Judaísmo. www.morasha.com.br.
O SIGNIFICADO DA ENTREGA DA TORÁ. O ápice e propósito da libertação do Povo
Judeu de sua escravidão no Egito ocorreu 50 dias após o Êxodo. As 10 Pragas que
se abateram sobre esse país, a abertura do Mar de Juncos e o início da jornada
através do deserto, a caminho da Terra de Israel, foram o prelúdio da Revelação
Divina no Monte Sinai e da Entrega da Torá, que são os eventos que celebramos
na festa de Shavuot. Essa festividade, celebrada na Diáspora nos dias 6 e 7 do
mês judaico de Sivan, é o ponto culminante de um processo
espiritual que se inicia 50 dias antes, em 15 de Nissan –
primeiro dia de Pessach. O mandamento da Contagem do Omer,
a partir da segunda noite de Pessach e terminando em Shavuot,
ensina-nos que os dias entre as duas festividades são degraus de uma escada
espiritual que nos leva a uma revelação Divina incomparavelmente superior a
tudo o que vivenciamos durante o Seder. O Livro Êxodo – segundo
livro da Torá – descreve a Revelação Divina no Monte Sinai como uma experiência
quase surreal. Esse evento único na história humana jamais será repetido, nem
mesmo na Era Messiânica. No Monte Sinai, D’us Se revelou a todo um povo –
homens, mulheres e crianças. Em meio a trovões e raios e ao toque do Shofar,
milhões de seres humanos vivenciaram uma revelação indescritível do Infinito.
D’us revelou-Se perante todo o Povo de Israel, face a face, e proclamou
os Asseret HaDibrot, os Dez Pronunciamentos – comumente e
erroneamente traduzidos como os Dez Mandamentos. A Revelação Divina no Monte
Sinai foi um evento sem paralelo. Pela primeira e única vez na história humana,
D’us Infinito revelou-Se a uma multidão de seres humanos. Poderíamos esperar
que Ele fizesse o pronunciamento mais importante, mais inspirador e místico
jamais ouvido: ensinamentos cabalísticos apresentados como lindos versos
poéticos. No entanto, o que o povo ouviu foram algumas declarações – os Asseret
HaDibrot. Se fôssemos analisar o teor desses Dez Pronunciamentos,
perceberíamos que excetuando-se o mandamento sobre o Shabat, há muito pouco de
sublime ou inovador neles. A maior parte dos Dez Pronunciamentos Divinos –
crença e lealdade perante D’us; honrar pai e mãe; não matar, não roubar nem
cometer adultério; e não corromper o sistema de justiça com falsos testemunhos
– são mandamentos que qualquer sociedade decente instituiria, cedo ou tarde,
como parte de seu código de leis. De fato, havia outros povos que promulgavam e
seguiam leis semelhantes – e já as praticavam antes mesmo da entrega da Torá.
Obediência, lealdade e reverência com a sua própria fé – base dos três
primeiros dos Dez Pronunciamentos – são comportamentos esperados mesmo de
membros de sociedades que criavam sua própria religião e moldavam suas próprias
divindades. Da mesma forma, a proibição contra assassinato, roubo e adultério,
são fundamentos atemporais de dignidade humana em praticamente todas as épocas.
