Islamismo.
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Por: Ahmed Ismail. DO LIVRE ARBÍTRIO E DA PREDESTINAÇÃO A LUZ DO ALCORÃO. Uma
das questões que desde os primeiros tempos originou diferentes abordagens e
opiniões entre os juristas, foi a da determinação do que exatamente o Alcorão,
A Palavra Divina, comunicava com referência à predestinação. Com o advento do
período em que o exercício do Ijtihad se expandiu, tendências de pensamento
conflitantes entre si passaram a defender pareceres opostos: racionalistas
propunham que o livre-arbítrio seria inquestionável, enquanto seus opositores
ditavam que o Qadar (determinação divina) continha em si todo o mecanismo da predestinação.
No âmbito xiita, as tradições dos Ahlul Bait (A.S.) definiam toda a questão de
maneira que pudesse ser compreendida sem dar margem a especulações filosóficas,
posição esta que pode ser resumida com o dizer do Imam Jafar Assadeq: “Nem
determinismo nem livre arbítrio (irrestrito), a verdade da questão está entre
ambos”. O que denota a existência de um sutil equilíbrio no qual se manifesta o
Qadar divino. Um outro aspecto peculiar do pensamento dos Imames (A.S.) é que a
reflexão sobre o tema não é considerada em si algo proibido como alguns a tomam
de maneira equivocada. Na realidade, o que pode ser entendido como vedado é a
polêmica e a especulação sobre o tema. Ao reportarmos ao Alcorão encontraremos
significativas passagens que apontam para estas duas realidades em
justaposição, se bem que uma reflexão se faz necessária para definir um correto
entendimento daquilo que Allah deu a conhecer ao homem sobre esta questão. Diz
o Alcorão Sagrado: “E de quando o teu Senhor extraiu das entranhas dos filhos
de Adão os seus descendentes e os fez testemunhar contra si próprios, dizendo:
Não é verdade que sou o vosso Senhor? Disseram: Sim! Testemunhamo-lo! Fizemos
isto com o fim de que no Dia da Ressurreição não dissésseis: Não estávamos
cientes”. (7:172) “Toda a ventura que te ocorra (ó homem) emana de Deus; mas
toda a desventura que te açoita provém de ti. Enviamos-te (ó Mohammad) como
Mensageiro da humanidade, e Deus é suficiente testemunha disto”. (4: 79) “A
Deus pertence tudo quanto existe nos céus e na terra, para castigar os
malévolos, segundo o que tenham cometido, e recompensar os benfeitores com o
melhor..” (53 : 31) Esses três ayát (versículos) exemplificam o fato de que o
homem é responsável por suas ações e detém uma considerável parcela de livre-arbítrio,
pois sem a qual não poderia ser recompensado nem castigado. Se aceitássemos
como verdadeira a opinião dos que negam inteiramente o livre-arbítrio, o homem
seria um mero marionete incapaz de agir e escolher o que quer que fosse, logo,
todo o sentido da mensagem divina se anularia. Em vários outros ayat se
evidencia que o homem é o elemento agente de suas escolhas e ações. Entretanto
o mecanismo da predestinação não se restringe a isso. O homem como todas as
demais criaturas é parte integrante do cosmos, e como tal encontra-se submetido
às leis que regem o universo, leis estabelecidas por seu Criador; que de modo
inevitável regem certos fenômenos que estão além do âmbito de ação do homem.
Como leis universais, são igualmente imutáveis e este é um aspecto fundamental
do Qadar, pelo qual podemos afirmar que o Decreto Divino define a origem, a
natureza e o fim das coisas, a constituição, a forma dos seres e a propriedade
dos elementos que compõem o universo. Assim evidencia o Alcorão: “Glorifica o
nome do teu Senhor, o Altíssimo, que criou e aperfeiçoou tudo; Que tudo
predestinou e encaminho…” (87 1 A 3) “E o agraciará, de onde menos esperar.
