Editor do
Mosaico. Comemorou-se no mês de janeiro (26) o Dia Internacional do Holocausto.
Evento criado para lembrar as vítimas do Holocausto e combater o antissemitismo
pelo mundo. Esse é um fato histórico ricamente documentado com sobreviventes,
judeus, ainda vivos. Memória, que a humanidade jamais deve esquecer, para que,
perversidades e crueldades desse vulto, contra pessoas humanas indefesas e
inocentes, não temam lugar novamente em nossa sociedade contemporânea. Dos nove
milhões de judeus que residiam na Europa antes do Holocausto, mais de dois
terços foram mortos. Mais de um milhão de crianças, dois milhões de mulheres e
quatro milhões de homens morreram durante o período da 2ª Guerra Mundial
(1939-1945) nos campos de extermínio. Segue o nome de alguns deles: Auschwitz -
Polônia. Belzec - Polônia. Bergen Belsen – Alemanha. Bordufus – Noruega.
Breitenau – Alemanha. Buchenwald – Alemanha. Chelmno – Polônia. Gross Rossen –
Polônia. Lwow – Ucrânia. Natzweiller Struthof – França. Treblinka – Polônia.
Dachau – Alemanha e muitos outros.
Judaísmo.
www.morasha.com.br. A RESISTÊNCIA
JUDAICA DURANTE O HOLOCAUSTO. Recentemente os historiadores passaram a
considerar o número de judeus brutalmente assassinados pelo Terceiro Reich em
torno de 7 milhões – e não mais 6 milhões. A pergunta muitas vezes feita é por
que estes não resistiram? Por que não lutaram? Por que se deixaram levar “como
ovelhas”? Quem pergunta tem a objetividade do tempo transcorrido desde então e
nenhuma vivência pessoal de um horror que a mente humana não consegue
assimilar. Mas a pergunta precisa ser respondida. Uma guerra sem fronteiras
havia sido declarada pela Alemanha de Adolf Hitler (1889-1945) contra o Povo
Judeu, sem restrição de homens ou armamentos. O fato colocava os judeus numa
situação extremamente difícil. Eles não possuíam um Estado, tampouco forças de
combate treinadas; e nem aliados. Eram uma minoria civil desarmada, espalhada
em todos os países da Europa. No Leste Europeu eram desprezados. Hoje, temos
provas e testemunhos de que houve centenas de atos, individuais e de grupo, de
resistência judaica aos nazistas nos países da Europa Ocidental e Oriental.
Essa resistência se manifestou de forma diferente dependendo do país, do grau
de antissemitismo da população local e do momento histórico. Um dos grandes
desafios na historiografia da resistência judaica durante o Holocausto é a
definição do que deve ser considerado como “resistência” a um poder opressor.
Deve-se considerar apenas a ação armada? Historiadores concordam que há duas
categorias básicas: a resistência civil, não violenta, e a armada. E, mesmo a
armada é subdividida entre a ofensiva e a chamada acorrentada. A resistência
ofensiva inclui operações armadas não convencionais, ações de guerrilheiros ou
de sabotagem. Um exemplo da resistência ofensiva foi a luta dos partisans1
nos territórios sob domínio alemão. A acorrentada, por sua vez, implica em
ações armadas em situações em que são praticamente nulas as esperanças de
sobrevivência. O Levante do Gueto de Varsóvia, há 75 anos, em abril de 1943,
assim como os levantes ocorridos em outros guetos e campos de concentração, são
exemplos de resistência acorrentada. Há testemunhos sobre centenas de atos
individuais de mulheres e homens judeus, que, sendo levados à morte, tentaram
ferir seus algozes com facadas e até mesmo mordidas. E, é um fato histórico de
que dezenas de milhares de judeus participaram da resistência armada,
engrossando as fileiras dos movimentos nacionais de resistência, os partisans,
na luta contra o inimigo comum. (Apenas em território polonês, com
raríssimas exceções, os grupos de resistência não aceitavam judeus em suas
fileiras). Nunca é demais enfatizar que os partisansoperavam apenas em
ações de guerrilhas. Um enfrentamento aberto, com armas em punho, contra os
alemães ocorreu em apenas três ocasiões – em Varsóvia, Paris e Eslováquia, no
final do verão europeu de 1944. Nas três ocasiões os resistentes sabiam que as
forças Aliadas estavam próximas. Em toda a Europa sob domínio nazista foram
muito frequentes os casos de ajuda por parte de judeus a seus correligionários
“em perigo ou em fuga”, de salvamento de crianças, de proteção aos que se
escondiam. E, enquanto aumentavam os esforços nazistas para erradicar os judeus
da História, dia após dia eles registravam a vida sob ocupação nazista,
inclusive nos campos de concentração. Escrever era uma forma de resistir, era
deixar a prova dos crimes nazistas. Na Polônia, trancafiados em guetos,
isolados e sem qualquer meio de comunicação com o exterior, os judeus criaram
uma ativa resistência civil, entre outras, organizações assistenciais,
religiosas e educacionais clandestinas. E conseguiram realizar levantes armados
em cinco dos principais guetos, em 45 dos menores, em cinco campos de
concentração e extermínio, e em 18 campos de trabalhos forçados. A fuga era uma
maneira de resistir. Mas, mesmo quando os judeus tinham os meios e a
oportunidade, as dificuldades eram enormes. A pergunta era “para onde ir? ”.
