Cristianismo.
Catolicismo Romano. A Obra de Deus, do latim, Opus Dei em latim, é uma
organização católica composta por leigos e sacerdotes, cuja filosofia prega a
"santificação da vida comum". Fundada pelo agora santo espanhol
Josemaria Escrivá (1902-1975), a Opus Dei, tornou-se um fenômeno católico
mundial, seja pela sua rápida ascensão e consolidação entre as organizações
religiosas mundiais, seja pelas diversas polêmicas que envolvem sua história.
De idolatrada a odiada, considerada desde seita católica a sociedade secreta,
esta organização sem dúvida mudou e continua mudando os rumos do Catolicismo
desde sua fundação, de um modo decisivo. Em 2 de outubro de 1928, é fundada a Opus Dei em Madrid. A proposta da
então recém criada associação cristã era de resgatar os princípios do
Catolicismo tradicional, que para Escrivá se traduzia no seu cumprimento
estrito, até mesmo para leigos, o que mais tarde criaria a ideia da
"santificação da vida comum", onde os homens em seus afazeres diários,
cumpririam à risca a doutrina pregada pela Igreja. Durante a guerra civil
espanhola (1936-1939), deflagrada no auge a Revolução Russa, criou-se um clima
muito pesado de anti-clericalismo, influenciado principalmente pelos ataques ao
Catolicismo na Espanha por parte do governo de esquerda. Essa perseguição criou
um verdadeiro clima de conservadorismo dentro da congregação, que faria sua
filosofia se apegar de modo radical à doutrina anti comunista da Igreja. Padres
e leigos da Opus Dei participaram da Guerra Civil de modo a mais tarde apoiar o
governo fascista de Francisco Franco (1892-1975) em oposição ao governo
Comunista. Curiosamente nessa época de tensão, Escrivá publicou a obra mor do
Opus Dei, a Bíblia da organização chama "Caminho". Pode-se dizer que além do exército, os católicos
espanhóis, conduzidos sob a Opus Dei foram decisivos na resistência à República
e na instauração da Ditadura Franquista. Com essa vitória sobre o Comunismo, em
1943 a organização receberia o status de "Sociedade de Direito Diocesano",
o que já lhe conferia a ordenação de sacerdotes, assim como as demais ordens
Católicas. Rapidamente durante a 2ª Guerra, devido ao seu ideal de resistência
cristã, a Opus Dei se espalhou pela Europa. Com a Europa toda arrasada pela
guerra, a filosofia de "reconstrução espiritual" pregada pelo Opus
Dei tornava-se uma poderosa aliada da Igreja na reconstrução do continente. Uma
onda de filiação varreu o mundo Católico de modo que antes, a organização
voltada para leigos viu-se abarrotada de padres, de modo que Escrivá fundou a
Sociedade Sacerdotal da Santa Cruz, a ala clerical da Opus Dei, que mais tarde
se tornaria uma espécie de divisão administrativa da Obra. Na década de 60, o
mundo Católico mudou de forma radical. Com o Concílio Vaticano II a Igreja Católica
abria-se para o mundo moderno, de modo a alterar tanto a forma dos seus
rituais, como fez uma verdadeira revisão na sua forma de compreender sua
própria doutrina. Nesta época de mudanças, o Opus Dei viu-se num dilema, ou
abria-se junto com as mudanças defendidas no Vaticano II e contradizia sua
doutrina de profunda defesa das tradições e dos rituais milenares, ou seguia as
demais ordens religiosas que mudaram profundamente sua maneira de conduzir a
doutrina da Igreja. Nessa época, com o
crescimento do Opus Dei, a Companhia de Jesus e a Ordem Franciscana tornaram-se
verdadeiros rivais da Obra, uma vez que com o Vaticano II, os Jesuítas e os
Franciscanos aderiram às transformações na doutrina, a ponto de patrocinarem os
novos pensamentos defendidos pela ala liberal da Igreja dentre eles, a polêmica
Teologia da Libertação, justamente de cunho Marxista. Com isso, uma verdadeira
disputa política tomou conta da Igreja, onde de um lado, a ala conservadora
representada pela Obra, defendia um rígido seguimento dos padrões tradicionais
católicos, quer seja na religião, na moral ou na política, enquanto que os
Jesuítas e os Franciscanos representavam a tendência da "Igreja
Social", que ganhou bastante destaque na América Latina dos anos 60.
