quinta-feira, 3 de agosto de 2017

I. A VERDADEIRA NATUREZA DO ESPÍRITO.

Bhagavad Gita. Capítulo Dois. I. A VERDADEIRA NATUREZA DO ESPÍRITO. Neste capítulo se ensina como se pode, por meio da meditação filosófica, obter a verdadeira concepção do Universo, isto é, o conhecimento da nulidade e instabilidade de todas as formas que existem no mundo dos fenômenos, em contraste com o Ser Eterno, e como este conhecimento nos conduz ao caminho da liberdade espiritual e da imortalidade.

Continua Sanjaya a contar:
1. KRISHNA, cheio de amor, piedade e compaixão, disse a Arjuna, vendo a sua pungente tristeza e as lágrimas nos seus olhos:

2. Donde te vem, ó Arjuna, essa pusilanimidade? Esta fraqueza, indigna de um homem, faz-te infeliz, pois te fecha as portas do céu (1).
(1) O homem que está cheio de medo e dúvidas, afasta-se por si mesmo do céu da bem-aventurança, que é próprio à alma que conhece a verdade.

3. Não te entregues a ela; sacode de ti essa cisma desprezível, levanta-te resoluto e bravo, ó vencedor de inmigos!

4. Respondeu Arjuna: Ó meu caríssimo! Como posso eu atacar e combater a Bhishma e Drona, quando a ambos respeito e estimo?

5. Seria melhor, para mim, comer o pão seco e sem sabor de mendigo, do que ser o instrumento de morte a estes nobres e respeitáveis homens, que eram meus preceptores e mestres! É verdade que eles são ávidos a riqueza e o poder, sobre os quais há manchas de sangue dos meus queridos!

6. Não posso dizer se é melhor que nós os vençamos ou que eles nos vençam a nós. Mas sei que eu não desejaria viver nem um minuto mais, se visse morrer os meus parentes e amigos, os filhos do rei Dhritarashtra e o povo de Kuru.

7. Compaixão e ânsia comprimem o meu coração, e a minha mente vacila diante do problema que se lhe apresenta. Não sei o que devo fazer. Dissipa tu, ó KRISHNA, estas dúvidas; dize-me, qual é o meu dever. Eu sou teu discípulo: prostrado perante Ti, peço que me dês as instruções de que careço.

8. Tão confuso está o meu entendimento, que não posso descobrir nada que acalme a febre da minha mente: o meu interior está em fogo que seca as minhas faculdades. Ainda que eu ganhasse um reino na Terra, cujo brilho excedesse a todos os outros reinos como os Sol excede às estrelas, ou conseguisse o poder dos deuses e o domínio sobre os exércitos celestes, minha aflição não diminuiria. Não, eu não quero combater.

9. Continua Sanjaya:
Depois de ter falado assim ao Senhor da Criação, Arjuna caiu em silêncio.

10. Então KRISHNA, sorrindo ternamente, dirigiu ao desanimado as seguintes palavras, achando-se ambos no meio do espaço entre os dois exércitos.

Palavras do Verbo Divino (1)
11. Sem necessidade te entristeces e afliges; contudo, as tuas palavras têm grãos de verdade. Elas exprimem a sabedoria do mundo exterior (exotérica), mas não satisfazem à mente interior (esotericamente); são, pois, apenas a expressão de uma parte da verdade. Os sábios não se entristecem nem por causa dos vivos nem por causa dos mortos.

12. Sabe, ó príncipes de Pandu, que nunca houve tempo em que não existíssemos eu ou tu, ou qualquer destes príncipes da Terra, igualmente, nunca virá tempo em que algum de nós deixe de existir (1).
(1). O que no homem é divino, o seu Ser verdadeiro, é eterno. Não nasce nem morre, e forma a sua individualidade, que aparece periodicamente, vestida de corpo material, mas é independente dele.

13. Assim como a alma, vestindo este corpo material, passa pelos estados de infância,  mocidade, virilidade e velhice, assim, no tempo devido, ela passa a um outro corpo, e em outras encarnações, viverá outra vez. Os que possuem a sabedoria da doutrina esotérica (interior), sabem isto é, não se deixam influenciar pelas mudanças a que está sujeito este mundo exterior.

14. Os sentidos dão-te, pelas apropriadas faculdades mentais, o sentimento do calor e do frio, do prazer e da dor. Mas estas mudanças vêm e vão, porque pertencem ao temporário, impermanente, inconstante. Suporta-as com equanimidade, valentia e paciência, ó príncipe!

15. O homem que não se deixa mais atormentar por essas coisas - que se conserva firme e inabalável no meio do prazer e da dor - que possui a verdadeira igualdade de ânimo: esse, crê-me, entrou no caminho que conduz a imortalidade.

