Espiritismo. www.febnet.org.br. Texto de Allan Kardec (1804-1869). Livro O Céu e o
Inferno. Primeira Parte. Capítulo 3. O CÉU. Em geral, a palavra céu
designa o espaço indefinido que circunda a Terra, e mais particularmente a
parte que está acima do nosso horizonte. Vem do latim cœelum, formada do grego
coïlos, côncavo, porque o céu parece uma imensa concavidade. Os antigos acreditavam
na existência de muitos céus superpostos, de matéria sólida e transparente,
formando esferas concêntricas e tendo a Terra por centro. Girando essas esferas
em torno da Terra, arrastavam consigo os astros que se achavam em seu circuito.
Essa ideia, provinda da deficiência de conhecimentos astronômicos, foi a de
todas as teogonias, que fizeram dos céus, assim escalados, os diversos degraus
da bem-aventurança: o último deles era abrigo da suprema felicidade. Segundo a
opinião mais comum, havia sete céus e daí a expressão — estar no sétimo céu —
para exprimir perfeita felicidade. Os muçulmanos admitem nove céus, em cada um
dos quais se aumenta a felicidade dos crentes. O astrônomo Ptolomeu contava
onze e denominava ao último Empíreo por causa da luz brilhante que nele reina.
É este ainda hoje o nome poético dado ao lugar da glória eterna. A teologia
cristã reconhece três céus: o primeiro é o da região do ar e das nuvens; o
segundo, o espaço em que giram os astros, e o terceiro, para além deste, é a
morada do Altíssimo, a habitação dos que o contemplam face a face. É conforme a
esta crença que se diz que Paulo foi alçado ao terceiro céu. As diferentes
doutrinas relativamente ao Paraíso repousam todas no duplo erro de considerar a
Terra centro do universo, e limitada a região dos astros. É além desse limite
imaginário que todas têm colocado a residência afortunada e a morada do
Todo-Poderoso. Singular anomalia que coloca o Autor de todas as coisas. Aquele
que as governa a todas, nos confins da Criação, em vez de no centro, donde o
seu pensamento poderia, irradiante, abranger tudo! A Ciência, com a lógica
inexorável da observação e dos fatos, levou o seu archote às profundezas do
Espaço e mostrou a nulidade de todas essas teorias. A Terra não é mais o eixo
do universo, porém um dos menores astros que rolam na imensidade; o próprio Sol
mais não é do que o centro de um turbilhão planetário; as estrelas são outros
tantos e inumeráveis sóis, em torno dos quais circulam mundos sem conta,
separados por distâncias apenas acessíveis ao pensamento, embora se nos afigure
tocarem-se. Neste conjunto grandioso, regido por leis eternas — reveladoras da
sabedoria e onipotência do Criador —, a Terra não é mais que um ponto
imperceptível e um dos planetas menos favorecidos quanto à habitabilidade. E,
assim sendo, é lícito perguntar por que Deus faria da Terra a única sede da
vida e nela degredaria as suas criaturas prediletas? Ao contrário, tudo anuncia
a vida por toda parte e a humanidade é infinita como o universo. Revelando-nos
a Ciência mundos semelhantes ao nosso, Deus não podia tê-los criado sem
intuito, antes deve tê-los povoado de seres capazes de os governar. As ideias
do homem estão na razão do que ele sabe; como todas as descobertas importantes,
a da constituição dos mundos deveria imprimir lhes outro curso; sob a
influência desses conhecimentos novos, as crenças se modificaram; o Céu foi
deslocado e a região estelar, sendo ilimitada, não mais lhe pode servir. Onde
está ele, pois? E ante esta questão emudecem todas as religiões. O Espiritismo
vem resolvê-las demonstrando o verdadeiro destino do homem. Tomando-se por base
a natureza deste último e os atributos divinos, chega-se a uma conclusão; isto
