Bhagavad Gita. A
Mensagem do Mestre. AUM (1) Capítulo Um. O DESÂNIMO DE ARJUNA. Neste capítulo
se descreve o combate entre o BEM e o MAL, que provém do complemento da
UNIDADE, tanto no Homem como na Natureza. O Homem, representado por Arjuna,
acha-se rodeado de Ilusões que pertencem à sua natureza inferior, mortal, e
deve vencê-las; porém, como se acostumou a identificar-se com elas, falta-lhe o
necessário ânimo
1. Disse
Dhritarashtra (2), rei dos Kurus, falando com o fiel Sanjaya: Conta-me, ó
Sanjaya, os feitos dos meus guerreiros e os do exército dos Pandavas, quando se
reuniram para se combaterem no sagrado campo dos Kurus.
(1) Em nome de
Deus! Palavra Sagrada entre os hindus, alusiva à Trindade Divina -Vishnu, Shiva
e Brahma. Sendo KRISHNA considerado a oitava encarnação de Vishnu. (2)
Representante da Vida material - forças cegas.
2. Pôs-se a relatar
Sanjaya: Quando o teu filho Duryodhana (1), o comandante supremo dos teus
exércitos, ó rei, avistou as falanges dos Pandavas (2), preparadas para o
combate, se aproximou do seu Drona, o filho de Bharadvaja, e disse:
(1) Dificilmente
vencível; obstinação. (2) Os Kurus representam as forças inferiores da alma
humana - nossos defeitos; os Pandavas (ou filhos de Panda), as forças
superiores - nossas virtudes.
3. Vê, ó Mestre, as
poderosas multidões dos filhos de Pandu, que constam de vastas fileiras de
guerreiros experientes e audaciosos, comandadas pelo valente e sábio filho de
Drupada, teu discípulo
4. Vê como é grande
o número daqueles combatentes fortes que ali estão em seus carros de guerra e
com seus arcos e flechas. Há, entre eles, heróis iguais a Bhima (3) e Arjuna
(4).
(3) Bhima -
terrível, é a vontade espiritual. (4) Arjuna é o homem em seu desenvolvimento.
5.Lá estão: Virata,
Yuyudhana, Drupada, Dhristaketu, Chekitana, o rei dos Kasis, Purujit,
Kuntiboja, Saivya.
6. Ali estão: o
audaz Yudhamanyo, o forte uttamauja, o filho de Subhadra e todos os filhos de
Drupada (1).
(1) Os heróis mencionados
aqui e nos seguintes versículos representam forças intelectuais, inclinações,
faculdades, paixões, artes e ciência. Os "carros" são os corpos pelos
quais essas forças se manifestam no homem. As forças inferiores são servidoras
do egoísmo e do instinto cego, ao passo que as superiores agem em harmonia com
a Vontade Divina.
7. Porém,
igualmente do nosso lado, sob o meu comando, encontras os melhores generais e
heróis do nosso povo.
8. Aqui estás tu
mesmo, e conosco se Vê Bhishma, Karna, Kripa, Asvatthaman, Vikarna, Somadatti.
9. Todos estes e
muitos outros guerreiros fortes, valentes e experimentados, trazendo as suas
armas favoritas, prontos estão para combater por nossa causa e, com entusiasmo,
arriscarão a vida por mim.
10. Porém, ó
Mestre, hei de confessar-te que este nosso exército, se bem que muito valente e
comandado por Brishma (2), na minha opinião não tem o número e a força
suficientes, enquanto em nossa frente está o inimigo, comandado por Bhima, em
posição ameaçadora, e muito mais forte.
(2) Bhishma -
terror, é o egoísmo. O exército dos Kurus, isto é, as forças inferiores (nossos
defeitos), têm por chefes o Egoismo e a obstinação; o exército pandava (nossas
virtudes), é as forças espirituais superiores, obedecem à vontade Divina.
11. Ordena, pois,
aos capitães do meu exército que todos ocupem os seus lugares e que se preparem
para auxiliar e defender o nosso comandante Bhishma.
12. Soprou então
Bhishma, o velho chefe dos kurus, em sua grande corneta e o seu toqu soou como
o rugido do leão, excitando a coragem e o ânimo de seus guerreiros.
13. E, em resposta,
imediatamente se ouviu o som tumultuoso de inumeráveis outras cornetas e
conchas, címbalos, tambores e trombetas, nas falanges dos Kurus.
14. Igualmente
deram sinal bélico KRISHNA, a encarnação de Deus, e Arjuna, filho de Pandu, que
estavam em seu magnífico carro de guerra, ornado com ouro e pedras preciosas, e
puxado por cavalos brancos (1). E responderam os instrumentos dos Pandavas em som
repetido e desafiador, como o som de trovão violento. (1) Branco é o símbolo da
pureza; cavalo, o símbolo da força e da obediência.
15. A corneta que
tocava KRISHNA, o dominador dos sentidos, fora feita de osso de gigante. O nome
da corneta de Arjuna era Devadatta (dom de Deus).
16. O forte Bhima
tocava a corneta com o nome de Paundra (o Povo). Yudishtira, filho de Kunti, a
"Vitória"; Nakula e Sahadeva tocavam a "Harmonia" e a
"Glória".
17. Ouvia-se o
toque dos famosos guerreiros Kasya, Sikhandin, Dharishtadymna, Virata,
Sattyaki;
18. E de Drupada e
seu povo, e dos filhos valentes de Subhadra.
19. E vibrou o ar,
como quando se prepara uma horrível tempestade, e a superfície da Terra vibrou
no mesmo ritmo. E o povo de Dhritarashtra estremeceu aterrorizado.