Praticamente nenhum país lhes abrira suas portas. Os que tiveram tempo de
escapar para outros países da Europa não foram rápido ou longe o suficiente;
judeus alemães e austríacos foram capturados na França, Bélgica e assim por
diante. Sem ajuda era quase impossível se esconder, e sobreviver. A população
não judaica muitas vezes era hostil; no melhor dos casos, indiferente a eles e
à sua sorte. Em sua caça aos judeus, os nazistas contavam com a ajuda
entusiasmada de ucranianos, lituanos e poloneses. E aquele que decidisse ajudar
um judeu, sabia que, se descoberto, seria executado. Ademais, qualquer tipo de
resistência por parte de uma nacionalidade qualquer era fortemente inibido pela
polícia nazista e seus métodos de terror. Porém, aos judeus os nazistas
reservavam um “tratamento especial”. A punição a um não judeu suspeito de um
ato de resistência era, em muitos casos, a execução sumária; a tortura era
usada para extrair informações. Porém, para um resistente judeu a execução
sumária era a melhor opção, pois, via de regra, ele devia “ser morto da maneira
que mais conduzisse à disciplina e que impedisse qualquer outro tipo de
resistência”. O sadismo nazista não teve limites. No Leste da Europa, os
resistentes judeus eram esfolados, queimados vivos, jovens judias recebiam
injeções de veneno que provocavam espasmos musculares antes da morte. Em
Minsk, o comandante das SS cegava os judeus capturados com ferro em brasa e os
enviava de volta para seus companheiros, como um “alerta”. Mas, acima de tudo,
a resistência era inibida pela política alemã de “responsabilidade coletiva”.
Essa tática de retaliação atribuía a responsabilidade a famílias, até a
comunidades inteiras por atos individuais de resistência. No caso judaico, a
retribuição podia atingir todos os habitantes de um gueto. Caso um judeu fosse
encontrado fugindo, de posse de um rádio, um telefone ou uma arma, dezenas ou
até centenas de judeus eram assassinados em represália. E, na eventualidade de
um judeu ferir ou matar um alemão, os números chegavam a milhares. Portanto, a
pergunta a ser feita é “como pôde haver uma resistência? ”. Na Europa
Ocidental. Nos países da Europa Ocidental são muitos os exemplos de
resistência judaica – individual e organizada, civil e armada. Na França, por
exemplo, às vésperas da eclosão da 2ª Guerra, quando as autoridades francesas
anunciaram que evacuariam crianças francesas de Paris, os líderes dos Éclaireurs
Israélites, (Escoteiros Judeus) organizaram a saída das crianças judias das
famílias de imigrantes e montaram lares de infância coletivos no sul da França.