Foram poucas as exceções – algumas sociedades permitiam o roubo, praticavam a
violência de forma desenfreada e não tinham o conceito de monogamia. Mas, os
seres humanos lúcidos entendem que há um certo código de moralidade e conduta
que precisa ser seguido se o povo ou a comunidade pretendem continuar a
existir. Não há necessidade de se ter grande intelecto ou compasso moral para
perceber que uma sociedade não pode funcionar adequadamente onde o assassinato
e o roubo correm soltos, bem como o desrespeito aos pais e professores, ou uma
quebra da estrutura familiar ou a corrupção do sistema de justiça. Qual teria
sido, então, a inovação trazida pelos Dez Pronunciamentos? Qual a importância
superior da Revelação Divina no Sinai e da Outorga da Torá? Como perguntaram
nossos Sábios: era necessário que D’us, Ele mesmo, tivesse que Se revelar em
todo o Seu esplendor, diante de milhões de pessoas, para dizer ao povo que não
roubasse? A questão sobre o significado da Entrega da Torá também pode ser
abordada por outro ângulo. Como mencionamos acima, apenas um dos Dez
Pronunciamentos era verdadeiramente inovador e original – o Shabat. Mas, nem
mesmo esse mandamento era novidade para o Povo Judeu. Os Filhos de Israel
guardavam o Shabat, em maior ou menor grau, antes mesmo da Revelação Divina no
Sinai. Moshé Rabenu – nosso maior profeta e gigante espiritual
de todos os tempos – percebeu a importância de guardar o Shabat mesmo enquanto
crescia no palácio do Faraó, adotado que fora pela filha do rei egípcio. Moshé
convenceu o Faraó a conceder aos escravos judeus um dia de descanso. E para
isso usou um pretexto, alegando que se os judeus descansassem um dia, teriam
uma boa recuperação de seu trabalho e seriam mais produtivos nos demais seis
dias da semana. Mas o objetivo de Moshé não era apenas diminuir o peso que
recaía sobre seu povo; ele queria permitir que respeitassem o Shabat. O conhecimento
de vários mandamentos da Torá precedeu a Revelação Divina no Monte Sinai. O
Talmud nos ensina que nosso Patriarca Avraham cumpria com todos os mandamentos
da Torá. No Livro de Gênesis, D’us assim Se refere ao nosso primeiro Patriarca,
Avraham: “E ... guardou Minha sentença, Meus mandamentos, Meus estatutos e
Minhas leis” (Gênesis 26:5). Não nos deve surpreender o fato de os Patriarcas
terem cumprido com a Torá. Seria impensável pensar que os três Patriarcas -
Avraham (Abraão), Itzhak (Isaque) e Yaacov (Jacó) – a quem a Cabalá se refere como “as rodas da
Carruagem Divina”, e cujo mérito invocamos toda vez que rezamos o Shemone
Esrê (a Amidá), poderiam desviar-se uma letra que fosse no
cumprimento da Vontade Divina. Seria absurdo considerar a possibilidade de um
dos Patriarcas não estudar a sabedoria Divina e não guardar o Shabat, ou que se
alimentasse de algo que não fosse casher. Na verdade, Avraham Avinu,
além de ter conhecimento da Torá, conhecia até mesmo seus segredos mais
profundos, que encontram expressão no estudo da Cabalá. Acredita-se que nosso
primeiro Patriarca tenha sido o autor do que constitui talvez o mais antigo
trabalho cabalista, o Sefer Yetzirá (Livro da Formação). Como
o conhecimento da Torá antecede a Revelação Divina no Sinai, o que teria sido
acrescentado quando D’us Se revelou ao Povo Judeu, 50 dias após o Êxodo? Qual
teria sido a mudança essencial revelada quando da Outorga da Torá e no período
após essa revelação? O desejo de se aproximar de D’us. Todo
ser humano contém dentro de si uma Neshamá, uma alma Divina – uma
centelha Divina de luz que é o ponto central, o mais profundo e oculto de sua
vida. É comum os seres humanos não conhecerem a natureza de sua alma. Não
conseguem ver por trás dos véus que escondem a Essência Divina dentro deles.
Contudo, esse ponto central, esse núcleo, sempre existe. Podemos ignorar e
tentar reprimi-la, mas não conseguimos, jamais, extinguir essa Centelha Divina.
E como esse ponto mais íntimo de nosso interior – “o sagrado dos sagrados” – é
Divino, o homem, consciente ou inconscientemente, anseia por encontrar sua
Origem – o Altíssimo. Consequentemente, a humanidade é atraída pelo metafísico
e transcendental. Ainda que muitos seres humanos usem sua alma de forma errada,
interpretem mal os seus chamados, e sigam uma enorme variedade de deuses e
religiões falsos, o homem é, por natureza, uma criatura religiosa. As
sociedades e ideologias que tentaram erradicar a religião não tiveram sucesso
em suas tentativas, pois o ser humano é religioso em sua própria essência – e a
essência de sua existência é sua alma Divina. Portanto, não nos surpreende o
fato de que um número sem fim de seres humanos esteve disposto a entregar sua
vida à sua religião. Ao longo da História Judaica, muitos judeus que nem sequer
cumpriam os mandamentos da Torá optaram pela tortura e morte a renunciar à sua
fé em D’us. Quando se incendeia a Centelha Divina no homem, essa alma fomenta
seu desejo de se relacionar com D’us. Esse encandecer se manifesta de várias
formas, mas o resultado é, em geral, o mesmo: o início da busca pelo Altíssimo.
