Fraternidade
Rosa Cruz. www.fraternidaderosacruz.org.
Livreto Introdutório aos Ensinamentos da Sabedoria Ocidental. Por um
Probacionista. JESUS CRISTO E A COSMOLOGIA DOS ROSACRUZES. Os Quatro Evangelhos
constituem as principais fontes de informação relativas a vida de Jesus Cristo.
Também existem Evangelhos Apócrifos que foram descartados, contendo fragmentos
de história, e algum material evidentemente alegórico. O Talmud Judeu menciona
um Jesus que predicava em Nazaré e na Galileia, que teria sido apedrejado até a
morte por suas heresias. Parece que o Jesus do Talmud (Jehoshua) teria vivido
cerca de 100 AC. Os escritos dos padres pré-Nicenicos contêm algumas tradições
presumivelmente derivadas das fontes do primeiro século. Os mais importantes
destes registros foram descobertos em Irenaeus. Há um breve relato em Flavius
Josephus (37-100), cuja, autenticidade tem sido questionada. Também foram
encontradas algumas menções em fragmentos de documentos cristãos do terceiro e
quarto século de nossa era, todavia Jesus teria sido ignorado pelos mais
importantes historiadores de sua época. Tomando tudo isto, os Evangelhos
permanecem como a única exposição sistemática de sua vida e seus trabalhos. Os
mais importantes registros paralelos aos Evangelhos, são os escritos Gnósticos;
todavia neles Cristo é tratado de forma mais simbólica que histórica, e eles
não são contemporâneos. Discutindo a natureza de Cristo, Manly Palmer Hall
(1901-1990) destaca que “os padres da Igreja Cristã Primitiva reconheciam uma
diferença entre Jesus e Cristo. Jesus foi um Adepto Nazareno cuja iluminação
teria ocorrido na época do seu batismo por João Batista. O Cristo é o Espírito
da Verdade Universal, e ser “cristianizado” significa ser iluminado ou ter
aberto as faculdades internas da realização espiritual. Jesus o cristianizado
ou Jesus o Cristo, significa, portanto, Jesus o Iluminado ou Aquele sobre o
qual desceu o Espírito da Verdade”. Há um perfeito paralelo na história de
Buda. O jovem príncipe indiano foi chamado Sidharta Gautama. Sob uma árvore
recebeu a Iluminação. O Espírito da Verdade, “Buddhi”, que é a sabedoria
universal, desceu sobre ele, ou mais precisamente, foi irradiado de sua própria
natureza, tornando-o Gautama Buddha – Gautama o Iluminado. Quando Jesus
proclama que o Pai estava nele, isto não significa que o Deus Todo Poderoso
Criador do Universo se encarnara somente e inteiramente dentro de um único
homem; nem significa que o Princípio Universal de todas as coisas não está
presente em todas as criaturas. Significa que através da realização espiritual
tinha alcançado a consciência de Sua Unidade com a Verdade, ou Realidade
Universal. Manly Palmer Hall advoga que “o termo Cristão deveria ser limitado
àqueles que receberam a luz interior, e não deveria designar os membros de uma
congregação ou qualquer movimento teológico. Um homem não é um Cristão até que
Cristo nasça dentro de si, ou seja até que a sabedoria, a virtude, a
integridade, e o entendimento façam parte de sua própria natureza”. Ainda
relativo a questão se a natureza de Cristo-Jesus era divina, ou humana, ou
parte divina e parte humana, em Mitologia, a diferença entre os seres divinos e
os seres humanos é que os seres divinos são imortais enquanto os seres humanos
são mortais. Também existem seres semidivinos que procedem de uma linhagem
mista, divina e humana, que são mortais, porém dotados de grandes poderes.