quer dizer que partindo do conhecido atinge-se o desconhecido por uma dedução
lógica, sem falar das observações diretas que o Espiritismo faculta. O homem
compõe-se de corpo e Espírito: o Espírito é o ser principal, racional,
inteligente; o corpo é o invólucro material que reveste o Espírito
temporariamente, para preenchimento da sua missão na Terra e execução do
trabalho necessário ao seu adiantamento. O corpo, usado, destrói-se e o
Espírito sobrevive à sua destruição. Privado do Espírito, o corpo é apenas
matéria inerte, qual instrumento privado da mola real de função; sem o corpo, o
Espírito é tudo; a vida, a inteligência. Ao deixar o corpo, torna ao mundo
espiritual, onde paira, para depois reencarnar. Existem, portanto, dois mundos:
o corporal, composto de Espíritos encarnados; e o espiritual, formado dos
Espíritos desencarnados. Os seres do mundo corporal, devido mesmo à
materialidade do seu envoltório, estão ligados à Terra ou a qualquer globo; o
mundo espiritual ostenta-se por toda parte, em redor de nós como no Espaço, sem
limite algum designado. Em razão mesmo da natureza fluídica do seu envoltório,
os seres que o compõem, em lugar de se arrastarem penosamente sobre o solo,
transpõem as distâncias com a rapidez do pensamento. A morte do corpo não é
mais que a ruptura dos laços que os retinham cativos. Os Espíritos são criados
simples e ignorantes, mas dotados de aptidão para tudo conhecerem e para
progredirem, em virtude do seu livre arbítrio. Pelo progresso adquirem novos
conhecimentos, novas faculdades, novas percepções e, conseguintemente, novos
gozos desconhecidos dos Espíritos inferiores; eles veem, ouvem, sentem e
compreendem o que os Espíritos atrasados não podem ver, sentir, ouvir ou
compreender. A felicidade está na razão direta do progresso realizado, de sorte
que, de dois Espíritos, um pode não ser tão feliz quanto outro, unicamente por
não possuir o mesmo adiantamento intelectual e moral, sem que por isso precisem
estar, cada qual, em lugar distinto. Ainda que juntos, pode um estar em trevas,
enquanto tudo resplandece para o outro, tal como um cego e um vidente que se
dão as mãos: este percebe a luz da qual aquele não recebe a mínima impressão.
Sendo a felicidade dos Espíritos inerente às suas qualidades, haurem-na eles em
toda parte em que se encontram, seja à superfície da Terra, no meio dos
encarnados, ou no Espaço. Uma comparação vulgar fará compreender melhor esta
situação. Se se encontrarem em um concerto dois homens, um, bom músico, de
ouvido educado, e outro, desconhecedor da música, de sentido auditivo pouco
delicado, o primeiro experimentará sensação de felicidade, enquanto o segundo
permanecerá insensível, porque um compreende e percebe o que nenhuma impressão
produz no outro. Assim sucede quanto a todos os gozos dos Espíritos, que estão
na razão da sua sensibilidade. O mundo espiritual tem esplendores por toda
parte, harmonias e sensações que os Espíritos inferiores, submetidos à
influência da matéria, não entreveem sequer, e que somente são acessíveis aos
Espíritos purificados. O progresso nos Espíritos é o fruto do próprio trabalho;
mas, como são livres, trabalham no seu adiantamento com maior ou menor
atividade, com mais ou menos negligência, segundo sua vontade, acelerando ou
retardando o progresso e, por conseguinte, a própria felicidade. Enquanto uns
avançam rapidamente, entorpecem-se outros, quais poltrões nas fileiras
inferiores. São eles, pois, os próprios autores da sua situação, feliz ou
desgraçada, conforme esta frase do Cristo: “A cada um segundo as suas obras”.