Algumas pessoas começam sua busca por D’us por meio da contemplação e profunda
reflexão sobre si próprios e sobre o mundo. Elas percebem que não existe
criação sem um criador, pois não há neste mundo nada que não se origine em
outro algo. Portanto, é evidente que tem de haver um Criador por trás de toda a
Criação. A missão do homem passa a ser, então, encontrar e se relacionar com
Aquele que está por trás de tudo o que existe. Como ensinam nossos Sábios, é
assim que nosso Patriarca Avraham iniciou sua jornada espiritual, percebendo
que se uma grande construção precisa de alguém que a erga, o majestoso universo
no qual habitamos certamente também tem que ser obra de um grande Arquiteto e
Criador. No entanto, há vezes em que o desejo de nos aproximarmos de D’us é
decorrência de eventos e experiências pessoais. Uma pessoa que esteja muito
afastada do Judaísmo e dos pensamentos sobre a Divindade pode subitamente
descobrir, quando defrontada com um evento ímpar em sua vida – feliz ou
doloroso - a grande força e significado do âmago de sua existência, e pode,
então, buscar uma conexão com sua Origem. Ademais, há uma profusão de fenômenos
que provocam no homem o desejo de se aproximar de D’us. Algumas pessoas
adquirem uma consciência religiosa ao contemplar a grandeza Divina revelada no
mundo que Ele criou e ao reconhecer as extraordinárias obras Divinas e Sua
transbordante luz e bondade. Essa contemplação lhes faz alcançar um estado
interior de entusiasmo, que leva a uma conscientização mais plena do desejo de
se achegar a D’us. Há, porém, outra maneira que faz o ser humano desejar ter a
Presença Divina em sua vida, que se faz por meio da contemplação de seu próprio
ser e de sua própria existência. Como, pois, está escrito na Torá: “...pois Ele
é a tua vida...” (Deuteronômio 30:20). Esse entendimento – a conscientização
interior, verdadeira, de que D’us é a essência da vida: de que Ele é a fonte da
vida – e não apenas do universo todo, mas também de nossa própria existência –
leva muitos seres humanos a buscar D’us com todo o seu coração e todo o seu
poder. No livro de Isaías, há um versículo que diz: “Minha alma Te tem buscado
a cada noite; ...” (Isaías 26:9). O Zohar, texto básico da Cabalá,
explica o profundo significado desse versículo: Tu, que és verdadeiramente
minha’lma, meu ser, verdadeira origem da minha vida – A Ti desejo, por Ti
espero à noite, na escuridão e na ocultação da existência (Zohar III,
67a). A percepção de que D’us não é apenas Quem dá a vida, mas é a nossa
própria vida, desperta e revela o desejo de O alcançar, d’Ele nos aproximar,
com Ele sempre estar. “Qual o lugar de Sua glória?” Quando a
aspiração do homem de se aproximar a D’us alcança o estágio de conscientização
e conhecimento, ele se sente motivado a percorrer um caminho de busca da
Divindade. Mas, mesmo quando o ser humano se propõe a buscar D’us como o
objetivo supremo de sua vida, o caminho não lhe é claro, pois ele se depara com
a pergunta transcendental feita por todos os que buscam o Eterno, mesmo os Anjos
mais elevados: “Qual é o lugar de Sua glória? (Kedushá da oração
de Mussaf de Shabat e das Festividades). D’us é Infinito e
Onipresente; até as crianças aprendem que D’us está em toda parte. Mas, como
declarou o profeta Isaías, o Eterno é um “D’us que Se oculta” (Isaías 45:15), e
a Quem não podemos perceber com nossos cinco sentidos. Como, então, alcançar e
nos relacionar com um D’us oculto e infinito, que pode estar infinitamente
próximo, mas também infinitamente distante? Muitos creem que a maneira de se
aproximar de D’us é por meio da auto elevação espiritual – na tentativa de
transcender o físico e o mundano. Essa crença provém de uma concepção
terrivelmente errada sobre D’us – de que Ele é um Ser espiritual. Essa ideia se
baseia na concepção de que se os seres humanos puderem se libertar dos muitos
desejos físicos que os rodeiam, eles automaticamente se aproximarão de D’us.
