segunda-feira, 28 de novembro de 2016

VII. DIREITO ISLÂMICO. I, DIREITO DO INDIVÍDUO SOBRE O ESTADO.



Islamismo. Monografia de Zuha Mohd El Hanini. NOÇÃO DE DIREITO ISLÂMICO. Capítulo II. DIREITO DO INDIVÍDUO SOBRE O ESTADO. No Estado Islâmico, é reservado ao indivíduo um papel tão importante quanto o Estado, uma vez que ele não é absorvido por este, mas evolui juntamente buscando o bem estar comum, e trabalhando em prol da preservação e aplicabilidade correta dos princípios e direitos islâmicos. Não há conflito entre Estado e indivíduo, exceto quando um destes se desviar do caminho do Islam que ambos se propuseram a submeterem-se. O indivíduo tem direitos amplos, uma vez que a função do Estado Islâmico é preservar e aplicar o disposto pelo Islam. Em suma podemos dizer que: O estado é o meio importante para o indivíduo ter prazer em desfrutar dos direitos sem a necessidade de o Estado induzi-lo a esse direto. Como forma de análise e estudo, podemos dividir os direitos do indivíduo sobre o Estado em duas categorias: os Direitos Políticos e os Direitos Públicos. Direitos Políticos: Os Direitos Políticos são: Os direitos que uma pessoa adquire em razão de se tornar membro de uma organização política, tais como o direito de eleger, nomear, de exercer função pública no governo, ou os direitos por meio dos quais uma pessoa participa das decisões e gerência nos assuntos do governo. Vejamos os direitos políticos contidos no Direito Islâmico: Direito de Eleger o Chefe do Estado (Khalifah): Aqui vale ressaltar a posição do Chefe de Estado num Estado Islâmico, antes de explanarmos este direito. O chefe do Estado ou Khalifah é o representante da comunidade que o elegeu com a finalidade de gerir seus assuntos em conformidade com a lei islâmica, implantando vários regulamentos dela derivados, ou seja, trata-se de pessoa delegada, que exerce sua autoridade em nome da comunidade. Os juristas explicam isso dá seguinte maneira: Aquele sob cuja liderança os muçulmanos coesos juram fidelidade, tem confirmada a sua condição de Líder e lhe passa ser obrigatoriamente devida obediência e apoio. Desse modo, poderíamos dizer que a comunidade num Estado Islâmico é a fonte de poder, mas aqui ressaltamos que o poder da comunidade é limitada e restrita pelo poder ilimitado de Deus. A vontade de Deus está prescrita nas Leis por Ele ditadas em relação tanto ao indivíduo quanto à organização do Estado. Portanto, nem a comunidade nem o representante tem autoridade ou poder para modificar este sistema pré-estabelecido, sua autoridade consiste no poder de cumprir com o sistema estabelecido por Deus. Em outras palavras, podemos afirmar que tanto a comunidade quanto o Chefe de Estado possuem uma autoridade executiva para a implantação da Lei Divina e não uma autoridade outorgada para criação e implantação de um novo código. Portanto, como vimos, o indivíduo como membro da comunidade, tem o direito e dever de eleger, de forma direta, o Chefe de Estado, derivando estes de dois princípios ditados pela Lei Islâmica: O primeiro é o Princípio da Consulta Mútua (Shura): Este princípio é ditado pelo Alcorão Sagrado, no seguinte versículo “(...) que resolvem seus assuntos em consenso (...)”. Capítulo 42 versículo 38. Esse versículo deixa claro o fato de que os assuntos dos muçulmanos devem ser resolvidos através do consenso. Neste caso específico, esse princípio exige que todos deem sua opinião sobre quem desejam eleger como Chefe de Estado. O segundo princípio da Responsabilidade Coletiva de Implantar a Lei Islâmica, segundo este, toda a coletividade é responsável pela implementação das leis e mandamentos islâmicos e pela condução de seus assuntos de acordo com essas leis. Essa responsabilidade é reiterada em todo o Alcorão Sagrado bem como nos ditos do Profeta Muhammad (que a paz esteja com ele) e nos precedentes históricos. As palavras do Legislador, Deus, são dirigidas aos muçulmanos como um todo: Ó fieis, sede firmes em observardes a justiça, atuando de testemunhas, por amor a Deus, ainda que o testemunho seja contra vós mesmos, contra os vossos pais ou contra os vossos parentes, seja o acusado rico ou pobre, porque a Deus incumbe protege-lo. Portanto, não sigais os vossos caprichos, para não serdes injustos; e se falseardes o vosso