Teosofia. Livro
As Revelações Secretas da Religião Cristã. Por Annie Wood Besant (1847-1933). O
CRISTO MÍTICO. Chegamos, agora, ao sentido mais profundo da história do Cristo,
sentido que lhe dá o verdadeiro poder sobre o coração humano. Aproximamo-nos
desta inesgotável vida que brota das profundezas do invisível manancial, cuja
esplêndida corrente se origina daquele que a representa e, pela virtude deste
batismo, todos os corações procuram pelo Cristo e sentem mais fácil rejeitar os
fatos históricos do que negar o que reconhecemos intuitivamente como uma
verdade essencial e suprema de sua vida divina. Vamos transpor o pórtico
sagrado que dá acesso aos Mistérios, e assim podemos levantar uma ponta do véu
que oculta o santuário aos nossos olhos. Como já vimos, encontramos por toda a
parte, mesmo nas épocas remotas, a existência de uma doutrina secreta que é
transmitida a candidatos aceitos, sob condições severas, pelos Mestres de
Sabedoria. Eram estes candidatos iniciados nos Mistérios, nome que compreendia,
na antiguidade, tudo o que há de mais espiritual em religião, de mais profundo
em filosofia, de mais precioso em ciência. Por estes Mistérios, passam todos os
grandes Instrutores dos tempos antigos, entre os quais os maiores foram os
Hierofantes. Os que se destinavam a falar à humanidade dos mundos invisíveis,
já tinham passado o limiar da Iniciação e aprendido o segredo dos lábios dos
Santos Seres; todos vinham acompanhados da mesma história, traziam as mesmas
versões dos mitos solares, idênticos em sua Essência, embora diferentes pela
cor local. Esta narração é, em princípio, a descida do Logos ao seio da
matéria. É com razão que o Logos tem por símbolo o Deus Sol, porque o Sol é seu
corpo e Ele é, muitas vezes, chamado "O que habita no Sol". Sob um
destes aspectos, o Cristo dos Mistérios é o Logos descendo à matéria, e o grande
Mito do Sol é esta suprema verdade sob a forma do ensinamento popular. Como
sempre acontece, Instrutor Divino, que traz a Sabedoria Antiga e novamente a
proclama ao mundo, é considerado como uma manifestação especial do Logos, e o
Jesus das Igrejas torna-se gradualmente o centro das narrações que pertencem a
este Ser Sublime. Jesus identificou-se assim, na nomenclatura cristã, com a
Segunda Pessoa da Trindade, o Logos ou Verbo Divino, e as grandes datas de que
fala o Mito do Deus Sol tornaram-se datas da história de Jesus, considerado
como a Divindade Encarnada, como o Cristo Místico. Assim como, no universo, ou
macrocosmo, o Cristo dos Mistérios representa o Logos, a Segunda Pessoa da
Trindade, também, no homem, ou microcosmo, Ele representa o segundo aspecto do
Espírito Divino no homem, chamado, por esta razão, o Cristo. O segundo aspecto
do Cristo dos Mistérios é, portanto, a vida o Iniciado, a vida que se abre ao
postulante, após a primeira grande Iniciação que assinala o nascimento do
Cristo no homem. No decorrer dela, o Cristo nasce no homem, e, mais tarde, nele
se desenvolve. Para tornar isto mais inteligível, é necessário considerar as
condições impostas ao candidato que se apresenta à Iniciação e também a
natureza do espírito no homem. Somente os bons, humanamente falando, os que se
conformam com a lei de amor de uma maneira absoluta, poderiam ser considerados
como candidatos à Iniciação. Puros, santos, sem mancha, sem pecado, vivendo sem
transgressão, tais são os diversos nomes que lhes eram aplicados. Além disso,
deviam ser inteligentes, com faculdades mentais bem desenvolvidas e
exercitadas. A evolução que, nas vidas sucessivas, tem por teatro o mundo; o
desenvolvimento e a submissão das faculdades intelectuais, das emoções, do
senso moral; as lições das religiões exotéricas; o cumprimento dos deveres como
meio de aperfeiçoamento; os esforços para ajudar e elevar o próximo, tudo isto
constitui a vida ordinária do homem que evolui. Quando já executou tudo isto,
tornou-se "bom", o Christos dos gregos, e esta qualidade deve ser
adquirida antes de poder tornar-se o Christos, o Ungido. Depois de ter chegado
a viver uma vida virtuosamente exotérica, está em condições de ser candidato à
esotérica, para começar a preparar-se à Iniciação, isto é, a satisfazer determinadas
condições. Estas condições mostram as qualidades que devemos adquirir e,
enquanto lutamos para incorporá-las em nós, já pisamos, conforme uma expressão
empregada, no Caminho da Provação, a Senda que leva a Porta Estreita, que dá
acesso ao Caminho Estreito, ao Caminho da Santidade, ao Caminho da Cruz. Não é
indispensável que o candidato desenvolva estas qualidades de um modo perfeito,
mas deve tê-la bastante adiantadas antes que o Cristo possa nascer em si,
preparando, assim, a morada pura desta Criança Divina que vai crescer dentre
dele. A primeira destas qualidades, todas mentais e morais, é o Discernimento.
