Hare Krishna. www.voltaaosupremo.com. Texto de Visakha Devi Dasi.
Para garantirmos a saúde de nosso progresso espiritual, temos que transformar a
esperança material em esperança espiritual. ESPERANÇA – O FUNDAMENTO DA VIDA.
Esperança, o reconhecimento dentro do coração humano de que algo melhor é
obtenível, pode significar a diferença entre a vida e a morte. No livro Em Busca de Sentido, o sobrevivente do
holocausto Victor Frankl (1905-1997) escreve que o índice de mortes no campo de
concentração cresceu após o Hanucá, muito embora não tenha acontecido nenhuma
mudança nas condições já horrendas do campo de concentração. Por que mais
pessoas morreram? Porque, todos os anos, eram espalhados rumores de que os
prisioneiros seriam libertos na época do festival sagrado, e, quando não eram,
os prisioneiros perdiam a esperança, seu sistema imunológico enfraquecia e eles
sucumbiam a alguma doença fatal. O que os mantinha vivos era a esperança – e,
quando a esperança partiu, eles morreram. Frankl escreve: “Ai daquele que não
via mais sentido na vida, mais nenhuma meta, nenhum propósito e, portanto,
nenhum motivo para seguir em frente. Ele logo se perdia (…)”. Similarmente, em
seu estudo seminal Sobre a Morte e o Morrer,
Elizabeth Kubler-Ross (1926-2004) escreve: “Se um paciente para de expressar
esperança, tal atitude é, frequentemente, um sinal de morte iminente. Eles
talvez digam: ‘Doutor, acho que é isso’ ou ‘acabou’ ou podem se expressar como
o paciente que sempre acreditou em um milagre e, um dia, nos recebeu no quarto
com as palavras: ‘Acho que morrer é o milagre para o qual estou pronto agora, e
não temo mais’. Todos esses pacientes morreram dentro de vinte e quatro horas”.
Por natureza, destinamo-nos a sermos esperançosos, mas esperançosos em relação
ao quê? Esperanças são de muitos tipos, mas podem ser classificadas, de modo
amplo, em dois tipos: espiritual e material. Esperança Espiritual. Rupa Gosvami
(1493-1564), praticante de bhakti-yoga do
século XV, descreve esse tipo de esperança como asa-bandha (“vínculo de esperança”). O
sujeito pensa: “Como estou dando o meu melhor em seguir os princípios rotineiros
do serviço devocional, eu, de uma maneira ou outra, conseguirei me aproximar do
Senhor e certamente receberei Seu favor. Sem dúvidas, irei de volta ao lar, de
volta ao Supremo”. Na disposição de asa-bandha, o
devoto de Deus pensa: “Não nasci em uma boa família, não fiz boas obras, não
tenho nenhum conhecimento acerca de Deus nem O amo, tampouco tenho atração
pelos processos de ouvir sobre ele, falar sobre ele e me lembrar dEle, o que
desenvolveria esse amor. Apesar de tudo isso, quero me aproximar dEle. E esse
próprio querer me entristece, porque sou completamente desqualificado para tal.