Justamente nessa época, vários golpes foram dados nos países latino-americanos
sendo justificados como sendo em nome da segurança contra a "ameaça
comunista". A expansão da Guerra Fria com o conflito ideológico e político
do Capitalismo x Comunismo causou um verdadeiro mal estar dentro da Igreja e
entre suas várias organizações, a ponto de desesperadamente, após o medo de uma
verdadeira abertura da Igreja por parte do falecido (talvez assassinado, e pela
própria Igreja) Papa João Paulo I, Albino Luciani (1912-1978), que poderia fazer
a Igreja (vulgo a sociedade Ocidental, vulgo sistema capitalista americano)
perder sua identidade, seus líderes tentarem retomar a prática das tradições
milenares como eram antes do Vaticano II. Com isso em 1978, para consolidar
essa intervenção contra o próprio Vaticano II, a ala conservadora da Igreja
elegeu o então desconhecido Karol Wojtyla, (1920-2005) que se tornaria o Papa
João Paulo II. João Paulo II, cresceu
na Polônia, na época da ascensão do Comunismo no Leste Europeu. Ser Católico
naquela região significava resistência política-ideológica ao Comunismo pregado
pela URSS. Com sua entrada no seminário, Wojtyla viu-se minado do
conservadorismo pregado contra o Comunismo, neste caso, patrocinado pelo
próprio Opus Dei, reconstrutor espiritual da Europa pós-guerra e organização
vitoriosa da Guerra Civil Espanhola. Com isso, no seu pontificado, João Paulo
II aos poucos assumiria uma postura altamente oposta ao Marxismo, a ponto de
destruir as bases da Teologia da Libertação na América Latina, ação essa
patrocinada pela Opus Dei. Não é coincidência que meses antes do golpe de
Augusto Pinochet (1915-2006) no Chile, Escrivá esteve na América Latina,
plantando literalmente as bases da organização em terras latino-americanas,
plantando nos diversos países uma ideologia altamente conservadora nas elites
locais, e com isso consolidando os governos militares ao redor do continente.
Com isso, a Companhia de Jesus e a Ordem Franciscana perdiam espaço junto com a
Teologia da Libertação e as Comunidades Eclesiais de Base, não é atoa que
durante uma visita à Nicarágua, justamente durante uma conferência da CEB's, o
Papa João Paulo II foi drasticamente vaiado pela multidão, revoltada com a
decisão do pontífice de calar de vez os teólogos da libertação considerando a filosofia
cristã-marxista uma heresia dentro das paredes da Igreja, o que mais tarde
seria concretizado na polêmica Conferência Episcopal Latino-Americana (CELAM),
no Chile, onde o atual Cardeal Juan Luis Cipriani Thome (1945- ) foi o agente supressor do movimento da
libertação na América Latina. Não é coincidência que justamente após a saída de
bispos e arcebispos liberais, como Dom Hélder Câmara (1909-1999), estes foram
substituídos por líderes altamente conservadores como Dom José Cardoso Sobrinho
(1933- ). Só um detalhe para tudo isso,
na época dessa verdadeira cruzada contra o liberalismo, quem decidia pela
substituição dos líderes locais era o presidente da Congregação para Doutrina
da Fé (antigo Tribunal do Santo Ofício, Tribunal da Inquisição), que na época
era o então Cardeal Joseph Ratzinger (1927-
), Papa Bento XVI. Seu pontificado foi de (2005-2013) ano em que
renunciou; por sinal sua eleição foi aos mesmos moldes do antecessor, um
"desconhecido" com características centradas na tradição proposta
pelas alas conservadoras da Igreja. Por isso nada mais hoje me espanta. Essa
atitude significou uma anestesia nos movimentos sociais não só da América
Latina, mas também nos países africanos como a África do Sul, que na época,
via-se oprimida pelo sistema racista do Apartheid. Com isso, a expansão de
governos conservadores moldados ao sistema político americano garantia não só
os interesses de expansão das grandes corporações da época, como evitava uma
possível expansão do Comunismo na América Latina que já tinha se iniciado em
