domingo, 10 de março de 2024

UMA SENDA QUE NÃO PODE SER BUSCADA

 

Teosofia. Sociedade Teosófica no Brasil. Março de 2017. Por Pedro Oliveira. UMA SENDA QUE NÃO PODE SER BUSCADA. Hoje a palavra “espiritualidade” significa coisas diferentes para pessoas diferentes. Algumas a interpretam como crenças, outros, como certo modo de vida e alguns, ainda, como uma senda de autodescoberta. Muitas vezes ouvimos a expressão: “Escolhi uma senda que me agrada”. Essa escolha aparentemente não parece levar a mudanças e transformações na vida. Essa “senda” torna-se parte da vida sem mudar a percepção de quem somos. Essa “senda” torna-se parte do “equipamento” de nossa vida sem, entretanto, contestar a percepção do que somos. Essa “senda” é outra forma de distração. T. Subba Row (1856-1890) foi um proeminente teósofo na Índia, no início da Sociedade Teosófica, que tinha contato direto com Helena Petrovna Blavatsky (1831-1891) e com o cofundador dessa sociedade Henry Steel Olcott (1832-1907). Um dos Mahatmas afirmou que ele era “um Brahmin iniciado e conhecia os ensinamentos esotéricos”. Ele trata o assunto da senda espiritual do ponto de vista mais profundo da Filosofia Oculta (Gupta-vidya). Ele fala de duas sendas: uma que segue a maneira normal evolucionária e conduz a um firme progresso, e outra que apresenta ao estudante uma jornada árdua de direta auto conformação e de seus perigos resultantes. Como veremos, parece que vale a pena escutá-lo. Numa discussão na Biblioteca de Adyar em 1º de dezembro de 1888 sobre “O Ocultismo no Sul da Índia”, que foi mais tarde publicado como um artigo em The Theosophist, janeiro de 1888. Subba Row compartilhou seus insghts sobre a visão mais profunda da espiritualidade. Esta filosofia reconhece duas sendas, ambas com o mesmo fim, uma mortalidade glorificada. Uma é a firme senda natural de progresso através de esforço moral e prática de virtude. O resultado é um crescimento seguro da alma, uma posição de firme equilíbrio atingida e mantida que não pode ser perdida ou sacudida por qualquer ataque inesperado. É o método normal seguido pela vasta massa humana e é o curso que Sankaracharya (788-820) recomendou a todos seus sannyasis e sucessores. O outro caminho é a íngreme senda do ocultismo, através de séries de iniciações. Somente algumas naturezas especialmente organizadas e escolhidas são adequadas a esta senda. Em A Voz do Silêncio, fragmento II, Blavatsky também faz referência a duas sendas: Discípulo, há uma senda e no fim, é dupla. Seus estágios são marcados por sete portais. No fim de uma, a bem-aventurança é imediata, e na outra, a bem-aventurança é protelada ... A senda aberta conduz à mudança sem mudança – Nirvana, o glorioso estado do Absoluto, a felicidade além do pensamento humano. Portanto, a primeira senda é libertação, mas a segunda é renúncia e chamada de Senda da dor. Subba Row sugere que na primeira senda o progresso é por meio de esforço moral e da prática de virtudes. É a construção do caráter, possivelmente em muitas vidas. Quando meditamos sobre as virtudes e as assimilamos, elas naturalmente modelam o caráter futuro do indivíduo. Por exemplo, se meditamos na natureza da compaixão de maneira prolongada, torna-se muito mais difícil produzir dor em outro ser senciente. A mente então adquire um forte sentido de equilíbrio e estabilidade que torna mais fácil para ela ir através do complexo processo da experiência sem se tornar agitada ou desencorajada. Uma vida virtuosa produz um profundo senso de flexibilidade, força interior e de equilíbrio. A outra, é a Senda da Dor. O aumento do progresso oculto nesta senda é efetuado pelo Adepto, dirigindo para o chela várias forças ocultas que o capacitam a obter prematuramente um conhecimento de sua natureza espiritual e obter poderes para os quais ele não está moralmente capacitado pelo seu grau de progresso. Nestas circunstâncias pode acontecer que o chela perca seu equilíbrio moral e caia na senda do dugpa. Mas não podemos concluir que a escola de ocultismo do sul da Índia veja o adeptado e a iniciação como um erro nem como uma usurpação perigosa das funções da Natureza. Atualmente a palavra ocultismo é muito mal aplicada. Seu sentido no dicionário é envolver ou relacionar poderes mágicos, práticas e fenômenos místicos, supernaturais. As vezes também é associada a nefastas práticas mágicas. Blavatsky a usa como sinônimo da sânscrita gupta vidya, conhecimento secreto. Secreto não porque os que o possuem são um bando de elitistas espirituais, mas porque este conhecimento leva ao despertar das faculdades ou poderes espirituais até agora adormecidos que, mal-usados, podem causar ao praticante e a seus circundantes incríveis danos. Quando um ser humano mediano é tomado de fúria, pode fazer muito dano. Mas quando um chela ou discípulo perde seu equilíbrio, a capacidade de ação destrutiva pode ser multiplicada por cem. Trilhar a senda oculta foi