Budismo. www.budavirtual.com.br.
Texto de Jetsunma Tenzin Palmo (1943- ).
II. A PRÁTICA DA MEDITAÇÃO E SABEDORIA NO COTIDIANO. Prajna Paramita, Ou
SABEDORIA. Demos uma olhada em shamatha, essa ideia de deixar a mente mais
quieta e calma, mais concentrada. Também consideramos o fato de que shamatha
ajuda a mente a enxergar o fundo do lago. Mas ela não remove o lodo, não remove
todo o lixo e todas as ervas daninhas que estão no fundo. Quando eu estava em
Lahaul, fora da minha caverna, havia uma área plana que parecia um pátio. Era
de terra endurecida e na superfície havia moitas de florzinhas bonitas.
Quando chovia, tudo ficava barrento, e decidi assentar algumas pedras grandes e
planas. Isso significava que eu teria que arrancar as florzinhas. Decidi que a
única maneira de me livrar daquelas flores delicadas era não apenas cortá-las,
mas arrancar todas as raízes para que não crescessem novamente. Imaginei que
puxaria e elas sairiam. Porém, quando comecei a rastrear às raízes das
florizinhas, descobri que literalmente estendiam-se por todo o pátio. Estavam
espalhadas e interconectadas em uma enorme rede subterrânea, embora apenas
algumas pequenas moitas fossem visíveis na superfície. As ervas daninhas da
nossa mente são assim. Além de tudo, parecem atraentes. ”Ah, eu amo chocolate”
ou ”Eu adoro roupas novas”. Tão inocente. Mas essas raízes de nosso desejo são
profundas e grossas, espalham-se e estão na base de tudo. Esse é o problema.
Essas raízes de negatividades, nossas ilusões, nossa má vontade e nossa
ganância são tão profundamente arraigadas em nossa mente que permeiam tudo, e muitas
vezes nem sequer as reconhecemos pelo que realmente são. Podemos questionar
para que arrancá-las fora. Puxamos, um pouco aqui, cortamos e aparamos um pouco
ali, mas não enfrentamos esse sistema de raízes penetrantes. A mim parece que a meditação vipassana lida com a mente em duas
frentes que, ao fina, se unem na realização da natureza vazia da mente.
Primeiro, lidamos com o fato de que nossa mente é permeada por impulsos
negativos muito profundos, que criam muita dor e muitos problemas em nossa vida,
para nós mesmos e para os outros. Além disso, há toda a questão de quem afinal
experimenta essa doer e esses problemas. Trataremos disso resumidamente, pois é
um assunto vasto. Por meio da pratica de shamatha, nossa mente
se acalma. E, à medida que a mente se aquieta, o fluxo de pensamentos passa por
3 estágios. Primeiro é como uma cachoeira, uma queda d’água estrondosa. Depois,
torna-se como um rio turbulento, tornando-se gradualmente mais plácido conforme
vai correndo. Eventualmente o rio deságua no oceano. Talvez em nossa prática de
meditação da permanência serena, nossa mente tenha chegado ao ponto em que não
é mais uma cachoeira, é como um rio correndo calmamente. Neste ponto não
precisamos entrar no oceano de samadhi, ou absorção profunda. Isso não é
tão importante. Precisamos apenas deixar a mente mais quieta, precisamos apenas
adquirir a capacidade de nos concentrarmos em um único ponto, ter concentração
uni direcionada. Essas duas condições são necessárias, mas não precisamos ficar
em um estado sem quaisquer pensamentos. Anteriormente, como estávamos
desenvolvendo a concentração uni focada, ignorávamos os pensamentos. Não
dávamos qualquer atenção a eles. Dávamos atenção ao ponto focal de nossa
concentração, que era a respiração. Agora, no entanto, aplicamos a concentração
aos próprios pensamentos. Pode-se dizer que isso é como alguém sentado na beira
de um rio apenas observando- o fluir. Não tentamos represar o rio, ou alterar
seu fluxo de forma alguma, estamos apenas sentados as margens de nosso rio
mental, observando os pensamentos fluírem. Não tentamos interferir. Não fazemos
nada a respeito. O importante é não ficarmos fascinados ou sermos capturados
pelos pensamentos – ”Óh! que ideia interessante”. Hmm sim certo”. – e no minuto
seguinte nossa mente é carregada rio abaixo. Precisamos apenas observar os
pensamentos fluindo. No entanto, se observamos a mente muito tensos, mantendo
todos pensamentos, acabamos nos desequilibrando. O mestre zen Suzuki Roshi
(1904-1971) disse que a maneira de controlar uma vaca é dar-lhe um amplo pasto.
