segunda-feira, 16 de maio de 2016

Upanishad. Sopro Vital do Universo.



AS MAIS ANTIGAS ESCRITURAS da Índia, e as mais importantes, são os Vedas. Todos os hindus ortodoxos reconhecem neles a origem da sua fé e o seu texto escrito mais autorizado. Os Vedas são em número de quatro: o Rig, o Sama, o Yajur e o Atharva. Cada um deles está dividido em duas partes: Trabalho e Conhecimento. A primeira é composta principalmente de hinos, instruções com relação aos rituais e às cerimônias, e regras de conduta. A segunda diz respeito ao conhecimento de Deus, o aspecto mais elevado da verdade religiosa, e é denominada Upanishads. O significado literal de Upanishad, sentando perto devotadamente, traz à mente, de modo pitoresco, um discípulo dedicado aprendendo com seu mestre. A palavra também significa ensinamento secreto, secreto, sem dúvida, porque um ensinamento só é outorgado àqueles que estão espiritualmente prontos para recebê-lo. Outra interpretação ainda é fornecida pelo grande comentarista do século XVII, Shankara (788-820): conhecimento de Deus, o conhecimento de Brahman, o conhecimento que destrói os laços da ignorância e leva à meta suprema da liberdade. Não se sabe quantos Upanishads já existiram. Cento e oito foram preservados, que variam em extensão de algumas centenas a muitos milhares de palavras, alguns em prosa, outros em verso, e outros ainda parte em prosa e parte em verso. Variam enormemente no estilo e na forma, frequentemente dentro do mesmo Upanishad, ora sendo simples e concretamente narrativos, ora sutil e abstratamente descritivos, assumindo muitas vezes, em ambos os casos, uma forma de diálogo. Seu tom também flutua, e a seriedade e elevação características encontram um alívio ocasional num humor primitivo. Não se sabe quem os escreveu e nem, com qualquer precisão, quando foram compostos. Os Rishis, cujo conhecimento intuitivo eles personificam, permanecem totalmente nos bastidores, impessoais como a verdade que defenderam, estando suas vidas pessoais perdidas para sempre, inclusive os seus nomes: In the dark backward and abysm of time. (No escuro reverso e no abismo do tempo.) Dos cento e oito Upanishads que foram conservados, dezesseis foram reconhecidos por Shankara como autênticos e oficiais. Ele escreveu elaborados comentários sobre dez deles, que incluíam citações dos outros seis; e foram esses dez que vieram a ser encarados como os principais Upanishads. Seus nomes são os seguintes: Isha, Kena, Katha, Prasna, Mundaka, Mandukya, Taittiriya, Aitareya, Chandogya, Brihadaranyaka. Juntos, eles constituem, e provavelmente sempre constituirão, o principal objeto de atenção de todos os que conheçam a religião hindu. Uma das características dos Upanishads é a sua homogeneidade. Muitas concepções que aparentemente diferem são encontradas neles, mas estas são, grosseiramente falando, encontradas em todos eles, e não distribuídas, uma num Upanishad, outra em outro. É verdade que um Upanishad poderá enfatizar certas ideias, ou determinado ponto de vista, mais do que o resto, ou poderá especializar-se num tópico específico; porém, tais distinções parecem com frequência puramente acidentais, e nunca são importantes. As divisões entre os Upanishads podem, portanto, para todas as finalidades práticas, ser completamente abolidas, com todos os cento e oito Upanishads reduzidos a apenas um. Uma característica mais importante surge do fato de os Upanishads representarem o trabalho de santos e profetas. Seus autores estavam preocupados em relatar o conhecimento intuitivo que veio a eles em pensamento ou visão, e não em tornar esse conhecimento superficialmente coerente. Eles não eram formadores de sistemas, e sim narradores de experiências. Temos de estar preparados, portanto, para encontrar aparentes inconsistências, para esquecer uma concepção pela absorção temporária em outra. Não devemos esperar encontrar toda a verdade reunida de uma vez para sempre numa formulação fácil, triunfante e consciente. Outra característica ainda dos Upanishads está relacionada com a sua forma. Em nenhum outro lugar, poderia suspeitar um comentador, que ideias foram registradas com tão pouca consideração quanto á sua conveniência. Em nenhum lugar existe um começo lógico, ou um final coerente. Além disso, em todas as ocasiões, a atenção não está focalizada nas partes, claramente reconhecidas como partes, e sim no todo talvez numa afirmação concisa, completa e não analisada, ou em elementos particulares que formem, quando reunidos, uma concepção do momento. Para realizar o estudo dos Vedas, de acordo com uma longa tradição, e mesmo de acordo com os próprios Vedas, temos de ter um mestre, ou Guru: Aproximai-vos de um mestre, lemos no Rik, com humildade e com desejo de servir; e nos Upanishads: A muitos não é concedido ouvir falar NAQUELE, significando Deus, que habita a eternidade. Muitos, embora ouçam falar dele, não o entendem. Maravilhoso é aquele que fala a respeito dele. Inteligente é aquele que aprende a respeito dele. Abençoado é aquele que, tendo aprendido com um bom mestre, é capaz de compreendê-lo. A função de um bom mestre, como o hinduísmo o concebe, é dupla. Ele naturalmente explica as escrituras, em forma e conteúdo; porém, o que é ainda mais importante, ele ensina através da sua vida: através das suas ações diárias, das suas palavras mais casuais, algumas vezes até através do seu silêncio. O simples fato de estar perto dele, de servi-lo e de obedecer-lhe humilde e reverentemente significa acelerar o espírito; e a finalidade do estudo das escrituras não é mera ou primariamente informar o intelecto, e sim purificar e enriquecer a alma. Como são agradáveis o estudo e o ensinamento dos Vedas! Aquele que se ocupa com essas coisas alcança a concentração, e não é mais um escravo de suas paixões; piedoso, autocontrolado, disciplinado no espírito. Ergue-se para a celebridade e é uma bênção para a humanidade. Dissemos que o hindu ortodoxo encara os Vedas como o seu texto escrito mais autorizado. Qualquer escritura subsequente, para ser encarada por ele como válida, tem de ser compatível com os Vedas. Poderá desenvolvê-los, ampliá-los, e ainda assim ser reconhecida; mas não poderá, porém, contradizê-los. Os Vedas representam para o hindu, o mais aproximadamente que um documento humano pode representar, a expressão da verdade divina. Ao mesmo tempo, seria um engano supor que sua lealdade à autoridade dos Vedas seja servil ou cega. Se ele os considera a palavra de Deus, é porque acredita que sua verdade seja comprovável, imediatamente, a qualquer momento, através da sua experiência pessoal. Se o hindu verificasse, após o devido exame, que não eram tão comprováveis, ele os rejeitaria. Se descobrisse que determinada parte deles não era tão comprovável, ele a rejeitaria. E nessa posição as escrituras, ele lhe dirá, o sustentam. O verdadeiro estudo, dizem os Upanishads, não é um estudo deles mesmos, e sim um estudo daquilo através do qual percebemos o imutável. Em outras palavras, o verdadeiro estudo, na religião, significa vivência direta de Deus. Na verdade, o termo Vedas, como é empregado pelos ortodoxos, não designa apenas um grande corpo de textos transmitidos de geração a geração, porém, em outro sentido, simboliza nada menos do que a verdade inexprimível da qual as escrituras são necessariamente um pálido reflexo. Considerados sob esse segundo aspecto, os Vedas são infinitos e eternos. Eles representam esse conhecimento perfeito que é Deus. Em resumo, eles são idênticos ao Verbo do cristão São João em seu evangelho: No início era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Abraço. Davi.

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