quinta-feira, 21 de abril de 2016

II. Teoria e Prática Tântrica.

Hinduísmo Tântrico. Escrito por Roberto de A. Martins. À medida que se desenrola, a Shakti se manifesta sob a forma de um som primordial (Nada), e através do som ela começa a criar o universo. O som é um dos principais instrumentos do Poder, no Tantra. Através de algumas práticas, o Tantrika pode ouvir os sons primordiais produzidos pela Grande Deusa.  Os seres do universo são descritos por nome (nama) e possuem uma forma (rupa). O som (shabda) e a palavra (vac) são manifestações daShakti, que dão forma aos seres. A Shakti não apenas cria todos os seres, ela permanece dentro deles. A Shakti imagina o universo, por sua própria vontade, pelo prazer de criar, e se incorpora nele. O universo não tem essência própria, é vazio, mas ao mesmo tempo contém o absoluto.   Em todos os seres do universo se manifesta o poder de Shakti e a consciência deShiva. O Absoluto está presente em todas as manifestações do universo. Portanto, tudo o que existe é sagrado. No centro de cada coisa estão Shiva e Shakti, que contêm tudo o que existe. Por isso o Tantra afirma: “Aquilo que está aqui está em toda parte. Aquilo que não está aqui não está em lugar nenhum” (yadihasti tad anyatra, yannehasti na tat kvacit). Tudo o que existe no universo é perfeito, divino, e Eu sou tudo isso, e tudo isso existe em mim. Toda a realidade e toda pessoa é, essencialmente, Shiva-Shakti, mas de forma específica todo homem é Shiva e toda mulher é Shakti. Perceber a realidade mais profunda disso é um dos caminhos para a libertação espiritual.  Embora nossa natureza seja divina, e tudo o que nos cerca também seja, nossa percepção usual da realidade é limitada, dualista, pobre. É a própria magia (maya) da Shaktique dá a aparência de finito ao infinito, de múltiplo àquilo que é uno, de específico (dotado de nome e forma) àquilo que não tem nome nem forma, de destrutível ao que é eterno. Ela envolve toda a criação divina, perfeita e ilimitada com um véu mágico, mas ela própria cria por toda parte as portas através das quais podemos atravessar a ilusão e chegar à percepção clara da realidade divina. Penetrando através de Maya-Shakti é possível atingir o absoluto, ultrapassando as limitações e dualidades.  A compreensão e o contato direto (vivência) da Shakti é um dos aspectos centrais do Tantra. A Shakti pode ser vista sob seus aspectos bondosos, como a Mãe (Ma) ou como a esposa - amante de Shiva, extremamente bela e sábia. No entanto, ela pode também ser vista sob seu aspecto destruidor, horrível, como Kali, que destrói as ilusões, aniquila as forças do egoísmo e leva as pessoas a verem a realidade divina. A pessoa em um corpo (jiva) conhece apenas os níveis mais baixos da realidade e se confunde com eles. No entanto, é possível se transformar, atingindo uma compreensão diferente da realidade. Às vezes se descreve essa transformação como uma libertação (kaivalya) ou como a união ao Eu Supremo (Paramatma). No entanto, o Tantra descreve esses processos de uma forma diferente. A pessoa viva (jiva) e o Eu Supremo possuem a mesma natureza, por isso eles não podem se unir. O Jiva não se liberta, ele pode apenas perceber que nunca esteve preso. Para isso, ele precisa penetrar através dos véus de Maya, a magia da Shakti, através da sabedoria (jñana) obtida através da vivência (vijñana), conhecendo diretamente a Shakti e tornando-se um jivanmukta e mantendo-se no mundo. O objetivo não consiste em se afastar do universo criado por Shakti, e sim percebê-lo como ele é: infinito, absoluto, eterno, sem dualidades. Através do Shakti-Tantra, o adepto atinge a libertação voltando-se para fora e não para dentro. Adotando uma visão não-dualista (advaita), a doutrina do Tantra admite que tudo é igualmente puro e perfeito. Por isso, o Tantra permite obter a iluminação (moksha) desfrutando do mundo (bhoga). Sob o ponto de vista prático, o Tantra desenvolve uma série de atividades que induzem estados alterados de consciência, transformam o praticante e o levam a uma percepção diferente da realidade. Essas vivências precisam ser compreendidas, para serem integradas à sua vida, e por isso o estudo teórico também é importante. Pela prática constante, a transformação do Tantrika vai se fortalecendo, levando a um contato contínuo com a Shakti.  