Todavia, quando os mitos são interpretados, escreve Elsa Glover, “ todas as
suas características representam aspectos de cada um de nós. Então, todos nós
temos partes mortais e imortais. Se nos tornamos “heróis”, as partes imortais
de nosso ser devem se unir com e trabalhar junto às partes mortais. É legítimo
postular que Cristo-Jesus (entre todos nós) tenha uma parte humana e divina”. A
natureza e missão de Cristo constituem um dos capítulos mais controvertidos da
literatura esotérica. Há vários aspectos não excludentes que merecem ser
considerado. Na obra de Max Heindel (1865-1919), Rudolf Steiner (1861-1925),
Corinne Heline (1882-1975), Alice Bailey (1880-1949) e Eduardo Schure
(1841-1929), encontramos aproximadamente, com algumas variações, que Jesus foi
um Grande Iniciado, que tendo atingido como Buda a iluminação ou consciência
crística, foi também instrumentado como mediador do ingresso de um dos Raios ou
manifestações do Cristo Cósmico ou Logos Solar, em sua missão singular em nossa
esfera planetária. Segundo Max Heindel, era necessário encontrar-se um ser tão
puro e santo, que cedesse espontaneamente seu corpo ao Arcanjo Solar Cristo,
que precisava utilizá-lo para sua missão especial em nosso planeta,
libertando-o das forças cristalizadoras então dominantes. O Mestre Essênio
Jesus, que havia encarnado anteriormente como Salomão, foi escolhido para esta
elevada missão, cedendo seus Corpos Físicos (denso e vital ou etérico) ao
Hóspede Celeste. Foi batizado no rio Jordão e, ao emergir da água, desceu dos
céus sobre Ele o grande Espírito de Cristo, e compenetrou-o, preenchendo-o de
poder espiritual. Após esse grande Mistério, Jesus foi chamado Cristo-Jesus.
Foi Ele o mais santo homem que jamais viveu sobre a Terra, e tornou-se o
Salvador da humanidade. Mas sua missão não terminou no Gólgota, ciclicamente um
Raio do Cristo Cósmico penetra no Centro da Terra a cada ano, purificando o
nosso planeta. Cristo, o mais alto Iniciado dos Arcanjos, nunca havia
construído previamente corpos físicos (denso e vital) servindo-se dos veículos
cedidos pelo Mestre Jesus a partir do Batismo no Jordão. Para diferenciar tal
episódio dos fenômenos de possessão, quando entidades desencarnadas tomam
corpos humanos, Alice Bailey utiliza o termo mediação, que só se aplica ao
Iniciado, em vez de mediunidade, termo extensivo muitas vezes aplicado
impropriamente a ambas categorias e as vezes relacionado com a instrumentação
involuntária a partir do plexo solar. A presença dos Reis Magos, provenientes
das Raças Negra, Branca e Amarela, mostra a Universalidade da Missão de Cristo-Jesus.
Mas como disse Ângelus Silesius: “Ainda que Cristo nasça em Belém mil vezes, e
não dentro de ti mesmo, tua alma seguirá perdida. Em vão olharás a Cruz do
Gólgota, até que ela seja erguida dentro de seu coração” Cristo ofereceu-se a
si mesmo em holocausto, num sacrifício vivente no altar da humanidade. Curou e
predicou em todo seu ministério o Evangelho do Serviço e do Amor. Seus
verdadeiros discípulos são conhecidos através do exercício do Amor. “Amai-vos
uns aos outros como eu vos amo. Ide pelo mundo, predicai o Evangelho e curai os
enfermos. Não vos ocupeis com dois pares de sandálias nem dois pedaços de pão
porque bem sabe o amo o que o servo precisa. Construí o Reino de Deus e tudo o
demais vos chegará por acréscimo”. Por Antônio de Macedo. COSMOLOGIA DOS ROSA
CRUZES. Devo começar por dizer que o uso da palavra Cosmologia no título desta
minha comunicação é, à primeira vista, um tanto provocatório, porque o associo
a uma doutrina «oculta» quando normalmente se deve associar à ciência, e o
termo que se costuma utilizar associado ao Rosacrucianismo é Cosmogonia. Bom,
aqui teria de fazer um breve desvio para explicar a diferença entre o «místico»
e o «oculto»: o primeiro relaciona-se com a fé, a devoção e o coração — é um
enquadramento cordial, ao passo que o segundo se relaciona com a razão, o
intelecto e a mente — é um enquadramento mental. Daí o facto de se poder falar
em «ciências ocultas», enquanto dificilmente se poderia compreender uma
expressão como «ciências místicas»! Assim, não será excessivo, segundo esta