Cuba. Por mais incrível que pareça, o próprio Opus Dei tornou-se um dos agentes
de repressão nos governos ditadoriais, como no Brasil, onde principalmente em
São Paulo, as alas mais conservadoras da sociedade paulistana tinham membros da
Opus Dei como militantes da campanha de repressão do Governo. Essa mesma elite,
nessa época, foi o principal motor de expansão, nesse caso, econômica, do Opus
Dei. Combinando todos os interesses possíveis que poderiam garantir a
estabilidade social das elites da época, o Opus Dei, tornou-se um verdadeiro
depositário dos dízimos mais gordos do mundo, uma vez que por seu caráter
conservador, seus membros, muitos da elite europeia e americana, seguiam à
risca a doutrina do dízimo, de modo que na época a Opus Dei possuía um
patrimônio único de 20 milhões de euros. Voltando na época de João Paulo I,
para ajudar na reconstrução da Europa, o Vaticano criou o Instituto para as
Obras da Religião, o Banco do Vaticano. O Banco do Vaticano era um verdadeiro
banco suíço nas terras pontifícias, que de modo discreto, servia de receptor e
fiador de grandes empresas e empresários europeus. Durante o pontificado de
João Paulo I, descobriu-se várias movimentações ilegais envolvendo importantes
membros da sociedade europeia, assim como vários bispos e até cardeais da
Igreja. Simplesmente, o então cardeal Jean-Marie Villot (1905-1979) era um dos
envolvidos nesse escândalo. Curiosamente, Villot era do Opus Dei, que na época
era uma das organizações acionistas no Banco. Com a súbita morte de João Paulo
I em condições até hoje inexplicáveis, ainda mais considerando que ele era
altamente progressista, e a favor do Catolicismo Social, não me impressiona que
a Igreja Opus Dei Villot tenham supostamente atentado contra o Papa, considerando
que o Camerlengo tinha acesso irrestrito ao pontífice e que por sinal, ambos
eram ideologicamente opostos, para assim, evitar a ascensão de uma doutrina de
abertura religiosa, social e política dentro da Igreja, que por milênios,
manteve uma série de compromissos com as elites locais e com o sistema
tradicional conservador pregado desde a sua fundação (qualquer semelhança com
Anjos e Demônios é mera coincidência, ou não. Para maiores esclarecimentos
leiam os textos do blog sobre o filme e sobre o Banco do Vaticano). Com todas essas absurdas "coincidências"
se cruzando, não me impressiona que da noite para o dia Jose Maria Escrivá
tenha sido canonizado, num dos processos mais polêmicos da história da igreja,
devido à quebra total dos clássicos protocolos de processo canônico
determinados nos códigos eclesiais. A enorme crítica a esse fato, vinda
principalmente das ordens católicas dos Jesuítas e dos Franciscanos deve-se ao
fato de que justamente na época da morte de João Paulo I, instaurou-se uma crise
institucional na Igreja, onde o Banco do Vaticano era seu principal fator. Com
a desconfiança em todo mundo pelo vazamento dessas informações, o Banco viu-se
cada vez mais afundado em negociações, rendendo mais prejuízos à Igreja. De
modo fantástico, a Opus Dei com uma "pequena" parte do seu
patrimônio, soergueu o Banco do Vaticano, trazendo de volta sua influência na
economia mundial (de modo a se envolver novamente mais tarde com o escândalo da
Máfia Italiana nos anos 90). Depois dessa santa ajuda, não me impressiona que
não só o fundador da Obra tenha se tornado um dos mais famosos e polêmicos
santos da Igreja como também em 1982 o Papa instituiria a "prelatura"
da Opus Dei, que ficaria conhecida popularmente como a "prelazia pessoal do
Papa". Este termo, às vezes
erroneamente entendido na verdade significava uma coisa, uma independência
administrativa da ordem perante às cúrias locais. Em outras palavras, a Opus
Dei, deixava de ser uma ordem religiosa subordinada às decisões das dioceses e
arquidioceses locais para responder somente e diretamente para com o Vaticano.