O Tantra utiliza muitos recursos empregados nas diferentes linhas do Yoga, como posturas (asanas), práticas de respiração (pranayama), meditação (dhyana), etc. A parte ética do Yoga de Patañjali (yama eniyama) não faz parte do Tantra propriamente dito; mas apenas pessoas que já tenham obtido um grande desenvolvimento ético podem ser admitidas no Tantra.  Algumas das características centrais do Tantra são a utilização de rituais, o uso das coisas do mundo profano para atingir a realidade divina, e a identificação entre o microcosmo (o ser humano) com o macrocosmo (o universo infinito). Um dos aspectos importantes das práticas tântricas é o controle da energia interna, que é um reflexo do Poder Cósmico (Shakti).  Dentro do corpo, essa energia é representada porKundalini, a energia em forma de uma serpente enrolada, que fica normalmente adormecida no chakra inferior (Muladhara). Através de práticas envolvendo respiração, posturas, meditação, mantras e outros elementos, o Tantrika desperta Kundalini e faz com que essa energia ative sucessivamente osvárioschakras corporais, transformando o corpo energético  doyogi (a estrutura sutil, constituída pelos chakras e pelos canais – nadis – onde circulam os diversos tipos de prana). Este aspecto do Tantra está também presente no Hatha Yoga tradicional indiano, já que o Hatha Yoga surgiu como um ramo especial dentro do Tantra.  São muito importantes no Tantra a recitação de mantras, o uso de imagens de devas e especialmente daShakti, o uso de diagramas (yantras) para meditação, purificação (nyasa) do corpo, e muitos rituais especiais utilizando mantras e gestos com as mãos (mudras), geralmente feitos dentro de círculos especiais (mandalas). O culto e adoração (puja) da Grande Deusa é também essencial, no Tantra.  Há rituais e práticas extremamente complexos, dentro do Tantra, e outras práticas que parecem simples. Todas devem ser aprendidas através dos ensinamentos diretos de um mestre (guru) que já tenha praticado e dominado essas técnicas. A união entre o discípulo e o mestre é fundamental, pois através dessa união o Guru consegue induzir estados alterados de consciência no discípulo e fazê-lo vivenciar coisas que ele não teria condições de conseguir sozinho, por seu próprio esforço. Práticas em grupo também são consideradas muito importantes, pois a união espiritual de várias pessoas, no Tantra, multiplica os resultados obtidos. Não existe Tantra sem vivências diretas dos aspectos sagrados do universo e de si próprio. E isso ocorre através de estados alterados de consciência, especialmente através de experiências de samadhi. Deve-se compreender que o samadhinão é o objetivo do Tantra (nem de nenhuma outra linha de Yoga), e sim uma prática especial, acompanhada por um estado alterado de consciência, que deve ser atingido repetidas vezes, produzindo aos poucos importantes efeitos no praticante.   A devoção à Grande Deusa (ou a Shiva, no caso da linha tântricashivaísta) é também essencial, no Tantra. O praticante desenvolve um enorme respeito, admiração, amor e adoração pela Grande Deusa, e Ela se torna um foco central de sua vida. Sem essa devoção (bhakti) e sem a ajuda direta da própria Deusa, o Tantrika não atinge seu objetivo. Embora não se possa aprender as práticas do Tantra através da leitura de livros, é muito útil estudar os textos tântricos tradicionais para obter uma compreensão teórica daquilo que essa linha espiritual significa. Algumas linhas do Yoga possuem práticas “leves”, destinadas a melhorar a saúde física e psíquica da pessoa. O Tantra, no entanto, não está voltado para a obtenção de resultados desse tipo. É uma linha de trabalho mais radical, destinada a mudar toda a consciência do praticante. Por isso, não se deve iniciar práticas tântricas a menos que a pessoa queira deixar para trás seus valores, suas crenças e sua vida antiga, iniciando uma nova. É um caminho poderoso, mas que tem também riscos e um custo alto – ele exige uma morte do ego, para levar a uma transformação espiritual completa.http://www.shri.yoga.devi.org Abraço. Davi.

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