óptica, falar de Cosmologia a respeito da «ciência oculta» que é a Filosofia
Rosacruz… Mesmo assim, considero indispensável um parêntesis, neste ponto, uma
vez que certos autores se insurgem contra a associação do termo «ciência» a
vocábulos inerentes a «campos» como a Astrologia, a Magia, a Alquimia ou,
genericamente, ao Ocultismo. Realmente, se nos ativermos ao significado que a
palavra «ciência» passou a ter sobretudo após as obras clássicas de Henri
Poincaré (1854-1912) La Science et l’Hipothèse (1906) e Science et Méthode
(1908), bem como os trabalhos sobre teoria e filosofia da ciência de Karl
Popper (1902-1994), o método científico não se compadece com uma expressão como
por exemplo “Ciência dos Magos”, corrente em philosophia occulta. Com efeito,
Popper considera como “pseudociências” a Astrologia, a Alquimia, a Metafísica,
o Historicismo marxista e até a Psicanálise freudiana, porque não se encaixam
no seu critério de “falsificabilidade”. A ciência académica, portanto, descarta
tudo quando não se reduza aos seguintes vectores: (1) a observação e a
experimentação veiculadas através dos cinco sentidos ou de artefatos
tecnológicos que os prolonguem e/ou amplifiquem, e (2) a razão que organiza os
dados observáveis em teorias coerentes, de preferência segundo o modelo
matemático. Bom, mas não sejamos demasiado reducionistas! A mesma palavra pode
ter, sem escândalo, acepções diferentes consoante o «território» onde se
contextualiza. Por exemplo o termo «plataforma» adquire significados radicalmente
distintos consoante o situamos no «território» ferroviário, no informático, ou
no da construção civil. O mesmo se passa com a ciência. O importante é usar
expressões compósitas que indiquem sem ambiguidades qual o território onde a
respectiva «ciência» se insere: por exemplo, se usarmos esse termo aplicado à
Física, à Química ou à Astronomia não temos dúvidas quanto ao seu significado;
do mesmo modo, quando dizemos «Ciência dos Magos» ou classificamos a Astrologia
ou a Alquimia como «Ciências Sagradas», estamos claramente noutro território,
aquele em que scientia significa um conhecimento ou um saber antigos,
organizados mas não necessariamente matematizantes, sejam secretos (esotéricos)
ou divulgáveis (exotéricos), e do mesmo passo as dúvidas desaparecem e deixa de
haver contradição ou sequer confusão. Ora bem: após este rápido esclarecimento,
retomemos o fio à nossa meada. Começarei por referir que a ciência, no sentido
académico, tem ao longo dos tempos entendido de forma ligeiramente diferente o significado
de ambos aqueles ramos do saber científico: Cosmogonia e Cosmologia: Fase 1
(antes dos anos 70 do século XX): Cosmogonia: Ramo da Astronomia que estuda a
formação do Sol e a origem e evolução dos restantes corpos do sistema solar;
Cosmologia: Ramo do Astronomia que estuda o nascimento, a estrutura e a
evolução do Universo, no seu conjunto. Fase 2 (depois dos anos 70 do século
XX): Cosmogonia: Ramo da Astronomia que estuda o comportamento evolucionário do
Universo, bem como a origem das suas características, incluindo o sistema
solar; Cosmologia: Campo de estudos interdisciplinares em que se associam
várias ciências naturais, nomeadamente a Astronomia, a Física, a Astrofísica, a
Paleontologia, etc. num esforço conjunto para compreender o Universo como um
todo unificado. A título de curiosidade, e entre parêntesis, refira-se uma
terceira ciência «cósmica» que eu ainda estudei nos meus longínquos tempos
liceais, a Cosmografia, uma palavra hoje caída em desuso mas que teve a sua
voga antigamente: é uma espécie de descrição elementar da esfera celeste e dos
corpos e círculos que a integram (o equador celeste, a eclíptica, etc.), de um
ponto de vista geocêntrico. A Astrologia, por exemplo, tal como a navegação
marítima e a navegação aérea, fazem mais apelo à antiga Cosmografia do que à
Astronomia propriamente dita. Um dos mais veneráveis e conhecidos tratados de
Cosmografia, por exemplo, foi o famoso Tratado da Esfera, do inglês João de
Sacrobosco (1195-1256). Em geral, pelo menos em certos círculos, insiste -se na
tendência de associar a Cosmogonia à especulação mítico-religiosa sobre a