Quando tentamos desenvolver as qualidades da consciência, da atenção plena e da
observação da mente, é muito importante dar a mente um bom pasto bem amplo e
não a mantendo muito apertada. Essa tensão extrema não é o que desejamos. Em
vez disso, queremos a sensação de permitir que nossos pensamentos venham e
flutuam, e, enquanto isso, tomamos conhecimento, observamos, vemos os
pensamentos, e se perderemos alguns não faz mal. Assim,
esta é a etapa que vem depois de termos praticado com a respiração, ou algum
objeto a nossa frente. Quando os pensamentos se acalmaram um pouco e não estão
caóticos, e quando o foco, a concentração e a consciência se tornaram um pouco
mais fortes e bem definidos, aí sim levamos a atenção da respiração para a
própria mente. Segundo a psicologia budista, não podemos ter dois pensamentos
ao mesmo tempo. Dois estados mentais não podem surgir em nossa consistência ao
mesmo tempo. Os estados mentais são incrivelmente rápidos, e no entanto,
sequenciais. Portanto, a medida que temos mais momentos de consciência, temos
menos momentos de pensamento discursivo. Os pensamentos começam a desacelerar,
começa a haver menos pensamentos, [..] quando chegamos a esse ponto, começamos
a desenvolver o que é chamado de insight. Começamos a usar essa inteligência
para observar a própria mente. Como eu disse antes, vivemos a partir da
mente, experienciamos qualquer coisa apenas por meio da mente. No entanto, não
a conhecemos. Nunca olhamos para ela. Dizemos ”Eu acho”, ”eu me lembro”, ”na
minha opinião”, ”meu julgamento é”. Estamos cheios de julgamentos, intenções,
ideias, pensamentos, fantasias, sonhos e memórias, mas o que é um pensamento?
Qual a sua aparência? De onde vem? Onde permanece? Para onde vai? Qual é a
sensação? Se parece com o que? ”Estou com raiva”, ”Estou feliz”, ”estou triste”
– que aparência tem uma emoção? De onde vem? É dessa forma que usamos a mente
para olhar para ela mesma. Tentamos ver o que é um pensamento – qual a sua
aparência. O que é? Podemos pensar a respeito de um pensamento, mas podemos
realmente experienciá-lo? Podemos continuar a investigar
a mente. ”Tudo bem, há momentos em que há pensamentos. E depois há momentos em
que não há pensamentos”. É igual ou diferente? E que tal a consciência que observa
os pensamentos – a consciência é igual aos pensamentos ou é diferente? E a
consciência se parece com o que? Podemos ver o observador? Podemos observa-lo?
E então, é claro, podemos nos fazer a pergunta das perguntas:
”’Quem é o observador?”. Não vou dar a resposta a vocês! Nós dizemos: ”Eu
acho”, ”eu me lembro”, ”eu gosto”, ”eu não gosto”, ”sou boa pessoa” ”sou má
pessoa, mas quem é esse ”eu”? Nunca nos questionamos, nunca olhamos. Isso é
essencial, porque estamos agarrados às nossas identificações, o que nos causa
confusão e angústia. Nós nos identificamos
primeiramente com o corpo que temos neste momento: ”Eu sou uma mulher”, ”eu sou
um homem”, ”eu sou branca, ”eu sou negra”, ”eu sou europeia” ”eu sou americana,
”eu sou bonita”, ”eu sou feia”, ”eu sou gorda, ”eu sou magra”, esta sou eu”.