comparado a ser virado ao avesso. A menos que nossos motivos reais sejam expostos pelo que são, não estaremos prontos para nos aventurar no caminho do autoconhecimento. Como disse certa vez Sri Chandrasekharendra Saraswato (1894-1994), o sábio de Kanchi, o autoconhecimento é a mais longa jornada para o mais próximo lugar. Esta afirmação tem a notável qualidade de mostrar que a alma e mente humana tendem a se perder no processo da experiência, vagando por sendas paralelas que são buscadas por apego e desejo, parecendo ser reais. A morada desse apego é sempre o ilusório sentido do eu. Vivekachudamani esclarece este assunto ao destacar a natureza do perigo que envolve a auto absorção. Para o sábio não há outro perigo a não ser a negligência a respeito da forma real do eu. Dela brota o engano ahamkara, de ahamkara a dependência, e da dependência a dor. O termo sânscrito ahamkara as vezes traduzido como a faculdade para fazer, parece sugerir que, o eu em nós, usa constantemente as experiências da vida para ficar mais forte e flexível, mantendo a consciência como uma natureza secundária. O propósito da senda oculta não e mais do que a destruição desta teia de ilusões tecida pelo eu. Naturalmente esse esforço possivelmente não agrade a todos. O que torna a senda oculta especialmente singular na ordem da Natureza entre outros aspectos é o processo de testar o chela, o discípulo. Nas Cartas dos Mahatmas é dito que é diferente de tempos antigos: O aspirante agora é atacado no lado psicológico de sua natureza. O curso deste teste, na Europa e na Índia, é que Raj-yoga é seu resultado, como explicado frequentemente, desenvolve em seu temperamento cada germe bom ou mau. A regra é inflexível e ninguém escapa quer ele nos escreva uma carta, ou no recinto privado de seu coração, embora um forte desejo por comunicação e conhecimento. Estaremos prontos para ver nosso orgulho, ciúme, sentimento de auto importância e arrogância, vendo -0s pelos que são, tentáculos do eu pessoal? Se não estivermos, porque as energias que surgem na senda ocultam certamente aumentam essas tendências e lhe dão um poder que certamente vence o candidato mal preparado. Como disse um dos Mestres: O ocultismo não é brincadeira. Outra palavra mencionada na afirmação de Subba Row previamente citada é iniciação. Extremamente superficial tem sido o uso desse termo hoje, quase sempre acompanhado de autoglorificação e auto exaltação. Se você tiver um cartão de crédito, você poderá mesmo comprar uma iniciação! Por outro lado, quando lemos com cuidado certos trechos das Cartas dos Mahatmas, não podemos deixar de ver que a real iniciação pode envolver a entrada na sagrada dimensão de vida e da consciência, que sem experiência a linguagem comum e a mente comum são incapazes de entender. O irmão Sri Ram (1889-1973) nos dá sua profunda compreensão deste singular assunto: A ideia superficial sobre iniciação é que a pessoa vá a determinada sala e vêm alguém lhe diz várias coisas, lhe dão roupas diferentes apresentadas com um talismã e outras coisas. Essa é uma visão muito pobre. A iniciação significa que o aspecto mais profundo de nós se move para a superfície, a mônada, faz o voto através do ego. A palavra iniciação significa um começo. Entramos em contato com nossa natureza espiritual na Primeira Iniciação, primeiro com buddhi e depois atman. Este começo na realidade é o plantar da semente. Depois deste contato, começamos a ser cada vez mais cônscios dessa natureza. A semente crescerá como Árvore de Sabedoria. Este é o significado da palavra sânscrita dvi-já, nascido duas vezes, uma maneira simbólica de referir-se ao nascimento através da mãe no mundo físico e o segundo nascimento em espírito. Logo a seguir outra afirmação de T. Subba Row no artigo mencionado acima: A hierarquia de Adeptos é um produto exclusivo da Natureza como a árvore, tem um indispensável propósito e funciona na evolução da raça humana. Esta função deixa aberta a senda superior pela qual desce luz e orientação sem as quais nossa raça precisaria dar cada passo pelo cansativo e interminável método de tentativa e erro em cada direção, até que a sorte mostre o caminho certo. Na verdade, a função da hierarquia de Adeptos é fornecer instrutores religiosos para as trôpegas massas da humanidade. Há alguns anos na Austrália uma pesquisa revelou que aproximadamente 53% de jovens com idades entre 18 e 25 anos diziam ser ateus. Muitos outros diziam ser agnósticos. A atitude de jovens sobre religião mudou drasticamente nos últimos quarenta anos. Em muitos lugares no mundo, a religião continua a ser denunciada na mídia, quer por escândalos envolvendo sacerdotes, pastores e swamis. Ou devido a atitudes fundamental que levam a violência sectária, agressão e eventualmente ao terrorismo. A despeito dessas tendências, os princípios éticos contidos nas grandes religiões do mundo são sempre válidos. Porque falam de compaixão, bondade