Hare Krishna. www.voltaaosupremo.com.br. Texto de
Archana Siddhi Devi Dasi. HUMILDADE E BEM CONSIGO. Confundir a HUMILDADE que
surge do amor espiritual com uma postura de baixa autoestima que nos torna
presas fáceis de exploradores, é um equívoco perigoso que precisamos
evitar. Como terapeuta de famílias, eu aconselho tantos
membros do Movimento HARE KRISHNA como pessoas de fora do Movimento.
Recentemente, recebi um e-mail de
uma jovem devota que estava infeliz em seu casamento devido à POSTURA ABUSIVA
QUE SEU ESPOSO tinha, mas estava em conflito quanto a deixá-lo. “Talvez seja
bom que eu me sinta mal comigo mesma”, ela escreveu, “porque isso me fará
desenvolver HUMILDADE”. Não foi a primeira vez que eu ouvi essa lógica. A Bhagavad-gita ensina que HUMILDADE é essencial para o progresso espiritual.
Algumas vezes, os devotos, infelizmente, pensam que se sentir mal é um
pré-requisito para a HUMILDADE. Diversas vezes, me deparo com devotos se
complicando com o conceito de autoestima. Tendo lido as orações de santos de
nossa linha, eles, algumas vezes, pensam que seus sentimentos deveriam se
enquadrar nas declarações autodepreciativas de tais grandes almas. Por
associarem baixa autoestima com avanço espiritual, tais devotos podem perpetuar
por toda a vida o sentimento de estarem mal consigo. Eles podem acabar por
atrair pessoas para suas vidas que lhes tratarão de acordo com a maneira que
eles mesmos se sentem e se percebem. A confusão começa por tentarmos igualar
sentimentos que se originam de nosso eu puro com sentimentos que se originam de
nosso ego material, ou falso. As grandes almas expressam sentimentos que nascem
do ego espiritual puro, sentimentos que não são contaminados pelas qualidades
da natureza material. Quando eles se sentem, nas palavras do Senhor Chaitanya
Mahaprabhu (1486-1534), “mais baixos que a palha na rua”, é uma emoção plena de
prazer. O devoto puro vê a grandeza do Senhor e vê todos como mais qualificados
do que ele próprio. Eles estão imbuídos de amor e apreciação por toda a criação
de KRISHNA. Bhaktivinoda Thakura (1838-1914), um destacado mestre devotado a
KRISHNA, escreveu belas canções expressando sua atração e seu amor por KRISHNA,
músicas sobre alcançar a meta do coração – amor incondicional pelo Senhor – e
canções autodepreciativas, nas quais ele lamenta sua falta de devoção. Como uma
alma pura, ele expressa seu apego e amor pelo Senhor e, ao mesmo tempo, sua
angústia de sentir-se desqualificado e sem esperança de atingir tal amor. Esses
são SENTIMENTOS autênticos que NASCEM DA HUMILDADE e do APEGO e AMOR pelo SENHOR. RECONHECENDO
NOSSAS FALHAS. Nas primeiras fases de nossa jornada espiritual, talvez
experimentemos rapidamente essas emoções por KRISHNA estar preparando a terra
de nossos corações para cultivar nossa devoção. Eu me lembro de uma importante
experiência que tive antes de me tornar devota. Eu tinha grande dificuldade de
aceitar críticas e achava que minha opinião era absolutamente certa. Essa
mentalidade criou inúmeros problemas, tanto na área profissional quanto
pessoal. Por meses, eu contestei as recomendações de meu supervisor quanto a
como fazer meu trabalho como diretora residente de um dormitório universitário.
Minha obstinação estava fazendo o meu trabalho muito difícil, e eu estava
aflita por isso. Finalmente, um dia eu tive a poderosa realização de que eu
estava errada. Não só eu estava errada quanto a esse problema em particular,
mas em relação a várias outras coisas. É-me impossível descrever quão
libertador foi para mim aceitar minha natureza falível. Eu não precisava mais
carregar o peso de estar sempre certa em relação a tudo. Eu me senti pequena,
mas, ao mesmo tempo, muitas possibilidades se abriram para mim. Pela primeira
vez na minha vida adulta, eu pude ver meu autoritarismo assumir uma posição
verdadeiramente submissa. Essa mudança de postura mental me preparou para tomar
refúgio em meu mestre espiritual e nos devotos de KRISHNA de maneira geral.
