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A FORÇA DO ESPÍRITO. O Dr. Abraham J. Twerski (1930- ) é o fundador e
diretor-médico emérito do Centro de Reabilitação Gateway, na Pensilvânia,
Estados Unidos. A entidade, especializada no tratamento de dependentes
químicos, é citada por publicações americanas como um dos doze melhores centros
para tratamento anti álcool e drogas do mundo. Ele é, também, um dos fundadores
do JACS (Jewish, Alcoholics, Chemically Dependent Persons and Significant
Others). Twerski tem 31 livros publicados, dois deles com ilustrações de
Charles M. Schulz, que trazem os personagens Charlie Brown e Snoopy. É o
fundador do primeiro programa da Pensilvânia para enfermeiras com problemas de
álcool ou drogas, denominado Nurses Off Chemicals - Enfermeiras Longe de
Substâncias Químicas. Também participou do Conselho Governamental sobre Drogas
e Abuso de Álcool e foi presidente do Comitê da Sociedade Médica da Pensilvânia
sobre Médicos Incapacitados. Em 1997, recebeu a maior honraria da Sociedade
Médica da Pensylvania, o The Distinguished Service Award, por sua dedicação no
combate à dependência química. Em 1988 foi agraciado pela Fundação Filantrópica
Católica com o prêmio Charitas. No entanto, antes de se tornar um dos maiores
especialistas dessa área, o dr. Abraham J. Twerski, ordenou-se rabino.
Descendente de quarta geração do líder chassídico Baal Shem Tov e filho de um
rabino, Twerski um dia percebeu que queria fazer algo mais, durante sua vida,
do que oficiar serviços religiosos e cerimônias de Bar Mitzvá. Sua experiência
como líder espiritual já lhe vinha mostrando que, às vezes, quando as pessoas
procuram um rabino para conversar, querem algo mais. Na verdade, estão em busca
de alguém que as ouça e que procure entendê-las, uma espécie de psicólogo. E
foi no estudo da medicina e da psiquiatria que foi buscar as respostas para
tentar compreender e ajudar os indivíduos, sem no entanto, abrir mão, a nenhum
instante, de sua formação religiosa e de sua herança judaica. Ao contrário, o
Rabino Twerski, já então com o título de médico, fez de sua bagagem espiritual
um dos principais instrumentos de seu dia-a-dia profissional. Sua crença no ser
humano e em sua capacidade de superar desafios, desde que encarados de frente,
são os princípios que norteiam o seu trabalho junto a dependentes de álcool e
de drogas. Sua fé em que a vida espiritual dos indivíduos – não importa qual a
sua religião é fundamental para a recuperação dos dependentes, é um dos pilares
que sustenta, há décadas, suas teorias. A maior prova da eficiência destes
conceitos são os resultados obtidos pelo Centro de Reabilitação Gateway e em
outras instituições que usam o seu método. Em entrevista concedida ao Projeto
Morashá, algumas horas, após a sua chegada a São Paulo, recentemente, Twerski
falou um pouco sobre os seus primeiros anos como médico. “Logo percebi que nem
a universidade, nem mesmo a especialização em psiquiatria, iriam mostrar-me
qual o melhor caminho para lidar com os dependentes químicos. Isso era algo que
eu iria aprender gradativamente, no contato com os pacientes, através de longas
conversas, tentando descobrir e entender as razões que os haviam levado ao
vício. Mesmo sem nem sempre entendê-los, percebi que era muito importante
ouvi-los, para então tentar conhecer o porquê e ajudá-los a trilhar o caminho
da volta”, lembra Twerski. Através do contato com os pacientes, o rabino
psiquiatra reafirmou sua certeza de que o caminho da sobriedade - ou o fim de
qualquer dependência - passa necessariamente pela motivação dos indivíduos e
pelo seu desejo autêntico de mudança. Sua crença nesse princípio fortaleceu-se
