terça-feira, 18 de novembro de 2014

Palestra do rabino Laibl Wolf. Parte II.

Continuamos a palestra do rabino Laibl Wolf. O Alter Rebe (Menachen Mendel Schneerson 1902-1994) ensinava: "É preciso que a mente esteja sob o domínio do coração em equilíbrio". E qual é o equilíbrio? Primeiro vem a direção, a mente, Moach, e depois os sentimentos. Não confundam! Não estou falando em reprimir sentimentos. Estou falando em reaprender a permitir que nosso coração flua de forma sábia. A emoção é a forma como a alma flui através do coração. Já a mente é a forma como essa mesma alma flui pela fisiologia cerebral. Será que o indivíduo consegue treinar novamente a forma como a alma flui através da mente? Será que consegue fazer o mesmo com a maneira pela qual a alma flui pelo coração? Em outras palavras, será possível reaprender a interpretar a realidade de forma diferente? Sim, é possível!. Vamos entender como funciona nosso esquema espiritual: quem somos e onde vivemos espiritualmente. A Cabala ensina que existem quatro mundos espirituais paralelos. Todos emanaram do Ein Sof, a Fonte Infinita, D us. O mundo mais distante desta Fonte, o mais baixo, chamado Assiyá, é o único no qual os seres humanos vivem. Neste mundo há tempo, espaço e consciência. No mundo um nível acima do nosso, chamado de Yetsirá, não há tempo nem espaço. O nível acima deste se chama Beryia. O mais elevado de todos é o Atsilut. Vamos complicar um pouco mais. Nossa alma, a Neshamá, é como um cordão umbilical espiritual que transcende os quatro mundos ou planos espirituais. Uma de suas extremidades é conectada à Fonte Divina, a outra ao interior de seu ser espiritual e físico. Segundo a Cabala, o homem é composto das mesmas "forças fundamentais", da mesma "matéria prima" através das quais D us deu forma e conteúdo a toda a Sua Criação: as dez Sefirot. Estas se originam no Infinito do Ein Sof e emanam através dos mundos, criando uma "corrente espiritual" que liga todas as coisas. É através das Sefirot que a Energia Divina flui, permeia e se torna parte de cada ser vivente. No homem, a Neshamá, a alma, é o conduíte para o fluxo das 10 Sefirot. Estas se individualizam em cada ser como dez qualidades da personalidade, os fluxos de nossa mente e emoção. Estes dez fluxos podem ser divididos em dois grupos. As três primeiras Sefirot: Chochmá, Biná e Da At, representam os processos internos mentais. O segundo grupo, compostos das outras sete Sefirot, formam o coração e as emoções humanas. Esses fluxos de energias emocionais são Chessed, Guevurá, Tiferet, Netzach, Hod, Yessod e Malchut. É atributo da mente o direcionamento, enquanto que o sentimento não tem direção. A maneira como cada um de nós canaliza os fluxos de energia da mente e da emoção depende de nosso nível de sabedoria.  Analisemos alguns destes fluxos para ter uma ideia de como funciona nosso esquema espiritual. Chochmá, por exemplo, a primeira Sefirá da mente, representa o fluxo espiritual responsável pela inspiração e criatividade. Pensem neste fluxo de energia como a forma como o ser humano vai pescar nos lagos do seu subconsciente. Cada um de nós tem seu próprio anzol, sua própria isca e sua própria vara de pescar. Todos procuramos pescar na parte do lago em que nos sentimos seguros. O resultado é que todos pescamos da mesma maneira, na mesma área e pegamos o mesmo peixe. Por isso pensamos sempre da mesma maneira e respondemos da mesma forma aos mesmos estímulos. Um escritor contemporâneo me disse que, todo dia, temos pelo meno 100 mil pensamentos. O triste é que 95 mil são iguais, todos os dias. E, se persistirmos em interpretar a realidade da mesma forma negativa, carregada de dor e medo, então nosso cérebro persistirá em destilar sua carga excessiva de estresse. Cientistas constataram que a memória que o corpo tem do medo é a emoção mais profundamente gravada nos bancos da memória cerebral. O que faz Biná, a segunda Sefirá da mente? É através desta que podemos mudar o padrão de pensamento, porque é o fluxo de energia que gera o entendimento e a compreensão, o