segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

YogaSutra de Patanjali. Resumo dos Capítulos.

O primeiro capítulo dos Sutras de Patanjali, em cujo início aparecem as duas frases já citadas, chama-se Capítulo Samadhi. O Samadhi é uma condição superior da consciência, que fica a meio caminho entre a vigília e a inconsciência, na qual o praticante de Yoga precisa se colocar para poder realizar a meditação. Esse primeiro capítulo descreve o que é o Yoga, detalhando logo no seu início o que são as Vrttis, projeções de Citta no mundo manifestado, e esclarecendo que o recolhimento  dessas Vrttis é possível através de uma prática que depende de duas condições indispensáveis: disciplina e desapego. Depois disso, trata da descoberta do saber que se revela como um conhecimento intenso e verdadeiro Samprajnata, que pode surgir de diversas maneiras, mas que é um indicativo do caminho para a natureza espiritual Purusa. Essa natureza espiritual se apresenta para o indivíduo como Içvara, o Senhor, um referencial seguro da direção que se deve seguir. Orientado pela entrega a esse referencial de Içvara e pelo surgimento do saber manifesto em nossa vocação, e dedicado a manter o desapego e a disciplina como normas básicas de seu comportamento. O praticante de Yoga se torna capaz de assentar sua mente num patamar superior de estabilidade, que é o Samadhi. Para alcançar o Samadhi o autor diz que podemos fazer uma aproximação gradual, por um caminho em que são construídas mentalmente as condições adequadas para o assentamento da mente no Samadhi, que então é chamado Com Semente. Mas há também o Samadhi Sem Semente, que se obtém de forma imediata quando o praticante aprende a identificar aquelas condições ideais e a reproduzi-las sem a necessidade de um esforço mental consciente. Concluído o primeiro capítulo com a descrição do Samadhi, que é o estágio final preparatório para a meditação, Patanjali descreve o elaborado caminho que leva, de uma maneira gradual e segura, até essa condição do Samadhi. É um caminho ético, demonstrativo da vivência dos princípios enumerados pelo Yoga, razão pela qual o capítulo segundo é chamado de Sadhana (implementação ou demonstração). Tudo o que é descrito nesse capítulo é uma versão prática do que foi examinado conceitualmente no primeiro capítulo. O objetivo é indicar para o praticante o que deve ele fazer para avançar a direção do Samadhi. O conjunto das práticas envolvidas nesse caminho para o Samadhi é chamado de Kriya Yoga (a realização do Yoga). A primeira frase desse capítulo (Sutra II, 1) descreve o Kriya Yoga como a combinação de sacrifício, Tapas, busca do saber interior, Svadhyaya, e entrega ao Senhor Interno, Içvarapranidhana. Longe do sentido negativo que tinge a palavra sacrifício entre os ocidentais, Tapas, é o conjunto de práticas que reorientam a atenção do praticante de Yoga para uma vida pautada pelo desapego e pela disciplina. A busca do saber interior se revela pelo surgimento do conhecimento intuitivo, Samprajnata. E a entrega ao Senhor Interno é a busca pela inspiração do Eu espiritual, junto ao qual repousa a semente de toda a Sabedoria. A segunda frase (Sutra II,2) afirma que a finalidade do Kriya yoga é a de produzir o Samadhi e atenuar as perturbações, Kleças, que dificultam nosso acesso à natureza de Citta. E a terceira frase (Sutra II,3) enumera essas perturbações; falta de sabedoria, egoidade, Asmita, desejo, aversão e apego à vida. Daí para frente o capítulo do Sadhana trata dos vínculos que unem o observador ao objeto observado, e da necessidade de se substituir uma relação impura com os objetos por uma relação imaculada, na qual o praticante procura identificar, Atman, nos objetos sobre os quais ele realiza a meditação. Essa substituição é feita através da prática dos oito componentes do Yoga: Yama, normas de convivências; Niyama, normas de aperfeiçoamento pessoal; Asana, posturas de assentamento; Pranayama, controle e direcionamento da vitalidade; Pratyahara, recolhimento da atenção; Dharana, concentração da atenção em um objeto determinado; Dhyanam, permanência no estado de concentração; e Samadhi, absorção e elevação da consciência dentro do próprio processo de cognição. Desses componentes do Yoga, o segundo capítulo explica resumidamente apenas os cinco primeiros. O terceiro capítulo trata da prática da meditação, Samyana, e dos resultados, Vibhuti, espontâneos dessa prática. Por essa razão é chamado de capítulo dos