segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

O SIGNIFICADO DE CADA MOMENTO PRESENTE.

Espiritualidade. Texto de N. Sri Ram (1889-1973). Tradução de Cássia Mesquita. O SIGNIFICADO DE CADA MOMENTO PRESENTE. Todo objeto que existe possui uma extensão. Essa extensão pode ser infinitesimal ou vasta e imensurável. Mas se não houver nenhuma extensão, o mesmo se tornará um ponto sem dimensão. Similarmente, se algo simplesmente existe, o faz por um período de tempo. Mesmo que seja uma partícula elementar que faz uma aparição por apenas um bilionésimo de segundo, esse período constitui sua duração. Grande ou pequena são termos relativos de medição na escala de nossa experiência. Nada é grande ou pequeno em si mesmo. É apenas o que é. Nosso pensamento tem com base nossa experiência das coisas. Somos conhecedores do munda acerca de nós. Das coisas que são sentidas e percebidas por nós de determinadas maneiras. Também as vemos relacionadas entre si. Mas isso só tem alguma validade quando nosso pensamento está de acordo com tudo isso. Se pensarmos de uma maneira que contraria os fatos de nossa experiência e do mundo em que vivemos, ao qual estamos relacionados, seremos então como a Alice no País das Maravilhas. Pois assim como as COISAS que nos circundam estão no espaço e no tempo, estão também em nosso pensamento. Uma imagem em nossa mente possui uma extensão como qualquer objeto no mundo exterior, e ela existe por um período de tempo, mesmo que esse período seja uma fração de segundo. Não é possível efetivamente imaginar um ponto sem dimensão, mesmo se falarmos sobre ele. Quando quisermos imaginar tal ponto, temos que começar com uma linha ou um círculo, diminuindo-o progressivamente. O processo de aproximação torna-se um substituto para o ponto. Também não podemos formar uma imagem do nada, apesar de acharmos que podemos. Esta é uma das ilusões de nossa mente. Digo isso porque o MOMENTO que descrevemos como o MOMENTO PRESENTE é este ponto que existe impalpável na linha que represente o PASSADO, o PRESENTE e o FUTURO. Também podemos pensar no PRESENTE como uma linha que divide o PASSADO do FUTURO, mas uma linha tão fina que quase não existe. Podemos imaginar o FUTURO como um FLUXO ESCOANDO DO PASSADO, embora o FUTURO não possa ser considerado como existente exceto em pensamento. O PASSADO também existe somente em nossa consciência, pois está concluído e já PASSOU. Na verdade, somente o PRESENTE existe, mas quando pensamos em algo no PRESENTE, a imagem mental já está no campo da memória, tendo-se tornado uma impressão do PASSADO. O PRESENTE, em constante avanço para frente, arrasta atrás de si o PASSADO associado a ele na forma de memória. A natureza essencial da consciência é refletir sobre o que é, perceber e registrar, um simples ato que, se abrangente e profundo o bastante para penetrar todas as camadas do que existe, somaria em si toda a verdade possível de ser produzida em pensamento. O pensar segue caminhos limitados, todavia muito mais complexos. Se observarmos qualquer COISA e passar adiante para outras, de modo que a consciência da percepção é como uma onda que se move continuamente para frente. Uma onda possui uma fachada na qual existem muitos pontos. Temos percepção da presença de muitas COISAS simultaneamente. Ela pode iluminar um campo inteiro de objetos. É realmente semelhante ao espaço que inclui todos os objetos. O que faz do homem um pensador, uma característica que o destaca de todos os outros seres vivos, é sua memória e o uso que é capaz de fazer dela. A VIDA ESTÁ sempre contida naquele INSTANTE INTANGÍVEL que chamamos de PRESENTE, contudo a consciência, que é inseparável dela, possui como seu domínio não apenas o que percebe no INSTANTE PRESENTE, mas a região que já percorreu e incluiu em suas memórias, sobre a qual projeta uma estranha luz colorida pelo PRESENTE. A memória constitui o terreno sobre o qual o pensamento se movimenta e constrói seus edifícios. Sem lembrança do que foi registrado cronologicamente no PASSADO, o homem não pode pensar. Assim como sua vida perderia sua coerência, e seus atos no PRESENTE, sua relevância.  