KRISHNA nos ajuda a ficarmos livres por um instante do falso prestígio para que
possamos, como encorajamento, provar a doçura da HUMILDADE. Algumas vezes,
todavia, quando ainda estamos contaminados pelos modos da natureza material e
identificados com nosso corpo e mente materiais, sentirmo-nos inferiores à
palha na rua pode nos tornar desmotivados, entediados ou deprimidos. Esses
sentimentos, então, impedem nossas práticas devocionais. Nós temos que julgar
se, para nossa psique específica, tal psicologia é favorável à consciência de
KRISHNA ou se é um impedimento no momento. Paradoxalmente, muitas pessoas
precisam desenvolver um saudável ego material antes de transcendê-lo e realizar
seu eu espiritual. Eu ouvi uma vez um palestrante motivacional dizer que as
pessoas com autoestima saudável pensam menos em si mesmas, e não menos de si
mesmas. Quando nos sentimos bem quanto a nós mesmos, nós podemos devotar mais
tempo e energia doando-nos aos outros, ao invés de absorvermo-nos em auto
piedade. Alta autoestima também nos dá liberdade para agirmos de acordo com
nossos valores e convicções. Quando nos sentimos mal conosco, às vezes fazemos
coisas para agradar ou apaziguar os outros. Em um esforço para satisfazer o
desejo dos outros, nós podemos acabar sendo influenciados a fazer coisas
conflitantes em relação às nossas crenças e valores. SENTINDO-SE DIGNO
E QUALIFICADO. Nathaniel Branden (1930-2014), um famoso psicólogo,
define autoestima como “a disposição de sentir-se bem consigo e qualificado
para lidar com os desafios básicos da vida e como sendo digno de ser feliz”.
Como esses aspectos da autoestima – autoconhecimento e amor próprio – têm
relação com a consciência de KRISHNA? KRISHNA quer que todas as almas
aprisionadas no mundo material sejam pacíficas e felizes. A vida humana nos
possibilita a oportunidade de ocuparmos nossos talentos e habilidades no
serviço ao Senhor. Quando oferecemos a servir o Senhor, sentimos grande
alegria. Um amigo, certa vez, deu ao meu esposo um quadrinho com os dizeres: “O
que você é, torna-se um presente de Deus para você, e o que você se torna é seu
presente para Deus”. Além de confundirem HUMILDADE com baixa autoestima, os devotos,
às vezes, correlacionam o conceito de autoestima com orgulho e egoísmo. Mas é,
de fato, o contrário. Pessoas que exibem alta autoestima também exibem uma
atitude mais HUMILDADE perante os outros. Eles são mais inclinados a admitir e
corrigir erros, enquanto pessoas com baixa autoestima são muitas vezes
defensivas e têm a necessidade de provarem que estão certas. Em uma famosa
história do Mahabharata, KRISHNA
encontrou certa vez com Yudhisthira Maharaja e Duryodhana. Desejando glorificar
seu devoto Yudhisthira, Krishna pediu a ele que encontrasse uma pessoa mais
baixa que ele, e pediu ao pecaminoso Duryodhana para que procurasse uma pessoa
mais gloriosa que ele. Yudhisthira tinha todas as boas qualidades. Ele era
pacífico e auto satisfeito. Sem dúvida, ele possuía uma saudável autoestima.