testemunho ou vos recusardes a prestá-lo, sabei que Deus está bem inteirado de tudo quanto fazeis. Alcorão Sagrado capítulo 4 versículo 135. Ó fieis, cumpri com as vossas obrigações, capítulo 5 e versículo 1. E que surja de vós uma nação que recomende o bem, dite a retidão e proíba o ilícito. Esta será uma nação bem aventurada, capítulo 3 e versículo 104. Esses versículos indicam claramente que se trata de uma responsabilidade tanto individual como coletiva, mas em diversos casos, o grupo não saberá exercer suas funções enquanto grupo, por isso vem a questão da delegação do poder a um Chefe do Estado para unificar o desempenho da autoridade do grupo. Direito de Consulta Mútua: Na verdade o direito de participar da consulta mútua trata-se de uma extensão do direito de eleger, refere-se a um direito natural tanto do indivíduo como da comunidade de ser consultado sobre questões que lhe digam respeito bem como sobre as implementações quanto às regras que lhe afetarão de algum modo. A consulta mútua não se trata de mero direito, mas principalmente de uma obrigação individual e coletiva, uma vez que é um mandamento da lei islâmica, que proíbe a comunidade de se eximir de tal dever bem como proíbe a sua dispensa ou omissão por parte do Chefe do Estado, a ponto de ser isso causa justa inclusive para a sua destituição, pois um governo tirano não tem possibilidade de sobreviver num Estado estabelecido com base no Islam. Quanto ao texto Alcorânico referente à consulta, está o seguinte versículo: Portanto, indulta-os, implora o perdão para eles e consulta-os assuntos (do momento). E quando te decidires encomenda-te a Deus, porque Deus aprecia aqueles que (a Ele) se encomendam. Alcorão Sagrado capítulo 3 versículo 159. Neste versículo, Deus ordenou ao Profeta Muhammad (que a paz esteja com ele) aplicar a consulta mútua, sendo este suficiente argumento para que tal regra seja cumprida pelo Chefe do Estado. O grande jurista islâmico Ibn Taymiya apud Zaidan afirma: Um governante não pode omitir-se da consulta mútua uma vez que esta prática foi ordenada por Deus ao Seu próprio Profeta. A consulta mútua refere-se a assuntos de grande importância a todos, seja assuntos religiosos como mundanos, a respeito dos quais não haja uma revelação clara ou ditos do Profeta, bem como exemplos na biografia do Profeta a respeito do fato em si, ou algo que possa ser utilizado como analogia. Não é necessário que haja a aplicabilidade desse direito em assuntos nem razoável. Se for um assunto de grande importância pública  e que afete a toda a comunidade será dever do Chefe de Estado consultar na medida do possível a comunidade inteira ou somente os representantes desta. Já se for um assunto que requeira um conhecimento específico ou opinião abalizada, então será seu dever consultar os especialistas. Al Qurtubi apud Zaidan, grande especialista na interpretação do Alcorão Sagrado, disse: É dever dos governantes consultar os sábios sobre assuntos que lhes sejam desconhecidos e assuntos religiosos que não lhes estiverem claros, os líderes do exército em assuntos relacionados com a guerra, e aos líderes do povo em assuntos relacionados com o bem estar do país e seu desenvolvimento. Os juristas islâmicos afirmam que a qualificação de um consultor em assuntos de religião é ser pessoa piedosa e sábia quantos aos fundamentos da religião, já quando se tratar de assuntos mundanos a qualificação do consultor é ser experiente e sábio quanto à área a ser consultado. Se chegar a ocorrer divergência entre o Chefe de Estado e os consultores, a solução será a do seguinte versículo do Alcorão Sagrado: Ó fieis, obedecei a Deus ao Mensageiro e as autoridades, dentre vós! Se disputardes sobre qualquer questão, recorrei a Deus e ao Mensageiro, se crerdes em Deus e no Dia do Juízo Final, porque isso vos será preferível, e de melhor alvitre, parecer, capítulo 4 e versículo 59. Ou seja, se for encontrada uma regra clara no Alcorão ou na Sunnah , a obediência a estas é compulsória (obrigatória), tanto a comunidade quanto ao Chefe de Estado, não sendo permissível a nenhum destes aplicar ou obedecer algo contrário a esta regra. Caso não haja uma regra clara, será aplicada a opinião que no Alcorão e na Sunnah corresponder a mais próxima à questão. O Direito