(Romanos, 2:6.) Todo Espírito que se atrasa não pode queixar-se senão de si
mesmo, assim como o que se adianta tem o mérito exclusivo do seu esforço, dando
por isso maior apreço à felicidade conquistada. A suprema felicidade só é
compartilhada pelos Espíritos perfeitos, ou, por outra, pelos puros Espíritos,
que não a conseguem senão depois de haverem progredido em inteligência e
moralidade. O progresso intelectual e o progresso moral raramente marcham
juntos, mas o que o Espírito não consegue em dado tempo, alcança em outro, de
modo que os dois progressos acabam por atingir o mesmo nível. Eis por que se
veem muitas vezes homens inteligentes e instruídos pouco adiantados moralmente,
e vice-versa. A encarnação é necessária ao duplo progresso moral e intelectual
do Espírito: ao progresso intelectual pela atividade obrigatória do trabalho;
ao progresso moral pela necessidade recíproca dos homens entre si. A vida
social é a pedra de toque das boas ou más qualidades. A bondade, a maldade, a
doçura, a violência, a benevolência, a caridade, o egoísmo, a avareza, o
orgulho, a humildade, a sinceridade, a franqueza, a lealdade, a má-fé, a
hipocrisia, em uma palavra, tudo o que constitui o homem de bem ou o perverso
tem por móvel, por alvo e por estímulo as relações do homem com os seus
semelhantes. Para o homem que vivesse isolado não haveria vícios nem virtudes;
preservando-se do mal pelo isolamento, o bem de si mesmo se anularia. Uma só
existência corporal é manifestamente insuficiente para o Espírito adquirir todo
o bem que lhe falta e eliminar o mal que lhe sobra. Como poderia o selvagem,
por exemplo, em uma só encarnação nivelar-se moral e intelectualmente ao mais
adiantado europeu? É materialmente impossível. Deve ele, pois, ficar
eternamente na ignorância e barbaria, privado dos gozos que só o
desenvolvimento das faculdades pode proporcionar-lhe? O simples bom senso
repele tal suposição, que seria não somente a negação da justiça e bondade
divinas, mas das próprias leis evolutivas e progressivas da natureza. Mas Deus,
que é soberanamente justo e bom, concede ao Espírito tantas encarnações quantas
as necessárias para atingir seu objetivo — a perfeição. Para cada nova
existência entra o Espírito com o cabedal adquirido nas anteriores em aptidões,
conhecimentos intuitivos, inteligência e moralidade. Cada existência é assim um
passo avante no caminho do progresso. A encarnação é inerente à inferioridade
dos Espíritos, deixando de ser necessária desde que estes, transpondo os
limites, ficam aptos para progredir no estado espiritual, ou nas existências
corporais de mundos superiores, que nada têm da materialidade terrestre. Da
parte destes a encarnação é voluntária, tendo por fim exercer sobre os
encarnados uma ação mais direta e tendente ao cumprimento da missão que lhes
compete junto dos mesmos. Desse modo aceitam abnegadamente as vicissitudes e
sofrimentos da encarnação. No intervalo das existências corporais o Espírito
torna a entrar no mundo espiritual, onde é feliz ou desgraçado segundo o bem ou
o mal que fez. Uma vez que o estado espiritual é o estado definitivo do
Espírito e o corpo espiritual não morre, deve ser esse também o seu estado
normal. O estado corporal é transitório e passageiro. É no estado espiritual
sobretudo que o Espírito colhe os frutos do progresso realizado pelo trabalho
da encarnação; é também nesse estado que se prepara para novas lutas e toma as
resoluções que há de pôr em prática na sua volta à humanidade. O Espírito
progride igualmente na erraticidade, adquirindo conhecimentos especiais que não
poderia obter na Terra, e modificando as suas ideias. O estado corporal e o
espiritual constituem a fonte de dois gêneros de progresso, pelos quais o
Espírito tem de passar alternadamente, nas existências peculiares a cada um dos
dois mundos. A reencarnação pode dar-se na Terra ou em outros mundos. Há entre
os mundos alguns mais adiantados onde a existência se exerce em condições menos
penosas que na Terra física e moralmente, mas onde também só são admitidos
Espíritos chegados a um grau de perfeição relativo ao estado desses mundos. A
vida nos mundos superiores já é uma recompensa, visto nos acharmos isentos, aí,
dos males e vicissitudes terrenos. Os corpos menos materiais, quase fluídicos,
não sujeitos aí às moléstias, às enfermidades, tampouco têm as mesmas
necessidades. Excluídos os Espíritos maus, gozam os homens de plena paz, sem
outra preocupação além da do adiantamento pelo trabalho intelectual. Reina lá a
verdadeira fraternidade, porque não há egoísmo; a verdadeira igualdade, porque
não há orgulho, e a verdadeira liberdade por não haver desordens a reprimir,
nem ambiciosos que procurem oprimir o fraco. Comparados à Terra, esses mundos
são verdadeiros paraísos, quais pousos ao longo do caminho do progresso
conducente ao estado definitivo. Sendo a Terra um mundo inferior destinado à
purificação dos Espíritos imperfeitos, está nisso a razão do mal que aí
predomina, até que praza a Deus fazer dela morada de Espíritos mais adiantados.