20. Então Arjuna,
em cuja cimeira figurava um macaco (1), vendo que os Kurus estavam já em ordem
de batalha, e que as flechas começavam a voar pelos ares, tomou na mão o seu
arco e disse a KRISHNA, que estava com ele no carro:
(1) Tomado como símbolo
da audácia e engenho.
21. Faze parar, Ó
Imutável, o nosso carro no meio do espaço entre estes dois exércitos opostos.
22. Quero ver de
perto os que aqui estão reunidos com o desejo de nos matarem, e com os quais
devo travar sangrento combate.
23. Deixa-me ver os
meus inimigos, os partidários insensatos do malicioso e vingativo filho de
Dhitarashtra.
24. Quando Arjuna
assim falou, KRISHNA fez parar o carro no meio do espaço entre os dois
exércitos contrários (2).
(2) Antaskarana, a
"ponte" ou o "caminho" entre a terrena e a divina parte da
mente.
25. Ali, em frente
de Bhishma, Dronn e dos outros principais da Terra, disse KRISHNA a Arjuna: Vê,
ó filho de Prithi, a família dos Kurus ali reunida!
26. E viu Arjuna
que, divididos em dois partidos bélicos, ali estavam seus parentes: pais e
filhos, irmãos, cunhados, avós e netos, tios e sobrinhos, sogros e genros.
27. Notou também
que mestres, benfeitores, amigos e camaradas ali estavam, preparados para se
combaterem reciprocamente (1).
(1) Também as
forças "inimigas" são nossos amigos e mestres, pois por meio delas é
que alcançamos a experiência: elas são os degraus pelos quais o homem sobe até
ao conhecimento perfeito de si mesmo.
28. E quando Arjuna
viu isso, entristeceu-se no seu nobre coração e, cheio de aflição e dó,
proferiu estas palavras:
29. Oh Senhor,
vendo eu as fases e os vultos dos parentes que querem lutar uns contra os
outros, sinto exaustos de forças os meus membros e sem sangue o meu coração.
30. As minhas
pernas tremem, os meus braços não me obedecem; a minha face está em agonia; a
febre queima-me a pele; os pensamentos se confundem no meu cérebro; todo o meu
corpo está em convulsões de horror; o arco cai das minhas mãos.
31. Maus sinais
vejo nos ares, e estranhas vozes ouço falar ao redor de mim; estou todo confuso
e indeciso. Não vejo nada de bom em matar em guerra os meus parentes e meus
companheiros.
32. Não desejo a
glória de vencedor, ó KRISHNA! Não aspiro nem ao reino nem aos prazeres, nem ao
domínio; para que me serve o domínio, a riqueza ou a vida mesma?
33. Todas estas
coisas me parecem muito vãs e sem agrado, enquanto que aqueles para quem tudo
isso seria desejável desprezam a própria vida!
34. Tutores, pais e
filhos, avós e netos, tios e sobrinhos, primos, cunhados, mestres e
companheiros vejo perante mim: não quero matá-los, embora eles tenham sede do
meu sangue.
35. Não quero
matá-los, embora com isso obtivesse o reino dos três mundos, quanto mais pelo
governo de um pedaço de Terra!
36. Se eu matar os
meus consanguíneos, os filhos de Dhritarashtra, que felicidade ou gozo poderia
me alegrar? Se nós os derrotarmos, o remorso seria o nosso companheiro
contínuo.
37. Penso que
devemos abster-nos de matarmos os nossos parentes e consanguíneos: porque, como
poderemos ser felizes, se exterminamos a nossa própria raça?
38. Não podemos
desculpar-nos dizendo que eles são tão depravados e sedentos de sangue, que não
vêm mal algum em derramarem o sangue de seus parentes e amigos.
39. Tal argumento
não nos justifica, porque nós sabemos melhor que a matança dos parentes é
grande pecado e horror.
40. Tem nos sido
ensinado que, com o extermínio de uma geração, se destrói a virtude, e com a
destruição da virtude e da religião de um povo, apoderam-se de toda a raça, o
vício e a impiedade.
41. Onde reina a
impiedade, corrompem-se também as mulheres nobres, e onde a mulher está
corrompida, desparece a pureza do sangue.
42. A adulteração
do sangue é precursora do esquecimento dos ritos devidos aos antepassados, e
estes (se as doutrinas do povo são verdadeiras) (1), sendo privados dos
sacrifícios de que se sustentam, caem das alturas celestes.
(1) A tradição, que
prescrevia o respeito à família, aos parentes, aos instrutores, aos ritos, à
instituição e a deveres das castas, sem o que a alma cairia em condições
piores, antes e depois da morte.
43. A consequência
de tal corrupção é o aniquilamento dos destruidores da raça e dos direitos
eternos da família.
44. Os homens que
destroem a religião da família vão para o inferno. Assim nos ensinam os nossos
livros sagrados.
45. Ai de mim! Ai
de nós, que estamos preparando para cometer o horrível crime de matar os
próprios parentes e consanguíneos pela bagatela de obter o domínio pelo desejo
do poder!
46. Eu preferiria
entregar o meu peito descoberto às armas dos Kurus, e deixá-los beber o sangue
do meu coração. Eu preferiria esperar a sua chegada, desarmado, e receber deles
o golpe mortal, sem me defender. De certo, isto seria melhor para mim do que
cometer esse horrível crime! Ai de mim! Ai de nós todos!
47. Assim clamando,
sentou-se Arjuna no banco do carro e deixou cair o arco e as flechas da sua
mão, todo entregue à aflição e ao desespero que lhe consumiam o coração. Livro
Bhagavad Gita - A Mensagem do Mestre. Abraço. Davi
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