Acreditam, erroneamente, que seu corpo, suas posses materiais e suas urgências
físicas e instintos são o que os impedem de se aproximar a D’us. Assim sendo,
os que buscam D’us geralmente se afastam do material para se voltar ao
espiritual. Eles até podem se tornar ascéticos, acreditando que somente a
privação física e a renúncia a tudo o que é matéria os levará mais perto de
D’us. Essas tentativas são fúteis e, quase sempre, danosas e contraproducentes.
Pois, se por um lado é verdade que D’us é totalmente despido do físico, Ele
tampouco é um Ser espiritual. D’us está infinitamente acima do físico, mas está
igualmente distante do espiritual – mesmo de suas formas mais elevadas.
Atribuir-se qualidades espirituais a D’us é uma blasfêmia comparável a
acreditar que Ele é físico. O Todo Poderoso não é físico nem espiritual; Ele é
exaltado acima de tudo. Comparada à Sua Infinita grandeza, mesmo a mais elevada
espiritualidade é tão insignificante quanto a mais baixa corporeidade. Podemos
indagar: se D’us não é físico nem espiritual, o que Ele é? E respondendo: D’us
é indefinível e incognoscível. O homem finito não pode nem sequer começar a compreender
a essência de D’us. Como Ele está tão distante do físico quanto do espiritual,
ignorar o físico e abraçar o espiritual não necessariamente leva a pessoa mais
perto de D’us. O homem deveria perceber que tudo o que sabemos acerca do Todo
Poderoso, e até o que julgamos que podemos entender sobre Ele, não nos leva a
entender absolutamente nada. D’us, por quem tantos seres humanos anseiam com
todo o seu ser, é elevado e exaltado, estando acima e além de qualquer
percepção. Ele é insondável. Nosso intelecto, por si só, é incapaz de conceber
a Essência Divina. Como poeticamente colocou o Rabi Shneur Zalman de Liadi,
o Baal HaTanya: assim como a mão humana é incapaz de agarrar um
pensamento, a mente humana também é incapaz de tocar o Divino. Em nossas orações,
frequentemente nos referimos a D’us como HaKadosh, Baruch Hu: “O
Sagrado, Bendito é Ele”. Como nos ensina o Talmud, a definição correta da
palavra hebraica Kadosh, “sagrado”, é “separado e distante”.
Portanto, quando dizemos em nossas preces que D’us é sagrado - “Tu és sagrado e
Teu Nome é sagrado… Bendito és Tu, Eterno, D’us sagrado” (a terceira bênção da
oração da Amidá) –, estamos admitindo que D’us é separado, distante
e elevado acima de tudo o que existe. Se D’us é a essência e a própria
definição do sagrado – separação e elevação - como poderia ser alcançado?
Portanto, todas as tentativas de se aproximar a D’us por meio do empenho do
próprio homem estão fadadas ao fracasso. Como pode o homem, limitado e finito,
alcançar um Ser que, além de Infinito, é sagrado – separado e remoto? Não é
preciso ser um matemático para perceber que o infinito não tem fim e, assim
sendo, é inatingível. Independentemente de quão longe for o homem, jamais
alcançará o infinito. Sendo assim, o ser humano, mesmo no auge de sua exaltação
espiritual – mesmo se pudesse levitar e meditar acerca da grandeza Divina em
cada momento desperto de sua vida – não teria como entrar em contato com Quem,
por natureza, é inatingível – o Infinito, Santificado e Remoto. Isso significa
que mesmo se o homem ascende ao nível mais alto possível a ele – que,
potencialmente é um nível acima do que o dos anjos –, ele continua distante e
remoto de D’us. A distância infinita que separa o homem finito do Infinito não
pode ser transposta por um ser humano. O homem não pode estar próximo – nem
sequer “mais próximo” – de D’us apenas por meio de seu empenho, por maior que
seja, e por mais sinceras as suas intenções. Assim, pois, o caminho até D’us
parece intransponível. Não há ser humano que possa vencer os obstáculos e