O Discernimento significa a distinção entre o Eterno e o Temporário, entre o
Real e o Ilusório, entre o Celeste e o Terrestre. As coisas visíveis são por
pouco tempo, mas as invisíveis são eternas, diz o apóstolo (II Coríntios 4:18).
Os homens são vítimas de uma ilusão permanente causada pelo mundo visível que
os impede de perceber o invisível. O postulante deve aprender a distinguir
entre estes dois mundos; o que é irreal, para o mundo, deve tornar-se real para
ele, porque é a única maneira de caminhar pela fé e não com a vista (II
Coríntios 5:7). É assim, ainda, que o homem se torna um daqueles de quem fala o
apóstolo neste versículo " o alimento sólido é para os homens feitos, por
terem na prática exercitado as faculdades de discernir o que é bom e mau
(Hebreus 5:14). O sentimento da falta de realidade deve produzir nele o
Desgosto pelo ilusório e passageiro, estes ranços da existência, impróprios para
satisfazerem a fome senão dos porcos (Lucas 15:16). Este estágio é descrito por
Jesus em termos enérgicos: Se alguém vier a mim e não aborrecer seu pai, sua
mãe, sua mulher, filhas e irmãos, e ainda também sua própria vida, não pode ser
meu discípulo (Lucas 14:16). Dura é, na verdade, esta sentença, mas deste
aborrecimento nascerá um amor mais profundo, mais verdadeiro; é necessário
passar por ele para atingir a Porta Estreita. O postulante deve, em seguida,
aprender a dominar seus pensamentos e, por eles, fazer-se senhor das suas
ações, pois que, com a visão interior, o pensamento e a ação fazem um só todo.
Quem olhar para uma mulher com desejo, já cometeu com ela o adultério em seu
coração (Mateus 5:28). É necessário adquirir a faculdade de suportar o mal com
resignação, porque os que aspiram seguir o Caminho da Cruz deverão afrontar
longas e amargas decepções e sofrimentos, suportando-os como se eles vissem
aquele que é invisível (Hebreus 11:27). As qualidades que precedem, devemos
juntar a Tolerância, para ser filhos daquele que faz nascer o Sol sobre os maus
como sobre os bons, fazendo cair a chuva sobre justos e injustos (Mateus 5:45).
Discípulo daquele que pediu aos apóstolos que não impedissem de fazer uso do
seu nome, mesmo a quem não o tomasse como Mestre (Lucas 9:49,60). O postulante
deve ainda adquirir a Fé, para a qual nada é impossível (Mateus 17:20) e o
Equilíbrio descrito pelo apóstolo (II Coríntios 6:8-10). Deve enfim desejar as
coisas que estão no alto (Colossenses 3:1) e ansiar com ardor pela felicidade
de ver Deus e de se unir a Ele (Mateus 5:8; João 17:21). Quando já fez entrar
estas qualidades em seu caráter, a pessoa é considerada prestes à Iniciação, e
os Guardiães dos Mistérios lhe abrirão a Porta Estreita. É assim, mas
unicamente assim, que ela se torna candidato pronto para ser aceito. O
Espírito que habita o homem é o dom do Deus Supremo, que em si contém os três
aspectos da Vida Divina (Inteligência, Amor e Verdade) por ser a imagem de
Deus. No curso de sua evolução, começa por desenvolver o aspecto Inteligência,
isto é, suas faculdades mentais, e esta evolução se executa na vida diária.