origem do Universo, de um ponto de vista quer místico, quer oculto, quer
teológico, ao passo que a Cosmologia fica mais sob a alçada da ciência
académica, ou das várias ciências implicadas, que se debruçam sobre esse
estudo, embora «ignorando», de certo modo, o problema da origem — ou do t = 0
(o ponto zero em que o tempo começou) — , para se concentrarem no estudo do que
aconteceu depois do big bang. Na verdade, especular sobre o que aconteceu antes
de t = 0 não terá muito sentido, porque «antes» implica o conceito de tempo, e
onde não há tempo não pode haver antes nem depois (…). Numa outra conferência
deste Colóqio já se falou aqui da génese mítica do Cosmos entre os gregos; por
exemplo, nos versos 115 a 125 da Teogonia, o velho Hesíodo (sécs. VIII AC VII))
pede às Musas que lhe contém o que existiu antes de tudo, dos deuses, dos
astros, do céu, da terra, etc. “Em primeiro lugar — diz Hesíodo — existiu,
realmente, o Caos”. Seguiu-se Gaia, “a de amplos seios”, e “do Caos nascerem
Erebo e a negra Noite”. Como “fruto dos amores destes dois, nasceram Éter e
Hemera (Dia)”. — Portanto a Noite é anterior ao Dia, ou seja: as trevas
antecederam a luz, ou ainda: a LUZ saiu das trevas. Os Órficos tinham uma
Cosmologia idêntica: tudo começara nas trevas, fosse a Noite, fosse o Tártaro —
terrível, negra e profundíssima região que fica tão distante do Hades como o
Hades fica do Céu. O Caos, portanto, é a profundidade total, o abismo, o Informe
primordial, anterior à Criação, quando um certo tipo de ordem ainda não havia
sido imposta aos elementos do mundo. O Caos, portanto, seria o equivalente a um
estado de entropia zero. (Como sabemos, à medida que o Universo avança no
tempo, a entropia aumenta, ou seja, há cada vez menos energia disponível para
se converter em trabalho mecânico). Até que ponto podemos identificar a Criação
com a explosão» inicial, ou a Singularidade do momento inicial, como uma
descarga de energia concentrada, é um assunto que tem provocado diversas
posturas e concomitantes discussões físico-filosóficas. Trata-se duma relação
ordem-desordem, e vice-versa. Segundo o Génesis, e com imagens alegóricas que
os estudiosos dizem ter sido extraídas da mitologia babilónica, Deus criou o
mundo a partir do caos, da escuridão, do abismo: os dois primeiros versículos
bíblicos dizem que Deus criou o céu e a terra, e que a terra era um vazio
informe — o tohu vabohu do texto hebraico. No Livro da Sabedoria, livro bíblico
que a tradição hebraica rejeita, mas que a tradição católica considera como
canónico, lê -se que a mão todo poderosa de Deus “criou o mundo a partir de
matéria informe” (Sabedoria 11, 17). Fora do mundo hebraico, a ideia de não
criação existia quer no pensamento grego, como o vemos por exemplo expresso em
Epicuro (IV AC III), quer também, mas mais tarde, entre os Romanos, por exemplo
na filosofia poética de Lucrécio (século I AC). Estes e outros autores deram
origem ao aforismo ex nihilo nihil fit («do nada, nada se faz») que resume a
referida posição e foi tirado do poeta latino estóico Pérsio (século I DC), de
um verso das suas Sátiras (III, 24), e significa que nada foi criado, pois tudo
o que existe, existe desde sempre, desde toda a eternidade (parece a teoria do
“estado estacionário”, de Fred Hoyle (1915-2001) Talvez devida a essa
influência grega, a única alusão bíblica a uma criação ex nihilo encontra-se
num livro escrito por volta do século II AC o 2.º livro dos Macabeus, numa
frase que a mãe dos sete heróis Macabeus profere para animar os filhos,
martirizados pelo tirano Antíoco Epifânio IV: «Imploro-te, meu filho, olha para
a terra e para o céu e tudo o que há neles, e de como Deus os fez a partir do
nada, e de como os humanos vieram à existência da mesma maneira» (2 Macabeus 7,
28). A ideia cristã de que Deus teria realmente criado o mundo a partir «de
nada» — a famosa creatio ex nihilo —, contrariando o que diz o Gênesis e o
livro da Sabedoria, estabeleceu-se e progrediu sobretudo no século II DC, e
surgiu de uma mescla de várias formulações filosóficas. Dois dos promulgadores
dessa ideia, que mais preponderância tiveram na respectiva divulgação, foram,
por um lado o gnóstico Basilides, e por outro o apologeta Justino Mártir, ambos
