Editor do Mosaico. O Poder Transformador das Virtudes. Vamos refletir
sobre o texto bíblico de Mateus 19,16 - 22. "Eis que alguém
aproximando, lhe perguntou: Mestre, que farei eu de bom, para alcançar a vida
eterna? Ele disse-lhe: Por que me chamas bom? Não há bom senão um só, que é
Deus. Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos. Disse-lhe ele:
Quais? E Jesus disse: Não matarás, não cometerás adultério, não furtaras, não
dirás falso testemunho. Honra teu pai e tua mãe, e amarás o teu próximo como a
ti mesmo. Disse-lhe o jovem: Tudo isso tenho guardado desde a minha mocidade; o
que me falta ainda? Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o
que tens e dá aos pobres, e terás um tesouro nos céus. E vem, e segue-me. E o
jovem, ouvindo esta palavra, retirou-se triste, por que possuía muitas
propriedades". O filósofo Sócrates (469 AC 399) fez uma clássica definição
de virtude, "é a arte da capacidade de perceber e realizar o bem". Um
dito popular que podemos aplicar ao jovem rico é o que diz: "a mente,
mente, descaradamente". O jovem da parábola, enganava-se, imaginando que
por cumprir os mandamentos estaria apto para entrar na vida eterna. Quando
refletimos em virtude podemos dizer: "falar do bem e do belo é bom e só
faz bem". O perceber o bem é um primeiro passo para trilhar uma vida
virtuosa. Uma ilustração disso é sabermos que uma flor desabrochará em um
momento determinado. Mas, vendo este evento o desejo da beatitude é realizado.
Assim, a virtude é uma ação motivada pelo coração. Conta uma lenda persa, que
um jovem foi a procura de sua amada. Encontrou-a em uma casa trancada num dos
quartos. Ele várias vezes bateu na porta, pedindo que ela abrisse, mas a
súplica foi negada. Então decidiu percorrer a periferia da aldeia onde morava
procurando os pobres e necessitados para ajudá-los conforme pudesse. Platão
(428 AC 328) e seus discípulos reconheciam que a virtude tinha como componentes
(prudência, sabedoria, coragem e verdade) quatro aspectos. A prudência (cautela
e cuidado) como a primeira categoria, mostra a necessidade de se evitar tudo o
que possa ser prejudicial ou inconveniente. Também é revelada quando usamos o
bom senso e o comedimento. É difícil precisar o termo sabedoria que é o segundo
requisito. Ela está ligada a temperança (moderação nos desejos e apetites),
tendo sobriedade nas escolhas e decisões. A sabedoria é adquirida pela
experiência de vida humana, além do conhecimento acumulado ao longo do tempo. A
coragem como o terceiro item, é a força ou energia moral diante do perigo ou de
situações adversas. Uma atitude de ânimo e bravura frente aos desafios da vida.
A verdade como o quarto elemento é a realidade para além dos sentidos e da
percepção. As filosofias e religiões buscam a "verdade" para
iniciarem seus processos de desvelamento dos mistérios exotéricos (externos,
abertos ao público) e os esotéricos (internos, ocultos, só aos iniciados). A
"verdade" é a base da virtude quando praticada com ética e moral nos
contextos humanos. O jovem do conto persa, após suas andanças exercitando a
virtude, volta à casa da amada, bate novamente na porta onde ela está trancada.
Com alegria, vê a porta abrir-se, e recebe um apertado abraço da moça. Mateus
7, 7 "Pedi, e vos dará, buscai e achareis, batei e vos abrirá. Pois,
aquele que pede recebe, o que busca encontra, e a quem bate se abrirá".