Este desenvolvimento, levado a um alto grau e paralelamente ao desenvolvimento
moral, conduz o homem à condição de candidato. O segundo aspecto do Espírito é
o Amor; sua evolução é a do Cristo. Nos verdadeiros Mistérios é que se pode
obter esta evolução; a vida do discípulo é o Drama dos Mistérios, e as frases
são assinaladas pelas Grandes Iniciações. Para mostrar os Mistérios no plano
físico, costumava-se representá-lo de um modo dramático, e as cerimônias
copiavam, sob diferentes aspectos, o modelo sempre seguido sobre a Montanha,
porque elas eram sombras, numa época de decadência, das formidáveis Rivalidades
do mundo espiritual. O Cristo Místico é, portanto, duplo, a princípio o Logos,
Segunda Pessoa da Trindade, que desce à matéria, em seguida, o Amor ou segundo
aspecto do Espírito Divino evoluindo no homem. Um representava os processos
cósmicos executados outrora; é a raiz do Mito Solar; o outro representa um
processo que se passa no indivíduo, fase última da evolução humana, que
determinou a aparição, no mito, de novos, e numerosos detalhes; ambos se
encontram na narração dos Evangelhos, sua união nos apresenta a Imagem do
Cristo Místico. Consideremos, primeiro, o Cristo Cósmico, isto é, a Divindade
que se envolve de matéria, a encarnação do Logos, o Deus feito carne. A matéria
destinada a formar nosso sistema solar, tendo sido separada da que enche o
oceano incomensurável do espaço, recebe, da Terceira Pessoa da Trindade, o
Espírito Santo, sua vida que a anima e lhe permite tomar forma. A matéria,
condensada, é, em seguida, modelada pela vida do Segundo Logos ou Segunda
Pessoa da Trindade que se sacrifica, encerrando-se nos limites materiais e assim
se tornando o Homem Celeste, em Seu Corpo todas as formas existem, de Seu
Corpo, todas as formas fazem parte. Tal é o processo cósmico representado
dramaticamente nos Mistérios; nos verdadeiros Mistérios é mostrado tal como se
deu no espaço; nos Mistérios; nos verdadeiros Mistérios é mostrado tal como se
deu no espaço; nos Mistérios do plano físico é representado por meio de métodos
mágico ou outros, e para certos detalhes mesmo por atores. Os processos são
claramente indicados na Bíblia. Quando o Espírito de Deus se movia sobre as
águas, nas trevas que estavam na face do abismo (Gênesis 1:1,2), o imenso
abismo da matéria não tinha forma alguma, estava vazio no princípio. A forma
lhe foi dada pelo Logos, a Palavra, da qual se escreveu: Todas as coisas foram
feitas por Ela, e nada foi feito sem Ela (João 1:3). Como disse Charles Webster
Leadbeater (1854-1934) em termos admiráveis: "O resultado desta primeira
grande emanação é o aceleramento dessa admirável e gloriosa vitalidade, que
interpenetra toda matéria, por mais inerte que ela apareça aos nossos
imperfeitos olhos físicos. Eletrizados por essa vitalidade, os átomos dos
diversos planos desenvolvem toda espécie de atrações e repulsões, até então
atentes, e entram em combinações mais variadas". Só quando termina o
trabalho do Espírito, o Logos, o Cristo Cósmico Místico, pode revestir-se de
matéria; entra, então verdadeiramente, no cio da Virgem, no seio da Matéria
ainda virgem e improdutiva. Esta matéria fora vivificada pelo Espírito Santo,
que, pairando acima da Virgem, nela verteu sua vida, preparando-a, assim, para
receber a vida do Segundo Logos. Este toma-a, então, para veículo de Sua
energia. É assim que o Cristo se encarna e se faz carne, "Você não
desprezou o seio da Virgem". Nas traduções latina e inglesa do texto
original grego do Símbolo de Niceia, na passagem que exprime o período da
descida do Cristo, as preposições foram trocadas e, com elas, o próprio
sentido. O texto original diz: "e foi encarnado do Espírito Santo e da
Virgem Maria, enquanto que a tradução diz: "e foi encarnado pelo Espírito