do século II. Na sequência, e prosseguindo na negação da ideia dum Caos
primordial donde foi criado o Cosmos (antiga ideia bíblica e — já veremos —
também Rosacruciana), Santo Agostinho (354-430) aceitou e teorizou a doutrina
da creatio ex nihilo, e fê-lo, curiosamente, para combater as concepções do
Neoplatonismo — segundo as quais o mundo, no seu próprio Ser, é contínuo com a
Realidade última e Divina, o Uno, e que do Uno emanam graus descendentes,
sucessivos e cada vez mais atenuados de Ser, constituindo os diversos níveis do
Universo. Agostinho, a fim de desmontar esta concepção emanatista, sustentou
que o Universo é um reino criado, trazido por Deus à existência a partir de
nada (ex nihilo). Ele defende esta ideia nomeadamente no seu livro De natura
boni, onde tenta demonstrar que o mal é a privação do bem, todas as coisas
criadas por Deus são boas por essência, e que o nihil do qual Deus criou o
Cosmos não é qualquer espécie de matéria ou caos preexistente, mas que a
expressão ex nihilo, “do nada”, significa apenas “não de algo”. Esta ideia do
«out of nothing» encontramo-la, curiosamente, em certas cosmologias atuais,
como as que são perfilhadas por dois cientistas agnósticos de Oxford, Peter
Atkins (1940- ) e Richard Dawkins (1941- ). Este último, que é um excelente
vulgarizador científico, “demonstra” nos seus muito citados livros The Selfish
Gene (1976) e The Blind Watchmaker (1987), que a existência dum intelligent
designer para a Criação e evolução do universo é uma falsidade: admitir que
existe uma divindade como causa inicial da evolução é uma falácia porque faz
depender o nosso nível de complexidade duma complexidade ainda mais complexa e
que não pode ser explicada — claro, não pode ser explicada em termos de ciência
materialista e positivista. Por sua vez o Prof. Peter Atkins, no seu livro
Creation Revisited (1994), afirma que «a Singularidade do big bang, que os
cientistas geralmente acreditam ter marcado o início do nosso Universo, pode
ter emergido espontaneamente ‘out of nothingness’. A ciência propõe-nos
diferentes teorias cosmológicas, como por exemplo a do cientista Andrej Linde
(1948- ), que é a da da inflação
caótica, com muitos universos dentro uns dos outros; a de Stephen Hawking
(1942-2018), uma Cosmologia quântica intemporal, que não necessita dum estado
inicial, ou seja, um universo sem fronteiras; a de Roger Penrose, que é
assimétrica relativamente ao tempo, assimetria essa que ele considera inerente
à própria natureza do tempo no Universo etc. Seja como for, qualquer das
teorias científicas concorda que inicialmente as partículas de energia
resultantes do «arranque» eram praticamente fotões — Luz! O que parece
concordar com o Génesis bíblico… antes de ter criado as «fontes de luz, ou
seja, o Sol, a Lua e as estrelas, a Divindade Criadora pronunciou uma palavra —
logo no primeiro dia! — e a luz surgiu. O Sol, a Lua e as estrelas só foram
criados no quarto dia. A ciência agnóstica, porém, não pode admitir um Criador
do Universo devido às armadilhas «exotéricas» em que essa posição se enreda:
com efeito, levando o raciocínio ao extremo lógico, os cientistas positivistas
ou neo positivistas não têm outro remédio senão contrapor a inevitável
pergunta: — E quem criou o Criador? A esta questão a Bíblia dá uma curiosa
resposta. Se articularmos a primeira epístola de João: Deus é luz (1 João 1,
5), com o primeiro capítulo do Génesis: Deus disse: faça-se a luz, e a luz
fez-se (Genesis 1, 3), concluiremos, matematicamente, que Deus se fez a Si
mesmo, ou seja, Deus é AQUILO que permite a auto irrupção de Singularidades —
entre as quais o big bang ! Apesar do que comecei por dizer há pouco sobre o
que é uma «ciência oculta», na verdade a concepção cosmológica do Universo,
dentro da Philo-Sophia Rosacruz, não é tanto científica no sentido popperiano
do termo, ou no sentido hard como hoje se costuma dizer, mas sobretudo
“Theo-Lógica”, no sentido lato. Aliás a concepção cosmológica rosacruciana
aproxima-se, de certo modo, da moderna Teologia do Processo, defendida por
filósofos e teólogos como A. N. Whitehead, J. B. Cobb, D. R. Griffin, Ch.