Assim é que o Espírito, progredindo gradualmente à medida que se desenvolve,
chega ao apogeu da felicidade; porém, antes de ter atingido a culminância da
perfeição, goza de uma felicidade relativa ao seu progresso. A criança também
frui os prazeres da infância, mais tarde os da mocidade, e finalmente os mais
sólidos, da madureza. A felicidade dos Espíritos bem-aventurados não consiste
na ociosidade contemplativa, que seria, como temos dito muitas vezes, uma
eterna e fastidiosa inutilidade. A vida espiritual em todos os seus graus é, ao
contrário, uma constante atividade, mas atividade isenta de fadigas. A suprema
felicidade consiste no gozo de todos os esplendores da Criação, que nenhuma
linguagem humana jamais poderia descrever, que a imaginação mais fecunda não
poderia conceber. Consiste também na penetração de todas as coisas, na ausência
de sofrimentos físicos e morais, numa satisfação íntima, numa serenidade da alma
imperturbável, no amor que envolve todos os seres, e portanto na ausência de
atrito proveniente do contato com os maus, e, acima de tudo, na contemplação de
Deus e na compreensão dos seus mistérios revelados aos mais dignos. A
felicidade também existe nas tarefas cujo encargo nos faz felizes. Os puros
Espíritos são os messias ou mensageiros de Deus pela transmissão e execução das
suas vontades. Preenchem as grandes missões, presidem à formação dos mundos e à
harmonia geral do universo, tarefa gloriosa a que se não chega senão pela
perfeição. Os da ordem mais elevada são os únicos a possuírem os segredos de
Deus, inspirando-se no seu pensamento, de que são diretos representantes. As
atribuições dos Espíritos são proporcionadas ao seu progresso, às luzes que
possuem, às suas capacidades, experiência e grau de confiança inspirada ao
Senhor soberano. Nem favores, nem privilégios que não sejam o prêmio ao mérito;
tudo é medido e pesado na balança da estrita justiça. As missões mais
importantes são confiadas somente àqueles que Deus julga capazes de as cumprir
e incapazes de desfalecimento ou comprometimento. E enquanto que os mais dignos
compõem o supremo conselho, sob as vistas de Deus, a chefes superiores é
cometida a direção de turbilhões planetários, e a outros conferida a de mundos
especiais. Vêm, depois, pela ordem de adiantamento e subordinação hierárquica,
as atribuições mais restritas dos prepostos ao progresso dos povos, à proteção
das famílias e indivíduos, ao impulso de cada ramo de progresso, às diversas
operações da natureza até os mais ínfimos pormenores da Criação. Neste vasto e
harmônico conjunto há ocupações para todas as capacidades, aptidões e esforços;
ocupações aceitas com júbilo, solicitadas com ardor, por serem um meio de
adiantamento para os Espíritos que ao progresso aspiram. Ao lado das grandes
missões confiadas aos Espíritos superiores, há outras de importância relativa
em todos os graus, concedidas a Espíritos de todas as categorias, podendo
afirmar-se que cada encarnado tem a sua, isto é, deveres a preencher a bem dos
seus semelhantes, desde o chefe de família, a quem incumbe o progresso dos
filhos, até o homem de gênio que lança às sociedades novos germens de
progresso. É nessas missões secundárias que se verificam desfalecimentos, prevaricações
e renúncias que prejudicam o indivíduo sem afetar o todo. Todas as