Mas é claro que não somos os nossos corpos. […]. Nos identificamos com nossos
pensamentos, com nossas opiniões e com nossos julgamentos, e nos identificamos
com nossas memórias, especialmente as tristes, especialmente as difíceis. Nos
agarramos, e nossa identidade orbita em torno do sofrimento. Somos seres tão
perversos, mas, quando olhamos para nossa mente, vemos que as memórias são
apenas pensamentos – e isso é tudo. Os eventos que estamos recordando
terminaram, aconteceram anos atrás. Não estão aqui, não existem. Tudo o
que nos restou são os pensamentos, mas, quando olhamos para os pensamentos
vemos que eles, em si mesmos, são bastantes transparentes. Um pensamento não é
uma coisa. Então por que nos identificamos tanto com eles? Nossas percepções criam a realidade que percebemos. Mas é claro
que isso não quer dizer que a totalidade de fenômenos externos é puramente
ilusão. Os tibetanos dizem que é como uma ilusão porque projetamos e não
estamos conscientes de que é uma projeção nossa. Uma vez que nossas percepções
são impuras e distorcidas pelo ego, não vemos as coisas como são, percebemos
apenas a nossa própria versão, baseada na delusão (engano). Estamos olhando para a mente. Estamos olhando para o fluxo de
pensamentos. Enquanto observamos os pensamentos e a consciência está em firme,
os pensamentos começam a desacelerar. É como um filme: se começa a ser passado
mais devagar e mais lentamente, reconhecemos quadro por quadro em vez do filme
projetado. Da mesma forma, se nossa consciência é clara e firme, os pensamentos
começam a desacelerar e podem ser reconhecido como unidades interligadas. E,
quando nossa consciência estiver muito clara, pode acontecer o fluxo de
pensamentos ser interrompido por uns instantes, havendo um intervalo entre o
último pensamento e o seguinte. Quando existe esse intervalo, o observador se
funde diretamente com aquilo que está subjacente ao pensamento, a natureza de
clara luz da mente. Neste momento, surge a intuição direta e a realização da natureza
da mente- não dual, não conceitual, não condicionada, além dos pensamentos.
Não somos capazes de pensar sobre isso, mas podemos experienciar. Neste tipo de meditação, a ideia é conseguir o maior número
possível de lampejos de visão não dual como esses e prolonga-los. A medida que
a mente repousa naturalmente nessa consciência não nascida com mais frequência
e por períodos mais longos, ao final o praticante irá permanecer nesse estado
desperto o tempo todo. É um nível de consciência que não tem fronteiras. Não
existe o eu e o outro. O céu não tem centro e o céu não tem circunferência, é
ilimitado. O céu permeia tudo, não apenas o espaço acima de nós, mas todos os
lugares. É o espaço. Sem o espaço, não poderíamos ser nada porque o espaço é
tudo. Quando falamos sobre o nosso verdadeiro eu, temos a ideia de alguém
sentado dentro de nós – maior, o melhor e mais maravilhoso eu. Mas não é disso
que estamos falando, de maneira alguma. Quando realizamos a verdadeira natureza
do nosso ser, onde está o ”eu”, onde está o ”outro”? Quanto ao espaço,
não posso dizer que este é o meu espaço e aquele é o seu. É apenas espaço. E a
verdadeira natureza da mente é assim. E essa natureza pode ser
experienciada e realizada. É a mente de um buda. E esta qualidade vasta e ampla
da mente está preenchida com todas as qualidades de sabedoria, compaixão e
pureza. É a clara consciência por trás do funcionamento dos nossos sentidos que
nos permite conhecer as coisas, que ilumina nosso pensamento e nossas emoções.
Por trás do movimento da mente conceitual está o vasto conhecer silencioso. É
tão simples. Mas não acreditamos. E de fato é triste que isso escape-nos.