Hartshorne, etc. que criaram e divulgaram o termo Process Theology. Esta
teologia perfilha a doutrina do panenteísmo [gr. pan + en + theos], caminho
intermédio entre a negação da liberdade individual e da criatividade (que
caracteriza muitas das variedades do panteísmo , como por exemplo o de
Heraclito, Anaxágoras, Platão, Plotino, ou das religiões orientais como o
Hinduísmo e o Budismo) e o remoto distanciamento do divino (que caracteriza o
teísmo clássico, como o das Igrejas ocidentais institucionalizadas, a Católica
romana, as denominações protestantes e as Ortodoxas grega e russa). O
panenteísmo começou a ter uma elaboração sistemática no séc. XIX com Fichte,
Schelling e Hegel, e sobretudo no séc. XX com a «Filosofia do Processo» do
filósofo e matemático inglês Alfred N. Whitehead (1861-1947). O «teólogo do
processo» Charles Hartshorne (A Natural Theology For Our Time, Open Court, La
Salle 1967) fez uma análise teológica completa do panenteísmo, baseado na
analogia de um organismo (Deus) que compreende células individuais e semi
autónomas (todos os constituintes conhecidos e desconhecidos da realidade). Uma
boa descrição deste sistema encontra-se em John B. Cobb & David R. Griffin
(Process Theology: An Introductory Exposition, Westminster Press, Philadelphia
1976). Segundo esta óptica, o problema do mal, de difícil solução no teísmo
clássico, é ultrapassado uma vez que Deus e o ser humano evoluem em
inter-acção, sendo o mal apenas uma fase de carência transitória: «Sereis,
pois, perfeitos, como o vosso Pai celestial é perfeito» (Mateus 5, 48). Recomendo a
consulta do estudo de Marjorie Suchoki The End of Evil: Process Eschatology in
Historical Context (Suny Press, Albany 1988). Com vimos, a perspectiva panenteísta que os filósofos e teólogos «do
Processo» defendem constitui uma posição intermédia entre teísmo — Deus
transcendente ao mundo — e panteísmo — Deus totalmente imanente ao mundo. Deus
e o mundo cooperam: Deus atrai o mundo para a novidade e para uma maior
complexidade, harmonia e ordem, ao mesmo tempo que é influenciado por
experiências com o mundo. Há liberdade em todas as entidades: Deus tenta
persuadir mas não obriga. Ou seja, a Teologia do Processo rejeita a creatio ex
nihilo e defende que a ação de Deus no mundo não se exerce por intervenções pontuais,
mais ou menos miraculosas, mas opera como creatio continua, como atividade
perene que sustenta a criatura sem cessar, promovendo-a continuamente. Assim, a
transcendência divina não é um remoto distanciamento, mas antes uma presença
íntima, fundante e sempre ativa, que inclui o «todo» em si mesma sem o absorver
nem se deixar absorver por ele. Esta ideia de «um Deus que evolui» é uma ideia
comum a diversas correntes esotéricas, ao mesmo tempo que se adapta
perfeitamente à ideia de um Deus pedagogo, que vai exercendo «catequese» nos
sucessivos estágios da evolução humana, revelando os mistérios à medida que o
ser humano vai sendo capaz de os apreender. Encontramos uma interessante
formulação desta ideia num dos três sonetos iniciáticos que Fernando Pessoa
dedicou a «Christian Rosenkreuz»: Deus é o Homem de outro Deus maior; Adão
Supremo, também teve Queda; também, como foi nosso Criador, foi criado, e a
Verdade lhe morreu… De além o Abismo, Sprito Seu, Lha veda; aquém não a há no
Mundo, Corpo Seu. … Deus é o Homem de outro Deus maior; Adão Supremo, também
teve Queda; também, como foi nosso Criador, foi criado, e a Verdade lhe morreu.
De além o Abismo, Sprito Seu, Lha veda; aquém não a há no Mundo, Corpo Seu.