inteligências concorrem, pois, para a obra geral, qualquer que seja o grau
atingido, e cada uma na medida das suas forças, seja no estado de encarnação ou
no de espírito. Por toda parte a atividade, desde a base ao ápice da escala,
instruindo-se, coadjuvando-se em mútuo apoio, dando-se as mãos para alcançarem
o zênite. Assim se estabelece a solidariedade entre o mundo espiritual e o
corporal, ou, em outros termos, entre os homens e os Espíritos, entre os
Espíritos libertos e os cativos. Assim se perpetuam e consolidam, pela
purificação e continuidade de relações, as verdadeiras simpatias e nobres
afeições. Por toda parte, a vida e o movimento: nenhum canto do infinito
despovoado, nenhuma região que não seja incessantemente percorrida por legiões
inumeráveis de Espíritos radiantes, invisíveis aos sentidos grosseiros dos
encarnados, mas cuja vista deslumbra de alegria e admiração as almas libertas
da matéria. Por toda parte, enfim, há uma felicidade relativa a todos os
progressos, a todos os deveres cumpridos, trazendo cada um consigo os elementos
de sua felicidade, decorrente da categoria em que se coloca pelo seu
adiantamento. Das qualidades do indivíduo depende-lhe a felicidade, e não do
estado material do meio em que se encontra, podendo a felicidade, portanto,
existir em qualquer parte onde haja Espíritos capazes de a gozar. Nenhum lugar
lhe é circunscrito e assinalado no universo. Onde quer que se encontrem, os
Espíritos podem contemplar a majestade divina, porque Deus está em toda parte.
Entretanto, a felicidade não é pessoal: se a possuíssemos somente em nós
mesmos, sem poder reparti-la com outrem, ela seria tristemente egoísta. Também
a encontramos na comunhão de ideias que une os seres simpáticos. Os Espíritos
felizes, atraindo-se pela similitude de ideias, gostos e sentimentos, formam
vastos agrupamentos ou famílias homogêneas, no seio das quais cada
individualidade irradia as qualidades próprias e satura-se dos eflúvios serenos
e benéficos emanados do conjunto. Os membros deste, ora se dispersam para se
darem à sua missão, ora se reúnem em dado ponto do Espaço a fim de se prestarem
contas do trabalho realizado, ora se congregam em torno dum Espírito mais
elevado para receberem instruções e conselhos. Posto que os Espíritos estejam
por toda parte, os mundos são de preferência os seus centros de atração, em
virtude da analogia existente entre eles e os que os habitam. Em torno dos
mundos adiantados abundam Espíritos superiores, como em torno dos atrasados
pululam Espíritos inferiores. Cada globo tem, de alguma sorte, sua população
própria de Espíritos encarnados e desencarnados, alimentada em sua maioria pela
encarnação e desencarnação dos mesmos. Esta população é mais estável nos mundos
inferiores, pelo apego dos Espíritos à matéria, e mais flutuante nos
superiores. Destes últimos, porém, verdadeiros focos de luz e felicidade,
Espíritos se destacam para mundos inferiores a fim de neles semearem os germens
do progresso, levar-lhes consolação e esperança, levantar os ânimos abatidos
pelas provações da vida. Por vezes também se encarnam para cumprir com mais
eficácia a sua missão. Nessa imensidade ilimitada, onde está o Céu? Em toda
parte. Nenhum contorno lhe traça limites. Os mundos adiantados são as últimas
estações do seu caminho, que as virtudes franqueiam e os vícios interditam.
