compreendido sua verdadeira natureza e tendo-se livrado do jugo da matéria, não tem mais atração nem mesmo pelas mais sutis formas de bem aventuranças, encontradas nos planos mais elevados da existência. Ele é totalmente auto suficiente e superior a toda essas atrações que se baseiam no jogo dos gunas. Este vairagya, baseado na destruição de avidya e na compreensão de que tudo está contido no próprio purusa, ou que purusa é a fonte de tudo, é a mais elevada espécie de vairagya e é chamada de para vairagya. Ver-se-á que este para vairagya, que é uma característica da consciência do purusa somente pode aparecer na conquista de Kaivalya. O fato de que a completa vairagya só se desenvolve na conquista de purusa khyati significa que, embora possa não haver apego ativo nos estágios inferiores, ainda assim, as raízes do apego permanecem. Isto quer dizer que, embora haja possibilidade de recidiva desse apego antes da conquista de purusa khyati, isto torna-se impossível após alcançado esse estágio. Este fato foi muito bem exposto na muito conhecida sloka (II-59) do Bhagavad Gita: “Os objetos dos sentidos, mas não o gosto por eles, afastam-se de um abstêmio (não consome bebida alcoólica) morador no corpo (espírito no Bhagavad Gita), e mesmo o gosto por eles afasta-se dele após o Supremo ser visto”. Referência do Texto: (1). Inferno – é oportuno considerar que o autor está visivelmente se referindo às religiões ortodoxas da Índia, nas quais o céu e o inferno são estados transitórios da alma, após a morte, entre uma e outra vida, no ciclo das reencarnações. Nessas religiões não se encontra o sentido do céu e inferno eternos, como ocorre em muitas religiões ocidentais. Livro A Ciência do Yoga. Abraço. Davi.

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