Segundo o teólogo galego Andrés Torres Queiruga (1940- ) a Teologia do Processo caracterizar-se-ia
do seguinte modo: « … a ação de Deus não se reduz a um mero impulso inicial que
cessa uma vez realizado e que, quando muito, reaparece em intervenções pontuais
[“intervencionismo teológico”]. Pelo contrário, a sua ação opera como creatio
continua, como atividade perene que sustenta a criatura sem cessar e
continuamente a promove. É nesta direção que se orienta a Teologia do Processo,
de grande vitalidade no atual pensamento anglo-saxónico. Trata-se duma visão
panenteísta (tudo em Deus), segundo a qual a transcendência divina não consiste
num apartamento/separação do mundo, mas numa presença íntima, fundante e sempre
ativa, presença essa que inclui tudo em si mesma sem absorver esse tudo nem se
deixar absorver por ele» (Fin del Cristianismo Pré-moderno, Editorial Sal Terra
e, Santander 2000, pp. 206-207). Ou seja, há liberdade em todas as entidades:
Deus influencia e tenta persuadir (daí a Revelação), mas Deus não coage (tal
como os Mestres Rosacruzes não coagem: ensinam o discípulo a julgar-se a si
mesmo e dão-lhe total liberdade e correlata responsabilidade). A Teologia do
Processo rejeita a creatio ex nihilo, e, pelo contrário, afirma uma doutrina de
criação a partir do caos (Cobb & Griffin 1976, 65). O fundador de The
Rosicrucian Fellowship, Max Heindel (1865-1919), iniciado rosacruciano que
afirma ter estado em contacto directo com os Fratres Seniores (Irmãos Maiores)
da misteriosa Ordem Rosacruz, e ter recebido deles as suas Iniciações,
praticamente não usa as palavras Cosmogonia ou Cosmologia excepto uma vez, cada
uma delas, a propósito do «mito da criação» nos textos islandeses da Edda
(Ancient and Modern Initiation, The Rosicrucian Fellowship, Oceanside 1931, p.
79). Em contrapartida prefere Cosmogénese, que contrapõe a Antropogénese, na
sua obra fundamental, The Rosicrucian Cosmo-Conception, de 1909. Neste seu
livro, Heindel elucida-nos alguns pontos interessantes desta Cosmogénese. Por
exemplo, sobre o Caos: «O Caos não é um estado que, tendo existido no passado,
tenha desaparecido completamente. Continua à nossa volta, mesmo agora. Não
poderia haver progresso se as formas velhas, que já prestaram toda a sua
utilidade, não se dissolvessem constantemente no Caos, e se este não desse
origem, também continuamente, a novas formas. A obra da evolução cessaria e a
estagnação impediria toda a possibilidade de desenvolvimento» (The Rosicrucian
Cosmo-Conception, The Rosicrucian Fellowship, reed. Oceanside 1977, p. 249).
Noutro lugar do mesmo livro esclarece a impossibilidade de um vazio absoluto,
mesmo primordial: «Para os Rosacruzes, tal como para qualquer outra escola de
ocultismo, não existe nada semelhante ao vácuo ou “vazio de espaço”. Para eles
o espaço é Espírito em forma atenuada, ao passo que a matéria é espaço ou
Espírito cristalizado. A manifestação do Espírito é dual: o que vemos como
Forma é a manifestação negativa ou polo negativo do Espírito, cristalizado e
inerte. O polo positivo do Espírito manifesta-se como Vida, que galvaniza a
Forma negativa e a leva à acção; porém, tanto a Vida como a Forma têm a sua
origem no Espírito, no Espaço, no Caos!» (ibidem, pp. 247-248). De acordo com a
Cosmogénese rosacruciana há que distinguir entre o SER SUPREMO e o Ser a que as
religiões chamam DEUS, numa visão majestosa e amplíssima evidenciada na citação
de Fernando Pessoa que vimos atrás: Deus é o Homem doutro Deus maior: Adão
Supremo, também teve Queda; Também como foi nosso Criador, Foi criado e a
Verdade lhe morreu. Os respectivos atributos assim se repartem
triunitariamente, em correlação «vertical»: SER SUPREMO: • PODER (Pai) • VERBO
(Filho) • MOVIMENTO (Espírito Santo). DEUS: • Vontade (? Pai) • Sabedoria |
Amor (? Filho) • Atividade (? Espírito Santo). O 1.º aspecto do Ser Supremo
concebe ou imagina o Universo antes do começo da Manifestação ativa, incluindo
os bilhões de mundos e sistemas e as grandes Hierarquias que habitam nos Seis
Planos Cósmicos de existência. O 2.º aspecto manifesta-se como força de atração
e coesão (que dá origem ao Amor de DEUS), é o Verbo Criador — Palavra criativa
—, e modela a Substância-Raiz cósmica, tal como os sons modelam formas. (Os
cientistas chamam-lhe substância cósmica primordial, de temperatura
elevadíssima nas primeiras fracções de segundo após o big bang). Entretanto, o
3.º aspecto (Movimento) já havia despertado a Substância-Raiz do seu estado
natural de inércia (a «ordem» caótica, ou estado «de simplicidade e equilíbrio»
como dizem os cientistas) a fim de a dotar de todos os graus diferentes de
vibração que vão permitir que o Verbo os modele. Essa Substância-Raiz é uma
expressão do polo negativo do Espírito Universal Absoluto, ao passo que a
expressão da energia positiva é o Grande Ser Criador a quem chamamos Deus, e de
quem fazemos parte: «Nele vivemos, nos movemos e somos» (Atos 17,28). Toda a
matéria que conhecemos resulta da ação mútua desses dois polos, e é espaço
cristalizado, emanado do pólo negativo dessa Substância Espiritual Primordial.