de Censura: Como já vimos, a relação disposta entre o Chefe de Estado Islâmico e a comunidade é como a relação existente entre o outorgante e o outorgado, portanto, a comunidade bem como o indivíduo tem o direito de censurar os atos e o comportamento do Chefe de Estado bem como de seus funcionários, relativos aos assuntos do Estado. A comunidade tem o direito de fiscalizar a pessoa a quem delegou certos poderes com o fim de assegurar-se do cumprimento correto de seu mandato. Vale ressaltar, que o direito à censura só pode ser utilizado como um meio para alcançar um fim, ou seja, o direito de censurar deve tencionar corrigir o Chefe de Estado quando este se desvia do caminho correto do Islam no exercício de seu governo. A primeira maneira de correção é utilizar-se do conselho sincero ao governante. Em um Hadith autêntico do Profeta Muhammad apud Al Nawawi ele disse: A religião é o conselho sincero. Os companheiros do Profeta perguntaram: Para quem? Ele respondeu: Para com Deus, Seu Livro, Seu profeta, para com os chefes dos muçulmanos, bem como para com os muçulmanos em geral. Se o conselho sincero não resolver, a comunidade tem o direito de se usar da força necessária para corrigi-lo e evitar que este cometa injustiças e desonestidade. Temos diversos exemplos na biografia do Profeta Muhammad, bem como dos primeiros quatro líderes da nação islâmica quanto a aplicabilidade deste direito, bem como o chamado dos próprios líderes a que seja censurado caso se desvie dos princípios islâmicos. Abu Bakr Assidiq, o primeiro Chefe do Estado Islâmico após a morte do Profeta, ao ser nomeado pelos muçulmanos disse: “Se eu me comportar bem me apoiem, mas se eu fraquejar corrijam-me”. Já no discurso do segundo Chefe de Estado, Omar Ibn Al Khatab, este disse: “Aqueles dentre vós que virem algum erro em mim devem corrigi-lo”. Neste momento alguém da plateia levantou-se e disse: Por que, se constatarmos em vós algo de desonestidade a corrigiremos com nossas espadas! Omar respondeu: “Graças a Deus, pois que criou na comunidade de Muhammad alguém capaz de corrigir Omar com a sua espada”. E disse também Omar ibn Khatab: O fraco dentre vós é forte perante mim até que lhe seja devolvido o seu direito e o forte dentre vós é fraco perante mim até que devolva o direito alheio. Direito de Destituir o Chefe do Estado. A comunidade tem o direito de destituir o Chefe de Estado se este extrapolar os limites do seu mandato, bem como dos limites e leis impostas pelo Islam. Como vimos o Chefe do Estado se obriga perante a comunidade a fazer prevalecer bem como aplicar as leis contidas no Alcorão Sagrado bem como na Sunnah do Profeta Muhammad, portanto, uma vez que este se desvie de qualquer um destes, caindo em incredulidade e apostasia ou violação das regras islâmicas, a comunidade tem o direito de destituí-lo. Como exemplo disto, temos o Chefe do Estado que se nega a respeitar o princípio da Consulta Mútua, uma vez que é um princípio estipulado diretamente pelo Alcorão. Portanto, só poderá haver a destituição desde que haja fundamento no Direito Islâmico para tal decisão. O Direito à Proteção do Estado: O fundamento desse direito está em que o Estado Islâmico é uma sociedade cooperativa, estabelecida numa base de ajuda mútua. Assim, cabe ao Estado assumir a previdência aos necessitados e aos pobres. O bem estar dos indivíduos de uma comunidade, em questões materiais, só é possível com a satisfação de suas necessidades básicas. Quando eles forem incapazes ou estiverem impossibilitados de fazê-lo, cabe ao Estado proporcionar total segurança pelo tempo que a carência ou necessidade existir. Por outro lado, cabe ainda ao Estado facilitar a geração dos meios de trabalho para a obtenção do sustento do indivíduo, criar empregos e propor projetos para erradicar a mendicância. Se a geração de empregos assim o exigir, o Estado pode conceder empréstimos do seu tesouro. Emprestar é melhor do que dar esmolas. Segundo o jurista Abu Yusuf, “se o proprietário de uma terra arável deixar de cultivá-la por não ter recursos, então, o erário público lhe proporcionará fundos suficientes para que ele possa trabalhar a sua terra”. Que Alláh abençoe o Profeta Muhammad e lhe dê a paz. Abraço. Davi.

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