limitações inerentes às criaturas finitas em um mundo finito e alcançar D’us,
Transcendente, Remoto, Ser Infinito, independentemente de quão nobre ou justo
ele seja. Para muitos, seu maior desejo é chegar a D’us, mas não há como
fazê-lo, por si sós. A Ponte para o Infinito. Considerando-se
o acima exposto – particularmente o fato de que os homens, sozinhos, não
conseguem alcançar D’us – podemos começar a entender o significado e propósito
da Outorga da Torá. Como nós, humanos, por nosso próprio empenho, não
conseguimos sozinhos alcançar a Divindade, D’us, Ele mesmo, em Seu infinito
amor e bondade, Se transporta até nós para cumprir a intenção original da
Criação. Somente, Ele, o Onipotente, pode vencer a distância que separa o que é
finito de Sua Essência Infinita. Já sabemos que o finito não alcança o
Infinito, mas o Infinito pode alcançar o finito. A Revelação Divina no Monte
Sinai e a Outorga da Torá foi o evento mais importante na história humana, pois
foi quando D’us venceu a distância entre o homem finito e Ele. E como isso
ocorreu? Por meio de Sua Torá, que contém Sua Essência – Sua Sabedoria e Sua
Vontade. Sendo assim, a Torá não é apenas um livro de Autoria Divina, com
relatos, leis e ensinamentos. A Torá é muito mais do que isso: é a ponte que
permite que o homem finito alcance D’us em Sua Infinidade. A Torá é a interface
que permite ao homem se aproximar a D’us e com Ele se comunicar – porque revela
a maneira para poder unir-se a D’us – ou seja, estudando a Sua Sabedoria e
cumprindo Sua Vontade – que vêm revestidas por Seus textos sagrados e Seus
mandamentos. Portanto, um mandamento da Torá é muito mais do que uma ordem
Divina, um tzav; com um teor dentro de si bem mais profundo e mais
essencial. A palavra Mitzvá, um mandamento da Torá, origina-se
na palavra tzavta – estar junto, unido a D’us. Assim, pois, o
cumprimento de uma Mitvzá une o homem a D’us. Ao descrever a
Revelação Divina, a Torá afirma que D’us “desceu sobre o Monte Sinai”. O que
isso significa? Como é possível que um Ser Infinito e Onipresente, que está em
toda parte, desça em algum lugar? Uma das respostas é que a Torá utiliza a
metáfora de D’us “descer” para nos ensinar de que, ao outorgar a Torá ao Povo
Judeu, Ele Se tornou acessível ao homem: D’us “Se rebaixou”, em termos metafóricos,
permitindo a nós, humanos, chegar até Ele. A Outorga da Torá no Sinai
trouxe-nos, ao nível de nossa inteligência humana, o caminho para alcançar
D’us. Assim sendo, no Monte Sinai, o Povo Judeu não recebeu uma dádiva Divina
dos Céus – recebeu os próprios Céus. O propósito máximo da Torá e de seus
mandamentos, entre os quais os Dez Pronunciamentos, é total e essencialmente
diferente do que qualquer outro código de leis redigido pelos homens. Quando
nós, seres humanos, instituímos nossas leis, temos por propósito estabelecer e
estabilizar a sociedade humana. As leis que elaboramos podem ser nobres,
benéficas e voltadas para o futuro. Mas são motivadas por interesses de uma
sociedade e limitadas por nossa natureza e caráter essencial. As leis dos homens
não transcendem o reino humano. Contrariamente, as leis proclamadas por D’us no
Monte Sinai, por mais mundanas que possam parecer, expressam a Vontade e
Sabedoria Divinas. A adoção e cumprimento dessas Leis Divinas são o portal que
nos permite chegar ao Ser Único e Transcendental, Abençoado o Seu Nome. É por
meio da Torá que o homem finito e D’us Infinito comungam, por ser a ponte que
permite ao homem verdadeiramente chegar a D’us. Quando o ser humano se abstém
de roubar – não apenas porque a sociedade ditou ser isso um ato ilegal –, mas
porque D’us o proibiu em Sua Torá, ele se aproxima do Altíssimo. Isso é válido
para todos os mandamentos da Torá. Cada vez que seguimos uma de suas leis pelo