e da riqueza espiritual que abençoa a vida além dos estreitos muros do egoísmo e isolamento psicológico. A expressão “manter aberta a senda superior, por onde desce a luz e orientação” parece indicar que genuínos e verdadeiros instrutores proporcionam as pessoas um sentido de permanente direção. Uma direção que não é uma ideologia totalitária nem uma crença, mas essencialmente uma maneira de viver que conduz a uma completa e irreversível regeneração da mente humana. Dotando-a com um insight transformador no propósito não criado que é a ordem do Universo. Mas Subba Row adverte: Esta senda é eminentemente perigosa aos que não têm o talismã que garante a segurança. Este talismã é uma devoção ao bem religioso da humanidade, completamente sem egoísmo, auto esquecida. Auto anulada, uma abnegação que não é temporária. Mas nunca deve ter fim, cujo objetivo é a iluminação religiosa da raça humana. Sem este talismã, embora o progresso do chela possa ser muito rápido por um tempo, chegará a hora em que seu avanço não irá adiante, quando seu valor real se mostrar, e o homem que progrediu na lenta e firme senda será o primeiro a mergulhar na luz do Logos. Embora o ideal descrito acima pareça extraordinariamente difícil e quase além da possibilidade humana, um de seus pontos centrais é a necessidade de ter uma infatigável honestidade a respeito de nossos reais motivos na vida. É verdade que enquanto o absoluto altruísmo pode estar acima da experiência comum de muitas pessoas, nós temos ao menos a capacidade de detectar por um inflexível questionamento. Os motivos que são de auto interesse, que buscam a própria vantagem ou pior, desejam explorar ou derrotar os outros, humilhando-os perante nossa maior glória e sucesso. Buddha ensinou a seus discípulos que o eu pessoal é como um estranho que chega à noite em nossa casa. É bem recebido e após algum tempo nos mata e assume nossa propriedade. Talvez muitos seres humanos não percebam o perigo do auto centralização. Isso pode levar a uma vida infeliz, para si e para os outros, atrasando a oportunidade de percepção e autotransformação. E, se tentarmos nos aproximar da senda oculta sem o talismã de um firme proposito altruísta, os tentáculos do eu pessoal ficarão mais fortes, aumentados pela sempre presente energia da senda que é a Verdade. Esta escola recomenda como a melhor senda para todos, devoção à virtude, afastamento gradativo das preocupações materiais, distanciamento das forças da vida do mundo lá fora e de seus interesses. Direcionar estas forças para a vida interna da alma, até que o homem seja capaz de retirar-se para dentro de si mesmo e depois, voltando-se ao Logos e a vida espiritual. Afastar-se do plano material, passando primeiro pela vida astral e depois pela vida espiritual até por fim atingir o Logos e chegar ao Nirvana. Textos clássicos importantes sobre a vida, como os Upanishads, o Bhagavad-gita, os Yoga Sutras de Patanjali, O Dhamapada, o Prajnaparamita Sutras, o Sermão da Montanha do Mestre Jesus, os poemas de Jalaluddin Rumi, entre muitos outros. Todos apresentam ensinamentos claros e inspiradores de como viver a vida espiritual. Esses ensinamentos foram comprovados por incontáveis gerações de praticantes em todo mundo. Eles não envolvem os rigores que são requeridos na sendo oculta, sendo sua tônica a devoção à virtude. Por isso é mais sábio não buscar a senda do discipulado, se o homem for talhado para isso, seu karma o conduzirá imperceptível e infalivelmente. Porque a senda do ocultismo busca o chela e não deixará de encontrá-lo quando o homem adequado se apresentar. O último conselho de Subba Row aos estudantes realça a questão do motivo: por que procurar a senda esculta? E um conselho igualmente significativo, no mesmo paragrafo acima, afirma que a senda do ocultismo busca o chela e não deixará de encontrá-lo quando o homem adequado se apresentar. Se houver uma profunda ressonância em nossa natureza interna ao propósito fundamental da senda oculta, para ajudar no trabalho de regeneração da consciência humana. Nosso karma fará os ajustes necessários e aporta pode ser aberta pelos progressos feitos por uma vida altruísta que visa trazer a luz da sabedoria à humanidade. E esta nossa vida, exceto por retiro público. Descobre línguas nas árvores, livros nos córregos e sermões em pedras e o bem em tudo. Esta expansão de nossa sensibilidade em todos os aspectos de nossa natureza pode realmente nos tornar uma simples força beneficente na natureza. Já foi dito por aqueles que sabem que o desabrochar desta força ou poder beneficente não tem limites. Parece não haver dúvida de que o mundo precisa de muito mais força beneficente para sobrepujar seus atuais desafios. Dentro de ti está a luz do mundo, a única luz que pode mostrar a senda. Se não puderes percebê-la em ti, é inútil procurá-la em outro lugar. Abraço. Davi.

 

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