Santo, da Virgem Maria". O Cristo não se reveste apenas da matéria virgem,
mas também da matéria já impregnada, palpitante de vida do Terceiro Logos (o
Espírito Santo); e de tal forma que a vida e a matéria o envolvem como de uma
dupla vestimenta. Tal é a descida do Logos na matéria, descrita como o
nascimento do Cristo de uma Virgem; ela se torna, no Mito Solar, o nascimento
do Deus Sol, no momento em que se levanta o signo Virgo. Então começa a ação do
Logos sobre a matéria. No Mito, o símbolo deste período primitivo é a infância
do Herói. O majestoso poder do Logos curva-se a todas as debilidades da
infância, manifestando-se quase nada nas formas frágeis de que ela é a alma. A
matéria aprisiona e parece querer sufocar seu Rei criança, cuja glória é velada
pelos limites impostos por Ele mesmo. Lentamente, Ele a modela para um destino
sublime. Ele a conduz à maturidade e estende-se sobre a cruz da matéria, a fim
de poder derramar, da cruz, todas as energias da Sua vida sacrificada. Eis o
Logos do qual Platão (428 AC 347) diz que é como uma cruz estendida sobre o
universo; o Homem Celeste de pé no espaço, os braços abertos para abençoar; o
Cristo crucificado, cuja morte na cruz da matéria impregna toda a matéria de
Sua Vida. Parece morto e sepultado, mas se levanta, revestido da própria
matéria no seio da qual parecia ter sucumbido, e transporta ao céu Seu corpo
material, agora radioso, onde recebe a vida que emana do Pai, tornando-se o
veículo das vidas humanas imortais. É a vida do Logos que forma a vestimenta da
alma humana; esta vestimenta lhe é dada para que o homem viva através das
idades e alcance "o estado de homem feito", atinja a Sua própria
estatura. Somos, na verdade, revestido por Ele, a princípio materialmente,
depois espiritualmente. Ele sacrificou-se para levar muitos dos seus filhos à
glória e, por isso, está sempre conosco até o fim das idades. A crucificação de
Cristo é, portanto, uma parte do grande sacrifício cósmico. A representação
alegórica desta crucificação, nos mistérios do plano físico, e o símbolo
sagrado do homem crucificado no espaço, se materializam a ponto de tornar-se
uma verdadeira morte sofrida na cruz e em um crucifixo trazendo um ser humano
expirando. Foi então que esta história, hoje a de um homem, foi aplicada ao
Instrutor Divino, Jesus, e se tornou a história de sua morte física, enquanto
que o nascimento da criança de uma virgem, a infância cercada de perigos, a
ressurreição e ascensão tornaram-se igualmente incidentes de Sua vida humana.
Os Mistérios desapareceram, mas suas representações grandiosas e empolgantes da
obra cósmica executada pelo Logos realçaram a figura venerada do Instrutor da
Judeia; O Cristo Cósmico dos Mistérios fica, assim, sob os traços do Jesus Histórico,
a Figura Central da Igreja Cristã. Há outro fato dá a História do Cristo um
caráter de fascinação Suprema; é que, nos Mistérios, Ele é ainda um Cristo,
intimamente ligado ao coração humano, O Cristo do Espírito humano, o Cristo que
existe em cada um de nós, que aí nasce e ai vive, é crucificado, ressuscita
dentre os mortos e sobe ao céu, no meio dos sofrimentos e do triunfo de todo o
"Filho no Homem". A vida de todo o Iniciado nos verdadeiros
Mistérios, nos Mistérios Celestes, está consignada, em suas grandes linhas, na
biografia dos evangelhos. Eis porque São Paulo fala, como já vimos, do
nascimento, da evolução e da completa maturidade do Cristo no discípulo. Todo
homem é potencialmente um Cristo; e o desenvolvimento, nele, da vida do Cristo,
segue, de um modo geral, a narração dos Evangelhos nos incidentes principais,
mas estes, com vimos, têm um caráter universal e não particular. Cinco grandes
Iniciações se sucedem na vida de um Cristo; cada uma arca um grau atingido, em
seu desenvolvimento, pela Vida do Amor. Estas Iniciações são ainda hoje