Os Éclaireurs Israélites e outros movimentos judaicos juvenis tiveram
papel crucial quando a perseguição ativa aos judeus chega ao país. Por toda a
Europa havia judeus engajados em ajudar seus correligionários “em perigo ou em
fuga”. A partir da França, a entidade judaica Oeuvre de Secours aux Enfants
(OSE), adotando o lema “Il faut sauver les enfants! ” (É preciso salvar
as crianças), organizou uma rede clandestina de resgate de crianças judias de
toda Europa, que ficou conhecida como Circuit Garel. A OSE os
transportava para o sul da França, acomodando-os em lares e orfanatos. Em 1943,
com a intensificação das deportações, conseguiram contrabandeá-las para a
Suíça. Como mencionamos acima, milhares de judeus combateram nas fileiras dos
movimentos nacionais de resistência na França, Bélgica, Itália, Iugoslávia,
Grécia e Eslováquia. Na França, foi grande o número de judeus na
Resistência Francesa, La Résistance. Muitos inclusive ocuparam
posições de liderança. Um dos grupos da Résistance era a Armée Juive
(Exército Judeu), que operava no sul da França. Quando os britânicos criaram a Special
Operations Executive (SOE) para espionar os inimigos e organizar os
movimentos de resistência, entre os agentes de campo infiltrados atrás das
linhas alemãs havia muitos judeus, principalmente mulheres. Na Grécia, o rabino
Barzilai e os líderes comunitários que faziam parte do Judenrat de
Atenas decidiram não atender nenhuma exigência nazista e agiram rapidamente.
Foram queimadas todas as informações sobre a comunidade, o rabino raspou a
barba, juntando-se aos partisans nas montanhas e incentivando todos os
judeus a fugir. Entre os que se juntaram aos partisans gregos,
destacam-se 40 indivíduos integrantes do grupo que explodiu a ponte da
principal ferrovia, ligando o norte ao sul da Grécia. A resistência não
armada no Leste Europeu. Os guetos no Leste Europeu eram centros de morte
lenta. Os judeus morriam de fome e de frio, pois a quantidade oficial de
alimentos e combustível que os nazistas destinavam a eles era ínfima e
constantemente reduzida. Morriam nas ruas por nenhum motivo além de serem
judeus. Em Varsóvia, a taxa de mortalidade chegou a mil por semana. Os judeus
procuraram resistir à política nazista de inanição e desumanização. No início
do seu confinamento – quando ninguém podia sequer imaginar a possibilidade de
um extermínio em massa ou de câmaras de gás – a preocupação girava em volta da
sobrevivência física, moral e espiritual. Na maioria dos guetos maiores, uma
“comunidade paralela”, uma rede de organizações sócias, assistências, e
políticas underground, incluindo movimentos juvenis, passou a funcionar. Seus
líderes haviam saído das fileiras das instituições judaicas, dos movimentos
juvenis sionistas e dos partidos de esquerda do pré-guerra. Alimentos, mercadorias
e medicamentos eram contrabandeados para dentro dos muros do gueto, muitas
vezes por crianças. Era o contrabando que mantinha o gueto vivo. A “comunidade
paralela” criou refeitórios, orfanatos, clínicas e abrigos para refugiados e os
mais pobres. Organizava ensino clandestino e atividades culturais. Em Varsóvia,
os “comitês das residências” atuavam para cuidar dos que moravam em seus
complexos habitacionais. Em muitos casos, as atividades sociais davam cobertura
a movimentos políticos ilegais. Sendo a prática da religião judaica proibida,
uma resistência religiosa entra em ação para ajudar os judeus a observarem leis
e feriados religiosos. Em casa de orações clandestinas havia diariamente minyanim;
apenas emVarsóvia eram cerca de 600. Os rabinos continuavam a lecionar, a
escrever comentários, a realizar casamentos, Brit milot, Bar Mitzvás.
Jovens continuaram a estudar em yeshivot clandestinas. Os médicos judeus
não tinham acesso a medicamentos para salvar os doentes já enfraquecidos pela
fome. Ao se dar conta de que a guerra contra a fome estava perdida, passaram a
estudar os efeitos da inanição em seu próprio corpo e nos cadáveres. Suas
conclusões foram publicadas após a guerra, em Paris. Sob domínio nazista era
“ilegal” que os judeus possuíssem rádio, telefone ou que publicassem um jornal.