Ignoramos a simplicidade que está a nossa frente. Isso pode parecer muito frio,
mas, as vezes, quando olhava nos olhos das outras pessoas ao meu redor, podia
ver que estavam extremamente envolvidas com o que ouviam, viam e pensavam, e
que não havia qualquer espaço interno. Por conta disso, suas mentes eram muito
turbulentas, assim como minha própria mente também costumava ser. Uma compaixão
imensa brotou dentro de mim porque entendi nossa situação difícil de forma
muito clara. A compaixão genuína surge do insight.
Normalmente, quando olhamos e quando experimentamos alguma coisa, acreditamos
para valer no que estamos vendo e experimentando. Ficamos envolvidos. É como se
não houvesse espaço interno. Porém, quando desenvolvemos a consciência pura,
não ficamos mais submersos em nossos pensamentos. A consciência está sempre por
trás do pensamento, e dos sentimentos. E assim nós praticamos.
Praticamos a habilidade de dar um passo atrás para ver os pensamentos memórias,
sentimentos e emoções apenas como pensamentos, memórias e sentimentos,
meramente como estados mentais, e não como algo sólido ou real. ”Eu” e
”meu” são apenas estados mentais. Eles vêm, permanecem por um tempo e vão. Isso
é tudo o que realmente está acontecendo, mas por não termos espaço em nossa
mente, não conseguimos ver. A meditação nos permite ter espaço para ver que
pensamentos e sentimentos não são algo sólido, opaco. São vazios em sua
natureza, como uma bolha. Não podemos agarrá-los. Se olhamos para o pensamento
em si, ele evapora. Em última análise, esta é a maneira mais hábil para
lidarmos com as emoções, porque, quando qualquer emoção vem à tona, podemos
olhá-la diretamente e, no momento em que a vemos, ela simplesmente desaparece.
Tomemos uma emoção negativa como a raiva, por exemplo. No exato instante em que
o pensamento de raiva se transforma espontaneamente em uma forma sutil de
energia clara e aguda. Os venenos da mente, em suas raízes, são uma fonte de
grande energia de sabedoria. O problema é que permitimos que se desenvolvam sem
reconhecê-los, e surgem em formas muito distorcidas, como ganância, raiva e
ciúme. Contudo, se conseguimos pegá-los no exato momento em que emergem na
consciência, têm vibração e clareza. É uma forma extremamente clara de energia.
Nos ensinamentos mais elevados se diz que quanto maiores as nossas
impurezas emocionais, maior a nossa sabedoria. Entretanto, até que possamos
pegar o pensamento em sua forma incipiente, no momento em que nasce – a menos
que possamos fazer isso e transformá-lo naquele instante -, será melhor tentar
lidar com as emoções negativas de outras maneiras. Porém, uma vez que possamos
fazer isso, uma vez que tenhamos essa consciência poderosa que você as coisas
de forma clara a cada momento, não há nada a temer, porque cada
pensamento que aparece é transformado em energia de sabedoria. Nos textos tibetanos é dito: ”Olhe, onde está a mente? Está no
estomago? Está no pé? No coração?”. Nesses textos, nunca se pergunta: ”Está na
cabeça?” Não é interessante? Talvez nunca tenha ocorrido a eles que fosse
possível a mente estar na cabeça. Certa vez, lembro que meu lama, Khamtrul
Rinpoche, disse que era muito curioso que os ocidentais pensarem que a mente
está na cabeça. Disso que o cérebro está na cabeça, mas o cérebro não é a
mente. ”Já sabemos muito sobre o cérebro, mas ainda não encontramos a mente”,
disse um famoso neurocirurgião. Quando os ocidentais, que dão muito valor a cabeça,
meditam, acontece frequentemente de a meditação ficar localizada na cabeça. Às
vezes, as pessoas, tem dores de cabeça por causa disso. Se alguém me dissesse: ”Eu sei que esta manhã você roubou minha
carteira. Você é uma ladra!”. Eu diria: ”Quem? Eu?”, e apontaria para meu
peito. Eu não diria ”Quem? Eu?”. Apontando para cabeça. A perfeição da
sabedoria tem a ver com a qualidade de vacuidade. Os budistas falam muito
sobre a vacuidade. Porém, quando os budistas dizem que tudo é vazio, estão falando
basicamente de 2 coisas: uma é que nada existe por si mesmo, nada existe em si
e por si só. Tudo pode surgir apenas em relação com todo o resto. É bastante
óbvio. Não podemos pensar sobre a escuridão a menos que pensemos sobre a luz.