Desse modo, qualquer oposição advinda de órgãos secundários como ordens
religiosas e a própria cúria local como a CNBB no Brasil, não seriam acatadas,
cabendo somente ao Papa, neste caso, à Cúria Romana, decidir sobre as questões
da Obra. Desse modo, não só a Opus Dei ficava blindada contra quaisquer ataques
vindo das demais ordens como ao mesmo tempo serviria de uma verdadeira milícia
vaticana, sendo o braço direito da Igreja quando a mesma precisasse suprimir
qualquer oposição até mesmo dentro da mesma, como ocorreu durante o auge da
Teologia da Libertação. Por isso a Opus Dei é tomada como uma Sociedade
Secreta, mais precisamente a agência secreta do Vaticano, pois a mesma tem uma
devoção tão grande à instituição quanto ao próprio Deus. E essa devoção se
reflete nas práticas e na filosofia da Opus Dei, tão criticadas ao longo dos
tempos. De livros a filmes, de
depoimentos a investigações, a Opus Dei é fruto de uma série de polêmicas que
envolve a Ordem quer desde sua fundação com o apoio à ditadura franquista e na
América durante os anos 60, até as práticas pregadas pela Obra, que são
criticadas até mesmo dentro da própria Igreja. Fundada na ideia de cumprir à
risca os ensinamentos da Igreja, a congregação tornou-se altamente conservadora
de modo a criar uma aura negra dentro dela própria. Os relatos e acusações de
lavagem cerebral, fanatismo por parte dos seus membros e até mortificações com
métodos medievais não são meras fantasias criadas em livros ou teorias da
conspiração defendidas em fóruns pela internet. A crítica sobre todas as
práticas da Opus Dei começou justamente no Vaticano II, onde após a revisão da
doutrina Católica, várias ordens aboliram uma série de práticas, que constavam
em suas Regras, devido ao típico hábito de evitar mudanças na Igreja. As Regras
das ordens vinham passando séculos sem serem alteradas, como a Beneditina, que
existia desde o tempo de São Bento (e bote tempo nisso) assim como os
Dominicanos e Cartuxos, onde dependendo da congregação e da localidade, a
utilização de rituais de mortificação assim como de extremos sacrifícios de
outros tipos ainda eram realizados, doutrina essa, vinda da Idade Média, onde o
sacrifício corporal era visto como uma atitude de purificação. Com o Vaticano
II, essas práticas que já vinham sendo abolidas desde as revoluções liberais
foram extintas de vez, criando uma nova modalidade de contemplação, esta, antes
já defendidas pelas ordens já citadas dos Jesuítas e dos Franciscanos. Com uma filosofia totalmente oposta a isso desde a
sua fundação, a Opus Dei, temendo uma desfiguração das tradições cristãs,
manteve-se fiel à doutrina original ignorando em suma o Concílio da década de
60, de modo a intensificar essa prática como uma resposta à adaptação que a
Igreja estava sofrendo nos tempos modernos. Com isso, a Opus Dei criava a
partir de uma interpretação grosseira e conservadora da doutrina católica e do
próprio Caminho de Escrivá, uma verdadeira filosofia sacrifical, onde os
sacrifícios eram louvados através da frase de Escrivá que dizia que "a dor
era boa". A dor, não era somente no contexto físico, mas na privação de
várias coisas, como foi instituído nas doutrinas da Obra como o total celibato,
até mesmo para casais, a utilização de cilícios e de autoflagelação por parte
de membros especiais determinados dentro da ordem, e um rígido programa de vida
espiritual que deveriam ser cumpridos quase que militarmente. Outro fator que
agravava as críticas a Opus Dei era o envolvimento de vários membros em casos
de corrupção, e a questão da espionagem dentro da própria Igreja, onde por meio
da Confissão, padres da Opus Dei na época tornavam-se verdadeiros soldados na
busca de informações de possíveis opositores da Igreja e dos governos (por sinal
a função original da confissão era justamente política, saber segredos
envolvendo o Estado e a Igreja). Com essa série de acusações por parte do
próprio clero católico, era tida como uma verdadeira máquina alienadora no seio
da Igreja Católica. O que por isso e por uma outra série de fatores, a
congregação ainda é muito criticada nos dias atuais. De fato, a Opus Dei mudou e continua mudando os
rumos não só da Igreja mas também da sociedade ocidental. Assentada sob os
pilares do conservadorismo e do tradicionalismo, a Opus Dei tornou-se um
verdadeiro Exército Católico, que aliado à ala conservadora da Igreja e da
sociedade, torna-se um agente ativo no processo de estratificação e modelação
social e político tecendo uma verdadeira rede de negociações que definem não só
os rumos da religião, mas também da política e da economia em vários países. Se
fosse uma ordem como outra qualquer, ela não receberia críticas tão pesadas de
dentro da própria Igreja, e de ordens que antes foram altamente conservadoras e
que agora são o braço do progresso e do diálogo da Igreja para com o mundo
moderno. De mentiras a segredos, a Obra de Deus se revela tão falsa quanto sua
filosofia pregada, que só visa garantir a perpetuação de uma sociedade
opressora alienando cada vez mais seus membros e deturpando de modo
irreversível a verdadeira mensagem de Jesus. Escrito por Rafael Vilaça. http://www.oiluminador.blogspot.com.br.
Abraço. Davi.
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