Budismo Nitiren Daishonin. Por Daisaku Ikeda
(1928- ). A vida é diversa. Os seres
humanos são diversos – este é o caminho natural. Durante a minha primeira
visita aos Estados Unidos, eu presenciei um incidente num parque local onde um
menino afro-americano foi excluído de brincar com os meninos anglo-saxões e
acabou saindo do parque humilhado e com raiva. Este pode ser um pequeno e insignificante
episódio mas através dele, eu obtive uma pequena amostra do escuro abismo do
preconceito que se esconde atrás deste ato. Esta experiência me fez refletir
sobre o problema da discriminação racial. De forma trágica, as
diferenças de cultura, nacionalidade e religião têm sido usadas, de tempos em
tempos, para dividir e classificar as pessoas em categorias e discriminar
certos grupos. A história tem nos mostrado intermináveis conflitos que causam a
divisão dos membros da família humana. Eu sinto que os Estados Unidos é o maior
país do mundo em diversidade cultural e que por esta razão tem o potencial de
tornar-se uma nação ideal, transformando a energia de diferentes culturas em um
esforço conjunto em prol da construção. O povo japonês ainda tem muito o que
aprender e crescer neste campo. Coreanos e outros povos asiáticos que vivem no
Japão ainda sofrem uma terrível discriminação e o povo em geral não se importa
com o valor da diversidade. Os encontros entre diferentes culturas não são sempre amigáveis.
Não podemos deixar de reconhecer que a realidade consiste em interesses
divergentes e hostilidades. Então, o que podemos fazer para promover uma
relação harmoniosa? O
budismo ensina que devemos buscar a harmonia em um nível mais profundo. Nós
devemos alcançar um estado de compaixão profunda o suficiente que nos capacite
encontrar nossa humanidade em comum e transcender as diferenças entre nós e os
outros. Isto não significa negar o ego individual, mas fundi-lo com o do
próximo – uma expansão do ego que é delimitado por nós mesmos, para um ego
muito maior e cuja escala é ilimitada, assim como o próprio universo. Certa ocasião, eu
conversei com um afro-americano que manifestou sua obsessão por suas raízes.
Ele não podia deixar de pensar que seu povo havia sido trazido para a América
como escravos. Ele continuou: "Eu tenho certeza que os brancos guardam
pensamentos similares sobre nós. Eles odeiam tratar um povo que eram seus
escravos como iguais. Por esta razão, eu desprezava os brancos norte-americanos.
Para mim era impossível gostar deles, pois quando relembrava como nosso pais,
avós e todos os ancestrais antes deles foram explorados, abusados e
discriminados pelo homem branco". "Desde a minha infância, todas as vezes
que era judiado ou sofria alguma discriminação, persistia em minha mente que eu
era negro. Eu mesmo cheguei a desprezar o sangue que corria em minhas veias.
Assim, quando eu aprendi sobre a visão budista de interconexão de todos os
fenômenos, eu consegui observar toda a questão de diferenças raciais sob outra
perspectiva. Eu compreendi que havia me enganado em enfatizar as diferenças com
base na cor da pele". Buscar localizar a origem da identidade de um indivíduo com base
na raça ou grupo étnico é uma ilusão. É como uma miragem no deserto. Tal
teoria, longe de servir como um ponto em comum que possa ser compartilhado por
todos, somente aumenta a distância entre si e os outros. Além disso, se torna
um fator que salienta o conflito e a discórdia. Caso, os integrantes de
cada grupo retrocederem, buscando somente suas próprias raízes e origens, a
sociedade será coberta por milhares de fissuras que irão dividir vizinho de
vizinho, provocando trágicos resultados. O que é necessário nos dias de hoje é uma
fundamental transformação em nossa compreensão do que significa ser humano. Não
devemos ter como base a nossa nacionalidade ou etnia. Não devemos observar a si
mesmos como inúteis ou escravos de nossos genes. Em nosso íntimo, somos
ilimitados e repletos de um imenso potencial. Como cada ser humano é uno com o
universo, cada um de nós tem um valioso e infinito poder! Há inúmeras pessoas que
sofrem terríveis ferimentos, amargas experiências e árduas circunstâncias como
resultado da discriminação. Enquanto reformas legais possam oferecer alguma
proteção contra tal comportamento, não é o suficiente para trazer felicidade
para todos, pois a fonte do preconceito está enraizada nos corações das
pessoas. Assim, enquanto o ser humano não modificar seu coração, a discriminação
irá continuar a se manifestar de diversas outras formas. É vital estabelecer no
íntimo de cada indivíduo uma nova e mais profunda visão de humanidade, uma que
enfatize a dignidade inerente e a igualdade de todos os seres humanos. Eu
acredito que a resposta mais correta para o problema da discriminação racial
reside na revolução humana, na profunda transformação interior que substitua o
egoísmo – que justifique o sub julgar do seu semelhante – por uma visão
compassível que nos faça respeitar a si e ao próximo, ao mesmo tempo que lute
pela coexistência pacífica entre todos os povos. A discriminação é
absolutamente maligna. Aqueles que são iludidos por este erro acabam
prejudicando a si e aqueles ao seu redor. Certa ocasião, um
estudante com limitações físicas perguntou-me como deveria enfrentar a
discriminação e maus-tratos. Meu conselho foi que ele deveria se tornar mais
forte. Isto também, é parte da luta em prol do reconhecimento do valor
indelével de cada indivíduo, a luta em prol dos direitos humanos. Fazer com que os nossos
direitos sejam reconhecidos pela sociedade não significa somente que as pessoas
devam ser complacentes por nossas causas. Devemos viver com dignidade e com
orgulho próprio, como indivíduos, independente de nossa condição. Aqueles que
nos desprezam ou caçoam (bullying ou assédio moral) são cruéis e agem de forma
errada, pois ignoram o nosso direito de sermos tratados como seres humanos. Por
esta razão, nunca devemos deixar que estes ataques nos derrubem. O
desenvolvimento do nosso caráter é a vitória dos direitos humanos. Eu sempre acreditei que
devemos reconhecer as diferenças e devido a isto, nos empenharmos ao máximo
para que possamos compreender uns aos outros como seres humanos. Aqueles que
apreciam as diferenças e descobrem a grandiosa beleza e as valoriza são mestres
da vida. A terra
nutre toda a humanidade, enquanto revitaliza todos sem distinção. Um vibrante
fonte de pura compaixão surge do solo e se formos capazes de fincarmos nossas
raízes neste manancial que engloba todos os seres vivos; então, as diferenças
superficiais de raça ou sexo não irão mais nos dividir, mas sim nos enriquecer.
http://www.maisbelashistoriabudistas.com.br. Abraço. Davi.
Fonte: Daily Mirror, 30 de novembro de 1998
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