concedidas como o foram no passado; a última indica o triunfo final do Homem
que, atingindo a Divindade, já ultrapassou o nível da humanidade, tornando-se
um Salvador do Mundo. Acompanhemos a história desta carreira ou curso que, sem
cessar, se repete no domínio das experiências espirituais e contemplemos o
Iniciado reproduzindo em sua própria vida a existência do Cristo. A primeira
grande Iniciação marca o nascimento do Cristo no discípulo, que realiza pela primeira
vez, em si mesmo, a efusão do Amor Divino e experimenta esta transformação,
estranhamente maravilhosa, na qual ele se sente um com tudo o que vive. É o
segundo nascimento com o qual se regozijam as hostes celestiais, pois o
discípulo nasce no "Reino de Deus" com uma criancinha. Tais são os
nomes sempre dados aos novos Iniciados. Assim o entendia Jesus, quando dizia:
Se vocês não se tornarem criancinhas, não irão entrar no Reino dos Céus (Mateus
18:3). Certos autores cristãos do começo de nossa era dizem, em termos
significativos, que Jesus "nasceu em uma caverna", o estábulo dos
Evangelhos. Ora, a "Caverna da Iniciação" é um termo antigo bastante
conhecido, e é sempre lá que nasce o Iniciado. Acima da caverna, onde está a
criancinha, brilha a Estrela da Iniciação, esta estrela que resplandece sempre
no Oriente quando nasce um Cristo criança. Cada uma destas crianças está
cercada de perigos e ameaças, perigos estranhos aos quais não estão sujeitas as
outras crianças, porque ela é ungida pela confirmação do novo nascimento e por
isso as Potências Tenebrosas do mundo invisível procuram sua perda. Apesar
destas provações, atinge a idade viril, porque o Cristo, tendo nascido, não
pode morrer, tendo que terminar sua evolução. Sua vida se expande em beleza e força,
crescendo em sabedoria e espiritualidade, até o momento da segunda grande
Iniciação, o Batismo do Cristo pela água e pelo Espírito, que lhe confere os
poderes necessários a um Instrutor destinado a percorrer o mundo e a executar a
tarefa do "Filho Bem Amado". Então, o Espírito divino desce, em
ondas, sobre ele e a glória do Pai invisível o ilumina com sua pura luz. Mas,
ao deixar este lugar bendito, é conduzido pelo Espírito ao deserto e de novo
exposto à prova de tentações terríveis. Os poderes do Espírito, ao se
desenvolverem nele, despertam os Setes Tenebrosos que se esforçam em lhe
dificultar o caminho: eles empregam, para isto, estes mesmos poderes,
convidando-o a serví-los para sua própria salvação, em lugar de repousar em seu
Pai com paciente confiança. Nestas transições rápidas e bruscas que as provas
trazem, sua fé e sua força não vacilam e, ao sussurro malicioso do Tentador
encarnado, sucede sempre a voz consoladora do Pai. Vencedor destas tentações,
volta ao seio dos homens, a fim de consagrar seus poderes ao serviço dos que
sofrem, poderes que não quis empregar em seu próprio benefício, recusando-se em
mudar em pão a pedra bruta para vencer a própria fome, antes alimentando com
alguns pães a cinco mil homens sem contar mulheres e crianças. Sua vida de
incessante serviço atravessa, então novamente, um curto período de glória, ao
galgar uma montanha, a Montanha Sagrada da Iniciação. Lá é transfigurado e
encontra alguns dos seus predecessores, Seres poderosos que outrora tinha
trilhado o mesmo caminho. Recebe, assim, a terceira grande Iniciação, e, logo
em seguida, a sombra da sua Paixão se aproxima, estendendo sobre ele o seu
manto doloroso; mas ele volta resolutamente sua face para Jerusalém e,
repelindo as palavras tentadoras dos seus discípulo, vai a Jerusalém, onde o
espera o batismo do Espírito Santo e do Fogo. Após a Natividade, a perseguição
de Herodes; após o batismo, a tentação no deserto; após a Transfiguração, a
entrada na última etapa do Caminho da Crus. É assim que a provocação sempre sucedeu