Ele estaria se movimentando como um veleiro ao sabor do vento, que sopra a todo momento daquele movimento, mas incapaz de direcionar seu curso em qualquer direção. Nesse caso, a própria palavra direção envolve dois pontos, o momento PRESENTE, com relação ao qual não há nenhuma opção de escolha, e um MOMENTO PRESENTE que, através do PRESENTE, faz sua ligação com o FUTURO. Quando se fala em evolução, existe uma contínua e crescente capacidade de lembrança. Nossa memória é muito mais sutil e inclusiva do que a de qualquer animal. Um animal desenvolvido como o elefante pode lembrar-se de determinados eventos por um longo tempo. Contudo a nossa memória possui uma extensão mais ampla; ela inclui ideias e experiências pertencentes exclusivamente ao estágio humano. Se apenas lembrássemos do PASSADO, essa memória factual não prejudicaria ou modificaria a ação da consciência NO PRESENTE. Pensamos, sentimos e reagimos aos eventos somente NO PRESENTE e esta ação pode ser nova e desvinculada de qualquer reação DO PASSADO que possamos recordar. De forma geral, esta ação pode ser desvinculada, mas infelizmente não é. A existência de um registro DO PASSADO não precisa interferir em uma ação NO PRESENTE. Então por que ela interfere desse modo e predetermina a ação da mente, privando-a de sua liberdade? A predeterminação nasce de uma ligação de causação entre o registro e a consciência PRESENTE. A menos que exista essa relação de causa e efeito, O PASSADO é finalizado. Ele na verdade não existe e não precisa afetar O PRESENTE de forma nenhuma. Porém, em nossa ignorância, CADA MOMENTO gera seu subsequente, transmitindo sua natureza de alguma maneira. Num PRIMEIRO MOMENTO existe um determinado estado de consciência. NO MOMENTO SEGUINTE, há o mesmo estado modificado por novos impactos e reações vindas do estado que existiu primeiro. A ligação entre os DOIS MOMENTOS não é uma mera cronologia do tempo, mas é psicologicamente criada pelas forças que surgem DO PASSADO e invadem O PRESENTE ESTADO de consciência. São forças de atração e repulsão, preferências e aversões, esperanças e medos. Somente aparentemente essas forças surgem DO PASSADO que carregam. Mas podemos falar delas como decorrentes DO PASSADO assim como dizemos que o Sol nasce do Leste. Algo aconteceu ontem. Fui insultado, ou pensei ter sido, o que muitas vezes é o caso, mesmo quando não há nenhuma intenção de insulto. A mágoa permanece. Ela afeta meu pensamento e comportamento agora. Vemos aqui que há uma determinada força surgindo da memória de um evento, que ocorreu NO PASSADO e está operando NO PRESENTE. Para dar outro exemplo. Tive uma agradável experiência ontem. O fato está registrado em minha consciência. Mas quando me recordo da experiência, há uma força que surge do registro em minha memória, que é o desejo por aquela experiência. Esta força dirige meu pensamento AO MOMENTO PRESENTE pelo apego àquela experiência. Se decidir repeti-la, o desejo será assim fortalecido, provocando em mim o desejo pela repetição frequente daquela experiência. Todos os desejos provêm da memória de EXPERIÊNCIAS PASSADAS, porém operam e modificam o pensamento e a ação NO PRESENTE. Não é possível desejar algo que jamais tenhamos conhecido. O desejo não pode existir sem uma base. Podemos experimentar uma nova sensação, ela pode vir a nós, todavia quando pensamos que desejamos algo novo em nós em função do estímulo de novas associações. Dentre as forças baseadas NO PASSADO estão os nossos medos que inibem o fluxo, a ação natural, das energias dentro de nós. Podemos facilmente encontrar inúmeros exemplos de nossa experiência de como os eventos DO PASSADO assombram O PRESENTE. Mesmo quando a consciência é apenas um minúsculo germe, ela pode se apegar, pois esta é sua natureza. Um inseto rasteja pela flor até o lugar onde o mel pode ser encontrado. Ele esteve lá antes e apreciou o sabor do mel ou é levado a ele pelo cheiro. Mesmo que sua consciência seja nada mais do que uma coisa minúscula, ela se apega à sensação de apreciação, sendo atraída por ela mecanicamente. Existe nela uma memória incipiente. O processo de formação de apegos é contínuo a partir da infância. A vida significa contatos de diversos tipos, e quando um contato é agradável, ele causa uma sensação gratificante, e a mente rapidamente se apega a essa sensação. Isso acontece pela forma da inércia psicológica, quando não se está atento ao processo. Tudo que é construído perde sua força no decorrer do tempo, e o cérebro também perde sua vitalidade e coerência com a idade. Contudo há mudanças que surgem não devido a qualquer causa física, mas exatamente em virtude da maneira pela qual a mente trabalha em estado de inconsciência. Estamos fazendo aqui uma distinção entre cérebro e mente, atribuindo a esta última uma condição independente. Se a vida fosse um produto da matéria, então a vida deveria secar com a deterioração do corpo, e quando o corpo morre, a vida e a consciência deveriam partir para