Em termos de justiça, meu caso não tem esperança alguma; tudo o que tenho são
deméritos. Então, busco minha fortuna na misericórdia do Senhor.” Em outras
palavras, com esperança espiritual, o devoto diz ao Senhor: “Vim a Você. Se
existe alguma possibilidade para isso, me salve”. O Srimad-Bhagavatam (5.5.15) declara: “Se
alguém é sério quanto a ir de volta ao lar, de volta ao Supremo, ele tem que
considerar a misericórdia da Suprema Personalidade de Deus como o summum bonum e a principal meta da vida”. Esperança Material. No
nono capítulo da Bhagavad-gita,
Krishna usa a palavra moghasa. Mogha significa “frustrado”, e moghasa se refere a pessoas frustradas em suas esperanças. Mais
adiante, no capítulo dezesseis, o Senhor fala de asa-pasa, ou indivíduos presos a uma rede (pasa significa rede ou qualquer outra armadilha) de centenas de
milhares de esperanças ilusórias e absortos na luxúria e na ira. Esperanças
ligadas a qualquer tipo de ganho material, seja fama, fortuna, poder, sucesso
ou relacionamentos, são forca em torno do pescoço da alma. Nós nos destinamos à
esperança espiritual, mas, desorientados pela vida material, nossas esperanças
agora são materiais, em decorrência do que nos sujeitamos a ondas de
insatisfação. Quem cultiva esperanças no âmbito material, Krishna diz, ficará
ansioso e infeliz, e será assaltado por problemas – em uma palavra, se
frustrará. Para nos libertarmos da cilada da esperança material, é preciso transformarmos
nossa esperança, mudando da matéria para o espírito. Para Transformar a Esperança:
Aceite a Vontade do Senhor. No Srimad-Bhagavatam, Maharaja Dhrtarastra, o
idoso e irresoluto ancião da dinastia Kuru, exemplificou o processo de
abandonar a esperança material. Depois que todos os seus filhos foram mortos na
Batalha de Kurukshetra, Dhrtarastra estava vivendo às custas de seus cinco
sobrinhos, conhecidos como “os Pandavas”, os quais ele tratara de maneira muito
desonrosa por muitos anos. Foi o sábio Vidura, meio-irmão de Dhrtarastra, quem
redirecionou a esperança de Dhrtarastra dos confortos corpóreos para a
aquisição espiritual. Vidura disse: “É a Suprema Personalidade de Deus, como o
tempo eterno [kala], que se aproximou de
todos nós. Quem quer que esteja sob a influência do supremo kala tem que entregar sua queridíssima vida, e o que dizer de
outras coisas, como riquezas, honra, filhos, terras e lar”. (Srimad-Bhagavatam 1.13.19-20). Assim, o
primeiro passo para transformarmos a esperança é vermos que Krishna, na forma
do tempo, levará de nós tudo o que é material. Dentro deste universo, nada nem
ninguém pode deter o curso do tempo. Materialmente, não há chance para nossas
esperanças: Pelo trânsito natural de tudo, velhice e morte chegarão para cada
um de nós. Mediante o conhecimento de nossa identidade eterna como humildes
servos de Deus, nós, pela graça dEle, podemos gradualmente parar de investir
nossa esperança em coisas destinadas a perecer. Desapegue-se. Com conhecimento sólido
de nossa identidade eterna, os desejos materiais terão cada vez menor apelo, em
virtude do que as esperanças materiais, que surgem dos desejos materiais,
enfraquecem. Poderemos sentir nossa inteligência pacificar-se, e nossas
prioridades, rearranjarem-se. O desapego nos liberta da escravidão a coisas que
passamos a ver como banais e da preocupação com o passado e o futuro. Nós
aceitamos a misericórdia de Krishna em qualquer forma que ela assuma. Vidura se
vale de palavra fortes para ajudar Dhrtarastra a se tornar desapegado: “Você é
cego desde o nascimento e, recentemente, tornou-se parcialmente surdo. Sua
memória está encurtada, e sua inteligência, confusa. Seus dentes estão bambos,
seu fígado está doente, e você tosse com muco. Ai! Como são poderosas as
esperanças de um ser vivo por continuar com sua vida (…). Apesar de sua
relutância a morrer e seu desejo de viver até mesmo a custo de sua honra e
prestígio, seu corpo miserável por certo definhará como um traje velho”. (Srimad-Bhagavatam 1.13.22-25). A alma é
eterna, e, portanto, todos têm um ímpeto natural em relação a evitar a morte.