Resultados. A meditação é apresentada como a combinação dos três componentes mais internos do Yoga: Dharana, Dhyanam e Samadhi. A persistência na prática da meditação realizada sobre variados objetos produz os diversos resultados psíquicos enumerados nesse terceiro capítulo. Cada um desses resultados é chamado de Siddhi, ou seja, aquilo que está completo, e representa uma força ou habilidade psíquica que fica disponível para o Yogue. São tomados por indicadores de progresso pelos mestres da prática do Yoga, que de maneira alguma se empolgam com esse tipo de resultado. O apego aos Siddhis é tão pernicioso para o desenvolvimento espiritual, senão mais, quanto o apego aos prazeres inferiores (luxúria, lascívia e concupiscência). Todas essas forças psíquicas gravita da natureza material para a natureza sutil, pois ela passa por essa zona etérea intermediária entre o universo visível e o invisível. Esse espaço entre as duas naturezas conflitantes e opostas é o campo em que se manifestam as forças psíquicas. É também o campo explorado pelos praticantes da magia (negra) terrestre e mundana. Para o autêntico Yogue essa passagem por esse campo psíquico tem valor apenas como uma transição de sua essência espiritual manifestada, Sattva, desde o eixo da consciência para o eixo espiritual inconsciente, e orientado para Purusha, o Espírito Puro. Na última frase desse terceiro capítulo (Sutra III, 56) se diz que da coincidência da pureza de Sattva e de Purusha surge o Kaivalyam, este sim, a meta final do Yoga. O Kaivalyam é a destruição de todo o apego à diferenciação, e a vivencia da integração total do indivíduo com tudo o que existe, como se fossem uma mesma e única existência absoluta. Os Bhaktins, devotos Vishnuitas, dizem que essa é a condição natural de Vishnu ou de Krishna. Por indicar um estado mental que não reconhece a existência de qualquer objeto diferenciado do próprio observador, e como o próprio texto informa que apesar de tudo os objetos continuam existindo diferenciados para os demais, alguns tradutores optaram por chamar esse estado de isolamento. Talvez o nome Integração fosse mais adequado, pois define esse resultado com mais profundidade. Integração é, de fato, a palavra chave para quem deseja compreender o verdadeiro sentido da prática do Yoga. O quarto capítulo dos Sutras do Yoga é exatamente o capítulo do Kaivalyam. É também o mais curto dos quatro, com apenas 34 aforismos. É o mais abstrato também. Sua leitura exige uma compreensão adequada do que foi tratado nos três capítulos que o antecederam. Ele explica que é possível a existência da mente espiritual, Citta, sem a necessidade de limites definidos entre o observador e os objetos observados. A diferença é apenas que, nessa situação, Citta está desprovido do sentimento de egoidade, Asmita, no seu sentido inferior, que o distingue do resto do mundo. O praticante já não identifica a separação entre ele mesmo e os objetos do mundo material. Patanjali também explica que as transformações, Parinama, que ocorrem na natureza manifestada afetam os desejos, os pensamentos, a percepção, e a própria noção de tempo, mas não afetam Citta, quando está em sua condição natural. Estabilizado em sua própria natureza, na condição chamada de Dharmamegha Samadhi, ou Samadhi da nuvem do Dharma. Citta identifica-se com Purusha e desinteressa-se por todas as forças que não tenham relação com Purusha. Tudo o que se relaciona com as qualidades, Gunas, da matéria e suas transformações, Parinama, deixa de produzir qualquer impressão sobre Citta. O tempo e as mudanças já não afetam o Yogue que se conectou com o Eterno, e alcançou o Kaivalyam. Não há mais ações nem sofrimento. Não há mais vinculação ao ciclo interminável dos renascimentos. Isolado de toda a turbulência ilusória do mundo manifestado, o Iluminado Yogue se torna a mais pura fonte de sabedoria, enquanto repousa serenamente no seio do absoluto. O Yogue pode alcançar o Kaivayam e permanecer vivo em seu corpo por muitos anos ainda. Não há qualquer incompatibilidade entre a vida corporal e a espiritual, desde que o corpo esteja sendo receptivo à interferência das forças espirituais. O Samadhi com semente é alcançado pela via intelectual, e vai sendo construído de forma gradual e vegetativa, como uma armadilha na qual, ao final, é aprisionado o próprio intelecto. Ficando a mente livre para entregar-se a uma meditação espiritual. Abraço. Davi.

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