A palavra hebraica elohim, que as Bíblias correntes traduzem por «Deus», na
verdade é um plural, «deuses», e nessa forma plural aparece mais de 2.000 vezes
na Bíblia hebraica, a começar pelo primeiro capítulo do Génesis: «No princípio
Elohim criou o céu e a terra» (Génesis 1,1). A forma singular, eloah, também se
encontra no Antigo Testamento: só no livro de Job, por exemplo, aparece cerca
de 40 vezes. Excluída a frágil explicação do plural majestático, que de facto
em hebraico não existe, e reconhecendo que a Bíblia hebraica enfatiza a
unicidade de Deus (“shema Yisra’el, Adonay elohênu, Adonay ekhad”: «Escuta,
Israel, Jahvé é o nosso Deus, Jahvé é um só» — Deuteronómio 6, 4), as doutrinas
Rosacruzes ensinam-nos que os Elohim correspondem às Seis Hierarquias Criadoras
que trabalharam na nossa evolução a fim de trazerem o homem até ao ponto de
adquirir uma forma física por meio da qual o Espírito interno pudesse funcionar
(Heindel 1977, 325-326). Na verdade Jahvé é o chefe dessas Hierarquias, e não
exatamente o Ser Supremo com que redatores tardios o confundiram. Não podemos
esquecer que a maior parte dos livros do Antigo Testamento bíblico, tais como
os conhecemos hoje, resultaram de uma tradição oral que vem de longínquos
ancestrais e que foi por fim passada a escrito por sucessivas gerações de
descendentes, com as deformações, «correções» e reformulações inevitáveis. Uma
prova de que Jahvé é um Superior, ou um Chefe pouco acessível, e que os humanos
tinham um contato mais imediato — eventualmente mais amigável — com os Elohim,
encontramo-lo na seguinte situação relatada no Génesis: Jacob empreendeu uma
longa viagem até Haran, para arranjar esposa, e fez o seguinte voto: «Se eu
regressar em paz [a salvo] a casa do meu pai, Jahvé será para mim como os
Elohim» (Génesis 28,21). Isto parece significar que se as coisas lhe correrem
bem, ele verá no distante «chefe» Jahvé um ser tão fraterno e convivial como os
Elohim, pois a forma como a frase está construída não deixa dúvidas de que se
está a referir a entidades distintas. Finalmente — mas não por último! — o
Divino Plano evolutivo realiza-se em sete Grandes Períodos de Manifestação, que
têm as suas correspondências ritualísticas nos dias da semana: Os Sete Grandes
Períodos de Manifestação, Max Heindel, Conceito Rosacruz do Cosmos. Atualmente,
encontramo-nos no início da Metade Mercurial do Período Terrestre. Esclareça-se
que aquelas designações não se referem aos astros que conhecemos, Saturno, Lua,
Sol etc., mas são designações ocultistas de estados diferentes e evolutivos do
nosso globo terrestre, ao longo de tempos inimagináveis, com a duração de bilhões
e bilhões de anos, cuja correspondência macro crónica se reflete, micro
cronicamente, no mistério dos sete dias da semana. É caso para se dizer: o Ser
Supremo, ou Deus Altíssimo, ou o Absoluto, ou a Grande Inteligência Cósmica (…)
é algo que transcende de tal modo a nossa relativíssima pequenez que não temos
imaginação e muito menos palavras que nos deem uma imagem sequer aproximada de
tão maravilhosa vastidão. Vastidão que não é apenas um incompreensível vazio,
mas um infinito RESERVATÓRIO DE AMOR. Assim sendo, por aqui me fico e mais não
digo porque mais não sei. www.fraternidaderosacruz.org.
Abraço. Davi
Nenhum comentário:
Postar um comentário