Dhrtarastra não era exceção. Ele queria continuar sua vida com conforto, mas o
corpo, sendo material, não vive indefinidamente. A responsabilidade de
Dhrtarastra, como é a nossa, era usar o corpo, a mente e a inteligência para
avançar no âmbito espiritual. A forma de vida humana é uma chance para a
autorrealização e para voltarmos ao lar, voltarmos ao Supremo, e não para nos
esforçarmos, com uma fala esperança, por ficar interminavelmente no mundo
material. Srila Prabhupada, o fundador do Movimento Hare Krishna, comenta:
“Cinco mil anos atrás, havia um Dhrtarastra, mas, no momento presente, há
Dhrtarastras em todas as casas”. A maioria das pessoas se mantém apegada a
buscas bruxuleantes e vazias e negligencia a oportunidade que o nascimento
humano propicia. Confiança
no Senhor. Depois de aceitar a vontade do Senhor e nos
desapegarmos de nossa situação material (enquanto continuamos cumprindo nosso
dever), o próximo passo para transformarmos a esperança é confiarmos em
Krishna. Se não confiarmos em Krishna, mas, sim, em algo material,
transformando tal coisa em um ancoradouro de esperanças, nós, cedo ou tarde,
nos desapontaremos profundamente. Nada material vale a nossa esperança, pois
nada material pode nos levar além da esfera material, que é para onde ansiamos
ir. Confiar em algo material (incluindo nossa própria inteligência e nossas
próprias capacidades) significa que a dádiva que Krishna nos deu para O
alcançarmos – a esperança espiritual – não está em uso. Se confiarmos em
Krishna, teremos confiança em Seus ensinamentos. Pela graça dEle,
compreenderemos que somos seres espirituais diminutos, completamente
dependentes dEle, e desejaremos servi-lo, bem como servir seus servos, mais do
que queremos qualquer outra coisa. Por meio de suas palavras incisivas, Vidura
evoca essa confiança no coração de Dhrtarastra: “É certamente um sujeito de
primeira classe aquele que desperta e compreende, quer por si mesmo, quer
graças aos outros, a falsidade e miséria deste mundo material e, então, deixa
seu lar e depende por completo da Personalidade de Deus, que reside em seu
próprio coração.” (Srimad-Bhagavatam1.13.27).
Independente, de onde estejamos, não estamos sozinhos. A Suprema Personalidade
de Deus está conosco e pode proteger Seus devotos sinceros independente das
circunstâncias em que estejam. Em qualquer lugar, podemos ouvir e cantar os
santos nomes de Deus, falar sobre Ele e buscar a companhia de Seus devotos. Em
proporção à nossa sinceridade, a esperança espiritual desperta. Fé Fortalecida. Dhrtarastra
partiu para a floresta acompanhado por sua esposa, Gandhari, e por Vidura, que
fortaleciam a fé de Dhrtarastra em Deus. A fé é, nas palavras do biógrafo e
poeta Krishna Dasa Kaviraja, “confiança inabalável em algo sublime”. A Svetasvatara Upanisad (6.23) declara:
“Apenas àquelas grandes almas que têm fé absoluta tanto no Senhor quanto no
mestre espiritual é que todos os significados do conhecimento védico se revelam
automaticamente”. Quem possui fé sabe que, por servir o Senhor, tudo se
completa. Toda alma se destina a prestar algum serviço a Krishna, e a fé nos
permite nos atermos a esse serviço apesar de todos os impedimentos. A fé
inspira esperança espiritual no coração. Vivemos com a expectativa de que,
apesar de nossas incapacidades, podemos voltar ao lar, voltar ao Supremo.
Vivendo com essa esperança, aceitamos as coisas que não podemos mudar, sabendo
que existe uma razão para tudo isso, e que, em última instância, a pessoa que
controla tudo, Krishna, é nosso benquerente e o amigo mais querido. Com essa
esperança produto de reflexão, experimentamos a misericórdia de Krishna em
nossa vida. “Assim, por sua determinação resoluta, Dhrtarastra, firmemente
convencido por conhecimento introspectivo, imediatamente partiu de casa para se
estabelecer no caminho da libertação, como orientado por seu irmão mais novo,
Vidura”. (Srimad-Bhagavatam 1.13.29)
A esperança se transforma de material para espiritual em consequência de nos
darmos à companhia dos sadhus, ou
devotos puros do Senhor. Srila Prabhupada comenta: “Não nos constrange admitir
que esse fato foi experimentado em nossa vida prática pessoal. Se não
tivéssemos sido favorecidos por Sua Divina Graça Srimad Bhaktisiddhanta
Sarasvati Gosvami (…), poderíamos ter nos tornado um grande magnata dos
negócios, mas jamais poderíamos ter trilhado o caminho da libertação e nos
ocupado verdadeiramente a serviço do Senhor.” (Srimad-Bhagavatam 1.13.29, comentário). Na
canção Sri Guru-vandana (“Oração
a Sri Guru”), Srila Narottama Dasa Thakura utiliza a palavra asa duas vezes.
guru-mukha-padma-vakya,
cittete koriya aikya,
ar na koriho mane asa
sri-guru-carane rati,
ei se uttama-gati,
je prasade pure sarva asa
cittete koriya aikya,
ar na koriho mane asa
sri-guru-carane rati,
ei se uttama-gati,
je prasade pure sarva asa
“Minha única esperança é ter minha consciência purificada pelas
palavras que emanam de sua boca de lótus. O apego a seus pés de lótus é a
perfeição que satisfaz todas as minhas esperanças por progresso espiritual”.