No entanto, a maioria dos grupos políticos clandestinos lutava contra o
isolamento judaico publicando jornais e boletins clandestinos. As notícias eram
compiladas de transmissões soviéticas ou da BBC, em rádios escondidos. Muitos,
judeus e não judeus, registram a vida sob julgo nazista, mas os arquivos mais
completos foram coletados pelo grupo “Oyneg Shabbes “, fundado em
Varsóvia pelo historiador Emanuel Ringelblum. As palavras de ordem de
Ringelblum eram “reunir material, juntar impressões e registrá-las,
imediatamente”. Ele acreditava que os arquivos permitiriam ao mundo pós-guerra
ouvir as vozes dos que foram silenciados. Eram registros dos crimes cometidos
pelos nazistas, e da vida, e morte dos judeus no gueto de Varsóvia e no resto
da Polônia. Um parêntese precisa ser aberto a respeito dos Judenrats, os
Conselhos Judaicos criados pelos nazistas para executarem suas ordens. As
atitudes de vários desses Conselhos são até hoje questionadas e criticadas, mas
não cabe aqui analisar suas ações ou razões. Porém, é preciso ressaltar que
muitos foram forçados a assumir o cargo, sob pena de morte, e que os Conselhos
eram impotentes frente aos nazistas. Suas tentativas de aliviar as condições de
vida nos guetos raramente tinham sucesso. O ponto de inflexão. A
operação Barbarossa, a invasão da União Soviética iniciada em junho de 1941,
marcou o ponto de inflexão da política alemã em relação aos judeus. Com a
invasão, dá-se início à matança rápida e indiscriminada de todo e qualquer
judeu, independente de idade ou sexo. Crianças de colo não eram poupadas. A
velocidade, e sigilo e ardis usados pelos alemães e seus colaboradores eram
essenciais para o “bom andamento das operações”. Quando havia qualquer tipo de
resistência, esta era brutal e imediatamente silenciada. Dia após dia, cidade
após cidade, os nazistas destruíram sistematicamente comunidades judaicas
inteiras. Não foram poucas as vezes em que foram “ajudados” pela população
local. Os alemães sabiam e exploraram ao máximo o antissemitismo reinante no
Leste europeu. Apesar do esforço alemão para manter a “Solução Final” em sigilo
absoluto, alguns judeus rastejaram com vida das valas onde os nazistas os havia
jogado junto com centenas de outros que haviam sido mortos a tiro. Eles
revelavam aos judeus que os encontraram “o crime sem nome” que vivenciaram. A
princípio, a maioria dos líderes dos movimentos judaicos clandestinos receberam
os relatos dos assassinatos em massa com ceticismo; os que acreditaram não
conseguiram interpretar o verdadeiro alcance dos acontecimentos. Em 1942, os
testemunhos de judeus que haviam fugido de campos de extermínio fizeram-nos
estremecer. A resistência polonesa também alertara seus contatos em Varsóvia
sobre o que acontecia com os judeus em Treblinka. Um dos membros do Bund é
então enviado para investigar, e volta com a confirmação de que se tratava de
um campo de morte, onde os judeus eram assassinados em câmaras de gás. Outros couriers,
foram despachados paraaveriguar e repassar as informações. Eles também voltam
com a confirmação dos massacres. Esses jovens, em sua maioria mulheres, haviam
criado uma rede de comunicação para conectar vários guetos. Com documentos
falsos viajavam por toda a Polônia levando informações, jornais clandestinos e
dinheiro; compravam e contrabandeavam armas para dentro dos guetos e
organizavam rotas de fuga. Ao receber confirmação dos assassinatos em massa e
das câmaras de gás, as lideranças compreenderam a realidade da “Solução Final”.
Perceberam que para evitar uma revolta em massa, os judeus eram ludibriados de
forma a pensar que apenas estavam sendo levados a campos de trabalho. Os
nazistas eram “ajudados” pela tendência do ser humano de racionalizar e de
negar o pior. “Por que os nazistas nos matariam se podiam explorar nossa mão de
obra? Vamos trabalhar nas piores condições possíveis, como escravos, mas vamos
sobreviver”. Para os movimentos clandestinos, a estratégia de não-provocação
até então adotada, facilitava os planos dos nazistas. Decidiram que era imprescindível
convencer outros judeus a resistir às deportações, convencendo-os de que eram o
passo inicial para a liquidação judaica. E decidiram que era preciso enviar as
informações para os Aliados, na esperança de que algo fosse feito em seu
socorro. Iludiam-se pensando que a falta de ajuda decorria da falta de
conhecimento... Resistência armada. Vimos acima que a ferramenta nazista
mais potente contra a resistência era a tática da “responsabilidade coletiva”.