Quanto àquele que se encomendar a Deus, saiba que Ele será Suficiente, porque
Deus cumpre o que promete. Certamente Deus predestinou uma proporção para cada
coisa..” ( 65: 3) Inserido neste contexto cósmico, é evidente que o homem está
submetido a inúmeros fatores e manifestações da determinação divina, há
similarmente um grupo de ayát que evidenciam o decreto divino sobre o destino
das criaturas: “Em verdade, Deus possui o conhecimento da Hora, faz descer a
chuva e conhece o que encerram os ventres maternos. Nenhum ser saber o que
ganhará amanhã, tampouco nenhum ser saberá em que terra morrerá, porque (só)
Deus é Sapiente, Inteiradíssimo!” (31: 34) “Em verdade, aqueles a quem
predestinamos o Nossos bem, serão afastados disso”. (21: 101) “Aqueles a quem
Deus desviar (por tal merecerem) ninguém poderá encaminhar, porque Ele os
abandonará, vacilantes, em sua transgressão.” (7 : 186) Estes e outros ayát que
tratam do decreto divino sobre a vida e o destino humano tem sido citados pelos
que propõem o determinismo absoluto. Todavia, a análise dos defensores desta
opinião se demonstra incompleta, pois é absolutamente necessário tomarmos um
terceiro grupo de ayát que nos informam um outro importante ponto da
predestinação divina: as razões (ligadas a justiça de Allah) que conduzem o seu
veredicto sobre suas criaturas: “Teu Senhor conhece tanto o que dissimulam os
seus corações como o que manifestam (as suas bocas)”. (28 : 69) O que se
depreende destes ayát é que Allah, o Supremo conhecedor de todas as coisas, do
passado e do futuro de todas as coisas, ao criar a alma já é perfeitamente
ciente de tudo sobre ela (de suas ações futuras) e fundamentado nesta ciência
absoluta decreta o seu final destino. Não se diz com isso que Allah não dê o
livre-arbítrio ao homem, se diz que Ele em sua sabedoria absoluta, conhece o
modo como cada criatura usará seu livre-arbítrio, o que carregará em seu
coração, se a crença ou a descrença, o bem ou o mal, se se arrependerá de seus
pecados ou não. Se merecerá a orientação para a senda reta, ou se merecerá ser
desviado. De nenhum modo se diz que Allah retire do homem a escolha que possa
levá-lo seja ao bem ou ao mal. Nenhum dos aspectos da determinação divina que
cercam o homem neste mundo (os fatores hereditários, o lugar onde nasceu, a
família a que pertence, as características naturais que recebeu, a provisão
destinada a ele, o tempo de vida na terra etc. são decisivos no Qadar relativo
a seu destino final apenas o exercício de sua liberdade de ação e escolha. E no
exercício dessa faculdade no decorrer de sua vida o homem pode granjear a
misericórdia divina ou ser afastado dela, evidencia o Alcorão: “Porém, àquele
que dá (em caridade e é temente a Deus, E crê no melhor, Facilitaremos o
caminho do conforto. Porém, àquele que mesquinhar e se considerar suficiente, E
negar o melhor, facilitaremos o caminho da adversidade”. (92 : 5 a 10) “E Deus
aumentará os orientados na orientação. As boas ações, as perduráveis, são mais
meritórias e mais apreciáveis aos olhos do teu Senhor.” (19: 76) Este é um
fator preponderante no mecanismo da predestinação: o homem conta com sua
liberdade de escolha e ação, porém a capacidade de realização não pertence a
ele, esta provém unicamente de Allah. Sem a permissão divina nada se
concretiza, nem para o bem nem para o mal, assim se um homem que cujo coração é
puro em sua intenção e por isso alcança misericórdia perante Allah, a senda das
boas ações lhe será facilitada e a senda da perdição será afastada dele,
enquanto aquele que tem seu íntimo dominado pela descrença, o mal e o orgulho,
lhe será abrilhantada a senda da perdição e lhe será afastada a senda divina da
salvação. Os seguintes ayát evidenciam essa realidade: “A quem Deus quer
iluminar, delata-lhe o peito para o Islam; a quem quer desviar (por tal
merecer), oprime o peito, como aquele que se eleva na atmosfera. Assim, Deus
cobre de abominação aqueles que se negam a crer”. (6: 125) “Afastarei dos Meus
versículos aqueles que se envaidecem sem razão, na terra e, mesmo quando virem
todo o sinal, nele não crerão; e, mesmo quando virem a senda da retidão, não a
adotarão por guia. Em troca, se virem a senda do erro, tomá-la-ão por guia.