após um contato mais estreito com a Associação Alcoólicos Anônimos (AAA), em
1961, uma entidade de autoajuda criada em meados de 1930 por duas pessoas que
não conseguiam deixar de beber. “Eu sempre acreditei que a maioria das pessoas
possui personalidade, força e recursos suficientes para lidar com os desafios
da vida. Se falhamos, é porque não temos consciência da nossa capacidade e de
nossos recursos. No meu contato com os pacientes, sempre trabalho no sentido de
fazer com que descubram sua força e também mostrar-lhes que, às vezes, é
preciso buscar uma ajuda externa com pessoas com as quais possam compartilhar
suas experiências. Com isso, sentem-se iguais e não inferiorizados por estarem
nessa situação. Instituições como a AAA desempenham um papel muito importante neste
contexto, pois, além de estimularem a autoajuda, enfatizam a igualdade entre
todos os membros. Lá, todo mundo é igual, todo mundo tem um problema que pode
resolver e todo mundo precisa de ajuda. Isto se chama ‘compartilhar’ e, de modo
geral, as pessoas dependentes são solitárias. O fato de compartilhar traz
resultados positivos”. Segundo Twerski, no entanto, o processo de recuperação
deve ser ordenado para que os objetivos sejam atingidos. Foi dentro deste
espírito que elaborou um programa de “doze passos” que conduz a uma vida mais
feliz e realizada. O método não possui nenhuma base religiosa específica, porém
tem um componente espiritual, já que a oração e fé são essenciais para o
sucesso do tratamento. “Acho fundamental que as pessoas acreditem em alguma
coisa, que tenham crenças e procuro transmitir isso aos meus pacientes. Ao
pensar em cada uma das etapas do programa de recuperação, eu tinha um objetivo
definido: ajudar os indivíduos a corrigir sua visão distorcida da realidade e a
obter uma conscientização plena da mesma e de si próprios”, ressalta o rabino
psiquiatra. Ele falou, também, sobre o papel da família e do contexto social no
processo de recuperação dos dependentes do álcool e das drogas. Segundo
Twerski, é muito comum que as pessoas mais próximas dos viciados,
inconscientemente, mascarem a realidade, preferindo ignorar a gravidade da
situação. “Este é um comportamento que só prejudica a todos. Por mais doloroso
que seja, é preciso enfrentar a situação e fazer com que o dependente confronte
a si mesmo e àqueles com os quais convive. O relacionamento sincero e aberto
entre todos os envolvidos, fazendo inclusive com que o dependente ouça e sinta
como seu comportamento afeta e preocupa os demais, é um dos pontos de partida
para o processo de recuperação. Sabemos que isto é muito difícil,
principalmente porque, em geral, o dependente não admite que tem o problema e
não reconhece sua impotência diante do elemento de dependência. Se conseguirmos
fazer com que ele aceite esse fato, o caminho já começou a ser trilhado”. O
caminho, no entanto, enfatiza Twerski, é longo e penoso e não termina nunca,
pois cada dia é um novo dia e os indivíduos não devem jamais se desviar de suas
metas. É neste processo constante de busca da sobriedade, que afirma ele, a crença
na força interior, uma vida espiritual rica e a fé são fatores de grande
importância. Em seu livro “Despertando na hora certa”, ele afirma que “as doze
etapas do programa são como degraus de uma escada que devemos estar
constantemente subindo, sempre reexaminando e colocando tudo em discussão.
Assim, percebemos tudo o que há de melhor em nós e damos o máximo possível de
nós mesmos”. Este programa, segundo Twerski, pode ser aplicado a qualquer tipo
de dependência, não apenas química, pois tudo que passa de um determinado
limite e que não pode mais ser controlado pelo indivíduo torna-se um vício.