Nossa condição é de ambiguidade em relação a virtude. Bem e mal residem em
nossa personalidade. O bem está em nossa parte superior chamada de
individualidade, composta da vontade, intuição e consciência. Essa é a tríade
superior, que na filosofia hindu é manas, buddhy e atman, sendo a instância que
conecta nossa alma espiritual a Divindade Eterna. O mal é manifestado em nossa
parte inferior chamada de personalidade, tendo como itens o corpo físico, a
energia sutil, as emoções e a mente concreta apegada ao materialismo. É a
esfera dos desejos mundanos e vontades egoístas. Aqui nestes dois aspectos
temos a dualidade (luta mortal) do ego inferior com o ego superior. Se em nossa
experiência cotidiana permitirmos a preponderância de nossa individualidade
espiritual, praticaremos atos de justiça. Apocalipse 19,8 "pois lhe foi
dado vestir-se de linho finíssimo resplandecente e puro. Porque o linho finíssimo
são os atos de justiça dos santos". Esses "atos" representam as
elevadas virtudes humanas. Os místicos das várias tradições religiosas
(judaica, budista, hindu, islâmica e cristã) cogitam a pessoa virtuosa como
aquele que é capaz de separar as coisas materiais das espirituais. O joio do
trigo. Algo dificílimo, pois o joio é cópia fiel do trigo, diferenciando-se
apenas na época da colheita. Caso, o inepto, se atreva a ceifá-lo antes,
constatará a triste realidade de ter jogado o trigo no fogo. Romanos 8,6
"Porque o pendor da carne dá para a morte, mas o do Espírito, para a vida
e paz". Esse ensinamento dos místicos leva o iniciado na Senda a alcançar
um considerável nível de pureza e santidade. Ser puro é a qualidade de não
estar misturado a elementos mundanos. É o exercício de um alto padrão de
moralidade, ética e fraternidade. Mateus 19,18-19 "Não matarás, não
adulterarás, não furtarás, não dirás falso testemunho, honra a teu pai e a tua
mãe e, amarás o teu próximo como a ti mesmo". O jovem rico da parábola
inicial, cumpria esses quesitos de pureza, contudo é necessário ser também uma
pessoa santa. A santidade é uma entrega do coração pelo exercício do altruísmo
e abnegação à favor do próximo. Uma experiência não de troca (cambio) pelo
merecimento, mas atitudes e comportamentos desprovidos de uma futura
recompensa. Um bom exemplo dessa santidade é São Francisco de Assis (1182-1226)
que com os seus três votos (pobreza, castidade e obediência) mostrou seu
compromisso com os desamparados e desprotegidos da sociedade. Ele considerava a
pobreza como sua esposa. A castidade como sua irmã e a obediência era sua
senhora. Entendam que é uma citação, do santo, que tinha esse propósito desde o
início de sua conversão quando na visão da capela, percebendo a imagem do
Cristo crucificado. A santidade hoje, podemos explicar como um compromisso de
vivermos conectados a Alma Universal laborando pelo interesse da fraternidade
humana. Ao final da sua vida São Francisco, "estigmatizado" pelas
feridas do Mestre Jesus, confidencia à sua íntima amiga Santa Clara
(1194-1253); sua tristeza por ver o Movimento Franciscano desviando-se
completamente de seus objetivos primordiais. Depois da grande expansão (Europa,
Ásia e África) os franciscanos se organizaram, sistematizaram-se, fundaram
escolas, universidades e, hierarquizando-se criaram bancos de investimentos.
Seus teóricos formularam conceitos de propriedade pública e privada. Tudo isso
no século XII e XIII. Essa não era a visão original de São Francisco quando os
primeiros discípulos se agregaram. Santa Clara teria dito que ele deveria fazer
um último voto: abrir mão do movimento e deixá-lo seguir seu próprio caminho. A
ideia do apego, tão combatida nas principais tradições, retrocede nossa pureza
ao objetivo divino, mesmo que ela tenha boas intenções e dignifique os
objetivos pelos quais iniciamos o projeto que Deus nos capacitou a fazê-lo. A
santa, queria dizer, que tudo vêm de Deus e nenhuma glória, mesmo que mínima
podemos atribuir ao nosso esforço ou dedicação. O Mestre Jesus ensinou ao jovem
rico que suas atitudes apesar de puras, manifestavam um coração impuro, pois
ele comparava as coisas espirituais com "negócios" terrenais onde
lucros e dividendos deveriam ser creditados ou diminuídos. Enxergava as
"obras" que realizava como "cotas" para aumentar seu
capital na empresa "celestial". Ele, como nós, devemos assumir uma
postura de pureza e santidade. Um despojar de nosso egoísmo e mesquinhez
materialista, para uma entrega; contribuindo com o que temos e o que somos para
a grande família humana através da irmandade universal. Davi.
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