Ante este quadro grandioso que povoa o universo, que dá a todas as coisas da
Criação um fim e uma razão de ser, quanto é pequena e mesquinha a doutrina que
circunscreve a humanidade a um ponto imperceptível do Espaço, que a mostra
começando em dado instante para acabar igualmente com o mundo que a contém, não
abrangendo mais que um minuto na eternidade! Como é triste, fria, glacial essa
doutrina quando nos mostra o resto do universo, durante e depois da humanidade
terrestre, sem vida, nem movimento, qual vastíssimo deserto imerso em profundo
silêncio! Como é desesperadora a perspectiva dos eleitos votados à contemplação
perpétua, enquanto a maioria das criaturas padece tormentos sem-fim! Como
lacera os corações sensíveis a ideia dessa barreira entre mortos e vivos! As
almas ditosas, dizem, só pensam na sua felicidade, como as desgraçadas, nas
suas dores. Admira que o egoísmo reine sobre a Terra quando no mostram no Céu?
Oh! quão mesquinha se nos afigura essa ideia da grandeza, do poder e da bondade
de Deus! Quanto é sublime a ideia que dele fazemos pelo Espiritismo! Quanto a
sua doutrina engrandece as ideias e amplia o pensamento! Mas quem diz que ela é
verdadeira? A razão primeiro, a revelação depois, e, finalmente, a sua
concordância com os progressos da Ciência. Entre duas doutrinas, das quais uma
amesquinha e a outra exalta os atributos de Deus; das quais uma só está em
desacordo e a outra em harmonia com o progresso; das quais uma se deixa ficar
na retaguarda enquanto a outra caminha, o bom senso diz de que lado está a
verdade. Que, confrontando-as, consulte cada qual a consciência, e uma voz
íntima lhe falará por ela. Pois bem, essas aspirações íntimas são a voz de
Deus, que não pode enganar os homens. Dir-se-á, por que Deus não lhes revelou
de princípio toda a verdade? Pela mesma razão por que se não ensina à infância
o que se ensina aos de idade madura. A revelação limitada foi suficiente a
certo período da humanidade, e Deus a proporciona gradativamente ao progresso e
às forças do Espírito. Os que recebem hoje uma revelação mais completa são os
mesmos Espíritos que tiveram dela uma partícula em outros tempos e que de então
por diante se engrandeceram em inteligência. Antes de a Ciência ter revelado
aos homens as forças vivas da natureza, a constituição dos astros, o verdadeiro
papel da Terra e sua formação, poderiam eles compreender a imensidade do Espaço
e a pluralidade dos mundos? Antes de a Geologia comprovar a formação da Terra,
poderiam os homens tirar-lhe o inferno das entranhas e compreender o sentido
alegórico dos seis dias da Criação? Antes de a Astronomia descobrir as leis que
regem o universo, poderiam compreender que não há alto nem baixo no Espaço, que
o Céu não está acima das nuvens nem limitado pelas estrelas? Poderiam
identificar-se com a vida espiritual antes dos progressos da ciência
psicológica? conceber depois da morte uma vida feliz ou desgraçada, a não ser
em lugar circunscrito e sob uma forma material? Não; compreendendo mais pelos
sentidos que pelo pensamento, o universo era muito vasto para a sua concepção;
era preciso restringi-lo ao seu ponto de vista para alargá-lo mais tarde. Uma
revelação parcial tinha sua utilidade, e, embora sábia até então, não
satisfaria hoje. O absurdo provém dos que pretendem poder governar os homens de
pensamento, sem se darem conta do progresso das ideias, quais se fossem
crianças. (Vede O Livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, cap. III.). www.febnet.org.br. Livro O
Céu e o Inferno. Abraço. Davi
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