ao Triunfo, até o fim a ser atingido. A vida de amor não cessa de crescer,
sempre mais rica e mais perfeita, até que a presença luminosa do Filho de Deus
se revele no Filho do Homem; e, ao aproximar-se o momento da batalha, a quarta
Iniciação o leva em triunfo a Jerusalém, de onde Ele contempla o Getsemani e o
Calvário. Neste instante, está o Cristo pronto a se oferecer no sacrifício da
cruz, prestes a afrontar a agonia do Jardim, onde adormecem aqueles que
escolheu, enquanto ele se debate na mais terrível angústia. Pede, um instante,
que o copo se afaste, mas sua vontade poderosa triunfa. Estende a mão, toma o
copo e bebe, enquanto o anjo o fortifica e consola, como fazem os anjos quando
veem o filho do Homem curvado sob a dor. bebe o copo amargo da traição, do
abandono, renegado de todos, escarnecido e só, no meio de seus inimigos que o
insultam. Caminha para a suprema prova. Torturado pela dor física, ferido pelo
espinho cruel da dúvida, despojado de suas imaculadas vestes, atirado às mãos
dos seus inimigos, desprezado, aparentemente, por Deus e pelos homens, suporta
tudo com paciência e, na angustia máxima, espera resignado o socorro no último
transe. Mas ainda lhe resta o sacrifício da cruz, em que morre a vida da forma,
onde renuncia inteiramente à vida do mundo inferior. Cercado de inimigos
triunfantes e zombadores, sentindo o horror da grande obscuridade que o
envolve, sofre o assalto de todas as forças do mal, e sua visão interior se
vela. Encontra-se, neste momento supremo, só, inteiramente só. Finalmente, seu
coração heroico, esmagado pelo desespero, lança um grito para o Pai que parece
tê-lo abandonado. A alma humana afronta, na solidão absoluta, a intolerável
tortura de uma aparente derrota. Mas, fazendo apelo a toda a sua força
indomável, fazendo o sacrifício da vida inferior, aceitando a morte
voluntariamente, abandonando o corpo dos desejos, o Iniciado desce aos infernos
para que possa conhecer todas as regiões do Universo, onde existem almas
pedindo auxílio; os mais deserdados devem ser atingidos por seu amor infinito.
Surgindo, então, do seio das trevas, ele revê a luz, sentindo-se de novo o
Filho, inseparável do Pai. Levanta-se para a vida que não tem fim, irradiando
alegria, com a certeza de ter afrontado e vencido a morte, sentindo-se bastante
forte para prestar a toda a criatura um socorro infinito, capas de derramar sua
vida em toda a alma que luta. Permanece algum tempo ainda com os discípulos,
instruindo-os, explicando-lhes os mistérios dos mundos espirituais,
preparando-os a seguir o caminho que acaba de percorrer; depois, terminada sua
vida terrestre, sobe ao Pai e, por meio da quinta Grande Iniciação, torna-se o
Mestre Triunfante, o traço de união entre Deus e o home. Tal era a história,
vivida nos verdadeiros Mistérios Antigos, como nos de hoje, história
representada sob forma dramática e simbólica nos Mistérios do plano físico, que
apenas levantam uma ponta do véu. Tal é o Cristo dos Mistérios sob seu duplo
aspecto, Logos e homem, cósmico e individual. Como nos admirar que essa história,
vagamente compreendida pelos místicos, sem que eles a conhecessem, esteja
intimamente unida ao coração humano e seja a inspiração das vidas nobres? O
Cristo do coração humano é, quase sempre, Jesus considerado como o Cristo
místico e humano, que luta, sofre, morre e, finalmente, triunfa. O Homem em
quem a humanidade se vê crucificada e ressuscitada, cuja vitória promete a
vitória a todos os que, semelhantes a ele, sejam fiéis na morte e mais além, o
Cristo que jamais será esquecido enquanto o mundo tiver necessidade de
Salvadores e os Salvadores se sacrificarem pela Humanidade". Livro As
Revelações Secretas da Religião Cristã. Abraço. Davi.
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