sempre, como a chama de um pavio que foi consumido. Todavia, em uma visão profunda da matéria, a vida e a consciência podem ser manifestações de uma energia que é a base do Universo. Porém que de assumir uma forma, uma organização material, para a expressão de significado. De qualquer maneira, podemos ver como a consciência limita a si própria. Ela forma ideias em diversas matérias. Essas ideias não são meramente formas de suas ações, mas tendem a se tornar cristalizações que permanecem na mente. A mente se apega a elas, pelo prazer que fornecem ou pelo medo da dor, e então, todo o processo de pensamento realiza-se em relação a elas, gira em torno delas. O homem é um pensador, como a derivação da palavras – homem – indica. Ele está constantemente envolvido na ideação de diferentes tipos. Não pode haver nada de errado com a formação de ideias ou em desfrutar algo agradável, isto é, em registrar uma sensação agradável. No entanto complicações apresentam-se quando nos tornamos apegados às sensações ou a ideias e buscamos permanência. Todo apego é um limitador. Mentalmente e emocionalmente levantamos muros ao nosso redor que constituem uma prisão dentro da qual as atividades da mente estão confinadas. Ela permanece enclausurada em seu interior e projeta diversas ideias de lá. Todas essas ideias brotam no solo de seus condicionamentos, isto é, o terreno das experiências vividas e de suas reações a elas. O homem ambiciosos projeta uma imagem de sua própria importância diante de si, a qual busca realizar. Da mesma forma, aquele que tem medo projeta sombras do que pode acontecer a ele a cada muro que lhe aparece. Se a consciência presente abandona seus apegos, que na verdade, são suas próprias memórias, imediatamente ocorre uma mudança de grande proporção. As memórias não deixam de existir, todavia irão retroceder, provocando NO PRESENTE um estado de completa liberdade e naturalidade. O PASSADO se transformará em mera paisagem. Diz-se que o BUDHA PODIA-SE LEMBRAR DE  TODOS OS EVENTOS de suas encarnações PASSADAS. Certamente tais lembranças não afetava de forma alguma sua serenidade, a liberdade que alcançou, e sua atitude benigna para com todos os seres e todas as COISAS. O PASSADO ERA APENAS UM MAPA estendido à sua frente. Quando a mente está se exercitando ENTRE PASSADO E FUTURO, preocupada com O PASSADO E PROJETANDO O FUTURO, ela tem pouca raiz ou interesse NO PRESENTE. Suas energias não estão ALI PRESENTES, exceto por um pequeno instante. Dividida e puxada em diferentes direções, a mente não está em seu ESTADO NATURAL, contudo em um estado de fragmentação e tensão. Seu ESTADO NATURAL é o espontâneo, enquanto que o estado modelado é aquele no qual a substância da consciência passou por MUDANÇAS e está modelada em fragmentos  de diversos tipos. Trata-se de uma condição em que a sensibilidade e a liberdade, inerente à sua natureza e ação consciente no estado não modificado, são quase que completamente perdidas. Somente a consciência, que é pura totalidade indivisível, pode refletir a verdade de tudo aquilo que toca, e é nesta verdade que reside a significância da coisa ou do evento. Não podemos dizer que todo momento vivenciado é significativo. Em alguns POUCOS MOMENTOS DE NOSSAS VIDAS , eles o são, porém são muito poucos. SÃO MOMENTOS de BELEZA, de AMOR e FELICIDADE, de ILUMINAÇÃO, de REVELAÇÃO DE COISAS que  não tínhamos conhecimento. O restante de nossa vida é lugar comum, muitas vezes uma prolongada monotonia desprovida de qualquer significado real. SE UM MOMENTO É SIGNIFICATIVO ou não, vai depender do estado da mente e do coração, bem como da reação NO MOMENTO. Independentemente das condições externas, todo MOMENTO PODE SER SIGNIFICATIVO. Se eu estou sofrendo da monotonia DO PRESENTE NA ESPERANÇA de atingir um ponto em que vou experimentar a sensação que pretendo, cuja sensação é um reflexo de experiência que tive NO PASSADO. Estarei na verdade projetando uma imagem DO PASSADO que me parece significativa, e tudo o que eu estou fazendo NO PRESENTE é viajar vagarosamente ou impacientemente na direção daquela imagem que no final pode se tornar uma miragem. A VIDA É AÇÃO EXTERIOR, mas também envolve o campo do pensamento e dos sentimentos. Pode-se experimentar significância em qualquer MOMENTO, independente do que acontece do lado de fora. Porém dependente da ação que brota no interior. Em outras palavras, a importância surge de toda a condição do indivíduo NAQUELE MOMENTO. Se isso for verdade, está verdade revela uma perspectiva integral do que a vida pode significar. A consciência