raciocínio dedutivo. Este fluxo busca o insight de Chochmá, trazendo do inconsciente  para o consciente; alimenta a centelha do pensamento consciente; torna-o tangível e lhe dá direção. A função da Sefirá de Biná é pegar a centelha criativa da reinterpretação (Chochmá) e redirecioná-la segundo a nova maneira de pensar. Ai vem Da At, que literalmente significa cognição, saber. É a lógica aplicada, a cristalização da consciência em termos de conclusão. Da At assegura a continuidade do pensamento, pois cria uma ponte entre as atividades cerebrais Chochmá e Biná. Os processos mentais só tomam forma quando são externalizados pelas Sefirot da emoção. E Da At é responsável pela conexão entre a mente e as emoções. As Sefirot das emoções humanas são divididas em dois grupos. No primeiro, temos Chessed, Guevurá e Tiferet. Vejamos as duas primeiras. Chessed é o fluxo de energia do amor. É esta Sefirá que nos abre para o mundo, para compartilhar, contribuir. É a generosidade, a extroversão, o altruísmo, o dar incondicional. Quando estendemos nossa mão para o outro é o fluxo de Chessed que se manifesta. O fluxo oposto é a Sefirá de Guevurá, que representa poder, força. É a auto contenção, o recuo das forças para dentro de si. É no fluxo de energia de Guevurá que o ser humano encontra a força e a habilidade de superar sua natureza, suas contradições e conflitos. Nenhum destes dois sentimentos internos são positivos ou negativos; são simplesmente emoções humanas e atitudes que para terem efeitos positivos devem ser guiadas pelas Sefirot da mente. O ideal é que estejam em equilíbrio. Mas como atingir o equilíbrio entre Chessed e Guevurà? Vejam um exercícios que costumo usar para treinar esta busca do equilíbrio. Peço aos alunos dos meus cursos que não digam nada a ninguém, nos dez dias seguintes, antes de deixar passar três segundos. É muito difícil conseguir isso. No segundo dia, peço que reduzam de três para dois segundos. No terceiro dia, para um segundo. No quarto, para meio segundo. No quinto. que façam apenas uma pequena pausa, sem passar nem um segundo. Os participantes costumam dizer que este simples exercício opera uma das maiores transformações de suas vidas. As palavras são mecanismos de relacionamentos, que sempre mudam. Antes de abrir a boca e falar, durante os três segundos, o indivíduo consegue atingir um equilíbrio entre mente e emoção. O resultado final é que se termina falando de uma forma diferente do que de outro modo. É importante lembrar o que foi dito anteriormente: todo ser humano é composto pelas dez Sefirot. Quando em equilíbrio, estes dez canais de energia unem-se como um canal único. Cada pessoa tem a sua Neshamá, seu fluxo individual da alma. Duas pessoas no mundo não tem igual fluxo, nem mesmo dois animais o têm. D us criou um mundo de individualidade e diferenças. Cada ser humano é diferente do outro e é maravilhoso ser diferente. E o motivo pelo qual cada um de nós é diferente, único, é que cada um de nós é uma dádiva para o mundo. Cada um de nós tem algo que mais ninguém pode oferecer. Esta é a base da auto estima e é isto que devemos ensinar a nossos filhos. Devemos ajudar cada criança a descobrir o que ela tem de especial, seus dons. E quando ela os descobre, o resultado em termos de auto estima consegue transformar sua vida, de todas as formas. Quando a criança não aprecia o que tem de especial, não tem motivação para ter sucesso. E mesmo que o tenha, não tem o equilíbrio. Atingimos a maturidade por volta dos 12 - 13 anos, na época do Bar ou Bat Mitsvá, isto é, quando os processos espirituais causam mudanças no corpo e na mente. O jovem passa a ser menos egoísta, a sentir compaixão e sensibilidade. O porque é simples: é nossa Alma Divina que começa a ser projetada para fora. Há quem não perceba isto de forma consciente e acaba ficando imaturo, egoísta. Por exemplo, na psicologia afirmamos que a imaturidade numa criança se revela quando ela toma os brinquedos do amiguinho. Crianças fazem isso, adultos não deveriam fazer. Mas, acontece que algumas crianças nunca