Mesmo assim, ele não conseguiu encontrar ninguém mais baixo que ele. Mais uma
vez, aqui se tem o exemplo de uma vaishnava avançado
que porta HUMILDADE GENUINA. Por outro lado, o perverso Duryodhana procurou por
todo o seu reino o dia todo e não conseguiu encontrar ninguém que ele
considerasse superior a ele mesmo. Duryodhana estava contaminado com orgulho e
vaidade. Ele invejou e ofendeu grandes almas. Ele vivia em constante ansiedade
para manter sua posição, sempre tentando eliminar seus competidores. Sua
autoestima dependia de fatores externos como posição e poder, e assim ele não
conhecia tal coisa como PAZ INTERIOR. Ele era atormentado por sua própria luxúria e ambição. ORGULHO
VERSUS AUTO ESTIMA. Pensar em si mesmo como grandioso é orgulho, não
autoestima. Uma pessoa com alta autoestima demonstra HUMILDADE. A perfeição da
autoestima é percebida em pessoas completamente livres do falso ego, nas quais
a humildade é produto da realização espiritual. No nosso estado condicionado,
nós possivelmente nos identificaríamos mais com a mentalidade de Duryodhana do
que com a de Yudhisthira Maharaja, mas, no nosso progresso na jornada
espiritual, nós começamos a nos ver de forma diferente. Quanto mais realizamos
não sermos o executor independente, mas o instrumento, mais saudável nossa
autoestima se torna. Na vida material, os modos da bondade, paixão e ignorância
nos influenciam. Esses modos se misturam e competem entre si para moldar nossa
mente, incluindo o modo como nos sentimos em relação a nós mesmos. Pessoas no
abismo do modo da ignorância se sentem felizes e bem em relação a si mesmas
quando seus sentidos estão satisfeitos. Pessoas imersas no modo da paixão estão
felizes e bem consigo mesmas quando outros valorizam e reconhecem suas
atividades. Nesses modos inferiores, nossa ideia de eu oscila o tempo todo. Pessoas no modo da bondade são felizes e
sentem-se bem em relação a si mesmas quando agem em conhecimento, de acordo com
seus códigos e valores. Elas são menos reativas a estímulos externos, assim, a
autoestima de tais pessoas depende mais de sua própria vida interior –
consequentemente, têm mais controle sobre como se sentem. Pessoas em bondade
pura, percebem a si mesmas como instrumentos do Senhor. Elas não se identificam
mais como o agente de suas atividades. O EXEMPLO DE PRABHUPADA. Nosso
mestre espiritual, Srila Prabhupada, demonstrou alta autoestima. Embora de
baixa estatura, ele parecia grande para nós. Ele sempre mantinha sua cabeça
alta e se movia com objetivo e confiança. Ele fala de forma direta, com
convicção e coragem. Suas ações eram intrépidas e ousadas, e mesmo assim ele
tinha uma atitude humilde, sabendo que seu sucesso era devido à providência do
Senhor. Sua humildade é exemplificada em suas orações abordo do navio, quando
ele estava vindo pela primeira vez aos Estados Unidos: “Ó Senhor, eu sou como
uma marionete em Tuas mãos. Então, se me trouxeste aqui para que eu dance,
faze-me dançar, faze-me dançar, ó Senhor, faze me dançar como quiseres. Não
tenho nenhuma devoção, tampouco conhecimento, mas tenho grande fé no santo nome
de KRISHNA. Eu fui designado como Bhaktivedanta, e agora, se assim quiseres,
podes cumprir o verdadeiro propósito Bhaktivedanta”. Com grande HUMILDADE,
Prabhupada finaliza sua carta assinando como “o mais desafortunado e
insignificante mendigo, A. C. Bhaktivedanta Svami”. De um lado, essas preces
demonstram que Prabhupada se sentia muito baixo, mas, por outro lado, ele
confiava poder fazer qualquer coisa com a MISERICÓRDIA DO SENHOR. A ORAÇÃO
também nos dá a chave para desenvolvermos PURAS QUALIDADES DEVOCIONAIS: fé no
santo nome. Quanto mais forte a nossa fé na capacidade de purificação dos
santos nomes, maior será nossa dedicação ao processo de cantar. Nós cantaremos
com tanto foco e atenção quanto pudermos e evitaremos com muito cuidado as
ofensas que retardam nosso progresso espiritual. Nós ficamos menos propensos a
explorar os outros quando vemos a nós mesmos como servos, realizando a nossa
natureza espiritual – bem como a dos outros – como servos de Deus. Nós somos
gloriosas centelhas da energia espiritual, com todas as boas qualidades, embora
sintamo-nos pequenos na presença do mais glorioso, nosso Senhor. Com esse
verdadeiro conhecimento, a alma pura pode ter alta autoestima e HUMILDADE
simultaneamente. Quando eu compartilhei alguns destes pontos com a jovem que
havia me enviado sua pergunta por e-mail, ela me
escreveu de volta: “É-me um grande alívio entender esses pontos dessa
perspectiva. Agora eu entendo que não tenho que continuar convivendo
desonrosamente com todo o tipo de abusos para ser espiritual”. Ela me sugeriu
escrever um artigo sobre o tema para a revista Volta ao Supremo. Eu aceitei de todo o coração sua sugestão, uma vez que
outros devotos haviam feito perguntas similares ao longo dos anos. Espero que o
artigo seja útil para todos. www.voltaaosupremo.com.br. Abraço. Davi.
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