Isso porque rejeitaram os Nossos sinais e os negligenciaram”. (7 : 146) Em
qualquer dos casos, seja para a salvação ou a perdição do homem em seu destino
final, Allah baseia o seu decreto no exercício de seu livre-arbítrio,
conhecendo na plenitude o estado em que deixará este mundo, na profundidade de
seu íntimo e quais serão as ações que mais pesarão em seu registro. Um outro
equívoco resultante do determinismo é a atitude do homem de entregar-se a um
conformismo diante do que entende como um destino pré-fixado. Esta atitude o
arrasta à perigosa posição de justificar sua fraqueza e a ausência de
determinação e luta para melhorar-se confiando sua responsabilidade ao destino.
Os que assim agem, com frequência atribuem as consequências de seus erros e omissões
à “vontade divina”. Ao homem não é dado conhecer o mecanismo da predestinação
desencadeado sobre os fenômenos, logo, nenhum homem pode dizer “isto é o
destino ou a vontade divina” sob pena de estar falando algo que não conhece
sobre Allah, o que o Alcorão proíbe. Podemos dizer que Allah tenha permitido
que algo acontecesse (pois nada acontece sem a sua permissão) mas não que tenha
sido sua vontade, porque isto pertence ao invisível e ao oculto que só ELE
conhece. Muitos dos fatos que ocorrem na vida de uma pessoa, são meros efeitos
de suas escolhas e ações, (ou como efeito das ações de outros) ora, se um homem
adquire uma doença incurável que o leva a morte após levar parte de sua vida
cometendo excessos e agressões a seu organismo, poderemos dizer que esta foi a
“Vontade divina”? Não. Poderemos dizer que Allah permitiu que ele assim agisse
e que as consequências de suas ações o alcançassem neste mundo. A morte desse
homem foi decretada deste modo (pela doença) porque Allah sabia que ele seria
um insensato e que se entregaria a todo tipo de excessos e que provocaria sua
própria morte desta maneira. A maior negação ao determinismo extremado se
encontra no próprio Din que nos orienta a buscar sempre o melhor, a utilizarmos
de nosso intelecto e de todos os demais recursos que nos tenham sido dados para
nos esforçarmos em busca dos benefícios deste mundo e do outro e jamais
abdicarmos de nossa razão. O ceder a imprudência sob o pretexto de um
improvável “tudo está predestinado” é o modo mais vulgar de se abdicar da razão
e agir nesciamente. Tal atitude não encontra base alguma no Din, e não pode ser
definida de outra maneira senão como estupidez voluntária. Nas tradições,
consta que uma vez Imam Ali (A.S.) estava descansando a sombra de uma parede
que parecia estar prestes a desabar. De repente se levantou e foi se sentar à
sombra de uma árvore. Um homem perguntou: “Estás escapando do que Allah te
destinou?” Respondeu: “Estou me refugiando no poder de Allah daquilo que me
tenha destinado, ou seja, estou indo de um destino a outro, o sentar-me e o
levantar-me estão igualmente sujeitos ao destino. Se a parede cai sobre mim e
eu me firo, isto será predestinação e destino, e se saio da zona de perigo e
escapo do mal também será predestinação e destino”. Há um hadith atribuído ao
Profeta (S.A.A.S.) que diz que certa vez foi perguntado se a medicina e a magia
poderiam alterar o Qadar (Decreto Divino) e o Mensageiro (S.A.A.S.) disse:
“Estes fazem parte do Qadar”. Deixando claro que qualquer benefício ou
malefício só se torna efetivo com a permissão Divina. Ao homem, porém, a quem
não é dado o conhecimento do invisível, é requerido que haja com empenho na
busca do melhor, que adote precauções, que diante de uma doença busque o
tratamento que lhe pareça melhor, enfim, que use a razão nos assuntos de sua
vida e não se omita de fazê-lo com base em suposições infundadas acerca da
predestinação divina. Muito embora qualquer benefício ou malefício só alcancem
o homem com o conhecimento e a permissão de Allah, é obrigatório para o homem
esforçar-se na busca do primeiro e no afastamento do segundo, com todos os
recursos que estejam a seu alcance e manter sua confiança em Allah em todas as
circunstâncias. www.arresala.org.br.
Abraço. Davi
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