crescem se tornam adultos que continuam a pegar os "brinquedos" do outro. Às vezes, o dinheiro dos outros; em outras, a esposa do outro. Essas pessoas não cresceram, suas Almas Divinas não conseguiram projetar-se para fora. Falemos, agora, sobre o segredo da felicidade e da satisfação. Olhem para si mesmos. Será que não há algo estranho sobre nós? por que tudo vem em dobro? Temos dois olhos, duas mãos, duas narinas, dois hemisférios cerebrais. Também olhamos para a realidade de forma dualista; superior versus inferior, direita versus esquerda, positivo versus negativo. Nossa consciência é dualista. Indo mais além com esse raciocínio, qual a forma mais poderosa de fazer com que dois se tornem um? É o amor entre um homem e uma mulher. Quando criamos uma ponte entre as diferenças, conseguimos nos unir e dois tornam-se um. Ou seja, vivenciamos a experiência da unidade por algum tempo para depois nos separarmos de novo, porque neste mundo de tempo e espaço não conseguimos manter esta unidade o tempo todo. Aprendemos sobre a transformação de dois em um na primeira parte da Toráh. A primeira letra da Toráh é o Beit, de Bereshit. Cada letra hebraica tem um valor numérico. Alef vale um; Beit, dois; Guimel, três. E a Toráh começa com a letra Beit, que tem o valor numérico dois. Por que dois? Para nos ensinar que nossa concepção da realidade é dualista. O propósito da vida é transformar o Beit em um Alef, ou seja, criar unidade. Esta dualidade está presente também no nível espiritual. Quando a alma flui de lá de cima, de sua Fonte Espiritual, atravessa os vários mundos e chega ao nível de Assiya. Em nosso mundo físico, divide-se e forma duas almas, dois tipos de consciência, fonte do desafio e do conflito interior: Nefesh Behamit (alma animal) e Nefesh Elokit (Alma Divina). O que significa isso? Nefesh Behamit, o lado "animal" da alma, é responsável pelo instinto de auto preservação; é o meu ego, no sentido comum, o egocentrismo. No Nefesh Elokit, o lado "Divino" nos conecta a aspirações mais elevadas; é o nível de consciência que está projetado para o outro. A primeira busca pela sobrevivência física, sustento e auto importância. A segunda é a compreensão de que há outras coisas na vida. Todos os nossos pensamentos são egocêntricos ou altruístas e os interesses competitivos destas duas tendências afloram face a um desafio ou a uma adversidade. O auto controle judaico nos ensina a treinar o fluxo que vai da mente ao coração, de tal maneira que este se orienta em direção à Alma Divina e não à Alma Animal. O homem possui o livre arbítrio, a opção, a escolha do caminho que quer traçar. É este dom de escolha que dá sentido à vida. Como seria o ser humano se não tivesse opção? Ele seria reduzido a um robô, autômato. O indivíduo apenas  responderia, de forma instintiva, ao destino. O livre arbítrio nos dá sentido na vida. É assim que saímos da alma animal, e adentramos a positividade, a Alma Divina. Sob essa perspectiva, gostaria de dar-lhes alguns conselhos: exercitem o livre arbítrio de forma sábia; equilibrem a mente; aprendam a treinar de outra maneira a forma como a mente reinterpreta a realidade; todos têm a capacidade de desfazer aquilo que foi criado pela força do hábito. Sigam algum método e acreditem que é possível. Para concluir a palestra, gostaria de ressaltar que a raiva é sempre uma resposta egocêntrica; raiva é desequilíbrio; raiva é uma tentativa de dominar o outro de forma a aliviar seu próprio medo e sua insegurança; raiva é uma tentativa de tornar o outro mais submisso, pois assim o "eu" sente-se mais seguro. Nada justifica a raiva. E isto não significa que não se possa ter emoções fortes. Se você percebe que alguém está ferindo um terceiro, você precisa soltar sua emoção para que a pessoa cresça e você possa ajudá-la. Mas isso não é raiva. Quem já estudou artes marciais, aprende logo nas primeiras lições: "Não fique com raiva, senão você perde". A composição da palestra foi de Claudia Altschuller Felberg. Abraço. Davi.

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