fato de constituírem a Vontade do Todo Poderoso, estamos nos aproximando de
D’us e nos conectando com o Infinito. Antes da Entrega da Torá, o mundo era um
mundo onde o homem tentava alcançar D’us, mas ainda assim, apesar de seus
esforços, continuava distante d’Ele. Foram poucas as exceções, tais como nossos
três Patriarcas, que tinham conhecimentos de Torá sem que ela nos tivesse sido
entregue, no Monte Sinai. A partir da Outorga da Torá, a forma de alcançar o
Divino foi disponibilizada a todos nós, seres humanos. D’us, Ele próprio,
“desceu” sobre o Monte Sinai e Se revelou por meio da Torá, dizendo-nos como é
possível ao homem vencer os obstáculos de sua própria humanidade para se
aproximar e se ligar ao Divino. O mandamento de servir a D’us com
alegria. Uma vez tendo compreendido que a Torá é a ponte que permite
conectar o homem finito a D’us Infinito, torna-se mais clara a razão pela qual
somos ordenados a servir a D’us com alegria – estudar a Sua Torá e cumprir Seus
mandamentos com o coração aberto e jubiloso. Sendo a Torá a interface que
permite ao homem conectar-se a D’us, cada vez que um judeu estuda a Torá, ele
está dialogando com o Sagrado, Bendito o Seu Nome. A Cabalá nos revela que
quando nós, judeus, estudamos Torá, D’us estuda conosco, a nosso lado. O Pirkei
Avot (“Ética dos Pais”), um Tratado da Mishná, ensina que
mesmo quando um judeu está sozinho estudando a Torá, a Shechiná, a
Presença Divina no mundo, paira sobre ele. Também a obra-prima cabalística
do Baal HaTanya – Likutei Amarim (conhecida como o Tanya)
– explica que quando um judeu está estudando Torá, ele está abraçando e sendo
abraçado, ao mesmo tempo, pelo Rei Infinito. O Talmud e os livros cabalísticos
também ensinam que os mandamentos da Torá são a Vontade de D’us e quando um
judeu cumpre uma Mitzvá, ele se une ao Altíssimo. Por exemplo,
a Shechiná habita naquele que coloca Tefilin. A
compreensão de que a Torá e seus mandamentos são o vínculo que une o homem a
D’us deve trazer-lhe um sentimento de grande júbilo ao estudar os textos
sagrados e cumprir as Mitzvot. Poucos minutos de estudo da Torá permitem
o que nenhum tipo de meditação sobre o Divino consegue alcançar: uma verdadeira
união com D’us. Portanto, é errado enxergar a Torá e seus mandamentos como um
ônus imposto ao Povo Judeu, pois de fato são a maior dádiva ao mundo: algo que
o homem vem buscando desde sua criação – o caminho até D’us. Quem não encontra
júbilo na Torá demonstra não entender seu ponto primordial, sua essência e
propósito. Diferente do que muitos pensam, a Torá não visa a civilizar o homem.
Isso os seres humanos podem fazer sozinhos. Nem nos foi dada como uma espécie
de teste Divino, para medir nossa lealdade ou obediência. Em vez disso, a Torá
é a maior expressão do amor de D’us por nós, Suas criaturas. A Torá não
simplesmente veio dos Céus; a Torá é os Céus. E sua outorga a nós, no Monte
Sinai, significou que os Céus desceram até a Terra. Assim, sempre que a
estudamos, emergimos dos confins de nosso mundo limitado e tocamos o Infinito.
O significado da Entrega da Torá mudou o curso da História para sempre – não
apenas para o Povo Judeu, mas para toda a humanidade. O mundo era um antes
desse acontecimento magno e passou a ser outro mundo totalmente diferente após
a Outorga. A festa de Shavuot, portanto, celebra o dia mais
importante e grandioso na História humana – o dia em que D’us Infinito trouxe
os Céus até a Terra e Se tornou disponível ao homem finito. www.morasha.com.br.
Abraço. Davi
BIBLIOGRAFIA
Rabbi Adin (Even
Israel) Steinsaltz – “The Significance of the Giving of the Torah – Change
and Renewal – The Essence of the Jewish Holidays, Festivals & Days of
Remembrance” - Maggid Books. www.morasha.com.br. Abraço. Davi
Nenhum comentário:
Postar um comentário