Comentando sobre esse verso em variadas ocasiões, Srila Prabhupada disse: “Se
você quer de fato progredir, então você tem que ter fé firme nos pés de lótus
do guru (…)” (Filadélfia, 1975)
“Temos simplesmente que obter instruções do guru, e se as cumprirmos com nosso coração e alma, isso será
sucesso. Isso é prático”. (Los Angeles, 1975) “Se alguém obtém um guia
apropriado e de boa razão, isso é felicidade. De outro modo, não existe
felicidade”. (Vrindavana, 1977). Por ouvirmos o mestre espiritual fidedigno,
como Dhrtarastra ouviu Vidura e como Srila Prabhupada ouviu Srila
Bhaktisiddhanta, aprendemos acerca da posição dignificada da alma, isto é,
nossa própria posição, em consequência do que os encantos mundanos se tornam
fantasmagorias. Nós nos damos conta de que tudo isso são algemas. Presos por
elas, em falsas esperanças, levamos uma vida triste, unidimensional e cheia de
privações, problemas pessoais e desarmonia. Amarrados pelos pulsos e tornozelos
por compulsões, ilusões e idiossincrasias, nunca fazemos o que realmente
queremos fazer, mas somos movidos unicamente pelos ditamos do medo, da inveja e
da raiva. Dhrtarastra, preso nas ciladas de política, luxúria e apegos
familiares, tentou ser bem-sucedido materialmente, mas se frustrou por
completo. Porém, pelas instruções poderosas de Vidura, um elevado devoto de
Krishna que evocou a fé de Dhrtarastra, Dhrtarastra obteve sucesso na
autorrealização. Devotos como Vidura não apenas quebram as algemas da afeição
mundana, mas também nutrem os laços espirituais que nos levam para o Senhor. O Resultado. Por
aceitarmos a vontade do Senhor, tornando-nos materialmente desapegados,
confiando no que Ele faz, usando nosso livre-arbítrio para nos ocuparmos a Seu
serviço. Ampliando nossa fé nEle, estamos semeando e nutrindo as experiências
que trazem a esperança. Pouco a pouco, simplesmente desejaremos aprimorar nosso
serviço ao Senhor. E, embora possamos ser desqualificados de tantas maneiras,
temos a confiança de que, de um modo ou outro, seremos espiritualmente
exitosos. A esperança espiritual nos permite utilizarmos as coisas para seu
propósito verdadeiro, isto é, como meios para nos levarem a Krishna. Vivermos
com esperança espiritual é vivermos no presente, sempre inspirados pelo futuro.
É vivermos com o sentimento de que, por nos rendermos a Krishna, teremos tudo
que sempre quisemos. Quando nossa esperança está em Krishna, estamos livres das
desorientações que surgem de uma esperança centrada em luxúria e cobiça, e nos
vinculamos à Pessoa Suprema, aquele que pode nos levar para um reino além de
tudo que poderíamos imaginar ou esperar. Dhrtarastra ocupou-se em yoga, controlou sua mente e seus sentidos, e libertou-se dos
pensamentos atinentes a afeições familiares mundanas. Ele “voltou seus sentidos
em direção à Absoluta Personalidade de Deus e, assim, ficou imune às
contaminações dos modos da natureza material, a saber, bondade mundana, paixão
e ignorância”. (Srimad-Bhagavatam 1.13.54).
Fixando nossa mente no Senhor, nossas esperanças mundanas certamente abrandam.
Conforme as palavras do mestre espiritual comecem a nos tocar de forma pessoal
e íntima, trazendo convencimento, a distância entre Krishna e nós se encurta
gradualmente. A esperança espiritual nos prepara para experimentarmos coisas
divinas. Por seus mistérios, possuímos a promessa de amor de Krishna,
independente do que possa acontecer. Essa esperança é a diferença entre vida
espiritual e morte espiritual. www.voltaaosupemo.com.
Abraço. Davi
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