A pessoa podia estar decidida a lutar, a enfrentar a tortura e a morte. Mas
estaria preparado para ver que suas decisões levaram os nazistas a assassinar
seus familiares, seus amigos, quem sabe, o gueto inteiro? Os inimigos eram
implacáveis e as represálias, selvagens. E, o crime supremo – matar um alemão –
era vingado com rios de sangue judaico. Os exemplos não terminam. Em Dolhyhnov,
próximo a Vilna, toda a população do gueto foi assassinada após a fuga de dois
meninos que se recusaram a voltar atrás. Em Bialystok os alemães atiraram em
120 judeus, em plena rua do gueto, após um judeu ter matado um policial alemão,
e ameaçaram destruir o gueto inteiro se ele não se rendesse – o que acabou
acontecendo... Os movimentos juvenis e os partidos de esquerda e o Judenrat
– que diferiam em muitos assuntos – estavam de acordo em que uma resistência
armada só poderia acabar em morte para os judeus. E, enquanto houvesse a
possibilidade de sobrevivência, ainda que para uma minoria, teriam que
aguardar. Mas eles se preparariam... Em 1942 são criadas organizações de
resistência armada. A primeira delas, a FPO, Organização dos Partisans Unidos,
foi formada em Vilna. Um de seus comandantes, o poeta Abba Kovner, foi um dos
primeiros a entender as intenções nazistas. Num discurso inflamado em uma
reunião underground, Kovner conclama seus irmãos, judeus, a resistir.
“Não acredite naqueles que pretendem enganar-nos.... O plano de Hitler é
eliminar todos os judeus da Europa. É melhor cair como guerreiros do que viver
à mercê dos assassinos. Levantem-se! Ergam-se com suas últimas forças!” O ZOB (Zydowska
Organizacja Bojowa, Organização de Combatentes Judeus, em polonês) deu seus
primeiros passos em Varsóvia, em 1942, após a Grande Deportação. Esse movimento
de resistência seria decisivo na organização do Levante do Gueto de Varsóvia. A
finalidade e velocidade da Solução Final deixava duas opções aos grupos de
resistência – que sobreviveram às deportações: organizar fugas em massa ou
ficar nos guetos e lutar. Os que optaram pela fuga, procuraram abrigo nas
florestas. Alguns juntaram-se às unidades de partisans soviéticos,
outros conseguiram formar grupos separados. Mas, muitos morreram de fome ou
pelas mãos de partisans ou camponeses poloneses: o ódio da população em
relação aos judeus era mais forte do que o ódio que nutriam pelos alemães. A
situação dos que ficaram para lutar era desesperadora e o tempo corria contra
eles. Rodeados por uma força militar alemã treinada e equipada estavam em
inferioridade numérica e seu “armamento” era irrisório; e era extremamente
difícil e perigoso obter armas. Os combatentes judeus não recebiam armas,
alimentos ou remédios “caídos dos céus”, jogados pelos Aliados, como os demais
grupos de resistência. Os couriers ou os judeus que viviam no lado
“ariano” tinham que comprar ou roubar armas, e contrabandeá-las para dentro dos
guetos sem serem detectados. No entanto, estavam preparados para lutar e
morrer; sua honra e a honra do Povo Judeu estavam em jogo. Sabiam que não
sobreviveriam, mas “por que não resistir quando a alternativa era a morte em momento
e local escolhidos pelos nazistas?”, escreveu um dos combatentes do Levante do
Gueto de Varsóvia, “Estamos sendo impelidos pelo desespero aliado ao desejo de
vingança. Nossos familiares foram abatidos como gado e atirados em covas sem
nome. O simples pensamento de dar um fim à vida de alguns alemães, que fosse,
já é um poderoso incentivo”. Nos guetos maiores, os combatentes das
organizações clandestinas sabiam que não podiam contar, de modo geral, com o
apoio dos Judenrat, nem com a população geral do gueto. Muitos líderes
desses conselhos eram ambivalentes quanto a ajudar a resistência porque
esperavam que a maior parte da população do gueto pudesse ser salva com seu
trabalho, e viam a rebelião armada como um plano suicida. Apenas em Kovno e
Minsk, os líderes do Judenrat cooperaram com o movimento clandestino. A