Não podemos ter a esquerda a menos que tenhamos a direita. Só podemos pensar em
termos relativos. A filosofia ocidental também lida com isso. Existem
estudiosos na tradição budista que analisam tudo em termos de seus componentes.
Esse relógio, por exemplo. Se eu disser: ”O que é isso?” Vocês vão responder ”É
um relógio”. Então podemos questionar: ”Qual parte é o relógio?” A da frente? A
de trás? A pulseira? O mecanismo interno?”‘ . Continuamos investigando para
tentar encontrar a ”relogiedade”, o que faz o relógio um relógio, mas nunca
poderemos encontrar o relógio em si. É apenas um rótulo que damos a uma
combinação de muitas coisas. A coisa em si não existe. É vazia de
existência intrínseca. Nunca conseguimos encontrar a coisa em si e por si. Tudo
o que vemos e experienciamos é um rótulo convencional. As pessoas passam 30
anos estudando esta abordagem. Vocês têm sorte – conseguiram em apenas algumas
frases! O outro significado de vacuidade é o que abordamos anteriormente,
essa qualidade de espaço de todas as coisas que permite que sejam preenchidas,
mas aquilo que preenche é intrinsecamente vazio. E isso se aplica também a e
mente. Os filósofos e estudiosos passam muitos anos analisando a realidade
externa. Os iogues analisam a realidade interna. Durante
minha primeira lição de meditação com o meu velho professor iogue, ele apontou
para uma mesinha e perguntou ”Aquela mesa é vazia?”. ”Sim”, eu disse. Tinha feito meus estudos budistas. ”Você vê que ela é vazia?”. ”Não”, respondi. ”Sua mente é vazia?”. Disse ele. ”Sim”, disse, com um pouco mais
de confiança. ”Você vê que ela é vazia?”. ”Não”. […] uma vez entendida a vacuidade da mente, entendemos
tudo. Quando realizamos a natureza da mente, não apenas pensamos a respeito,
mas vemos diretamente como ela funciona e como projeta a realidade externa.
Considere que qualquer físico diria que esta mesa é basicamente
vazia. É espaço com uns prótons e nêutrons esvoaçando. Mas não vemos assim.
Nossa experiência não é essa. Experienciamos a mesa como algo muito sólido. Ela
pesa quando tento erguê-la. Embora essa seja a minha experiencia, não é assim
que um físico vê a matéria, não é? Portanto, o que estou experimentando é o que
a minha mente projeta. Agora, se eu tivesse sentidos muito diferentes e um tipo
diferente de mente, é provável que experienciasse a mesa de uma forma
completamente distinta. Se fosse um daqueles insetos que fazem furos na
maneira, minha percepção da mesa seria diferente, mas também seria real. Para o
cupim, seria real. Nós acreditamos em nossos
sentidos, temos uma espécie de consenso e conspiração para ver as coisas
conforme nossas percepções sensoriais nos apresentam. Está ótimo, porque é
assim que funcionamos, e não há nada de errado com isso em um nível relativo. É
assim que estamos equipados para lidar com a vida em um plano convencional. Mas
o problema surge quando pensamos que isso é verdadeiro. O problema surge porque
acreditamos que nossos pensamentos condicionados estão nos dizendo a verdade.
Acreditamos implicitamente em nossas identidades muito
transitórias. O problema não é o ego – o problema é nossa identificação com o
ego. A solução é saber que estamos apenas desempenhando um papel, como um ator.