do homem, em seu estado composto, isto é, fatiada em vários segmentos e mantidos unidos por meio de diversos ajustes como uma aparente totalidade, participa da natureza da matéria e funciona mecanicamente. Ela assume tal condição quando não está desperta. Por estar meio dormindo ou sonhando, ela não reage plenamente nem enxerga claramente; sendo então tomada, em grande parte, pela operação do hábito ou do instinto cego. Os eventos ocorrem por si próprios no campo do pensamento e dos relacionamentos exteriores. Existe algum tipo de consciência durante o sonho, contudo pela ausência de uma inteligência alerta, o sonho torna-se sem coerência e racionalidade. Quando estamos agindo mecanicamente, somente roçamos a superfície das COISAS E AGIMOS, com uma fração ou com toda nossa capacidade. Olhamos para algo belo, mas não somos tocados na essência de nosso ser. Comentamos sobre a beleza talvez vagamente ou convencionalmente e passamos para outra coisa. Trata-se apenas de uma resposta superficial. E é assim que nossa vida é vivida em sua maior parte, e é o motivo pelo qual é tão pouco satisfatória. Para ser perfeita e completa, uma ação ou reação deve envolver a totalidade do ser. Não pode haver atividades mentais de qualquer nível e profundidade, em termos de palavras e símbolos. Pode parecer que a profundidade individual exista somente na memória individual. No entanto pode haver profundidade individual totalmente diferente, na pura reação que surge a margem DO MOMENTO PRESENTE. A profundidade na memória é como a espessura nos estratos geológicos, matéria solidificada e sedimentada. A profundidade que não estiver fincada NO TEMPO pode ser chamada de profundidade no absoluto ou no Espírito, contendo em si toda a vibração, o impulso, a vitalidade e frescor que pertence à vida. A profundidade está no ser, em SUA ALMA. A ALMA é aquela natureza dentro de nós que reage a tudo aquilo que existe. É a sensibilidade que reside ali e sua totalidade que pode tornar CADA MOMENTO UM MOMENTO PERFEITO, PERFEITO no sentido de completo, sem depender DO PASSADO ou DO FUTURO. Para permitir a ação desta natureza, deve haver uma MUDANÇA FUNDAMENTAL para nos desnudar das camadas ou dos estratos acumulados que aderem ao nosso verdadeiro ser, mas que são estranhos e contrários a ele. A natureza essencial ou nós mesmos, que é a natureza subjacente da consciência, é como um espelho que reflete não apenas os aspectos superficiais das COISAS, mas também as linhas ocultas de sua BELEZA, os movimentos de SUA ALMA, aquilo que os poetas percebem talvez vagamente. Da mesma forma que um enamorado pode ser imaginado como capaz de entrar NA ALMA DE SEU AMADO, também pode ser possível entrar NA ALMA DO UNIVERSO. Assim como NA ALMA de todas as coisas dentro dele, vendo-o em todo seu esplendor, em sua perfeição arquetípica. SRI KRISHNA FALA DE SI MESMO COMO A ESSÊNCIA MANIFESTADA na perfeição de CADA COISA eminente que existe. A natureza divina está em todas as coisas, de forma singular em cada uma delas. Somente quando percebemos e reagimos à divindade PRESENTE que conhecemos a sua verdade, o significado que reside em sua própria existência e sua relação íntima com todas as OUTRAS COISAS. A BELEZA de qualquer objeto não obtém seu significado de algo exterior a si mesma. A única reação verdadeira diante dela é a que nasce do coração, uma sensação que acontece quando não há nenhum obstáculo a ela. Ao mesmo tempo, como tudo está relacionado a tudo mais, também existe significância em cada relacionamento. Apesar da negação de nossa consciência tornar-se opressiva e manipuladora, causando assim a perda de sua capacidade de refletir a verdadeira natureza DAS COISAS, EXISTE A EXCEPCIONAL possibilidade dela se autorregular, desprendendo-se de suas camadas de opressão e chegando a um EXTRAORDINÁRIO ESTADO IMACULADO. Isso só pode ser feito através de uma conscientização das MUDANÇAS e pela percepção da possibilidade e da vontade de se libertar das condições que se desenvolveram na inconsciência, a verdadeira ignorância. Quando está de volta em seu próprio estado de pureza e de despertar, então tudo que toca comunica-lhe seu pleno e profundo significado. Cada evento que acontece se torna uma chave que TRANSFORMA A CONSCIÊNCIA e destrava uma faceta do MISTÉRIO que lá reside. Portanto, CADA MOMENTO POSSUI SUA PRÓPRIA SINGULARIDADE e beleza. Tudo o que é visto neste estado é novo, pois a inovação está na própria consciência. Extraído de The Theosophist. Abraço. Davi.

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