16. Aquilo que é irreal, ilusório, não tem em si o Ser Real, não existe na realidade, e sim só na ilusão; e aquilo que é o Ser Real, nunca cessa de ser - nunca pode deixar de existir, apesar de todas as aparências contrárias. Os sábios, ó Arjuna, fizeram pesquisas relativas a isto e descobriram a verdadeira Essência e o sentido interior das coisas (1).
(1).Só aquele Ser, no homem que é penetrado pela Verdade, pode conhecê-la, porque a Verdade é a sua essência e conhece-se, no homem, a si mesma.

17. Sabe que o Ser Absoluto, de que todo o Universo tem o seu princípio, está em tudo, e é indestrutível. Ninguém pode causar a destruição desse Imperecível (2).
(2). O corpo é o instrumento do Espírito; é a sombra incorpórea, em que a Luz se esforça por manifestar-se.

18. Estes corpos caducos, que servem como envoltórios para as almas que os ocupam, são coisas finitas, coisas do momento, e não são o verdadeiro Homem real. Eles perecem, como todas as coisas finitas; deixa-os perecer, ó príncipe de Pandu, e, sabendo isto, prepara-te para o combate.

19. Aquele que pensa, em sua ignorância: "Eu mato ou Eu serei morto", procede como criança que não tem conhecimento da verdade, porque o que é na realidade, é eterno, e o Eterno não pode matar nem ser morto.

20. Conhece esta verdade, ó príncipe! O Homem real, isto é, o Espírito do homem, não nasce nem morre. Inato, imortal, perpétuo e eterno, sempre existiu e sempre existirá. O corpo pode morrer ou ser morto e destruído; porém, aquele que ocupou o corpo, permanece depois da morte deste (1).
(1). O Espírito é a vida mesma; isto é, a Vida Eterna, de que a vida exterior, corporal, é só um reflexo, uma manifestação de ordem inferior.

21. Quem conhece a verdade de que o Homem real é eterno, indestrutível, superior ao tempo, a mudança e aos acidentes, não pode cometer a estultice de pensar que pode matar ou ser morto.

22. Como a gente tira do corpo as roupas usadas e as substitui por novas e melhores, assim também o habitante do corpo (que é o Espírito), tendo abandonado a velha morada mortal, entra em outra, nova e recém preparada para ele (1).
(1). A reencarnação é uma lei Universal em toda a natureza. O espírito do homem desencarnado volta, depois de um tempo de descanso, a ocupar um novo corpo, formando assim nova pessoa. Enquanto a alma não tem conhecimento espiritual de si mesma este processo é inconsciente.

23. O Homem real, o Espírito, não pode ser ferido por armas, nem queimado pelo fogo; a água não o molha, o vento não o seca nem move.

24. Ele é impermeável, incombustível, indissolúvel, imortal, permanente, imutável, inalterável, eterno e penetra tudo.

25. Em sua essência, é invisível, inconcebível, incognoscível (2). Sabendo isto, não te entregues à aflição pueril.
(2). Isto é, para o intelecto exterior; mas é cognoscível (que se consegue conhecer) para a percepção interior de homem espiritualmente iluminado.

26. Se, porém, não o crês, e pensas que nascimento e morte são coisas reais, mesmo assim te pergunto: por que te lamentas e entristeces?

27. Pois, em verdade, a morte deriva do nascimento, e o nascimento dimana da morte. Não te aflijas, pois, pelo inevitável

28. Aqueles que carecem da Sabedoria Interior, ignoram de onde vimos e para onde vamos; conhecem só aquilo que e transitório. No Ser Eterno, todas as coisas são compreendidas no estado invisível; depois se fazem visíveis, e na morte tornam a ser invisíveis. Por que então lamentar?

29. Quanto à alma, o Homem real, Espírito ou Ser Eterno, alguns o tomam por coisa maravilhosa; outros ouvem falar e falam dele como de uma maravilha, com incredulidade e sem compreensão. Mas  a mente mortal não compreende esse mistério, nem o conhece em sua natureza verdadeira e essencial, apesar de tudo o que foi dito, ensinado e pensado a seu respeito (1).
(1). Só pode compreender o Ser Eterno, quem o realizou em si mesmo.

30. O Espírito, esse Homem real que habita o corpo, é invulnerável e indestrutível: é a vida mesma. Não há, pois, motivo para te abandonares à aflição e tristeza. 

31. Deves estar atento ao teu dever. Tu, que és um príncipe da casa dos guerreiros, tens por dever combater com resolução e heroísmo.


32. O dever de um soldado é combater, e combater bem. O combate justo honra o guerreiro e abre-lhe a porta do céu. Livro Bhagavad Gita - A Mensagem do Mestre. Abraço. Davi.

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