Para ser convincente, o ator precisa desempenhar o papel de forma mais
persuasiva possível. O ator se identifica com o papel. Mas que problemão se o
ator sai do palco e pensa que ainda é o personagem! O termo ”personalidade” vem
da palavra latina persona, que era a máscara que os atores usavam no palco para
representar os diferentes personagens. O problema é que nunca tiramos as nossas
máscaras, mesmo na privacidade do nosso quarto. Pensamos: ”Este é quem
realmente sou”. […] Por trás de tudo com o que nos identificamos está a
consciência vasta e aberta que não é apenas o conhecimento, mas é em si a
plenitude da sabedoria e compaixão. Sabedoria significa vermos as coisas como
realmente são. Compreendemos as coisas com clareza, sem distorções. Quando
falamos sobre sabedoria e vacuidade, não nos referimos a algo frio e distante.
Esta consciência ampla e aberta contém tudo. A mente de Buda é vazia, por
isso, pode estar repleta de todas as qualidades. Estamos plenos de todas as
qualidades do Buda. Neste momento, elas estão apenas encobertas pelo
esquecimento. A única maneira de descobri-las é olhar para dentro e começar a
remover os falsos véus que cobrem o que sempre esteve presente, esperando ser
encontrado. “Vocês têm a oportunidade de treinar a
mente. Não estão pensando o tempo todo em como poderão conseguir a próxima
refeição para os seus filhos. Têm tempo livre e oportunidade para pensar além.
Vocês nunca terão um momento melhor do que este de agora para usar esta vida de
maneira significativa”. “A compaixão é extraordinariamente importante no
caminho espiritual. É o outro lado da moeda — temos a sabedoria e a compaixão.
Quanto maior a compreensão da dor inerente aos seres — quanto mais clara se
torna a mente, como se limpando a poeira dos olhos —, mais se vê a dor
subjacente à vida das pessoas e mais compaixão surge. Mesmo que as pessoas não
aparentem explicitamente estar sofrendo, vemos que por trás da fachada há muita
dor e muitos problemas.
Naturalmente, então, surge a compaixão
e uma nutre a outra. Compaixão sem sabedoria é estéril, é cega. É como ter
pernas, mas não ter olhos. Sabedoria sem compaixão é como ser mutilado, não se
consegue ir a lugar algum. Então, precisamos das duas e elas se apoiam
mutuamente, porque não apenas o intelecto tem que estar aberto, mas também o
coração. Elas são indivisíveis. Sabedoria e compaixão são como duas asas. Não
conseguimos voar com uma só”. — Tenzin Palmo, em “No Coração da Vida”. Estes textos acima fazem parte
do livro ‘No coração da vida: Sabedoria e compaixão para o
cotidiano”. O primeiro livro de Jetsunma Tenzin Palmo em português. Para
adquirir, clique aqui. Trata-se de um verdadeiro presente e
oportunidade ter uma obra destas em português. O conteúdo deste livro
refere-se a praticantes comuns preocupados em traduzir as instruções do Dharma
para uma experiência de vida em andamento. Um aspecto importante do Dharma
trata da transformação de nossa mente e atitudes ordinárias em algo altamente
positivo, que traga benefícios não só para nós mesmos, como para todos que
tenham contato conosco. O problema básico que encaramos é como mudar uma mente
cheia de pensamentos e emoções negativos – ganância, raiva, ansiedade, inveja e
por aí vai – em uma mente mais pacífica e cordial, com a qual seja um prazer
para todo mundo (inclusive nós mesmos) viver. Este livro estabelece de forma
simples alguns indicadores para ajudar praticantes comuns a usar o Dharma para
levar uma vida mais significativa. Nossa mente, com seu fluxo
incessante de pensamentos, memórias, opiniões, esperanças e medos, é nossa
companhia constante, da qual não conseguimos escapar nem mesmo em sonhos. Assim,
faz sentido cultivar para nossa jornada uma companhia de viagem que valha a
pena. www.budavirtual.com.br.
Abraço. Davi
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