resistência mais bem-sucedida, uma fuga em massa, ocorreu em Minsk. Entre 6 mil
a 10 mil judeus fugiram para as densas matas, e alguns milhares sobreviveram
até o final da guerra. Em muitos guetos menores, nos territórios ocupados no
leste da Polônia e da então URSS, os membros dos Judenrat eram atuantes
no movimento ou cooperavam com a resistência. Em muitos desses guetos
irromperam revoltas espontâneas durante sua liquidação final. O exemplo mais
famoso e dramático de resistência judaica armada durante o Holocausto foi o
Levante do Gueto de Varsóvia, em abril e maio de 1943, que assumiu um
significado muito além da revolta em si. Tornou-se um momento decisivo na
História Judaica, como reconheceu Mordechai Anielewicz, líder da ZOB, ao
escrever sua derradeira carta duas semanas antes de sua morte. Revolta nos
campos. Durante a Guerra, no período de 1939-1945, milhões de pessoas
passaram por uma extensa rede de milhares de diferentes campos erguidos na
Alemanha e nos países europeus ocupados por esse poder. Acredita-se que 5,7
milhões de judeus, entre homens, mulheres e crianças foram mortos nos campos
nazistas. A maioria foi envenenada por gás Zyklon-B logo após sua chegada em um
dos seis campos de extermínio estabelecidos em território polonês: Chelmno,
Belzec, Sobibor, Treblinka, Auschwitz-Birkenau e Majdanek. A atmosfera de total
terror e isolamento, nos campos, bem como a inanição crônica da maioria dos
prisioneiros inibiram completamente sua vontade e suas possibilidades de
resistir. A rotina diária nos campos era organizada de forma brutal. Incluía um
sistema elaborado de duros castigos pelas menores “infrações”, vigilância
acirrada e intermináveis chamadas para a contagem dos prisioneiros. Cercas de
arame farpado e de alta voltagem, cães selvagens amestrados e torres de
segurança deixavam pouca esperança de fuga. Quem tentava resistir ou fugir era
morto de imediato. Mas, apesar desses enormes obstáculos, houve vários atos de
resistência em diversos campos. Mesmo nos de extermínio, à sombra das câmaras
de gás e crematórios, os judeus encontraram formas de resistir a seus
opressores: lutar contra a desumanização. Havia tentativas organizadas pelos
movimentos clandestinos para informar ao mundo a brutalidade nazista, as cruéis
condições físicas e a sistemática aniquilação de judeus nesses campos do
inferno. Os judeus rezavam, acendiam velas de Chanucá; um par de tefilin
era um bem precioso... Três levantes corajosos e ousados ocorreram nos centros de
morte de Treblinka, Sobibor e Auschwitz-Birkenau. De forma semelhante às
rebeliões nos guetos, as revoltas organizadas nesses centros, onde a humanidade
chegou ao seu nível mais baixo, surgiam do puro desespero e desesperança.
Yehuda Bauer, Professor Emérito de História e Estudos do Holocausto na
Universidade Hebraica de Jerusalém, e Consultor Acadêmico no Yad Vashem, é um
dos historiadores e pesquisadores que, em seu livro Rethinking the Holocaust
(“Repensando o Holocausto”), respondeu à pergunta: “Por que os judeus não
resistiram? ”. Ele escreveu: “A análise sobre a reação ativa judaica à opressão
nazista poderia resumir-se de maneira quase triunfalista: havia uma resistência
não armada, havia a santificação da vida, havia a resistência armada... Ao se revoltar
contra o regime hitlerista, que visava exterminar toda a população judaica, os
judeus não se envolveram em um ato de heroísmo. Eles simplesmente quiseram
preservar a substância moral e material de nosso povo. Seu sucesso lhes
garantiu a imortalidade”.
BIBLIOGRAFIA
Dawidowicz,
Lucy, The War Against the Jews: 1933-1945. Gutman, Israel, Resistência:
O levante do gueto de Varsóvia. Kassow, Samuel D,Who Will Write Our
History?: Rediscovering a Hidden Archive from the Warsaw Ghetto. Ebook
Kindle Gilbert, Martin, The Holocaust. Ebook Kindle. 1A
expressão é geralmente usada para se referir aos grupos armados organizados que
combatiam o domínio nazista na Europa ocupada, durante a 2ª Guerra Mundial.
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