Quando questionado se até a Internet não se encaixa nisto, respondeu que
provavelmente sim e mencionou o fato de ter descoberto, recentemente, um site
sobre este tema - netaddiction.com. “O ponto fundamental quando se analisa a
questão da dependência é justamente o que se refere à falta de controle. Ou
seja, quando o elemento da dependência exerce tanto controle sobre os
indivíduos que provoca mudanças significativas de comportamento, como
agressividade e até lapsos de memória. É aí que se deve estar atento e não
relevar qualquer mudança”. Como evitar comportamentos autodestrutivos. Especial
para a Revista Morashá meu envolvimento no tratamento de alcoólatras tem sido
uma forma de aprendizado muito valiosa. Indivíduos que levam a sério sua
recuperação, e que fazem grandes esforços para eliminar em seu caráter as
falhas que marcaram sua história com a bebida, podem ser vistos como uma rica
fonte de mussar - disciplina. São exemplos vivos do que deve se fazer para
evitar comportamentos autodestrutivos. Se substituirmos a palavra avera -
transgressão - por álcool, podemos ver que existe uma similaridade muito grande
entre um programa efetivo de recuperação para alcoólatras e muitos dos
ensinamentos do mussar. É muito comum, por exemplo, ouvir de um alcoólatra que
conseguiu se recuperar, a afirmação de que “na vida não há coincidências.
Coincidências nada mais são do que milagres nos quais D’ us quis ficar
anônimo”. A transição do alcoolismo para a sobriedade requer que o indivíduo
aceite o quanto ele tem sido impotente perante certos aspectos de sua vida. Ao
se conscientizar de sua própria falta de poder, ele poderá então aceitar a
existência de uma Força Superior. Ao mesmo tempo em que temos livre arbítrio
para termos comportamentais e morais, devemos compreender que existem muitas
coisas que são obras de D’us. Muitos acontecimentos em nossas vidas parecem ser
“fenômenos naturais”, mas na realidade são atos de D’us nos quais Ele prefere
permanecer anônimo. A Torá é repleta de milagres, mas é importante notar que
nem todos são comemorados. Não temos uma festa para celebrar a ocasião na qual
o profeta Yoshua parou o sol e a lua, para que o Povo de Israel pudesse
continuar guerreando numa sexta à noite, sem violar o Shabat. Mesmo Pessach é
celebrada como a Festa da Liberdade, e não como a Festa dos inúmeros milagres
descritos na Torá. Chanucá e Purim são celebradas como as Festas dos Milagres
porque os acontecimentos de ambas ocasiões podem ser facilmente interpretados
como eventos naturais. Afinal, não há nada de excepcional na história de um rei
bêbado se livrar de sua rainha e casar-se com uma mulher mais jovem que acaba
defendendo a causa de seu povo. O triunfo dos Macabeus, celebrado em Chanucá,
pode ser visto como o sucesso de guerrilhas numa luta. Mas, estes
“acontecimentos naturais” devem ser compreendidos como intervenções Divinas.
Mesmo se D’us preferiu permanecer anônimo em tais situações, não devemos
permitir que assim sejam considerados. Você deve estar se perguntando por que
um psicanalista está escrevendo sobre um assunto que a rigor deveria ser
deixado para os rabinos? Porque enquanto há ansiedades patológicas que requerem
tratamento médico ou psicológico, também há muitos tipos de estresse que são
decorrentes da realidade que nos cerca. Estes são acompanhados por ansiedade e
tensão que na realidade são respostas normais para eventos ou acontecimentos
que nos incomodam, nos pressionam e nos estressam. São condições normais que
não exigem “tratamento”. Este tipo de ansiedade pode ser atenuado pelo apoio de
amigos com os quais podemos contar, e pela segurança que podemos ter através da
fé e da confiança em D’us (emuná e bitachon). Devemos sempre lembrar que D’us
está “tomando conta” e que Ele é Infinitamente Bom. Um paciente cuja insônia
era resultante de uma situação que o deixava muito estressado me disse: “Eu
finalmente consegui dormir quando percebi que D’us está sempre acordado, e que
não há necessidade que ambos façamos o mesmo”. Tranquilizantes são remédios e
estes só servem em caso de doenças. Porém, quando as realidades de nosso
cotidiano nos deixam insatisfeitos e podem nos causar ansiedade e tensão, não
devemos recorrer imediatamente a medicamentos. Talvez, confiar em D’us e se
apoiar em um amigo que nos ouça e que compartilhe conosco nossa angústia, não
sejam “tratamentos”, mas acreditem, podem ser atitudes de extrema eficácia. www.morasha.com.br.
Abraço. Davi
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